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architexts ISSN 1809-6298

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O artigo discute a relevância do pensar e fazer projetual se retroalimentarem em prol da promoção da qualidade de vida urbana. Um procedimento que favorece a construção do conhecimento a partir da unidade teoria-prática é descrito.


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BARROS, Paula. O projeto como tentativa e a pesquisa continuada como elo entre o pensar-fazer. Arquitextos, São Paulo, ano 13, n. 152.02, Vitruvius, jan. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.152/4635>.

Mapa axial de uma porção da área central de Belo Horizonte
Paula Barros

A rapidez com que as cidades vêm sendo transformadas na contemporaneidade tem contribuído para o declínio da qualidade de vida no meio urbano (1). Se o desenvolvimento lento e gradual dos tecidos urbanos oferecia aos seus agentes a possibilidade de identificação e multiplicação daquelas alternativas projetuais percebidas como ‘boas’, simultaneamente à demolição ou transformação daquelas consideradas ‘ruins’, o mesmo fenômeno não se observa nas cidades contemporâneas que se modificam velozmente a partir de inúmeros, complexos e concomitantes processos de adição, subtração e substituição orquestrados pelos projetistas (2).

Para os propósitos desta análise, o termo projetista inclui todos os agentes urbanos cujas ações impactarão, direta ou indiretamente, sobre o tecido urbano das cidades. Dependendo do grau de consciência do papel por eles desempenhado, os projetistas podem ser divididos em dois grandes grupos: os conhecidos e os ignorados (3). Os membros do primeiro grupo, dentre eles arquitetos, têm consciência do papel das suas ações na definição do tecido urbano de uma cidade, enquanto os componentes do segundo grupo, como os vereadores, não são reconhecidos como projetistas por mais que as suas resoluções tenham um impacto significativo na forma urbana.

A distinção proposta por Carmona reforça o caráter fragmentário, e necessariamente coletivo, do processo de conformação do tecido urbano. Sob esta ótica, projetistas diplomados e não diplomados são vistos como igualmente importantes na definição da forma físico-ambiental das cidades contemporâneas e na definição da qualidade de vida urbana. Diante deste quadro, a seguinte questão emerge: como a teoria e a prática projetual podem se retroalimentar em prol da geração de espaços que contribuam para a melhoria da qualidade de vida da população urbana?

É fato que todo e qualquer processo projetual, de caráter participativo (4) ou não, demanda algum nível de pesquisa, mas o necessário feedback teoria-prática será função da geração de conhecimentos aplicáveis a outros objetos de projetação (5). Constata-se, todavia, que as pesquisas recorrentemente elaboradas pelos projetistas tendem a ter como objetivo principal a geração de conhecimentos voltados para solução da situação-problema posta em pauta.

Desde que a Avaliação de Pós-Ocupação (APO) amplia o conhecimento sobre tipos arquitetônicos e urbanísticos, a sua aplicação continuada pelos meios acadêmicos e profissionais, em paralelo a construção de um banco de dados/ pesquisas, potencialmente promoveria a necessária retroalimentação teoria-prática.

As APOs estudam ambientes contendedores, por algum tempo, de atividades humanas. Terminado o ciclo programa-projeto-execução, métodos e técnicas provenientes das ciências tecnológicas, exatas e sociais são aplicados com o objetivo de compreender o quão bem um dado ambiente atende às necessidades e desejos dos seus usuários. As APOs diferem de outras avaliações de desempenho por focarem nas demandas e expectativas dos ocupantes do ambiente em análise.

Como a elaboração de APOs demanda conhecimentos e habilidades específicas, estas pesquisas tendem a ser desenvolvidas no meio acadêmico e publicadas em periódicos científicos, como Environment and behavior and Journal of environmental psychology,  meios de comunicação ocasionalmente acessados por projetistas. Vale pontuar que o próprio fato dos cursos de graduação de Arquitetura e Urbanismo não terem como objetivo o desenvolvimento da habilidade de pesquisa nos estudantes (6) (7), formados para elaboração de projetos e planos (8), contribui para o distanciamento entre a teoria e a prática projetual.

