Introdução
O objetivo do artigo é entender algumas das principais leis urbanas municipais que determinavam os limites construtivos de edifícios de apartamentos em São Paulo. A intenção aqui não é identificar todas as leis sobre o tema e sim estudar diferentes formas utilizadas para limitar a construção de edifícios, realizados pelos promotores privados. São leis que frequentemente foram citadas no estudo de pesquisadores expressivos do assunto, como os de Rolnik (1), Somekh (2) e Souza (3). Foram levantadas três formas principais que serão discutidas nesse trabalho: (a) leis que limitavam a altura do edifício de acordo com a largura da rua, (b) leis que possibilitavam aumento de altura mediante recuos laterais e frontais escalonados e (c) leis que estabeleciam uma relação entre a altura do edifício e o tamanho do terreno.
O trabalho se limita a cidade de São Paulo, e enfoca leis promulgadas entre os anos de 1920 e 1957, ou seja, entre a lei 2.332, que à época da construção dos primeiros edifícios altos foi uma das primeiras tentativas na cidade de se criar um "padrão municipal", e a lei 5.261, que alterou uma forma de contenção das alturas dos edifícios de quase quatro décadas.
Diálogos entre arquitetos, promotores imobiliários e legislação
O setor sudoeste da cidade de São Paulo foi o mais regulado do ponto de vista da legislação urbana, e como é nessa área do centro que se localiza grande parte dos edifícios de apartamentos da primeira metade do século XX, pode-se afirmar que em São Paulo a verticalização urbana inicial teve um grande controle do governo municipal. Isso, entretanto, segundo Rolnik (4), não significou necessariamente limites. Por um lado, conteúdo de uma determinada lei quase sempre ponderou aspectos técnicos colocados por profissionais da área; mas também considerou objetivos da prefeitura do município, que misturavam interesses políticos e técnicos; e por outro lado, as leis foram muito influenciadas por interesses mercadológicos de particulares ou empresas que promoviam os empreendimentos habitacionais. O resultado foi que leis urbanas foram produtos do conflito desses interesses.
No fim da década de1920, aconstrução de edifícios já extrapolava os limites do "triângulo histórico", formado pelas ruas Direita, XV de Novembro e São Bento (5). A partir de seu antigo núcleo, seguiu em direção ao vale do Anhangabaú e às mediações da praça da República. Essa produção também ocorreu em alguns eixos viários, como a rua Barão de Itapetininga e a avenida São João. Em 1939, 30% dos prédios construídos já se localizavam fora do triângulo histórico. Apesar disso, seguindo em direção ao centro novo, a predominância (65%) de usos nos edifícios era terciária. Esses dados indicam que, inicialmente, ele surgiu no centro da cidade como uma novidade, em alguns prédios. Com o tempo, ocupou boa parte do lugar dos casarios coloniais do Triângulo e expandiu fronteiras rumo ao setor mencionado. Além disso, a quantidade de edifícios de apartamentos, comparada aos de escritórios, era cada vez maior. As residências em altura se tornavam, timidamente, uma opção para moradia. Cerca de um quilômetro separa o encontro das ruas Direita e XV de Novembro - nas imediações da praça da Sé - com a praça da República, posterior ao vale do Anhangabaú. Geograficamente, portanto, a construção de apartamentos era bastante limitada, se restringindo a poucos quarteirões. Além disso, sua produção era restringida à apenas alguns promotores, grandes fazendeiros exportadores de café, na sua maioria (6).
Poucos promotores, com uma boa soma de capital para esse tipo de investimento, com interesses muito específicos e com bastante influência política. Alguns chegaram a importantes cargos públicos, como Antônio da Silva Prado, prefeito da cidade de São Paulo. Esse talvez fosse o quadro geral para a promoção privada de habitações.
