Your browser is out-of-date.

In order to have a more interesting navigation, we suggest upgrading your browser, clicking in one of the following links.
All browsers are free and easy to install.

 
  • in vitruvius
    • in magazines
    • in journal
  • \/
  •  

research

magazines

architexts ISSN 1809-6298


abstracts

português
Os autores comentam o uma obra pouco conhecida de autoria de Sérgio Bernardes, projeto moderno de arquitetura sanatorial, hoje tema de preservação histórica


how to quote

COSTA, Renato da Gama-Rosa; PESSOA, Alexandre; MELLO, Estefânia Neiva de; NASCIMENTO, Dilene Raimundo do. O sanatório de Curicica: Uma obra pouco conhecida de Sérgio Bernardes. Arquitextos, São Paulo, ano 03, n. 026.02, Vitruvius, jul. 2002 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/03.026/766>.

A Casa de Oswaldo Cruz, unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz, através de seus departamentos de Pesquisa, de Patrimônio Histórico e de Arquivo e Documentação, junto com a direção do Hospital Raphael de Paula Souza e o Centro de Referência Professor Hélio Fraga estão envolvidos em um projeto de pesquisa cujo objetivo é analisar historicamente o Complexo Sanatorial Raphael de Paula Souza, originalmente, Complexo Sanatorial de Curicica, e assim contribuir para maiores investigações e preservação da história da saúde pública no Brasil, tanto do ponto de vista científico quanto arquitetônico.

Pequeno histórico do combate à tuberculose no Brasil

O governo federal intensificou a luta contra a tuberculose no país, em 1946, e instituiu a Campanha Nacional contra a Tuberculose (CNCT), subordinada ao Serviço Nacional de Tuberculose (SNT), com a proposta de ser um órgão de caráter temporário até que se controlasse a doença nacionalmente. A CNCT estabeleceu um plano de combate à doença e assumiu a construção de dispensários e sanatórios por todo o país, com o objetivo não só de tratar, mas de isolar os doentes para evitar a propagação da doença. No final da década de 1940 e meados de 1950, muitos sanatórios foram construídos pelos vários estados e, no Rio de Janeiro, inaugurou-se então o de Curicica, durante a gestão de Raphael de Paula Souza frente ao SNT.

Curicica e Bernardes

O Conjunto Sanatorial de Curicica, em Jacarepaguá, foi um dos primeiros projetos de Sérgio Bernardes, feito durante sua chefia no Setor de Arquitetura (2) da CNCT, cargo que exerceu nos dois anos que sucederam sua formatura, 1949-1950 (3). Esta experiência possibilitou ao arquiteto pôr em prática as idéias de um jovem modernista, uma vez que elas contemplavam as premissas de higiene, ausência de ornamentos, racionalidade e funcionalidade, inerentes às edificações sanatoriais.

A CNCT contou ainda com outros arquitetos que participaram da produção arquitetônica sanatorial do SNT, como Jorge Machado Moreira, que desenvolveu os projetos de sanatórios para o Instituto de Pensões e Aposentadoria de Estado de Sergipe e Instituto de Aposentadoria e Pensões de Estado da Paraíba.

O projeto de Curicica seguiu o modelo de um hospital pavilhonar, embora tal modelo, próprio da era industrial, estivesse em desuso face ao modelo monobloco, surgido com a modernidade do entre guerras. A tipologia adotada por Bernardes, mais indicada para o tratamento da tuberculose pulmonar, possibilitou a adoção de áreas ajardinadas envolvendo a edificação, aeração programada, galerias de cura, setorização funcional dos espaços, independência das circulações e orientação dos recintos em relação à insolação. O conjunto com capacidade para 1500 leitos espalhados em aproximadamente 25.000 m² de construção é o maior exemplar desta tipologia no Brasil e um dos marcos da construção da imagem dos sanatórios nacionais.

O sistema pavilhonar, porém, sofria de críticas freqüentes à época, talvez por causar um maior desgaste físico em seus servidores ao percorrerem todo o conjunto. Mas este detalhe não foi ignorado e ficou estabelecido que apenas um grupo pequeno de servidores ficaria obrigado a percorrer todo o complexo (4).

O projeto desenvolvido por Bernardes seguia o programa técnico elaborado pelo SNCT, previamente aprovado pelo Ministério da Educação e Saúde, cujas recomendações gerais exigiam, entre outras:

“(...) estudo e padronização da construção de sanatórios e dispensários tipo Campanha, eficiente, de baixo custo e manutenção econômica, porém sem sacrifícios de suas qualidades técnicas e funcionais” (5).

O mesmo projeto foi ainda utilizado no Sanatório de Sancho, no Recife.

