O lugar comum mais repetido no planeta nas últimas semanas é que a humanidade está frente a um desafio inédito.
Não pelo fato de termos uma pandemia – um inimigo invisível – que desconhece fronteiras geográficas e sociais. Já existiram grandes surtos de epidemias responsáveis pela morte de milhões de pessoas. A peste negra no século 15 ou a bubônica no século 17 ou mesmo a chamada gripe espanhola (que começou nos Estados Unidos) no início do século passado.
A novidade da atual pandemia vem de dois fatores: um vírus desconhecido que talvez (porque ainda não se sabe ao certo) não tenha uma letalidade muito alta, mas demonstra uma velocidade de contaminação altíssima, e um mundo altamente conectado em que as pessoas viajam e tem contatos interpessoais numa escala inédita (viagens internacionais e nacionais, grandes redes de transporte, cidades imensas com altas densidades populacionais).
Diante desse quadro é natural que haja indecisões e diferentes estratégias de combate. Mas também é claro que deve haver um esforço conjunto e articulado de medidas de restrição ao contagio para ganhar tempo até que a ciência encontre remédios paliativos ou preventivos para o novo vírus.
A Organização Mundial da Saúde – OMS e a maioria dos governos nacionais, estaduais e municipais do planeta estão apostando no auto isolamento dos cidadãos e famílias como estratégia para ganhar tempo e sobretudo para evitar o colapso dos sistemas de saúde e hospitais. Colapso que não atingirá apenas os contaminados pelo Corona, mas a todos os que usam normalmente esses sistemas e hospitais.
A Coréia do Sul apostou vigorosamente nessa estratégia e conseguiu controlar a expansão do vírus. A Itália demorou para tomar essa atitude, já pediu desculpas pelo erro e tem atualmente o maior número de mortos num só país.
Apenas Donald Trump (1) e Jair Bolsonaro hoje apostam em uma estratégia de isolar apenas os “grupos de risco” e manter o máximo possível de atividade econômica funcionando para evitar o outro colapso (da economia, do abastecimento e do emprego).
Até agora o resultado é que os Estados Unidos já são o país com o maior número de infectados e o Brasil tem uma das maiores curvas de aceleração do contagio.
Os políticos não esquecem que têm eleições pela frente e disputam seus eleitorados. Dórias, Witzels e Bolsonaros fazem seus cálculos e suas apostas.
Mas as fichas que estão sobre a mesa desse cassino são a minha vida, a sua e a de nossas famílias.
nota
1
NE – Neste domingo, dia 29 de março de 2020, o presidente norte-americano Donald Trump pediu para a população ficar em casa até 30 de abril, mudando sua posição anterior.
sobre o autor
Carlos A Ferreira Martins é professor titular do IAU USP São Carlos.