O governo municipal também realizou reformas urbanas que contribuíram para a valorização das áreas. À parte questões urbanísticas e sanitárias, todas legítimas, um dos objetivos dessas reformas foi a intensificação da ocupação do solo, liberando o preço dos terrenos e possibilitando lucros imobiliários bem maiores. Uma dessas intervenções ocorreu nos anos 1930, colocando em prática parte do Plano de Avenidas de Prestes Maia. Segundo Bosetti (7), as ruas localizadas no interior do Perímetro de Irradiação tiveram uma ocupação quase integral do solo e uma verticalização acentuada, que alterou a paisagem da cidade.
O controle de áreas verticalizadas gerava polêmica e dividia opiniões. Um exemplo disso é o processo de aprovação do edifício CBI Esplanada, que começou na década de 1930. Já na primeira versão de seu projeto, que não chegou a ser construído, desenvolvido pelo arquiteto Elisiário Bahiana, nota-se a interferência política e a influência de seus promotores sobre os técnicos da prefeitura. Falbel e Ohno relata que isso ocorreu pela excepcionalidade do projeto e do seu programa, mas também pelo fato de se tratar de um empreendimento realizado pela família Crespi, que tinha forte influência em decisões políticas e econômicas da cidade. A seguir, o parecer do engenheiro da prefeitura, Carlos Alberto Gomes Cardim Filho:
Um grande edifício destinado a hotel, tão necessário para estimular o turismo e com grande salão de festas tão útil para a cidade que é pobre nesse particular; e que finalmente é um prédio de grandes proporções que só virá engrandecer a cidade, sendo de se elogiar a disposição de um particular em inverter tão grande capital num prédio dessa proporção que também irá equilibrar o conjunto dos prédios no local (8).
Curioso notar a postura do engenheiro, talvez extrapolando o campo de suas competências técnicas e administrativas. Ele não se limitou às questões espaciais, dimensionais, construtivas ou a compatibilidade do uso, altura e volume da edificação com o lugar em que ele seria implantado. Tentou, ele próprio, justificar a validade dessa proposta mesmo que, eventualmente, sua construção estivesse a margem do que as posturas municipais recomendavam. Além disso, ponderou a inversão de "grande capital" e elogiou a "disposição" do empresário.
A opinião favorável do parecer oficial foi dada mesmo contrariando o disposto no ato 1.373 de 1938, que previa alturas máximas inferiores àquela proposta no projeto, de121 metros. Depois de algum tempo, foi realizado outro projeto para a mesma área, dessa vez desenvolvido pelo arquiteto Lucjan Korngold. Apesar disso, as divergências continuaram, com o processo de aprovação se estendendo por anos.
Muitas vezes os próprios arquitetos envolvidos nesses empreendimentos tentavam transgredir recomendações do município, justificando-se através de supostas questões estéticas. Um exemplo é a avenida Nove de Julho, que teve suas Posturas Municipais contestadas por vários profissionais que queriam oferecer à cidade "um conjunto de edifícios de melhor qualidade não só construtiva, mas também estética, fugindo-se das empenas cegas, dos vãos estreitos e frios entre dois edifícios, da falta de integração entre as construções geminadas, etc." (9). Essa avenida previa que suas construções tivessem recuos laterais e frontais na medida que aumentava a sua altura. É bom lembrar que boa parte da legislação urbana foi formulada a partir de recomendações de técnicos da prefeitura que eram, muitos deles, profissionais com formação acadêmica: engenheiros, arquitetos, urbanistas.
Nesse eixo viário existia outro problema que, ainda segundo Bosetti, extrapolava os limites dos lotes em que os edifícios eram implantados: foram poucos os edifícios residenciais que tiveram preocupação com o espaço público. O autor mostra que constituem raríssimas exceções os projetos em que os interesses mercadológicos não suplantaram o interesse público; e que os investidores é que davam, "subjugados à avaliação dos engenheiros da prefeitura, a palavra final sobre o projeto a ser executado".
