O papel se estende em ziguezague em delicada tensão. Materializa-se tanto como desenho, escultura e relevo. São os três ao mesmo tempo. Foram muitas as variações desse exercício de submeter o material a seus limites no jogo com sua fragilidade. Se cometer algum pecado é o de – mesmo lidando com materiais banais, tiras de papel, elástico, roldanas ou carretéis – manter sempre uma elegância discreta. Em nenhum momento brutaliza o processo de sua construção. Outro elemento evidente desses trabalhos é o ritmo marcado com que se estendem como se estivessem escrevendo uma partitura de música minimalista. Essa é uma característica das obras sobre a parede.
No outro extremo dessas obras se encontram as acumulações de jornais rigorosamente empacotados de modo a configurar um sólido paralelepípedo. Por favor, não vale politizar apressadamente de modo vulgar o trabalho apreciando, neste caso, críticas à sociedade do desperdício e seu lixo. Os primeiros e elegantes trabalhos se elaboram sob a tensão no limite da resistência da folha de papel; agora no grande paralelepípedo de jornais é a pressão que transforma o papel acumulado num sólido resistente. A estatura bruta da arte agora aparece. De um lado leveza, agora todo o peso. Antes a investigação da fragilidade, agora a afirmação da solidez. Tannuri mantém essa polarização para desenvolver suas rapsódias sobre o papel e suas qualidades.
Vejam que nos trabalhos em que a obra não é submetida a nenhuma força externa, a não ser aquela da gravidade, sua apreensão mantém-se sobre as qualidades do material. E aqui convém lembrar que o artista contemporâneo não lida com a “matéria” tal como os pintores informais do segundo pós-guerra e sua atenção sobre a presença de camadas brutas de tinta sobre a superfície. Desde a Arte Povera ficou evidente que toda uma arte contemporânea está interessada na semântica imanente aos materiais, às suas qualidades intrínsecas como portadoras de significado. Este é o papel do papel no trabalho de Tannuri.
Essa obra já se configura por mais de uma década e aqui na Galeria Maria de Lourdes Mendes de Almeida da Universidade Candido Mendes, em Ipanema, exibe-se num conjunto que permite a avaliação de elementos significativos dos extremos explorados pelo artista.
nota
NE
Texto crítico sobre a exposição de José Tannuri, Galeria de Arte Maria de Lourdes Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, de 16 de agosto a 21 de setembro de 2012.
sobre o autor
Paulo Sergio Duarte é crítico de arte.