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Donald Shoup, em seu livro Parking and the City (“Estacionamentos e a cidade”), defende a remoção dos estacionamentos gratuitos das ruas da cidade e o investimento das receitas a melhoraria de calçadas, mobiliários urbanos e segurança viária.

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PAIVA, Lincoln. Quem paga o alto custo de estacionar carros nas ruas? Resenhas Online, São Paulo, ano 17, n. 196.02, Vitruvius, abr. 2018 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/17.196/6957>.


Donald Shoup, professor de planejamento urbano da UCLA, vem estudando os impactos dos estacionamento dos carros nas ruas das cidades desde 1978. Ele é conhecido pelos urbanistas do mundo todo como o guru contra os estacionamentos em vias públicas. Ao longo de sua carreira acadêmica escreveu inúmeras pesquisas e artigos sobre o assunto, em 2005 lançou o livro O alto custo do estacionamento gratuito. E agora em 2018 ele lançou o livro intitulado Parking and the City (ou “Estacionamentos e a cidade, em tradução livre).

Segundo o professor, “o estacionamento de carros é o maior uso do solo na maioria das cidades; há mais solo dedicado ao estacionamento de carros do que para habitação, escolas, comércio ou hospitais”. Segundo Shoup, não tem nenhum sentido oferecer estacionamentos gratuitos para uma parte da cidade e em outras partes cobrar do cidadão; na prática, o cidadão paga para usar o espaço que é público, mas com que benefícios para a cidade?

As cidades que privatizaram os estacionamentos de carros nas vias públicas enfrentam hoje enormes problemas com o serviço oferecido pelos concessionários, com a justiça, com despesas de processos de vários agentes da economia e também com as queixas sobre a constitucionalidade da cobrança sobre o uso e ocupação do espaço público.

Em 2008, no auge da crise imobiliária, a cidade de Chicago passava por um enorme déficit orçamentário. O então prefeito, Richard M. Daley, procurava novas formas de ajudar a preencher o déficit existente quando foi abordado por consultores de negócios sobre um novo potencial da Parceria Público-Privada – PPP: o arrendamento dos parquímetros da cidade. Sob forte pressão do dilema orçamentário, o prefeito e seu diretor financeiro concederam, através de um contrato de concessão de 75 anos, o controle dos 36 mil parquímetros da cidade para o vencedor de uma concorrência do setor privado, a Morgan Stanley Infrastructure Partners – MSIP. Os vereadores expressaram na ocasião forte preocupação com a forma apressada que o acordo foi feito, sem tempo suficiente para avaliação cuidadosa sobre possíveis riscos de longo prazo que a cidade estava assumindo.

A privatização do estacionamento rotativo de Chicago é considerada hoje um case negativo sobre as novas formas de obrigações de gerenciamento de risco que as prefeituras frequentemente absorvem nos contratos de concessão de arrendamento de infraestrutura. Na busca de alívio orçamentário de curto prazo, a cidade de Chicago perdeu intencionalmente grande parte de sua flexibilidade para atender e proteger os interesses e as necessidades de seus cidadãos, além de absorver custos adicionais de longo prazo.

A cidade de Chicago tem o custo mais alto nos Estados Unidos de estacionamentos nas ruas, sendo mais cara do que os estacionamentos privados: para estacionar um carro na rua custa cerca de US$ 6,50 por hora, o equivalente a R$ 22,75 por hora. A cidade tem que arcar com custos de estacionamento gratuitos para idosos e pessoas com mobilidade reduzida. A cidade também perdeu o controle sobre o espaço público: os fechamentos de ruas para comemorações e manutenções implicam em indenizações para a iniciativa privada.

O problema maior de Chicago foi que sua avaliação econômica do arrendamento de 75 anos produziu resultados extremamente desfavoráveis para a cidade. Uma análise mais profunda da estrutura financeira do acordo levou muitos especialistas a concluirem que a cidade havia subestimado grosseiramente o valor de seus ativos e que a taxa de desconto utilizada para cálculos de valor presente não foram precisas. A estrutura financeira de um governo é muito diferente da perspectiva das entidades privadas. Usando a metodologia de incorporação do risco, os novos cálculos mostraram que a taxa de descontos utilizada deveria ter sido de 7% em vez dos 5% utilizados pelos consultores da prefeitura. Projeções financeiras internas foram altamente subestimadas e custam potencialmente à cidade de Chicago vários bilhões de dólares em perdas de receita.

Em seu balanço acerca da questão, Donald Shoup defende as seguintes medidas que as cidades devem tomar em relação aos seus estacionamentos:

  • remover todos os estacionamentos gratuitos das ruas da cidade;
  • cobrar preços corretos para estacionar na rua de acordo com uma estratégia de crescimento da cidade;
  • investir as receitas com estacionamentos na rua para melhorar os serviços públicos : Calçadas, mobiliários urbanos, segurança viária etc.

Os pontos de vista defendidos por Shoup traz luz para um episódio em curso na cidade de São Paulo. Antes de renunciar ao cargo, o prefeito João Dória lançou um projeto de concessão do serviço público de estacionamento rotativo pago (Zona Azul), visando o adiantamento de valores de cerca de R$ 1 bilhão pelo arrendamento de cobrança do estacionamento pela iniciativa privada por 30 anos iniciando com 50 mil estacionamentos pagos (hoje são cerca de 30 mil). Segundo apurou o jornal Folha de S.Paulo, o serviço hoje é lucrativo para a prefeitura, ela gasta cerca de R$ 29 milhões para fiscalizar e recebe cerca de R$ 90 milhões por ano de cobrança da zona azul, o que coloca em dúvida a decisão de privatização.

O exemplo de Chicago e o próprio bom senso nos coloca diante do arrendamento dos estacionamentos de rua na cidade de São Paulo: se a Zona Azul é hoje altamente lucrativa para o município, além de representar um ativo não apenas dos cidadãos mas de controle sobre o crescimento econômico e social da cidade, pode uma administração pública abrir mão disso voluntariamente por trinta anos?

Privatizar os estacionamentos das ruas para adiantar recebíveis que serão inevitavelmente utilizados para o custeio da máquina deveria ser considerado não apenas erro estratégico de administração pública, mas um ato de improbidade administrativa. Vai na contramão do que as cidades inteligentes estão fazendo, preocupadas em inibir o uso de automóveis. Qualquer medida que induza indiscriminadamente a circulação dos automóveis estará incentivando mais poluição, mais congestionamentos, com benefícios financeiros direcionados apenas para empresas privadas, um desatino total. Isso mostra como gestores públicos irresponsáveis e inconsequentes estão alienando o futuro das nossas cidades.

sobre o autor

Lincoln Paiva é especialista em Planejamento e gestão de cidades (Poli USP), mestre em Arquitetura e Urbanismo (FAU Mackenzie) e Board Advisor WRI Ross Prize for Cities.

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resenha do livro

Parking and the City

Parking and the City

Donald Shoup

2018

196.02 livro
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