As regras impostas pela legislação sobre a altura das edificações colocavam não apenas limites máximos, mas também alturas mínimas. Nos anos 1910, provavelmente legislando para alguns dos primeiros edifícios construídos na cidade, tais regras já existiam, induzindo a construção de prédios de três ou quatro andares no centro, estimulando o adensamento populacional. Somekh, em sua periodização da verticalização em São Paulo, considera como marco inicial o ano de 1920, pois é nessa data que foi promulgada a lei n. 2.332. A partir de 9 de novembro desse ano, e durante quase quatro décadas, a altura de um edifício seria relacionada com a largura da rua. Quanto menor essa largura, menos altura deveria ter o prédio. Além disso, não poderia ultrapassar três vezes a largura da rua quando essa fosse maior do que 12 metros. Mais uma vez encontram-se casos em que a regra foi burlada. Não em qualquer edifício, mas naquele que foi considerado – antes da construção do edifício Martinelli – o primeiro arranha-céu da cidade: o edifício Sampaio Moreira. O Diretor de Obras da Prefeitura, o engenheiro Vitor da Silva Freire, teria sido vencido pela insistência de seus promotores e do próprio arquiteto que o projetou, Christiano das Neves, e aprovou o processo. Abriu-se então "um precedente para a aprovação do Martinelli e, mais adiante, para a modificação da legislação" (10).
Quase sempre o Sampaio Moreira foi associado à modernização que a cidade incorporou, e a um suposto progresso que se materializou em seus edifícios. No entanto, a história do edifício pode ser inserida nesse ambiente propício de burlas sobre a legislação. Pode-se argumentar que os aspectos das leis ainda evidenciavam uma São Paulo provinciana e colonial, e que esse edifício propunha em outros termos, novas alturas, para outra cidade, mais moderna e atual. Mas o fato é que, independentemente das razões, a tentativa de aprovar projetos sabidamente contrários aos regulamentos se tornou uma prática.
No fim da década de 1920, entrou em vigor o Código de Obras conhecido como Arthur Saboya, a primeira tentativa de normatizar a construção de edificações (11). As disposições desse Código eram as mesmas da lei n. 2.332: ele agrupava as ruas em três categorias, segundo sua largura: até9 metros; de9 a12 metros; e maiores que12 metros. Para cada uma delas, limites de altura diferentes: duas vezes; duas vezes e meia; e três vezes, respectivamente. A partir dessa época, o município começou a fazer concessões na altura dos edifícios através da implantação de uma nova regra: os prédios seriam escalonados, com recuos laterais e frontais quanto maior fosse sua altura. Esse é o caso do Ato Municipal n. 663 de 1934, que atualizou o Código Saboya. Nove de Julho e São Luis são avenidas paulistanas em que se verificam reflexos dessa legislação em boa parte de sua extensão. O Decreto lei n. 75, de 11 de fevereiro de 1941, que legislava especificamente sobre a São Luis, estabelecia permissão para aumentos de altura mediante recuos escalonados.
Com isso o aspecto geral da paisagem desses trechos cidade alterou-se. Até então, as edificações normalmente eram construídas no limite do terreno, sem recuos. A construção se conjugava às outras existentes, vizinhas, nas laterais. Somente por cima, em função do número de andares ou do pé-direito dos pavimentos, a altura poderia variar. No entanto, é possível notar em alguns fragmentos urbanos certa unidade de fachadas, quando suas platibandas ficavam alinhadas. Posteriormente, como dito, a municipalidade exigiu recuos escalonados, maiores conforme a altura aumentava. Com isso, e com prédios cada vez maiores, começaram a pontilhar nas ruas de São Paulo arranha-céus, isolados no terreno.
Além disso, edificações com recuos permitiam outras soluções para implantação das unidades habitacionais. Como agora existia uma distância entre um edifício e outro, as janelas passaram a ser instaladas também nas laterais. Antes, sem recuos, as aberturas para iluminação e ventilação ficavam localizadas somente na frente e fundos do edifício, além de escuros e pequenos poços centrais, quase sempre sub-dimensionados. De qualquer forma, os edifícios ainda localizavam-se muito próximos uns dos outros e, provavelmente, a área de recuo ainda não era suficientemente boa para uma ventilação e iluminação corretas.
