Beatriz Carra Bertho: Carlos Alberto Maciel propõe que se pense o projeto como o trabalho do arquiteto na compreensão, interpretação e transformação dos dados do problema arquitetônico, fundamentais ao seu trabalho e admite que “... no processo de projeto, a compreensão e interpretação de cada aspecto colocado como premissa exigem por parte do arquiteto a tomada de sucessivas decisões” (6). Para vocês, quais são essas premissas e como são elaboradas e traduzidas em desenhos? A partir daí, como programa se desenvolve e como é feita a definição do partido arquitetônico?
Marcelo Ferraz: Essa é uma pergunta difícil.
Francisco Fanucci: A questão do programa, da interpretação do programa, do chamado partido arquitetônico, esse roteiro, de certa maneira, para nós, não acontece com linearidade, talvez sejamos um pouco mais caóticos, um pouco menos disciplinados. Não há como falar exatamente: “assim é nosso método de trabalho”. Não há uma seqüência padronizada de ações. Tentamos não distinguir programa e projeto. Gosto muito do Louis Kahn, quando ele fala em reprograma, ou seja, em arquitetura, programa é muito mais que uma lista de áreas e de funções, é a interpretação daquilo que se deseja, é imaginar, como uma antevisão, a relação entre os espaços e as pessoas. Se for fazer uma escola, aquela escola é única, ela é a melhor escola que podemos imaginar, diante das condições gerais para determinado lugar. Assim, o programa é um olhar para aquela lista com outros olhos: um refeitório não é um retângulo de 7(m) por 4(m), é uma vivência, é um encontro, o refeitório é a coisa mais importante; e quando você vai para a sala de aula, ela é mais importante ainda, e depois, o corredor, também é importantíssimo. Então, com tudo isso, trabalhar com o programa é, de certa maneira, já estar fazendo arquitetura, é assim que a gente tenta fazer.
MF: Eu concordo com o Chico, eu acho que nós tentamos reinventar o programa, trabalhamos num vai-e-vem constante, cada decisão tomada no próprio projeto altera outras, volta atrás: “se eu for por aqui, não dá para ir por ali”. É tudo muito dinâmico. Não usamos o termo “partido arquitetônico” Partido é um termo pesado, apesar de ser muito usado pelos arquitetos, por nossos professores na faculdade. Eu não sei se é o partido ou se é um monte de partidos, um monte de idéias, um monte de coisas que vão se apinhando, criando certa unidade, uma personalidade, uma cara, um jeito. Acho que entra técnica, entra material, é tudo junto, não tem uma seqüência; hipóteses experimentadas, transformadas e abandonadas; certas decisões arbitrárias que ganham força e acabam se sustentando. Então o projeto vai ganhando um monte de “regras”, vai se construindo numa história, num enredo que ordena as coisas. Nós não sabemos projetar de outra maneira. Por isso, não dá para dizer “o partido é assim”. Não pode ser tão rígido.
nota
6
MACIEL, Carlos Alberto. Arquitetura, projeto e conceito. Arquitextos, São Paulo, 04.043, Vitruvius, dez 2003 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/04.043/633>.