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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
Autora expõe aspectos da Trienal de Lisboa de 2013, apresenta uma leitura das três edições anteriores, e coloca em perspectiva propostas desejáveis para as futuras.

how to quote

MOREIRA, Inês. Pós-Trienal de Arquitetura de Lisboa 2013. Relações instáveis entre eventos, arquiteturas e cidades. Minha Cidade, São Paulo, ano 14, n. 164.05, Vitruvius, mar. 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/14.164/5098>.



Trienal

Os grandes eventos culturais internacionais requerem balanços de estratégia, formato, ou mesmo frequência, para manterem a sua relevância. Por definição, uma trienal repete-se a cada três anos, tem usualmente a duração de um trimestre e apoia-se em exposições em pólos centrais, tal como na Trienal de Lisboa, ou na Trienal de Oslo. Há porém variações, casos de bienais/trienais que propõem programações mais curtas no tempo e intensas na quantidade, como o Festival de Arquitetura de Londres – caso que passou em 2013 de bienal a evento anual. Existem, também, modos de programação trienal/bienal por ciclo, isto é, vários pequenos eventos que podem ser preparatórios do evento seguinte (encontros, workshops, thinktanks), ou mais vocacionados para “manter” o público, distribuem-se ao longo do período de “quebra”, ano e meio a dois anos, culminando então num momento de maior amplitude pública, como é o exemplo da Trienal de Praga.

Há modelos de programação mais espaçados no tempo, como a grande exposição da Documenta de Kassel, a cada cinco anos, ou a mostra ao ar livre do SkulpturProjekt de Munster, a cada dez anos. Ambos os modelos ambicionam ser marcos de referência cultural internacional para as décadas posteriores, e são-no. A questão da permanência do espaço expositivo, como nas paradigmáticas Bienais de Veneza e de São Paulo, tem relevo: aí grandes exposições marcam as temáticas bienais (Arsenalle, Giardinni, ou o Pavilhão Ciccillo Matarazzo) – acompanhadas em Veneza por pavilhões das nações – facilitando a mobilidade dos públicos (e a logística de produção) e garantindo uma continuidade no tempo.

Com regularidade fixada e já nove anos de existência, cabe à Trienal de Lisboa amadurecer diversos aspectos, isto é, refletir e aprender com suas experiências. Nas suas três edições adoptou/oscilou entre versões diversas tanto nos conteúdos, como na forma, nos locais de apresentação, como na ideia e relação com o público. Sintetizo as duas edições mais diversas: 2007 e 2013. A Trienal, no Verão de 2007, iniciando com o modelo “grande exposição internacional”, com seções/pavilhões de representações nacionais no recinto do Pavilhão de Portugal, e mostras de grandes intervenções arquitetônicas e urbanísticas, no envolvimento dos investidores, autarquias e mesmo universidades, começou por apostar nos grandes nomes internacionais (e nacionais), reflexo de uma visão da arquitetura como prática de projeto, orientada para a concepção e edificação de obras de autor/referência.

Nos “antípodas”, a Trienal de 2013 apostou num concurso internacional para curador geral, tendo selecionado uma jovem equipe com uma visão crítica da noção de “Arquitetura”, apostando numa programação dispersa em vários pontos da cidade, incluindo o espaço público, apostando no caráter efêmero dos espaços relacionais, envolvendo o público em ações/workshops/eventos, e abrindo vários open calls para integrar no programa, e prêmios a projetos autopropostos. O recente conceito curatorial levou à negação de qualquer noção de representação (registro, documento, modelo), refutando a apresentação de obras/edifícios construídos, bem como não incluindo os “grandes autores” de referência. Também o seu orçamento, muito inferior aos anteriores e fruto da “crise”, é um fator de diferenciação. Assim, em 2013, a Trienal trouxe formatos e modalidades “não expositivas” e mais “experienciais”, favorecendo instalações efêmeras em espaços a ser apropriados.

Antagônicas a vários níveis, as edições de 2007 e 2013 apontam em direções opostas (1): se pensarmos na ideia de Arquitetura, na relação com a cidade, seu centro e margens, no tipo de espaços e de agentes culturais envolvidos, nos modos de relação/interpolação do público, no seu calendário, nos tipos de produção cultural, e mesmo no tipo de público e especialistas que se sente atraído e representado. Tendo-se arriscado e experimentado, será de retirar conclusões e agora construir um outro modelo, mais informado. 