No edifício Lealdade, projetado por Francisco Beck na avenida Nove de Julho em 1948, tem-se um exemplo dessa situação (figura 1). São sete andares habitados antes do recuo lateral, e acima deles mais cinco andares com recuo de cerca de2,5 metros. Se, eventualmente, fosse construído um edifício com volume equivalente no terrreno ao lado do Lealdade, esses cômodos – dos dois edifícios – estariam distanciados apenas em5 metros. Nos sete primeiros andares habitacionais a situação é ainda pior. Como não existe recuo algum, quando outro edifício ocupasse o terreno ao lado, a ventilação das janelas laterais aconteceria por poços de ventilação. Além disso, numa quadra toda ocupada, ou mesmo em bairros inteiros preenchidos com prédios altos, é possível imaginar grandes faixas de sombras, onde o sol provavelmente não chega.
Outra importante avenida paulistana para a qual foram estipulados, nos anos 1940, limites mínimos e máximos de altura em seus prédios, com previsão de escalonamento gradual, foi a Ipiranga. O Decreto-lei n. 41 de 3 de agosto de 1940 exigia uma altura mínima de 39 metros, com possibilidade de 80 metrosmediante recuos e, em casos especiais, chegar até 115 ou 135 metros(12). Proprietários de edifícios que não atingissem a medida mínima seriam penalizados com um acréscimo de 20% no valor de seu imposto predial. A prefeitura, dessa forma, incentivava o crescimento vertical dessa região da cidade. O parágrafo terceiro dessa lei explicava como deveriam ser os recuos: "Os corpos super-elevados, isto é, os que subirem além de 39,00 ms, deverão obedecer às seguintes determinações: 50% entre as cotas 39,00 e 52 ms; 40% entre as cotas 52,00 e 75,00 ms; 30% acima da cota 75,00 ms" (13).
Uma questão importante é que as alturas máximas previstas em lei eram sempre muito maiores do que a média construída na época, não significando, portanto, nenhuma restrição aos construtores. O edifício Esther, por exemplo, projetado em 1935, e que teve sua construção concluída apenas dois anos antes de tal decreto, tem 12 pavimentos e cerca de36 metrosde altura. O Esther, grande símbolo de modernidade e projeto paradigmático da arquitetura modernista local estaria fora da altura mínima exigida. Já o Copan, projetado em 1951 e concluído somente no fim dos anos 1960, tem 33 pavimentos. Sua altura, de cerca de100 metros, ainda estaria aquém do limite máximo previsto pelo decreto-lei de 1941. Os dois edifícios citados localizam-se na avenida Ipiranga. O edifício Mirante do Vale localizado no vale do Anhangabaú, considerado o maior da cidade de São Paulo e com cerca de170 metrosde altura, estaria apenas35 metrosacima do exigido para essa avenida. Ao que parece, é verdadeira a suposição de que a restrição máxima de altura prevista nessa avenida não impediu em nada os promotores imobiliários de construírem seus edifícios na altura que lhes fossem convenientes. E essa afirmativa servir para outras grandes áreas verticalizadas, pode-se afirmar também que a legislação não foi impedimento para a definição das alturas dos edifícios na cidade.
O Decreto-lei n. 92, de 2 de maio de 1941, manteve a mesma fórmula de décadas anteriores para cálculo de limite de altura dos edifícios, aumentando-as proporcionalmente à largura das ruas, que nessa década já eram maiores. Essas medidas são válidas também para a região central: para as ruas de até12 metros, prédios com no máximo40 metrosde altura; em ruas com largura entre 12 e18 metros, prédios com um limite de60 metros; e em ruas com tamanho superiores a18 metros, seria permitido construir até80 metros(14).
