Na atualidade, a mídia dá ênfase em matérias de importância fundamental para o futuro da humanidade. Trata-se de ressaltar os riscos que teremos com as mudanças climáticas geradas pelas ações humanas com características variadas. Essas mudanças começam a aparecer em diversos continentes sob a forma de solos esturricados por falta de chuvas ou de territórios devastados por inundações e torrentes de lama escorrendo pelas ruas de vilas e cidades. Essas alterações no clima possuem variada gama de características e origens. No caso brasileiro, sob o olhar de outros países, é a devastação das bordas sul da floresta Amazônica e o norte do Cerrados, dois biomas importantíssimos para o equilíbrio ambiental do continente. Na atual administração federal, não se coíbem os garimpos que destroem a flora, a fauna e o solo, deixando crateras por onde escavam à procura de ouro e pedras de valor econômico. Muitos avaliam que isso nos deixa “no sal” (como é dito popularmente). As queimadas nesses mesmos biomas estão sendo consideradas perigosas para o efeito estufa e nada se faz para coibir essa prática de limpeza de terrenos visando, além dos garimpos, a agricultura e a criação de gado.
Alguns perguntarão: onde estará Ibama? Esse órgão é importante para monitorar o que é feito em diversos pontos do território nacional. Espera-se que, a partir de 2023, o Ibama volte a atuar plenamente em benefício de tudo o que nos afeta diariamente, no âmbito do meio ambiente e dos recursos naturais renováveis, explicitando o que a sigla significa, inclusive para que se saiba a gigantesca tarefa dessa instituição brasileira. Alias, registre-se também a existência da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico – ANA e sua correspondente em Brasília, que é da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal – Adasa. Essas duas agências possuem competências regularas, fiscalizadoras do uso da água potável e do destino dos resíduos resultantes da água servida – o saneamento básico ou esgoto resultante. Em cidades grandes o esgoto recebe um tratamento prévio antes de voltar para rios, lagos ou mar. Diga-se que há cidades litorâneas que possuem emissários submarinos, que despejam os resíduos longe da costa. Sempre será importante, no ciclo das águas, que os resíduos sejam despejados distante da costa para que as praias sejam utilizáveis pelos banhistas.
A solução para os problemas emergentes não deverá surgir a curto e médio prazo, pois suas estruturas não se acomodam rapidamente. Também o que está estabelecido no comércio nacional e internacional detém instrumentos elaborados há décadas (o dia de ontem) e a economia ficará ressentida, ocasionando desemprego não apenas nos setores envolvidos (o dia de amanhã), mas em toda a cadeia dos negócios envolvidos. Por isso, analisar os dados possíveis de tabular ou não será de grande importância para que nada escape ao controle dos envolvidos. Igualmente, como deve-se avaliar como serão afetadas em âmbito internacional o circuito das águas e a responsabilidade dos gestores, tanto no dia de ontem como no de amanhã. Como será o futuro da humanidade e, no caso particular, o Brasil. Isso não será exercício teórico ou mera conjetura, mas algo a sopesar para evitar os impactos negativos de atuações sem respaldo nos fatos anteriores e os que poderão advir nos tempos à frente, tais como possíveis danos à natureza, isto é, às águas, ao solo, ao manto vegetal e ao ar que respiramos.
Acima, se indaga onde estará o órgão fiscalizador? Sobre esse incógnito e significativo desaparecimento estão, de alguma forma, intencionalidades com vontade de bloquear tudo o que for restrição ao desmatamento, uso depredador do solo, sem manejo da utilização intensiva da água para irrigação e tudo o que mais facilitaria a ação de cultivos, grandes ou restritos/familiares. Ademais, não se recuperam solos já utilizados e, por isso, novos espaços são abertos, a partir da “limpeza de terrenos”, o que significa ir em frente, para isso usando dois tratores e com pesadas correntes para que não fique árvores ou arbustos em pé. Seguidamente, o fogo é acionado para o serviço final de “limpeza”. Sabe-se que isso se traduz em destruição do verde, da vida existente no subsolo e microfauna dos lugares nos quais se pretende cultivar. Pesquisas edafológicas revelaram que a recuperação do dano produzido no solo pode levar anos e até décadas. E nada se faz para que se respeite os ciclos naturais e as interconexões dos seres vivos destruídos e que interagem com essas atividades e da significância para o meio ambiente - solo, água e ar.
O Brasil possui vários biomas de grande valor para o país e para o continente sul-americano (1). Todavia, o brasileiro em geral, acostumado com o verde, não o valoriza suficientemente. Alguns poderiam deixar as árvores em pé porque são mais valiosas nessa condição do que derrubadas e queimadas. Costumo me referir que os derrubam parte do Cerrado, do Pantanal e da floresta Amazônica não avaliam o quanto esses conjuntos têm valor em pé, muito mais do que derrubadas e destruídas pelas motosserras e por labaredas. Também refiro que não precisamos ter “raiva do verde” porque as plantas são vida, são fator de água no aquífero, sombra para o viajante e abrigo para os pássaros construírem ninhos e criam seus filhotes. Portanto, deixemos todas as plantas como vida, como sombra, como acolhimento duradouro. Não podemos querer cortes radicais de arvores, deixando-as com os troncos nus a serem bafejados por labaredas de forma continuada por quem desejará “limpar o terreno”, pois isso poderá fugir ao controle do incendiário e se espalhar para além das fronteiras de uma fazenda.
Sejamos amigos dessas vidas verdes, porque nos alegram, são aconchego dos pássaros e nos dão sombra ao longo da jornada em área urbanas ou rurais. Manter as árvores grandes da floresta Amazônica, as retorcidas árvores do Cerrado e as que resistem no Pantanal Mato-Grossense, a grama e os arbustos da Caatinga farão mulheres e homens mais respeitados e admirados pela população continental porque mantém esse bioma sui generis, que alguns pensam ser uma savana. Teremos que admitir que, ao manter os tapetes verdes, nos fará admirados pela população jovem e crianças do século 21. Veremos que elas serão muito agradecidas a todos os adultos perseverantes nos diversificados sistemas ecológicos e ambientais.
notas
NA – Modificado de artigo publicado no Correio Braziliense, em 23 nov. 2022.
1
Argumento ampliado de artigo publicado no Correio Braziliense de 23 set. 2022, p. 10.
sobre o autor
Aldo Paviani é geógrafo e professor emérito da Universidade de Brasília – UnB, membro do Instituto Histórico Geográfico do DF – IHG.DF), do Núcleo do Futuro da UnB e da Associação Nacional de Escritores – ANE.