Confesso com certa vergonha não ter muita paciência para exposições de arquitetura. Plantas, cortes, perspectivas em série acabam me cansando e sempre levo mais tempo apreciando as maquetes.
Qual não foi minha feliz surpresa ao visitar a mostra sobre Artacho Jurado (1) na Chácara Lane e me deliciar com cada sala? Tive o privilégio de participar de visita guiada com o curador Abilio Guerra e de rever, sob novos olhos, tantos edifícios que visitei em Higienópolis e no centro da cidade.
A exposição foge do formato que mencionei acima e monta seu raciocínio apoiado na história cultural. Desse modo, torna-se uma exposição para arquitetos e não arquitetos, pois fala da arquitetura enquanto modo de vida, incluindo aí a publicidade dos empreendimentos imobiliários (até mesmo as fontes tipográficas utilizadas), a comparação com lançamentos comerciais com iniciativas dos arquitetos modernos. E também a apreensão de moradores, os filmes publicitários, a convivência proposta etc.
É claro que os ataques sofridos por Jurado estão lá e, desse modo, a mostra cumpre papel historiográfico relevante.
Especial é a sala destinada às crianças, elaborada por Michel Gorski, Silvia Zats e equipe (2), em que o coroamento, tão particular dos edifícios artachianos, ganha o nome de chapéus. Pois são isso mesmo, assim como as coroas são chapéus ou os chapéus são formas laicas de coroas.
Chamaram minha atenção alguns aspectos, que lanço aqui com a liberdade de não assinar texto acadêmico: a palheta de cores de muitos prédios. A justaposição do rosa/azul justamente no período em que estas cores se configuravam como atributos de gênero nos EUA e, logo em seguida aqui. Mas há bem mais do que isso para pensar as cores empregadas.
E segundo lugar, Jurado não parecia ver o campo – e os subúrbios – como alternativa de moradia. Sua visão de adensamento urbano se aproxima, talvez, daquela de Norman Bel Geddes, em que o campo é fornecedor de alimentos para a cidade, apenas isso.
Pena que não tive mais de duas horas para apreciar com calma cada sala, assistir aos vídeos etc. Por isso vou voltar (e também ver a mostra da Escola da Cidade, curadoria de Carla Caffe e Paulo von Poser) e recomendo a visita. A Chácara Lane é espaço dos mais agradáveis, próprio para todas as idades, com elevador e áreas abertas, um respiro nesta cidade que Artacho Jurado quis tanto embelezar.
notas
1
Exposição Artacho Jurado, arquiteto? Curadoria Abilio Guerra. Chácara Lane, Rua da Consolação 1024, Consolação, São Paulo SP, de 02 out. 2021 até 24 abr. 2022. Produção AYO, projeto expográfico Estúdio GRU / Jeanine Menezes, comunicação visual Pandoala Estúdio / Tissa Kimoto e Natália Solferini. Realização Museu da Cidade de São Paulo, Secretaria da Cultura, Prefeitura da Cidade de São Paulo. Gratuito, classificação livre.
2
Módulo infantil “A cidade dos chapéus”. História e personagens de Michel Gorski e Silvia Zatz. Desenhos e ilustrações de Fabrizio Lenci (direção criativa), Zique Girão, Gabriel César, Guilherme Paschoal e Julia Daudén.
3
Exposição “Artacho Jurado no desenho da cidade”, curadoria de Teca Eça e participação coletiva de estudantes e professores sob coordenação de Carla Caffé e Paulo Von Poser. Galeria da Cidade, Escola da Cidade, Rua General Jardim, 65, Centro, São Paulo SP, de 4 set. a 31 jan. 2022. Realização: Governo do Estado de São Paulo – Secretaria de Cultura e Economia Criativa.
Ethel Leon é jornalista, pesquisadora, professora na área de história do design brasileiro e autora dos livros Memórias do design brasileiro, IAC – Primeira Escola de Design do Brasil, Michel Arnoult, design e utopia – móveis em série para todos e Design brasileiro – quem fez, quem faz.