A construção, propriamente dita

As obras foram iniciadas em 08 de maio de 1949 (6) e a adoção de uma arquitetura modulada permitiu o uso de um sistema de pré-moldados em concreto armado, possibilitando o barateamento e a rapidez da obra. Foram confeccionadas 164 placas pré-moldadas de concreto e 7.896 unidades de cobogó, todas preparadas em canteiro em 207 dias apenas por um oficial e um servente (7). Toda a montagem da estrutura, bem como a realização dos cálculos ficou a cargo do chefe do setor de engenharia da Campanha, o engenheiro Julio Coacy Pereira e a obra, sob a direção do engenheiro Newton Kubrusly.

A obra sofreu dificuldades por causa da localização afastada do centro da cidade, acarretando escassez de mão de obra especializada e a irregularidade no abastecimento de material para a construção. Para diminuir as dificuldades em torno da aquisição dos materiais, a própria Campanha instalou uma pedreira no terreno e passou a dispor da exploração direta de um saibreiro e de um areal localizados nas proximidades (8).

A Campanha teve ainda de pavimentar a entrada do terreno da Estrada dos Bandeirantes para tornar possível o acesso, que em dias de chuva ficava impraticável, atrasando e dificultando ainda mais o andamento das obras (9).

Toda a obra foi acompanhada com grandes esperanças e uma “mística”, que não poupou elogios à sua construção. As expressões captadas de discursos e relatos da época falavam de “grande obra de arquitetura e engenharia sanitária”, “o maior e mais completo sanatório para tuberculosos da América do Sul”, “(...) esta inauguração transcende do simples ato inaugural para o da simbolização da própria Campanha Nacional contra a Tuberculose”, “(...) a mais alta escala alcançada pela Campanha, na construção de hospitais pavilhonares” ou ainda “(...) Hospital-Escola, de âmbito nacional”.

Na inauguração de 25 de janeiro de 1951, Gaspar Dutra demonstra que a preocupação de seguir as recomendações do programa do Serviço Nacional de Tuberculose tinha sido amplamente bem sucedida, pois “(...) o sentido funcional e a plástica (...)” alcançados pelo projeto “(...) reforçam o alto conceito em que é (ou era) tido a moderna escola arquitetônica brasileira” (10).

O complexo começou a ser ocupado em 2 de janeiro de 1952 (11), sendo esta a data que marca o nascimento da instituição.

O programa para o sanatório incluía capacidade para 1.423 leitos; alojamentos para o diretor, médicos, funcionários, enfermeiras, auxiliares, etc.; central elétrica com 80 KVA de capacidade; uma estação de tratamento de água; centro radilógico completo; um refeitório para quatro mil refeições diárias; uma lavanderia; um forno crematório de lixo, além de um frigorífico com capacidade para 7.200 Kg (12).

O complexo se compunha, na data de sua inauguração, de 23 serviços espalhados por pavilhões interligados compreendendo portaria, administração, biblioteca, necrotério, enfermarias, centro médico, maternidade, centro cirúrgico, laboratório, biotério, serviços gerais, alojamentos, casa do diretor, estação de tratamento de esgoto e sub-estação de luz e força.

Segundo Lourival Ribeiro, em fins de 1951, quando foi chamado para organizar a abertura do Sanatório de Curicica, do plano inicial, faltavam importantes pavilhões como o de Reabilitação, o da Engenharia, a Igreja, o Cinema e o Auditório. O projeto da Igreja foi finalizado em 10 de fevereiro de 1958 e sua construção deve ter sido iniciada ainda naquele ano.

Projetado para funcionar num período máximo de dez anos, tempo considerado a época suficiente para a erradicação da doença, o Conjunto Sanatorial de Curicica chega aos nossos dias pouco alterado em sua arquitetura, principalmente nos pavilhões das enfermarias e do centro médico.

Uma resolução administrativa dividiu o conjunto entre Prefeitura e Governo Federal, o que acentua os projetos de descaracterização da arquitetura pensada por Bernardes. Para piorar, todo o conjunto está sofrendo com a ação das chuvas e a da falta de um projeto de drenagem.

O avanço do processo de favelização ao seu redor e ao longo dos rios que circundam o complexo, contribui para o seu estado desolador. A Prefeitura do Rio, através da Secretaria Municipal de Saúde, possui um projeto de construir um novo hospital com instalações mais modernas e adequadas ao atual uso de hospital geral, que prevê a demolição total da igreja e de parte do restante do complexo.

