Nestes tempos em que as "políticas" da "austeridade" pretendem colonizar não apenas os campos da saúde, educação, previdência e política social, mas também da arte e da cultura – moralizando-as com discursos de utilidade (de direita ou de esquerda), chega o dia de nos despedirmos de Tunga, que foi o melhor antídoto para as falsas instrumentalizações da arte e da invenção.
Um dos mais inquietantes artistas de sua geração (não só no Brasil), Tunga esteve sempre comprometido com a parcela maldita da arte, com o sacrifício de energia e materiais, com o indizível e o mítico em uma sociedade obcecada com a produtividade e a acumulação. Sua acumulação foi de enigmas insolúveis, concentrados em fitas sem princípio ou fim, cenas erógenas e matérias que pulsam forças de crescimento, fecundação e morte.
Nunca tive chance de conversar com ele para pedir pistas para suas charadas – talvez seja melhor assim, guardo a inquietação em minhas entranhas para compartilhá-la pela vida.
nota
NE – Antônio José de Barros de Carvalho e Mello Mourão, conhecido como Tunga (Palmares, 8 de fevereiro de 1952 – Rio de Janeiro, 6 de junho de 2016), é artista plástico contemporâneo consagrado, com exposições individuais e coletivas no Brasil e exterior, e diversos prêmios por sua obra.
sobre o autor
Paulo Miyada é arquiteto e mestre pela FAU USP. Atualmente é curador do Instituto Tomie Ohtake, onde coordena o Núcleo de Pesquisa e Curadoria. Foi assistente da curadoria da 29ª Bienal de São Paulo (2010) e integrou a equipe curatorial do “Rumos Artes Visuais” do Itaú Cultural (2011-2013) e da edição retrospectiva desse programa realizada em 2014.