Construir em madeira significa explorar as florestas existentes e reflorestar áreas desmatadas. Portanto, ao se projetar em madeira, estar-se-á colaborando com o processo de seqüestro de CO2, fundamental para a qualidade de vida no planeta.
Dentro da cadeia do desenvolvimento sustentável, a madeira é totalmente adequada aos princípios da construção ecológica. É um material de pouco consumo energético, tanto em sua fase de formação, como na fase de desdobro e aplicação. Apresenta boa resistência mecânica, proporcionando execução de estruturas leves, além de ser durável quando bem utilizada dentro de um sistema construtivo adequado, aliado às novas tecnologias.
O Brasil possui uma forte tradição construtiva em alvenaria de tijolos e um grande preconceito em relação à madeira, herdados de nossos colonizadores portugueses e consolidados pelo uso inadequado do material. A gradual eliminação desses obstáculos, poderá ser adquirida através da divulgação dos conhecimentos tecnológicos que levem a utilização correta desse material, garantindo assim, desempenho, durabilidade e qualidade estética adequados.
Dentre os principais inconvenientes que surgem nas construções de madeira, destacam-se o ataque destas pelos fungos, insetos e a ação do fogo. Além das soluções de projeto, recomenda-se no combate aos fungos e insetos a utilização de tratamento fungicida/inseticida, o que a torna praticamente imune ao ataque destas pragas. A inflamabilidade e a resistência ao fogo não são determinadas exclusivamente pela composição química dos materiais, mas também, pelas proporções das dimensões da seção transversal e pela sua espessura.
Madeira laminada colada (MLC)
Pode ser definida como um elemento composto por peças de madeira com comprimento variável, unidas por meio de cola em toda a sua extensão. É adaptável as mais diversas formas e possui seção transversal variável, tendo como limitador o transporte. A pequena espessura de suas lâminas (0,75 cm a 3,00 cm) permite uma secagem mais regular das peças, facilitando assim o controle da umidade desejada. Por causa da colagem, trabalha-se apenas com madeira seca, o que melhora a qualidade do produto.
Madeira laminada pregada
A substituição da colagem na madeira laminada colada (MLC) pela pregagem como meio de solidarização das lâminas, dá origem a madeira laminada pregada. Apesar de não apresentar a mesma eficiência e qualidade da madeira laminada colada, a madeira laminada pregada possui menor custo.
Relação arco x tabuleiro
As pontes e passarelas em arco apresentam as seguintes configurações geométricas:
- Arco abaixo do tabuleiro, também conhecido como arco protegido. Os montantes sofrem compressão, pois o tabuleiro encontra-se sobre o arco. Apresenta maior durabilidade.
- Arco acima do tabuleiro. Os montantes, que podem ser metálicos, sofrem tração, pois o tabuleiro encontra-se sob o arco. Apresenta menor durabilidade, mas é útil para os casos de gabarito da ponte muito pequeno.
- Tabuleiro em nível intermediário ao arco. Esse tipo de arco sofre compressão em seus montantes inferiores e tração nos superiores. Apresenta parte das vantagens e desvantagens dos anteriores.
Sistemas estruturais
Quanto ao sistema estrutural, as pontes e passarelas podem possuir arcos biarticulados ou triarticulados. Estes são usados em arco de grande porte pois podem ser transportados em duas partes, porém apresentam uma montagem mais trabalhosa.
Conforme observa-se nos exemplos anteriores, há uma grande compatibilidade entre a madeira e o aço, tanto na execução de passarelas e pontes como em outros sistemas estruturais. Isso ocorre porque peças de pequena bitola de aço são resistentes à tração, enquanto a madeira apresenta boa resistência à compressão, formando assim um conjunto perfeito.
Metodologia
Para a realização do projeto da passarela em madeira no Campus III da Unipar, pelos alunos do 4º ano de Arquitetura e Urbanismo, foi realizado um concurso de projetos no qual os alunos concorriam, divididos em equipes. Os acadêmicos tiveram que considerar as seguintes condicionantes: o local da execução da passarela possui vão livre de 5,20 m, largura máxima de 2,20 m e altura máxima de 2,88 m – para assim não prejudicar a estrutura de cobertura existente, obedecendo ainda o gabarito de 2,35 m onde há fluxo de pessoas.
A equipe vencedora adotou como partido um sistema estrutural utilizando o arco circular com raio de 4,41m e seção transversal I com tábuas de 20 x 1,5 cm (madeira laminada pregada). O tabuleiro é composto por tábuas de 1,20 x 20 x 2,5 cm, que se apóiam sobre 4 linhas longitudinais de caibros 5 x 6 cm com espaçamento de 33,3 cm. 7 vigas 6 x 12 cm com 2,10 m de comprimento (Garapeira) apóiam os caibros. Estas vigas são por sua vez apoiadas em suas extremidades por tirantes de aço, sustentados pelos arcos. Por causa do processo de ajuste do nível do tabuleiro, estes tirantes possuem esticadores.