Algo urgente deve ser feito para tentar salvar o que parece ser o único, ainda existente no sistema pavilhonar, de todos os hospitais construídos na mesma época para o então Distrito Federal.

notas

1
Leia mais sobre Sérgio Bernardes em Vitruvius:

MEURS, Paul. "Pavilhão brasileiro na Expo de Bruxelas, 1958". Arquitextos. Texto Especial nº 034, São Paulo, Portal Vitruvius, dezembro 2000 <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp034.asp>.

NOBRE, Ana Luiza. "Sérgio Bernardes: a subversão do possível". Arquitetura.Crítica nº 009, São Paulo, Portal Vitruvius, junho de 2002 <http://www.vitruvius.com.br/ac/ac009/ac009.asp>.

PONTES, Ana Paula. "Sérgio Bernardes e Eduardo de Almeida: arquitetura que ensina". Arquitetura.Crítica nº 009, São Paulo, Portal Vitruvius, junho de 2002 <http://www.vitruvius.com.br/ac/ac009/ac009.asp>.

2
As outras seções, criadas como órgãos especiais da Campanha incluíam, as de Ensino, Planejamento, Engenharia, Aquisição, Distribuição, Transporte e conferência de materiais e obras e equipamentos, Pagadoria e Contabilidade e apropriação. RIBEIRO, Lourival. A luta contra a tuberculose no Brasil (apontamentos para a sua história). Rio de Janeiro, Editorial Sul-Americana, 1956, p. 188.

3
BITTENCOURT, Tânia Maria Mota. Peste Branca – arquitetura branca: os sanatórios de tuberculose no Brasil na primeira metade do século vinte. São Carlos, Dissertação (mestrado). Mimeo, 2000.

4
RIBEIRO, Lourival, op cit., p. 174.

5
Idem, p. 185.

6
Segundo relatório publicado na Revista Brasileira de Tuberculose, jan./jun. 1951, p. 207.

7
Idem, ibidem, p. 210.

8
Inaugurado o Conjunto Sanatorial de Curicica. Revista Brasileira de Tuberculose, ano 19, jan./jun. 1951, p. 209.

9
Idem, ibidem.

10
Inaugurado o Conjunto Sanatorial de Curicica. Revista Brasileira de Tuberculose, ano 19, jan/jun, 1951, p. 193.
11
Segundo discurso do prof. Manoel José Pereira Filho durante a inauguração do Hospital Curicica, a data prevista para receber os primeiros pacientes seria a de 29 de dezembro de 1951. A própria data do discurso, 02 de dezembro de 1951 antecipa a data oficial de abertura, de 02 de janeiro de 1952. In: Boletim da Campanha Nacional Contra a Tuberculose, ano I, n º 1, jan., 1952. A data de 02 de janeiro de 1952, também aparece no livro de RIBEIRO, Lourival. A luta contra a tuberculose no Brasil, p. 240, e o Boletim da Campanha, jan. 1952, confirma seu funcionamento desde os primeiros dias de janeiro daquele ano.

12
Segundo informações recolhidas do Boletim da Campanha Nacional Contra a Tuberculose, n º 1, 1952, p. 3; e da Revista Brasileira da Tuberculose, jan./jun. 1951

sobre os autores

Dilene Raimundo do Nascimento é Mestre em Saúde Pública pelo IMS/UERJ em 1992 e Doutora em História/UFF em 1999, e pesquisadora do Departamento de Pesquisa da Casa de Oswaldo Cruz desde 1987

Renato da Gama-Rosa Costa é Mestre em Arquitetura pelo PROARQ-FAU/UHRJ em 1998 e atualmente Doutorando do PROURB-FAU/UFRJ, e trabalha no Departamento de Patrimônio Histórico da Casa de Oswaldo Cruz desde 1987

Alexandre Pessoa é graduado na FAU/UFRJ em 1997, e trabalha no Departamento de Patrimônio Histórico da Casa de Oswaldo Cruz desde 1999

Estefânia Mello é graduanda da EAU/UFF e é estagiária no Departamento de Patrimônio Histórico da Casa de Oswaldo Cruz desde o início de 2002

comments

026.02
abstracts
how to quote

languages

original: português

share

026

026.00

Sérgio Bernardes (1919-2002)

Entre el regionalismo y el high tech

Roberto Segre

026.01

Um breve olhar sobre o arquiteto Sérgio Bernardes (depoimento)

Antonio Claudio Pinto da Fonseca

026.03

Fábulas metropolitanas de Hugh Ferriss: Narrativa e desenho no projeto da cidade do amanhã

Rogério de Castro Oliveira and Anna Paula Canez

026.04

Viaje al fin del paraíso. Arquitectura y crisis civilizatoria

Eduardo Subirats

newspaper


© 2000–2024 Vitruvius
All rights reserved

The sources are always responsible for the accuracy of the information provided