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architexts ISSN 1809-6298


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O trabalho de Forte Netto expressa as tensões das décadas de 1960 e 70, quando a arquitetura paulista liderada por Vilanova Artigas causava grande impacto


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GNOATO, Salvador. Arquitetura de Luiz Forte Netto: transformações da poética paulista. Arquitextos, São Paulo, ano 04, n. 047.02, Vitruvius, abr. 2004 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/04.047/592>.

O trabalho de Luiz Forte Netto expressa as tensões das décadas de 1960 e 70, durante o final do processo de difusão do Movimento Moderno. A Unidade Habitacional de Marselha (1947) e outras obras de Le Corbusier (1887-1965) do pós-guerra, assim como os edifícios de Mies van der Rohe (1886-1969) em Chicago, foram projetos marcantes para essa geração, que produziu uma arquitetura genericamente caracterizada como “brutalista”.

No final da década de 1950, floresceu em São Paulo uma segunda poética para a Arquitetura Moderna Brasileira, com a Residência Olga Baeta (1956) e a Escola de Itanhaém (1959) de Vilanova Artigas (1915-1985), a Residência Cunha Lima (1958) de Joaquim Guedes (1932), além do Museu de Arte de São Paulo – MASP (1957) de Lina Bo Bardi (1914-1992).

Forte Netto nasceu em 1935 e se graduou em 1957 em São Paulo, mas desenvolveu seu trabalho em Curitiba, trilhando caminho inverso ao de Vilanova Artigas. Alguns anos depois de seus estudos no Mackenzie, Cristiano Stockler das Neves (1889-1982) deixou de lecionar, simbolizando o fim do modelo Belas Artes. Forte Netto permaneceu fiel à sua formação racionalista, absorvendo a poética paulista, mas transformando-a na execução de outros programas para o atendimento de concursos nacionais de arquitetura e de novas tipologias para edifícios administrativos.

A liderança de Vilanova Artigas e Fábio Penteado (1929), aliada à convivência com colegas do Mackenzie e da USP nos escritórios do edifício do IAB, em São Paulo, marcaram essa geração, que inclui Pedro Paulo de Melo Saraiva (1933) e Paulo Mendes da Rocha (1928), entre outros.

A vinda de Forte Netto para Curitiba foi provocada pela vitória no concurso para o Clube de Campo Santa Mônica (1962), que tinha uma nova proposta para este programa, diferente das usuais sedes urbanas. O projeto vencedor, que resolvia toda a edificação em um único bloco, não foi utilizado, mas os arquitetos foram chamados para realizar outra solução, posteriormente executada. Dentre os projetos implantados, o pórtico da guarita de entrada permanece como testemunho da poética paulista, assim como a solução estrutural do projeto original, semelhante às propostas de Vilanova Artigas para escolas estaduais.

Quando ainda em São Paulo, Forte Netto participou, junto com Fábio Penteado, no trabalho que obteve a segunda colocação no concurso do Clube Paulistano (1957), e no primeiro lugar para o Clube Harmonia (1958). Essa experiência foi utilizada em Curitiba, em dois outros projetos. O Clube Curitibano possuía uma “sede urbana” e precisava construir outra, em terreno de maiores proporções, para abrigar piscinas e outros equipamentos. Uma proposta arrojada foi projetada em 1966 para o salão social, constituído de uma estrutura em forma de casca “plissada” apoiada em dezesseis pilares. No caso da cobertura do Ginásio do Círculo Militar (1966), foi executada estrutura espacial metálica, sustentada em apenas quatro apoios, complementado por uma composição de conjuntos de prismas com vidros espelhados nas vedações laterais. Esses projetos foram desenvolvidos em conjunto com José Maria Gandolfi (1933–), seu colega do Mackenzie, e Vicente de Castro (1943), graduado na UFPR. Tal sociedade resultou no escritório “Forte-Gandolfi”.

As propostas de uma arquitetura com grandes vãos e a ampla utilização do concreto aparente de Forte Netto, soavam radicais para uma cidade acostumada com o racionalismo clássico da obra de Rubens Meister (1922), autor do Teatro Guaíra (1949). Na criação do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPR, em 1962, Forte Netto imprimiu sua personalidade nas disciplinas voltadas para o projeto. Sua liderança também esteve presente no processo de criação, no mesmo ano, do departamento local do IAB.