O ano de 1957 trouxe mudanças significativas para o processo de verticalização da cidade: mudou-se a forma de restrição de altura, agora não mais em função da largura da rua, mas levando-se em conta uma ocupação máxima de acordo com o tamanho do terreno. Além disso, a idéia de uma cidade que crescia “indefinidamente para cima e para os lados, personificada no lema ademarista dos anos 50 - `São Paulo não pode parar´ - começa a ser questionada pela primeira vez por um grupo de engenheiros e arquitetos liderados por Anhaia Melo” (15). A proposta liderada por Anhaia Melo foi idealizada dentro dos trabalhos desenvolvidos na Comissão do Plano Diretor, constituída pelo então prefeito Cristiano Stockler das Neves:
Estudo [de 1954] de Anhaia Mello `Elementos básicos para o planejamento regional de São Paulo´, conhecido como `Esquema Anhaia´. Continha, pela primeira vez, a idéia docomprehensive planninge a defesa da tese de conter a expansão urbana, tanto vertical como horizontal. (16)
O comprehensive planning era a idéia de que o plano abarcasse a totalidade dos aspectos que compunham a cidade, inclusive aqueles que extrapolavam seu âmbito territorial. Até 1957, a média do coeficiente de aproveitamento variava entre 8 e 10 vezes a área do terreno (17). Com a nova lei n. 5.261/57, ele passou a ser restringido a 4 vezes a área do terreno, no caso de edifícios residenciais, e a 6 vezes, no caso de edifícios comerciais. Essa diferença entre os índices de edifícios residenciais e comerciais gerou uma prática entre os empreendedores, que conseguiam burlar a lei mediante alteração do uso depois da aprovação do projeto. Construíam-se "prédios para uso comercial, e até hospitais prevalecendo, portanto, o coeficiente de aproveitamento 6, e após a obtenção do habite-se eles se tornavam prédios de apartamentos cujo coeficiente, para construção, seria quatro" (18). Em 31 de dezembro de 1961, no último dia de seu mandato, o prefeito Adhemar de Barros fez alterações na lei, ao introduzir questões que descaracterizaram alguns de seus mecanismos, como a fórmula para o cálculo da densidade populacional em zonas residenciais, e o estabelecimento de critérios para aprovação de edificações mistas. Esses expedientes "ampliavam a margem de manobra dos incorporadores" (19).
A partir das descrições dos parágrafos acima, notam-se três formas principais de leis que durante a primeira metade do século XX determinaram a volumetria dos edifícios de apartamentos da cidade de São Paulo:
•1910-1920-1930 - com a sua altura limitada pela largura da rua. Muitos edifícios do centro tradicional condicionaram suas construções a esse limite. Quando eles tinham o mesmo pé-direito em todos os andares e a mesma quantidade de pavimentos, formava-se certa unidade na atmosfera da rua, com os edifícios alinhados por cima, na platibanda. Normalmente, eram em estilo acadêmico e tinham características estéticas que os aproximavam dos edifícios projetados nos boulevares haussmanianos da Paris do século XIX;
• 1930-1940-1950 - com a sua altura ainda limitada pela largura da rua, mas com concessões de alturas maiores mediante recuos escalonados laterais e frontal. São edifícios que ocupam as imediações do centro novo, rumo a praça da República e os eixos de grandes avenidas do Perímetro de Irradiação, como a Nove de Julho. Normalmente, ficavam com aparência que lembram a silhueta de grandes arranha-céus americanos, como o Empire State Building.
• 1950-1960 – limitados em função de um coeficiente de aproveitamento do terreno: igual a 4 no caso de edifício residencial e igual a 6 em edifícios comerciais. A altura média construída, em princípio, foi diminuída. Aos poucos, entretanto, novas regulamentações da lei concederam permissões para aumentar a altura construída.
Conclusões
Independentemente da eficácia das normas, de eventuais burlas e leis complementares que alteravam certos aspectos em benefício de interesses particulares do promotor privado, as razões iniciais que motivavam tais leis enfocam questões sanitárias, de infra-estrutura ou de transporte: a capacidade das tubulações de água e esgoto, os limites de tráfego nas vias públicas, quais as taxas de insolação necessária, etc.. Todo o gabarito de altura indicado se limita ao interior de cada terreno, sem reexames da conformação fundiária da cidade. As formas de usos, as relações do edifício com a cidade através do entorno imediato, a transição da zona pública para a privada foram consideradas, ao que parece pela descrição de tais leis, menos relevantes.