Foi construído um molde sobre o piso próximo ao local da passarela para a execução dos arcos. Composto por 7 vigas 6 x 16 cm com 1,50 m de comprimento, contendo um recorte em sua extremidade de acordo com a seção I do arco, para assim encaixar e pregar as tábuas de Cedrilho. O tabuleiro foi devidamente construído e pregado. Os apoios dos arcos são metálicos. O acabamento deu-se por meio de verniz. O custo do material utilizado na passarela é de R$ 1.747,70 e o da mão-de-obra R$ 611,70, totalizando em R$ 2.359,40. É importante salientar que, a execução da passarela deu-se exclusivamente pelos alunos do 4º ano de Arquitetura e Urbanismo, em um prazo de 6 semanas.
Dado o pequeno comprimento do arco em relação a sua seção transversal, não foi necessário contraventá-lo transversalmente e deste modo atende-se a necessidade de liberação de espaço para o fluxo dos usuários.
Resultados
Os resultados obtidos foram os melhores possíveis. Na questão estética e funcional, a passarela trouxe satisfação aos usuários, além de ter sido uma grande experiência no processo de ensino e aprendizagem para os acadêmicos que projetaram, executaram e utilizam a passarela. Trata-se de uma experiência ímpar, em que os alunos vivenciaram completamente todas as fases de uma construção. Através da realização de um ensaio de flecha carregando a passarela com uma carga de 225 kg/m², totalizando 1350 kg, obteve-se a deformabilidade de 3 mm , sendo que a flecha máxima admitida é de 1,73 cm (l/300). Fato que demonstra que a passarela apresenta as condições adequadas de segurança (2).
Conclusão
Do projeto e construção desta passarela pode-se concluir que:
- Trata-se de uma estrutura pré-fabricada, resistente, rígida, sem vibrações, cujo sistema construtivo permite que as peças trabalhem unidas de modo solidário, minimizando a importância de algumas fissuras.
- Tornou-se uma solução viável (R$1.747,70), pois a madeira utilizada possui baixo custo e é facilmente encontrada no mercado. Observou-se também pelo uso da madeira, um baixo consumo de materiais e uma rápida execução.
- O projeto demonstra, que uma boa solução estrutural usualmente é uma boa solução arquitetônica, com forma e geometria diferenciadas. Neste simples exemplo de projeto e construção da passarela, verifica-se que o arquiteto pode e deve exercer a função de projetista de estruturas juntamente com os engenheiros estruturistas.
- O projeto é de importância fundamental. Ele permitiu resolver um problema com racionalidade, baixo custo, rapidez e criatividade, assegurando funcionalidade e valor estético. Esta obra é um exemplo de agregação de valor à madeira laminada pregada. A mão-de-obra, mesmo sem experiência e apenas com o projeto em mãos, conseguiu executar a obra.
- Esta obra contribuiu para resgatar e divulgar a tecnologia da madeira laminada pregada.
notas
1
O projeto aqui apresentado, de autoria dos alunos Daniele Rosa, Leandro Luiz Bessão, Michelle Faura Ferrarini e Patrícia Aparecida Gonçalves, foi ganhador do concurso interno de passarelas UNIPAR – Universidade Paranaense, Umuarama PR. O artigo, elaborado por Michelle Faura Ferrarini, foi orientado pelo Professor Doutor Everaldo Pletz, docente de Sistemas Estruturais III, também idealizador da disputa. O projeto foi totalmente executado pelos alunos do 4º ano de Arquitetura e Urbanismo.
2
Os seguintes títulos são de enorme interesse para o estudo do tema: 1) BURGER, Luíza Maria; RICHTER, Hans Georg. Anatomia da madeira. São Paulo, Editora Nobel, 1991; 2) CORADIN, Vera T. R.; MUNIZ, Graciela L. B. de. Normas de procedimentos em estudos de anatomia da madeira. ABNT; 3) DECHAMPS, Roger. How to understand the structure of hardwood. Tervuren, 1973; 4) RECORD, Samuel J.; HESS, Robert W. Timbers of the New World. New Haven Yale University Press, 1949. Também foram consultados os seguintes websites: 1) http://www.iem.ep.usp.br; 2) http://www.madeirasdobrasil.eng.com.br/; 3) http://nisee.berkeley.edu/godden/godden_index.html; 4) http://www.planetaorganico.com.br/meioamb.htm
sobre o autor
Michelle Faura Ferrarini é estudante do 5º ano do Curso de arquitetura e urbanismo da Unipar – Universidade Paranaense, Umuarama PR.