Arquitetura(s)

Arquitetura é uma designação genérica e dificilmente pode espelhar a pluralidade (e disparidade) de problemáticas e posicionamentos hoje em discussão no espectro da “disciplina”. Esta designação lata facilita a relação com o exterior, com público e clientes; pela força dos media, a expressão mais dominante da Arquitetura junto da sociedade é aquela mais icônica, desligada dos problemas concretos das cidades e das comunidades – tal como o novo Museu dos Coches – cujo relevo social, cultural e, mesmo econômico para a sociedade e a população é, como neste caso, questionável.

É minha convicção que, pensando em eventos sobre Arquitetura, deveríamos referir “Arquiteturas”, no plural, na sua diversidade e seus antagonismos. Não o referindo, podemos, contudo, pensar esse plural: das questões do patrimônio (profundamente europeu), aos conceitos espaciais e práticas sociais (mais jovens, discursivas e com componentes mais artísticas), às técnicas e processos construtivos (tema transversal e com grande expressão nos EUA), ao virtuosismo formal potenciado por sistemas econômicos em crescimento (hoje do Médio Oriente à Ásia), às questões da sustentabilidade e da energia (de relevo nas zonas pós-industriais e nas zonas em desenvolvimento), a tantas outras problemáticas.

A par da fragmentação de problemáticas e temáticas da(s) Arquitetura(s), também as condições das práticas profissionais dos arquitetos se têm desmultiplicado, alterando-se os seus centros. Das migrações para destinos mais abastados, às profundas contingências trazidas pela crise financeira, à transformação da noção de ateliê/carreira, isto é, da sociologia à pragmática, as “Arquiteturas” alteraram-se.

Neste contexto, um evento especializado em cultura da Arquitetura merece cuidada afinação, pois as questões com maior relevo social e cultural são aquelas em que a Arquitetura problematiza e responde às grandes problemáticas culturais do mundo contemporâneo, isto é, aquelas que consideram a Arquitetura além do projeto/produto/proposta mas que a veem, sobretudo, enquanto uma proposta social, política e econômica. Assim, programar eventos culturais de Arquitetura(s) deveria considerar uma apresentação dos seus vários sub-campos, apresentado-os ao público através de conceitos curatoriais que comuniquem e problematizem a sociedade, e não apenas as questões de linguagem, de composição ou de autorias.

Assim, em 2016, a Trienal de Arquitetura(s) necessitará pensar como considera a pluralidade de problemáticas, linguagens, realidades, e práticas contemporâneas a nível internacional, não podendo ignorar a forte alteração da realidade da arquitetura portuguesa nos últimos anos (2).

Lisboa

Como deve a programação de um evento cíclico, e disciplinar, cruzar-se com a realidade específica do lugar que o promove/acolhe? Como evento genérico e global que privilegia a apresentação/representação “internacional”, ou, pelo contrário, privilegiando o “nacional”, divulgando-o? Claramente que existem possibilidades mistas. Porém, e ainda mais complexo, como se poderia articular um evento com a cidade que o promove/acolhe, se esta for entendida além de um receptáculo pontual de atividades culturais?

Olhando o mapa publicado em setembro de 2013 na revista A10, ilustrando um artigo (3) de Carlos M. Guimarães, encontramos os três níveis que estamos a tentar analisar e que, parece-me, não foram ainda suficientemente explorados em Lisboa: apresenta-se a cidade de Lisboa através de alguma programação da Trienal, de alguns edifícios recentes com Arquitetura à qual recomendam uma visita, convidando ainda a deslocação aos seus limites (Almada, Cascais). Esta integração da programação cultural, com o potencial da arquitetura existente (próxima ou um pouco mais distante) e, diria mesmo, com outros eventos congêneres (por exemplo, a Experimenta Design) mereceria vir a ser explorada no futuro. 

Até que ponto pode um evento cultural efêmero manter a sua própria ambição e autonomia interferindo também no conhecimento da realidade local? Decorrem em Lisboa interessantes estratégias de cruzamento entre relevo arquitetônico, reocupação e programação cultural, casos em curso nalguns projetos para espaços camarários. A cidade de Lisboa, como capital histórica, sofre de excesso de patrimônio degradado, devoluto ou sub-aproveitado, fato posto em evidência na recente proposta de venda pela Câmara Municipal dos Palácios Pancas Palha, Palácio Monte Real e Palácio de Xabregas (4). Porém, a cidade tem explorado um cruzamento entre programação cultural e patrimônio, confiando em intervenções discretas de arquitetura que permitem o uso dos seus espaços. São exemplos o Palácio do Marquês de Pombal, onde se instalou o Carpe Diem Arte e Pesquisa (5); o Palácio Sinel de Cordes, onde a própria Trienal de Lisboa é parte de um conjunto de futuras atividades criativas, a par de residências e de co-work; ou o Palácio Alarcão, num projeto denominado DNA Lisboa (6), onde o Teatro Praga e outros grupos se instalarão. 