Essa legislação, que durante meio século tentou disciplinar, orientar e regulamentar a construção de prédios altosem São Paulo, sempre teve participação efetiva da iniciativa privada em sua concepção e desrespeito. Ela tinha interesses próprios e específicos, com o objetivo de realizar o seu empreendimento gerando o maior lucro possível. Quase nunca seus interesses correspondiam às recomendações técnicas de arquitetos, urbanistas, ou mesmo da prefeitura. Portanto, muitas dessas leis foram criadas para beneficiar os empresários e outras foram posteriormente alteradas visando a diminuição das restrições construtivas. Os interesses individuais ou de determinados grupos econômicos com grande influência política sempre se sobrepuseram aos interesses públicos.
notas
1
ROLNIK, R. A cidade e a lei: legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo. São Paulo: FAPESP / Studio Nobel, 1997.
2
SOMEKH, N. A cidade vertical e o urbanismo modernizador: São Paulo 1920-1939. São Paulo: EDUSP / Nobel, 1997.
3
SOUZA, M. A. A. de. A identidade da metrópole: a verticalização em São Paulo. São Paulo: HUCITEC / EDUSP, 1994.
4
ROLNIK, R. Op. Cit.
5
SOMEKH, N. Op. Cit.
6
ANITELLI, F. Como nasce um modelo: o projeto de apartamentos na cidade de São Paulo. 2010. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Carlos, 2010.
7
BOSETTI, A. A. “A avenida Nove de Julho como síntese das intervenções urbanísticas na cidade de São Paulo na primeira metade do século 20”. In: SAMPAIO, M. R. A. de (org). A promoção privada de habitação econômica e a arquitetura moderna, 1930-1964. São Paulo: Rima, 2002.
8
FALBEL, A. OHNO, C. E. “CBI Esplanada: memória e futuro de um edifício moderno em São Paulo”. In: 6° Seminário DOCOMOMO Brasil, 2005, Niterói, 2005. Anais eletrônicos... Niterói: UFF. Disponível em < http://www.docomomo.org.br/seminario%205%20pdfs/019R.pdf > Acesso em: 18 jul 2011.
9
BOSETTI, A. A. Op. Cit., p. 87.
10
SOMEKH, N. Op. Cit., p. 93.
11
SOUZA, M. A. A. de. Op. Cit.
12
SILVA, L. O. da. “A constituição das bases para a verticalização na cidade de São Paulo”. In: Arquitextos n. 080.05, jan 2007. São Paulo: Vitruvius. Disponível em <www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp399> Acesso em: 1 de mai 2008.
13
LEAL, D. V. “Edifício Montreal: arquitetura moderna e orgulho nacional apropriados pela iniciativa privada paulistana na década de 1950”. In: 6º Seminário DOCOMOMO Brasil, 2005, Niterói. Anais eletrônicos... Niterói: UFF, 2005. Disponível em: < http://www.docomomo.org.br/seminario%206%20pdfs/Daniela%20Viana%20Leal.pdf>. Acesso em: 13 jul 2011, p. 6.
14
SOMEKH, N. Op. Cit.
15
ROLNIK, R. São Paulo. São Paulo: Publifolhas, 2001, p. 48.
16
ROLNIK, R. Op. Cit. 1997, p. 194.
17
COCCARO, J. L. Modernização urbano–industrial e arquitetura na cidade de São Paulo no período de 1960-1975. 2000. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, 2000.
18
SOUZA, M. A. A. de. Op. Cit, p. 225.
19
ROLNIK, R. Op. Cit. 1997, p. 199.
sobre os autores
Felipe Anitelli é arquiteto e Mestre em Arquitetura e Urbanismo. Doutorando do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP), e pesquisador do Nomads.usp - núcleo de estudos de habitares interativos. Estuda atualmente as repercussões de características do desenho do edifício de apartamentos paulistano em projetos empreendidos no Brasil.
Marcelo Tramontano é arquiteto, Doutor e Livre-docente em Arquitetura. Professor Associado do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP) e Coordenador do Nomads.usp. Estuda relações entre a evolução das estruturas familiares, as estruturas sociais e o desenho dos espaços de morar.