Adalberto da Silva Retto Júnior: Por ocasião do I Congresso Internacional de História Urbana foi abordada de forma muito elucidativa a circulação das idéias, dos saberes, dos modelos, de livros, tratados e de profissionais. Pode-se constatar, dentro de uma perspectiva comparada, que o sucesso internacional da obra do de Camillo Sitte Der Städtebau nach seinen Künslerische Grundsätzen, publicado pela primeira vez em Viena em 1889, atingiu um repentino sucesso entre um público de especialistas ou semi-especialistas de planificação urbana assumindo diferentes contextualizações. A tradução elaborada por Camille Martin (1902) publicada quase concomitante à referida obra assume um papel importante nesses primeiros anos de difusão. Mas é a partir do fim dos anos sessenta, com a desmistificação dos CIAM – Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna e com o mundo submerso pelo crescimento de uma urbanização incontrolada, que se pode pensar em uma nova trajetória para o Der Städtebau, graças à tradução fiel e integral e a uma crítica filológica elaborada pela senhora e seu marido George Collins (1965). Quais as diferenças de maior relevância da tradução feita por vocês e àquela de Camille Martin?
Christiane Crasemann Collins: A tradução de Camille Martin do livro de Camillo Sitte Der Städte-Bau nach seinen künstlerischen Grundstitzen (1889) foi publicada em 1902 e novamente em 1918. Ao invés de apresentar uma tradução cuidadosa do texto original de Sitte, Martin produziu um livro totalmente diferente. As alterações de Martin envolveram o significado da mensagem de Sitte assim como a substituição das ilustrações. G.R. e C.C. Collins, Camillo Sitte: the birth of modern city planning (1986) dedicam nove páginas (p. 78-86) a uma detalhada análise das alterações de Martin ao trabalho de Sitte. Eles também discutem o dano que esta tradução (de C. Martin) causou ao legado de Sitte.
Quando a primeira edição da tradução dos Collins foi publicada em 1965 (em dois volumes), junto com uma discussão crítica de Der Städte-Bau de Camillo Sitte e da sua difusão, sua recepção foi condicionada pela reação emergente de arquitetos contra o Movimento Moderno e os princípios do CIAM. O descontentamento em celebrar edifícios como objetos artísticos destacados do próprio tempo e espaço, ignorando seu contexto cultural e físico começava a ser visto como anti-humanístico e indiferente às necessidades sociais. Estas realizações alteraram a atenção relativa à cidade e ao projeto urbano exigindo uma efetiva entrada de arquitetos no debate. Camillo Sitte tornou-se o espírito guardião da redescoberta da urbanidade na cidade e da validez dos seus princípios artísticos para o urbanismo contemporâneo. O despertar dos arquitetos, ao ver seus edifícios neste contexto mais amplo, levou a uma transformação da profissão que perdura até nossos dias. Como resultado deste processo, a disciplina urbanismo evoluiu num processo reflexivo dando forma física ao ambiente construído, respondendo às aspirações das pessoas.