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drops ISSN 2175-6716

abstracts

português
Algumas notas sobre a representação de Portugal na mais recente edição da Exposição Internacional de Arquitetura da Bienal de Veneza, apontando para novos formatos de apresentação e comunicação da arquitetura na contemporaneidade.

english
Some notes on thePortugal’s pavilion at the latest edition of the International Architecture Exhibition of the Venice Biennale, which points to new formats of presentation and communication on contemporary architecture.

español
Algunas notas sobre la representación de Portugal en la última edición de la Exposición Internacional de Arquitectura de la Bienal de Venecia, que apunta a los nuevos formatos de presentación y comunicación en la arquitectura contemporánea.

how to quote

CROSSETTI, Laurem. Um pavilhão que é um jornal. Notas sobre a participação de Portugal na 14ª Exposição Internacional de Arquitetura da Bienal de Veneza. Drops, São Paulo, ano 15, n. 088.02, Vitruvius, jan. 2015 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/15.088/5388>.


Em dezembro de 2013, a Direção Geral das Artes (DGArtes) –  órgão responsável por coordenar e executar as políticas de apoio às artes em Portugal – fez um anúncio onde divulgou o conceito e os responsáveis pela representação nacional na aclamada Exposição Internacional de Arquitetura da 14aedição da Bienal de Veneza: sob o título Homeland | Less Housing More Home, a ideia da exposição surgiu da parceria entre o arquiteto e curador Pedro Campos Costa e a Trienal de Arquitetura de Lisboa, com o apoio da DGArtes.

Designada para representar o país num dos maiores eventos culturais do mundo – que, na edição de 2014, teve como curador-geral o arquiteto holandês Rem Koolhaas – a representação portuguesa propunha um debate sobre a questão da habitação, partindo da ideia de moradia "como elemento essencial e primário da construção urbana e territorial”, funcionando também como reflexo dos aspectos sociais e culturais de quem habita. Eram essas, pelo menos, as linhas gerais apresentadas ao público em finais de 2013.

Entretanto, o cenário ganha outros contornos em março de 2014, há pouco menos de três meses da abertura da exposição. Anunciou-se que a representação não iria seguir os modelos realizados anteriormente, quando ocupava determinado espaço físico cedido pela Bienal (1): naquele ano, optou-se por transformar o Pavilhão Português em um jornal, batizado de Homeland: News from Portugal.

A primeira resposta dada a essa arriscada proposta foi que a decisão havia sido tomada, principalmente, por questões e problemas orçamentários, pelo que a verba disponibilizada para edição de 2014 (150 mil Euros) representava metade do valor cedido em 2012. A DGArtes e o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, afirmaram que esse não havia sido o único ou maior critério para a escolha. Ainda que se reconheça que o projeto surgiu como uma adaptação frente às circunstâncias econômicas vividas em Portugal, era garantido que a abordagem e o conteúdo apresentado no jornal não fariam uma má representação do país.

O curador Pedro Campos Costa foi além ao sustentar tal decisão, garantindo que, ainda que houvesse mais dinheiro disponível, manteria o formato não-tradicional da mostra. Disse também que o formato jornal insere-se conceitualmente na resposta à curadoria da Bienal, que, aos pavilhões nacionais, propôs o mote Absorbing Modernity: 1914-2014, instigando uma reflexão sobre o desenvolvimento do movimento Modernista em cada um dos países representados. Ele explica essa posição citando Beatriz Colomina, historiadora e teórica de arquitetura, que diz que “os arquitectos modernos não existiriam sem os media” (2). Por esse motivo, optaram por elaborar “um jornal, hoje quase um objeto arqueológico, que simbolizasse essa relação com a modernidade e que reflectisse sobre o que é ela hoje” (3).

Ainda segundo o curador, o formato de jornal permite a apresentação de textos numa linguagem mais direta e assertiva, sem deixar de lado a dimensão reflexiva e crítica das exposições sobre arquitetura. Ressaltamos também que essa configuração concede ao visitante a oportunidade de levar a exposição consigo, aumentando potencialmente a divulgação do conteúdo apresentado à outros públicos e locais, extrapolando assim os limites geográficos e temporais da Bienal de Veneza.

No que diz respeito ao conteúdo do jornal, manteve-se a temática central da habitação em Portugal. Optou-se por tratar o assunto através de duas abordagens distintas: uma reflexão cronológica e uma reflexão propositiva. No primeiro caso, a intenção é apresentar a evolução da moradia no país nos últimos cem anos, através de pequenos estudos que apontam para diferentes pontos de vista. Já no segundo, seis grupos de arquitetos (4) são convidados a intervir em seis cidades portuguesas (Porto, Matosinhos, Loures, Lisboa, Setúbal e Évora), realizando projetos urbanísticos durante o período de duração da Bienal à partir da definição de seis tipologias habitacionais (temporária, informal, unifamiliar, coletiva, rural e reabilitação).