Diante de tal quadro, esboça-se, a seguir, um procedimento que, apesar de reducionista, potencialmente promove o feedback teoria-prática e favorece o renascimento da lógica da ‘tentativa e eliminação de erros’ que norteava a gradual conformação das cidades no passado. O procedimento aqui proposto é inspirado nas ideias discutidas por Popper (9) no livro A lógica da pesquisa científica e por Schön (10) no livro The reflective practitioner: how professionals think in action.

Propõe-se, primeiramente, que o projeto, independente da sua escala e grau de participação popular, seja encarado como uma ‘tentativa’ ao invés de uma ‘solução’. Como todo projeto é uma totalidade complexa, faz-se necessário a definição prévia de hipóteses que nortearão todo o processo de concepção físico-espacial. As hipóteses, afirmações específicas, claras, objetivas e passíveis de verificação empírica, serão verificadas a partir da avaliação dos projetos em uso.

Como em um trabalho científico, a elaboração das hipóteses será função da leitura de teorias, resultados obtidos em estudos prévios, observações ou intuição (11). Como a geração de conhecimentos aplicáveis a outros objetos de projetação pode ser fruto da verificação de hipóteses oriundas de observações e intuição, todo e qualquer projetista, independente do seu nível educacional, estariam aptos a fazer uso do procedimento aqui proposto, como ilustra o estudo realizado por Palhares (12).

Segundo o pesquisador, vários moradores do Conjunto Habitacional Esperança em Belo Horizonte, fruto de um processo participativo de projeto, foram capazes de identificar em suas respectivas habitações uma série de problemas de ordem sócio-espacial a partir do momento em que passaram a ocupá-las. Sem a interveniência de arquitetos e urbanistas, este grupo orquestrou uma série de modificações projetuais, muitas delas avaliadas por Palhares como mais eficazes que a ‘solução’ original.

Tal processo, inicialmente protagonizado por projetistas diplomados e não-diplomados, necessariamente incluiu, mesmo que informalmente, o desenvolvimento de uma série de hipóteses que foram testadas pelo segundo grupo. As não-conformidades identificadas pelos moradores do Conjunto após a sua execução impulsionaram a reformulação das hipóteses inicialmente lançadas e a concepção e execução de novas alternativas projetuais. Finalmente, pode-se inferir que muitas das hipóteses elaboradas pelos moradores do Conjunto foram confirmadas uma vez que várias das modificações físico-espaciais então executadas foram avaliadas como satisfatórias.

A escolha do(s) método(s) e técnica(s) para verificação das hipóteses lançadas estará necessariamente condicionada aos tipos de resultados pretendidos, cronograma, recursos financeiros destinados à investigação, além das competências e habilidades do(s) projetista(s) para aplicá-lo(s). O conhecimento de diferentes métodos e técnicas de coleta e análise de dados, indubitavelmente, empodera o(s) projetista(s)-pesquisador(es).

Vários métodos e técnicas poderiam ser aplicados, incluindo: levantamento fotométrico de iluminação, medições de desempenho térmico e acústico até medidas perceptivo-comportamentais, a partir da utilização da observação, entrevista, questionário e grupos focais. Existem vários livros que discutem as vantagens, limitações e a aplicação de diferentes métodos e técnicas que permitem avaliar o desempenho do espaço edificado, como Inquiry by design: Environment/Behavior/Neuroscience in Architecture, Interiors, Landscape, and Planning (13), A practical guide to behavioral research: tool and techniques (14), Methods in environmental and behavioral research (14) e Avaliação pós-ocupação do ambiente construído (16).

Vale ressaltar que a aquisição de conhecimentos estendíveis a outros objetos de projetação análogos se dará independentemente da refutação ou confirmação das hipóteses previamente lançadas pelo(s) projetista(s)-pesquisador(es), como se dá em qualquer trabalho de cunho científico. Se refutadas, as hipóteses serão refinadas ou novas hipóteses deverão ser formuladas de forma a explicar razoavelmente os resultados da investigação (17). A refutação ou confirmação das hipóteses, portanto, fecha o ciclo teoria-prática e facilita a ‘eliminação de erros’ projetuais, como ilustra o caso do Conjunto Habitacional Esperança. O procedimento aqui descrito, portanto, propõe a construção de conhecimento pela unidade pensar-fazer a partir de um processo dinâmico e contínuo, além de sistemático.