Sendo a arquitetura, o urbanismo, o paisagismo, disciplinas com potencial de intervenção e transformação da realidade, poderá um evento cultural ser uma ferramenta de transformação da percepção dessa mesma realidade? Os concursos de ideias, as encomendas de estudos e as consultas públicas são auscultações de propostas concretas para problemas específicos e têm sido exploradas em diversos eventos, como em Lisboa já se fez. Concretizá-los é praticamente impossível e servem sobretudo como consciencialização para problemas. Mas poderá a reflexão curatorial em volta da Arquitetura, a par de políticas de programação cultural (em arquitetura e noutras áreas) transformar a leitura de uma cidade? Eventos de escala maior, como as Capitais Europeias da Cultura, exploram o cruzamento entre política cultural e política de cidade. Pelo relevo social, econômico e político que têm a arquitetura, ou o urbanismo, poderão também influenciar leituras, percepções, e eventualmente, decisões. Esta questão mereceria ser explorada.

Para concluir, deixo algumas questões que, embora simples, me parecem ser de fundo, e que partilho: deverá a Trienal de Lisboa ser um espaço de experimentação e de diálogo internacional, ou deverá ser uma ferramenta de afirmação da arquitetura portuguesa? Como se selecionará a equipe curatorial das próximas edições: por concurso, como em 2013, ou regressando ao convite direto? Que formatos/modelos de programação se pretendem afirmar: um conjunto de pavilhões, grandes exposições, ou um modelo de festival? Que estratégias de relação com o público especializado e os públicos generalista/turístico serão ativadas: um público participativo/propositivo, um observador/visitante passivo? A amplitude de experiências na sua curta vida merecem que seja iniciado um balanço e questionamento, se retirem conclusões e afinem estratégias para que, com base nestas experiências, se possam perspectivar os próximos três, seis e, se possível, os seguintes anos.

notas

NA
O presente texto completa as minhas reflexões anteriormente escritas em artigos publicados em outubro e dezembro de 2013 na revista urbanista.org #2, com o título: ‘Post-something’ – actionsandvoicesof a generationunder 35: theLisbonArchitectureTriennale 2013 — http://www.urbanista.org/issues/local-eyes/features/post-something-actions-and-voices-of-a-generation-under-35-the-lisbon-architecture-triennale-2013; e na revista arq.an. 110, com o título: Exegese da Trienal 2013 <www.revarqa.com/content/1/1366/conetividade-jovem-corpo-arquitetos/.>.

NE
Publicação original do artigo: MOREIRA, Inês. Pós-Trienal 2013. Relações instáveis entre eventos, arquiteturas e cidades. Lisboa, Artecapital.net, 2013 <www.artecapital.net/arq_des-102>.Agradecemos ao administrador de Artecapital, Victor Pinto da Fonseca, pela autorização da republicação do artigo, e a Pedro Baía, pela intermediação da conversa com administrador e autora.

1
Ver artigo: http://www.revarqa.com/content/1/1366/conetividade-jovem-corpo-arquitetos/

2
Ver artigo: http://www.revarqa.com/content/1/1366/conetividade-jovem-corpo-arquitetos/ 

3
Carlos M. Guimarães, “Envisioningthe future, redefiningthepast”, A10 magazine, n. 53, set./out. 2013, p.58-60.

4
Ver notícia: http://www.tvl.pt/2013/12/14/a-camara-municipal-de-lisboa-quer-vender-tres-palacios-por-55-milhoes-de-euros/

5
Ver website: http://www.carpediemartepesquisa.com/

6
Ver ficha de projeto: http://www.arteria.pt/portfolio/dna-lisboa_36.html

sobre a autora

Inês Moreira é arquiteta, pesquisadora e curadora. Em 2013 completou o seu doutoramento no GoldsmithsCollege, Universityof London. Entre 2010-2012 dirigiu os projetos Edifícios & Vestígios eDevir Menor para Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura, foi co-curadora da exposição Materiality nos Estaleiros Navais de Gdansk (Polônia), dos eventos públicos do Evento 2009 – Bienal de Arte Pública de Bordeaux em 2009 e desenhou diversas cenografias para outros autores e instituições. Atualmente é curadora de dois projetos europeus e uma exposição na França sobre “Construtores Insaciáveis”.

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