A residência, uma das tipologias particulares dos paulistas, foi desenvolvida em Curitiba com características diferenciadas. Os arquitetos não precisavam negar o espaço urbano e recriá-lo no lote, como os paulistas, pois dispunham de terrenos com dimensões mais generosas em ambiente urbano mais ameno. Forte Netto foi um dos responsáveis pela interpretação da Residência Olga Baeta, em que diversos meios níveis são construídos sob uma cobertura de forma retangular, presente na solução espacial para a Residência José de Freitas Neto (1962), em Curitiba. Da mesma forma que a tipologia do edifício-lâmina de forma retangular com abertura para as laterais, disposta para a rua ou para as divisas do lote, esta forma de implantação é uma das características da “Casa Paulista” e de seu desenvolvimento pelos arquitetos paranaenses.

A Residência Mário Petrelli (1964), com o desenho e dimensões avantajadas das vigas estruturais, e nas disposições espaciais com volumes curvos de alguns de seus espaços internos, pode ser considerada uma versão maneirista da “Casa Paulista”.

Forte Netto difundiu em Curitiba a prática na participação em concursos para outros arquitetos como Abrão Assad (1940), Dilva Busarello (1947 ), Jaime Lerner (1937), Joel Ramalho Junior (1934), José Sanchotene (1943), Lubomir Ficinski (1929), Orlando Busarello (1946) e Roberto Gandolfi (1936), que trabalharam no escritório Forte-Gandolfi e mais tarde se estabeleceram de forma independente.

Além da participação em diversos concursos nacionais, foi de especial interesse a segunda colocação para o Centro Turístico do Euro Kurssal (1965), em San Sebastian, na Espanha, local onde Rafael Moneo (1937) executou um projeto em 1989. Como a solução proposta para o primeiro colocado era inexeqüível, os arquitetos paranaenses foram chamados a Espanha, ocasião em que desenvolveram uma segunda proposta, igualmente não executada. A solução apresentada, que obteve a segunda colocação, apresentava a clássica disposição de torre em lâmina sobre embasamento horizontal, desenvolvido em grandes pórticos de concreto aparente.

A permanência da equipe de arquitetos por alguns meses na Europa permitiu um maior contato com as concepções de arquitetura e urbanismo que estavam sendo desenvolvidos naquele continente, como o debate em torno da revisão da Carta de Atenas, por parte do Team X, e o início dos estudos de revitalização de Centros Históricos, com ênfase na utilização de pedestres.

Forte Netto foi um dos nomes que liderou o processo de debate do novo plano urbano de Curitiba, conhecido como Serete-IPPUC (1965), durante a gestão do prefeito Ivo Arzua. Na gestão seguinte, Forte Netto foi o presidente do IPPUC, que estruturou esta autarquia. O envolvimento entre os arquitetos atuantes com os novos projetos para a cidade e o debate acadêmico na UFPR, propiciou um ambiente favorável para a introdução das transformações urbanas de Curitiba, desenvolvidas durante a década de 1970.

A proposta que prevaleceu destas discussões foi a implantação de diversos Eixos Estruturais para a cidade, aliando a verticalização mais intensa no espaço correspondente a dois quarteirões e a circulação de transporte de massa em canaletas exclusivas. Para estas vias desenvolveu-se um Plano Massa específico permitindo criar uma galeria contínua para pedestres em edificações que ocupavam toda a área do lote, com torres de apartamentos ou escritórios construídos sobre estes embasamentos. Depois de décadas de implantação continuada, Curitiba possui um desenho urbano definido, onde os eixos de verticalização passaram a estruturar a paisagem da cidade.

O desenvolvimento da arquitetura de edifícios em altura continuou ocorrendo, porém em outras regiões de Curitiba. Depois da construção do edifício de apartamentos Panorama (1966), diversas variações da tipologia do edifício-lâmina foram executadas. A utilização de estrutura em concreto aparente, com modulação racional de pilares e esquadrias e o uso de revestimento cerâmico, muitas vezes especialmente desenhado para o edifício, estão entre as principais características destes projetos. No edifício Mikare Tha (1972) a introdução de vigas de transição com desenho em arcos abatidos, entre os pavimentos-tipo e o térreo, apresenta outra variação para tipologia edifício-lâmina.

O edifício Springfield (1975) merece destaque especial, pelas varandas dispostas de forma alternadas nas quatro faces do edifício para “movimentar as fachadas”, contrastam com a racionalidade da modulação da estrutura e das esquadrias de alumínio combinando com o concreto aparente. Estes artifícios de volumetria passaram a ser amplamente utilizados mais tarde, pelos pós-modernos.