A dimensão sistemática do processo de construção de conhecimento pela retroalimentação teoria-prática aqui descrito pressupõe o registro dos estudos realizados pelo(s) pesquisador(es)-projetista(s). A não-sistematização dos estudos de pós-ocupação realizados explicam a não aplicação do conhecimento adquirido em outras situações análogas e a inevitável multiplicação de equívocos projetuais em uma escala e ritmo jamais vistos. Com o auxílio das Tecnologias de Informação e Comunicação abre-se na contemporaneidade a possibilidade de construção de bancos de dados e pesquisas próprios, mas de acesso amplo, gratuito e irrestrito.

Independente dos métodos e técnicas utilizados e da natureza das hipóteses a serem construídas e testadas, o que se pleiteia neste artigo é a pesquisa sistemática, continuada, empiricamente fundamentada e de curto prazo, como elo entre o pensar e fazer projetual. A partir da aplicação continuada de avaliações de desempenho pelos projetistas, a prática projetual potencialmente informaria e seria informada pela teoria, facilitando a ‘eliminação de erros’ e proliferação de ‘tentativas’ projetuais que eventualmente contribuiriam para a melhoria da qualidade de vida nas cidades contemporâneas.

notas

1
MARSHALL, Stephen. Cities, Design & Evolution. London, Routledge, 2009.

2
Idem. Ibidem.

3
CARMONA, Matthew et al. Public places urban spaces: the dimensions of urban design. 2. ed. Amsterdam, Architectural Press, 2010.

4
Sem querer menosprezar a importância da participação popular na fase de concepção de projetos, vale pontuar que este trabalho tem como objetivo geral esboçar como que a teoria e a prática projetual podem definir um continuum em prol da promoção da qualidade de vida urbana. Cabe, todavia, ressaltar que a efetiva participação popular é não apenas legítima, mas necessária, principalmente quando o objeto de projetação será apropriado pela coletividade. Neste sentido, o desenvolvimento de metodologias que venham a viabilizar tal engajamento é fundamental e vem sendo objeto de pesquisa.

5
MALARD, Maria Lúcia. Alguns problemas de projeto ou de ensino de arquitetura. In: MALARD, Maria Lúcia (Org.). Cinco Textos sobre Arquitetura. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2005.

6
LAWSON, Bryan. How designers think: the design process demystified. 3. ed. Oxford, Architectural Press, 1997.

7
MALARD, Maria Lúcia. Alguns problemas de projeto ou de ensino de arquitetura. In: MALARD, Maria Lúcia (Org.). Cinco Textos sobre Arquitetura. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2005.

8
Idem. Ibidem.

9
POPPER, Karl. A lógica da pesquisa científica. São Paulo, Cultrix, 1972. 

10
SCHÖN, Donald A. The reflective practitioner: how professionals think in action. New York, Basic Books, 1983.

11
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo, Atlas, 1991.

12
PALHARES, Sérgio Ricardo. Variantes de modificação em habitação popular do espaço planejado ao espaço vivido, estudo de caso: Conjunto Habitacional Esperança. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001.

13
ZEILSEL, John. Inquiry by design: Environment/Behavior/Neuroscience in Architecture, Interiors, Landscape, and Planning. New York, Norton, 2006. 

14
SOMMER, Robert; SOMMER, Barbara. A practical guide to behavioural research: tool and techniques. 5. ed. Oxford, Oxford University Press, 2001.

15
BECHTEL, Robert B.; MARANS, Robert W.; MICHELSON, William (Org.). Methods in environmental and behavioral research. Nova York, Van Nostrand Rheinold, 1987. 

16
ORNSTEIN, S; ROMERO, M. (Colab.). Avaliação pós-ocupação do ambiente construído. São Paulo, Studio Nobel/Edusp, 1992.

17
POPPER, Karl. A lógica da pesquisa científica. São Paulo, Cultrix, 1972.  

sobre a autora

Paula Barros é doutora em Desenho Urbano pela Oxford Brookes University (2010), mestre em Requalificação Urbana pela Liverpool Hope University / Liverpool University (2003), especialista em Arquitetura Contemporânea pelo IEC/PUC-Minas (1999) e graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Minas Gerais (1996). 

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