Para gerar o conteúdo das três edições do jornal, que conta uma tiragem total de 165 mil exemplares, reuniu-se uma equipe multidisciplinar composta por profissionais da arquitetura, do design, da fotografia, da economia, da sociologia, da geografia, da história e da antropologia, com a intenção de abordar a disciplina arquitetônica não somente pelo viés do projeto e do desenho, mas também através de suas implicações e relações sociais, culturais e políticas. Para o curador, é necessário discutir e repensar a postura da arquitetura atual, que encontra-se “isoladamente fechada, focada nos limites dos terrenos ou na especulação acadêmica e ilusória” (5).

Com o projeto Homeland: News from Portugal, pretende-se abrir uma discussão para os desafios que a disciplina enfrenta, especialmente perante o momento econômico crítico vivido no país, e reivindica-se uma posição mais aberta e ativa por parte dos profissionais da área, sugerindo a criação de novas relações entre o arquiteto e a sociedade contemporânea. Desse maneira, além de possibilitar novos modos de praticar arquitetura, abre-se caminho para pensarmos, também, em outras maneiras de expô-la.

notas

1
As últimas quatro participações de Portugal na Exposição Internacional de Arquitetura da Bienal de Veneza foram: Lisboscópio (2006), curadoria de Cláudia Taborda, apresentada no Giardini Della Bienale; Cá Fora: Arquitectura Desassossegada (2008), curadoria de Joaquim Moreno e José Gil, apresentada no Palácio Fundaco Marcello; No Place Like... (2010), curadoria de Delfim Sardo, apresentada no Palazzo da Universidade Ca’Foscari; e Lisbon Ground (2012), curadoria de Inês Lobo, apresentada no Palácio Fundaco Marcello.

2
Em Portugal, usa-se a palavra media ao invés de mídia. Fonte: CASTELEIRO, João Malaca (org.). Dicionário da língua portuguesa contemporânea. Lisboa, Academia das Ciências de Lisboa e Editorial Verbo, 2001.

3
SALEMA, Isabel. Muita conversa, pouco desenho. Entrevista com Pedro Campos Costa. Público (Ípsilon), Lisboa, 06 jun. 2014. Disponível em:
<www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/muita-conversa-pouco-desenho-335348?page=-1>. Acesso em: 22 set.2014.

4
Participam do projeto os arquitetos: Adoc Architects, André Tavares, Artéria, Ateliermob, Like Architects, Mariana Pestana, Miguel Eufrásia, Miguel Marcelino, Paulo Moreira, Pedro Clarke, Sami Arquitectos e Susana Ventura.

5
BARATTO, R. Bienal de Veneza 2014: participação portuguesa com o jornal "Homeland, News from Portugal". ArchDaily Brasil, 28 mai. 2014. Disponível em: <www.archdaily.com.br/br/603532/bienal-de-veneza-2014-participacao-portuguesa-com-o-jornal-homeland-news-from-portugal>. Acesso em:20 set. 2014.

6
Sobre a participação de Portugal na 14ª Bienal de Arquitetura de Veneza, ver:

CARDOSO, J. A. Pedro Campos Costa e Trienal de Lisboa na 14ª Bienal de Arquitetura de Veneza. Público (Ípsilon), Lisboa, 03 dez. 2013. Disponível em: <www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/os-arquitectos-portugueses-vao-pensar-a-habitacao-na-proxima-bienal-de-veneza-1614846>. Acesso em: 21 set.2014.

LUSA, Bienal de Arquitectura de Veneza abre com projecto português em forma de jornal. DNotícias, Lisboa, 31 mai. 2014. Disponível em: <www.dnoticias.pt/actualidade/5-sentidos/450933-bienal-de-arquitectura-de-veneza-abre-com-projecto-portugues-em-forma->. Acesso em: 21 set.2014.

LUSA, DGArtes defende que participação portuguesa na Bienal de Veneza é uma "ideia criativa". Público (Ípsilon), Lisboa, 24 mar. 2014. Disponível em: <www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/dgartes-defende-que-participacao-portuguesa-na-bienal-de-veneza-e-uma-ideia-criativa-1629502>. Acesso em: 21 set.2014.

PEDRO CAMPOS COSTA. Homeland: News from Portugal. Disponível em: <http://homeland.pt>. Acesso em: 22 set.2014.

sobre a autora

Laurem Crossetti é pesquisadora em Arte Contemporânea e curadoria de exposições, é bacharel em Artes Visuais pela Universidade de Brasília (2010) e mestre em Estudos Curatoriais pela Universidade de Coimbra, com a dissertação “Exposições de Arquitetura nos 20 anos de atividades do Centro Cultural de Belém”. Atualmente vive e trabalho no Porto (Portugal). 

Homeland: News from Portugal, n. 1, jun. 2014 [http://homeland.pt/wp-content/uploads/2014/08/HOMELAND_site-final.pdf]

Homeland: News from Portugal, n. 2, ago. 2014 [http://homeland.pt/wp-content/uploads/2014/09/HOMELAND2_web.pdf]

Homeland: News from Portugal, n. 3, out. 2014 [http://homeland.pt/wp-content/uploads/2014/10/HOMELAND_3.pdf]

 

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