A sede do Instituto de Previdência do Estado IPE (1967), talvez seja o edifício que melhor traduza a transformação da poética paulista e a caracterização de uma postura projetual dos arquitetos paranaenses da geração de Forte Netto. O edifício, apesar de conter cinco níveis, apresenta proporção de horizontalidade. As relações com a rua acontecem de forma gradual, estabelecendo diversos nuanças de integração entre espaços públicos e semipúblicos. A proposta volumétrica do edifício integrou o bloco destinado a consultórios com outro destinado aos escritórios administrativos unidos por uma rua interna, coberta com domos de acrílico. Uma grande viga de platibanda em concreto aparente, com desenhos em relevo, une o conjunto. O grande espaço coberto da rua interna integra os dois blocos da mesma forma que os espaços internos de cada bloco estão integrados por coberturas zenitais translúcidas.

Enquanto Artigas desenvolveu sua concepção espacial de interligação dos diversos níveis da construção alternando os pés-direitos, a poética paranaense utiliza a integração dos espaços administrativos através de vazios de contidos nos módulos da estrutura.

O projeto de maior prestígio nacional realizado pelos arquitetos paranaenses foi o edifício sede da Petrobrás (1968), no Rio de Janeiro, cuja premiação foi avalizada por Artigas como membro do júri. Tal edifício foi desenvolvido no escritório “Forte-Gandolfi”, depois da primeira etapa do concurso elaborado por Roberto Gandolfi, José Sanchotene e Abrão Assad. A experiência da Petrobrás trouxe desdobramentos para diversos projetos realizados em Curitiba, constituindo-se paradigma para essa geração. A solução adotada que permitiu ao volume do edifício criar jardins internos, projetados por Burle Marx (1909-1994), foi induzida pelo edital do concurso que exigia que a obra permitisse acréscimos posteriores. O resultado plástico final imprimiu personalidade própria para o edifício.

O Centro de Processamento de Dados do Bamerindus, atual HSBC (1970), em Curitiba, contém os pressupostos do Produtivismo, segundo Kenneth Frampton (1930), em que o projeto corresponde a um pavilhão cuja estrutura deve ser o mais flexível possível para atender as constantes mudanças de utilização dos espaços de trabalho. Estes preceitos se mostravam como os mais adequados para a crescente demanda de edifícios administrativos, naquele momento de aumento de construções destinadas a prestação de serviços anterior a era da informática.

Em meados da década de 1970, Forte Netto desfez a sociedade com José Maria Gandolfi mas permaneceu trabalhando com o casal Orlando e Dilva Busarello. Para a sede das Secretarias de Estado (1977) foi projetado um conjunto de blocos miesianos em vidro, interligados por paisagismo projetado por Burle Marx. A rigidez geométrica destes blocos, que inicialmente foram projetados para receber brises e proteção solar, foi amenizada com o desenho dos pilotis compostos por volumes inclinados contendo taludes em grama. A localização destes edifícios acontece em terreno que faz continuidade ao Centro Cívico estadual, projetado no início da década de 1950.

A proposta mais exuberante realizada por esta geração de arquitetos é a sede da Acarpa (1977). Construído em terreno afastado das áreas administrativas da cidade, o edifício apresenta forma de prisma de lateral triangular, como referência às residências com telhados inclinados construídas na vizinhança. Internamente possui vazio de pé-direito pleno, que integra os espaços destinado a escritórios. Externamente, o grande volume em concreto aparente, apresenta uma composição maneirista de arcos, com floreiras dispostas de modo a fazer proteção solar para a face norte, que contrasta com laterais executadas em pele de vidro, onde estão dispostas escadas de incêndio externas, inspiradas na Unidade Habitacional de Marselha.

Forte Netto permanece ativo como urbanista, coordenando o programa Paraná Cidade junto ao governo estadual desde 2003, e como arquiteto acompanhando a conclusão de um de seus últimos projetos, o edifício administrativo Centro Século XXI (1999), que mantém concepção racionalista na disposição do volume do edifício.

O trabalho de Forte Netto, e de outros atuantes arquitetos em Curitiba, acompanhou o final do processo econômico de Estado Desenvolvimentista, iniciado na gestão de Getúlio Vargas como presidente eleito, e esgotado nos governos militares com a falência do “milagre brasileiro”. Estes projetos adotaram a estética do Movimento Moderno com um desenvolvimento maneirista. Em pouco mais de uma década os arquitetos paranaenses atingiram sua maturidade no processo projetual, obtida na participação em concursos, no debate na universidade e na introdução de novas propostas urbanísticas para a cidade.

referências bibliográficas

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sobre o autor

Luis Salvador Gnoato é arquiteto pela UFPR (1977), Doutor pela FAU-USP (2002), diretor adjunto de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo na PUC-PR.

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