Nanda Eskes: Por trás de cada um de seus trabalhos sempre é visível um mundo imaginário, um universo que lhe é particular e que você explora ao longo de suas realizações. Você poderia nos falar sobre esse universo, o que ele representa para você e a maneira que você o transpõe para a arquitetura e o urbanismo?
Christian de Portzamparc: Sim, todos os lugares da infância, das viagens e da vida estão presentes. Minhas leituras, os filmes e os sonhos. É com o que trabalha um arquiteto, a matéria prima do imaginário, que é colocada em relação com os parâmetros de um projeto, com o programa, com os projetos de vida que as pessoas têm dentro delas e com as paisagens e as cidades. E desse confronto que nasce o projeto, que materializa desejos e idéias. Trata-se de uma verdade para todos os arquitetos, quando se coloca a concepção alguma coisa.
Você pode também dizer que a arquitetura vai simplesmente responder a uma necessidade, mas muito rapidamente ela vai virar um cálculo pobre, que aliás responde muito mal às necessidades. Em geral, para ser uma boa solução, há uma necessidade maior do que simplesmente responder ao programa. Temos que trazer alguma coisa, uma maneira específica de conceber o espaço. Um projeto sempre coloca questões – ou o programa nunca foi realizado, ou ele é estranho, ou muito interessante, ou o terreno é torto e inabitável, ou o volume tem uma massa cuja densidade é excessiva... A partir do momento que você afirma que sua arquitetura será uma solução para tudo isso, automaticamente a imaginação entra em jogo. Não é uma verdade para todos os projetos, mas são para os projetos com os quais me confrontei. Por exemplo, na Caixa d’Água eu tinha a idéia de trazer algo mais para o terreno, além do programa. Achei que num terreno que se urbanizava rapidamente, elementos ou pontos de referência fortes, tanto físicos como políticos, seriam importantes. É um desejo que vem antes mesmo do programa.
Quando realizei o Hautes Formes, me vi diante de um impasse, com 210 apartamentos em um terreno pequeno, no meio da quadra, com uma densidade fóbica. Diante disso, a arquitetura pode fazer alguma coisa, e para que as idéias surjam, é necessário retomar a problemática de um outro ponto de vista, repartir os cheios e vazios de uma outra maneira. Cada projeto é diferente, precisa de um ponto de partida distinto. Em Bordeaux os elementos chave foram o porto e o cais, o uso marítimo passado das grandes viagens. Em cada caso, alguma coisa diferente vai prevalecer. Em Montreal, outro exemplo, foi decisiva uma questão climática, de como usufruir o espaço público em uma região fria aonde todo mundo prefere os subterrâneos. São questões que vão engajar o imaginário e resultar numa resposta arquitetural.