Os anos 1980 foram pródigos para a crítica de arquitetura nacional, em especial em face à abertura política que já se vislumbrava. Naquele momento, o debate era animado pela circulação de revistas de arquitetura cujo espaço crítico era valorizado e incentivado. Fizeram carreira no chamado “jornalismo de arquitetura”, personagens de importância singular, como Hugo Segawa, José Wolf, Sérgio Teperman, Anna Regina di Marco e Ruth Verde Zein.
Podemos falar de uma temática básica no discurso da crítica nacional: uma procura por um sentimento de latinidade na produção nacional e a valorização de trabalhos examinados como regionais, nos quais os dogmas da arquitetura moderna tivessem sido substituídos por um exame mais aprofundado da cultura das diferentes localidades brasileiras. O regionalismo era, portanto, uma saída digna da pós-modernidade que aportava tardiamente no Brasil.
É nesse momento que são colocados na vitrine arquitetos comprometidos com soluções formais menos pautadas pelo racionalismo, com destaque absoluto para Severiano Porto e Zanine Caldas. E na esteira do exame da relação entre tradição e modernidade, uso de materiais e técnicas locais, até Lúcio Costa é redescoberto.
É também nesses idos que a obra arquitetônica, embora reduzidíssima, do mestre é reavaliada, ponderando sobre outra temática do então: qual o papel da arquitetura moderna brasileira, qual o significado de Brasília e o que se estabeleceu como sendo arquitetura pós-Brasilia.
Em um tempo de crise, em que as condições econômicas dificultavam o aporte de livros, as revistas de arquitetura cumpriram um papel exemplar. Elas mantiveram, na dura realidade editorial do Brasil, um esforço questionador sobre a natureza da profissão e da cultura arquitetônica nacional.
Daí pergunto: o que fazemos das nossas revistas hoje? Por um período de tempo razoável, as revistas retiraram da pauta seções críticas, sendo a pouco reatadas. Os websites de arquitetura tem participado desse processo de rediscussão, mas tem o inconveniente de ficarem restritos a um grupo “sedento” de informação. O interessante da revista é surpreender o leitor desinteressado, aquele que se pega lendo sobre Auguste Perret em meio a um sem fim de publicidade.
Mas esse aspecto não pode ser diminuidor do valor editorial das revistas. Ao examinar mesmo os números mais antigos da extinta Acrópole, lá estão sendo vendidos lotes da Cia. City, ou mesmo os requintados móveis da Branco & Preto. Ou seja, numa perspectiva otimista, no futuro, o excesso de propaganda nas revistas atuais será motivo de pesquisa acadêmica, e com certeza dirá muito sobre o momento pelo qual passa a sociedade brasileira.
E conclamo: pesquisadores, utilizemos o espaço das revistas. Seu grande mérito é extrapolar o ambiente universitário, e seu destino, aos poucos a se recuperar, é informar. Agora, informar e formar criticamente. Fazem falta os números especiais, as seções de documentação. Aliás, outro filão que as editoras esqueceram: que tal organizar catálogos com textos de crítica reunidos, números especiais sobre as seções de entrevista, ou mesmo sobre a Documenta. Acredito que surpresas boas poderão surgir.
Talvez um outro olhar sobre a arquitetura nas últimas décadas possa surgir. O que estamos dizendo da arquitetura pós-Sevilha? Talvez seja a hora de reavaliar o papel de uma profissão quase extinta, a do jornalista-arquiteto. E animar jovens profissionais a exercê-la. Eu já digo: presente, professor!
notas
[publicação: janeiro 2005]
Clevio Rabelo, Fortaleza CE Brasil