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PORTAL VITRUVIUS. Sede da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais. Projetos, São Paulo, ano 05, n. 054.02, Vitruvius, jun. 2005 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/05.054/2494>.


O projeto que se apresenta aqui traz uma idéia singular em seu princípio de intervenção. Fundamenta-se no profundo respeito ao monumento, no entendimento de que qualquer intervenção dessa natureza deve evitar a competição com o bem tombado em suas especificidades formais, construtivas e de uso, assegurando a maior importância hierárquica do edifício existente na sua escala, na sua articulação com o espaço urbano adjacente, e na sua relevância como testemunha de diversos tempos da construção de nossa história.

Da pertinência da intervenção

“Indivíduos e sociedade não podem preservar e desenvolver sua identidade senão pela duração e pela memória
Félix Vicq d'Azyr, Primeiro tratado de conservação

A difícil tarefa de transformar o uso de um edifício de conformação neoclássica em sede para uma Orquestra impõe uma reflexão profunda quanto à pertinência de diversas estratégias para esta intervenção. De inquestionável relevância histórica, a edificação que terá seu uso transformado é parte integrante da memória da cidade e carrega em si a idéia de símbolo republicano: sua imagem está incondicionalmente associada ao Poder Estadual e participa da construção da imagem do principal espaço público que define este poder: a Praça da Liberdade. Como espaço interior, testemunha momentos sucessivos desta história pela justaposição dos diversos tempos caracterizados por suas distintas etapas de construção. Considerando a recomendação explícita no Termo de Referência de que a proposta deve se basear “(...) no reconhecimento do edifício e seus valores em três instâncias: consistência material, trajetória histórica e caráter artístico”, compreendemos que é extremamente desejável a integral preservação da volumetria original e da configuração interna dos espaços com seus materiais, cores e divisões o mais próximo de sua condição original, convertendo-as em lugar público, aberto e acessível a todos de modo a explicitar o tempo e a história. Para isso, todos os elementos novos devem revelar explicitamente sua contemporaneidade, e devem preservar incondicionalmente a possibilidade de reversibilidade da intervenção à conformação original do edifício.

Outro fundamento conceitual que orientou a estratégia de intervenção adotada consiste no direcionamento do maior afluxo de público para as partes novas da edificação, uma vez que a transformação de monumentos históricos em edifícios de uso cultural costuma acelerar o desgaste dos edifícios devido ao uso intenso para o qual não foram construídos. Como afirma Françoise Choay, “o monumento é poupado dos riscos do desuso para ser exposto ao desgaste e usurpações do uso.” (in: A alegoria do patrimônio, p.219). Isto posto, entendemos que a idéia de uma “conservação estratégica”, como defendida por Choay, deve ser premissa para conciliar o novo uso que apresenta maior atratividade de público, com a necessária permanência do edifício para as gerações futuras.

Para atender às premissas expostas, a localização dos dois maiores espaços do programa Grande Sala de Concertos e seu Foyer demanda o maior esforço projetual. Duas alternativas se afiguram como possíveis, de acordo com as prescrições do Termo de Referência do Concurso: a primeira, a elevação completa destes espaços sobre a parte posterior do edifício até a cota máxima permitida. Esta alternativa tende a produzir enorme esforço de compatibilização das novas estruturas portantes deste grande volume construído com as pré-existências da edificação tombada. Essa inserção de novas estruturas, por mais cuidadosa que seja, pode demandar intervenções que comprometem a integridade dos elementos construtivos que caracterizam as ambiências internas do edifício forros, pisos, e a conformação regular dos salões. Apresenta ainda, quanto à inserção urbana do volume edificado, uma transformação da imagem da Secretaria da Fazenda na configuração da paisagem urbana da Praça da Liberdade, comprometendo em especial a relação de proporção e escala deste edifício com as demais secretarias, além de se assemelhar demasiadamente com estratégias já utilizadas por outros arquitetos em situações análogas.

A segunda alternativa que se deduz das determinações do Termo de Referência é a escavação dos porões do edifício e, de modo integrado, da área livre posterior, permitida conforme descrito no ítem 2.2. Diretrizes Específicas, letra d)Subsolo. Esta solução, por um lado, evita a interferência na volumetria da edificação. Por outro lado, considerando as especificidades do sistema construtivo original, com fundações em pedra e alvenaria de tijolos, demanda intervenção de alto custo e grande risco para a integridade do edifício uma vez que impõe a construção de reforços e grandes estruturas para sustentar as partes descalçadas de suas fundações. Além disso, o rebaixo dos porões provavelmente resultaria em conflitos construtivos com os reforços de fundações executados ao longo da existência da edificação.

Assim sendo, considerando que:

  • é prioritária a preservação integral do Monumento na sua volumetria e nas suas ambiências internas;
  • deve-se assegurar a completa reversibilidade das intervenções, visando à integral preservação do bem tombado para as gerações futuras;
  • a opção de verticalização da porção posterior tende a contrariar estas premissas;
  • a opção de rebaixo em subsolo é permitida na projeção do Monumento e na área livre posterior;
  • e que há, ao lado do Monumento, espaço público que configura importante passagem urbana, cuja área e dimensões permitem atender integralmente às demandas do termo de referência quanto às especificações técnicas da grande sala de concertos, optamos por dispor o Foyer e a Grande Sala de Concertos em subsolo, por sob a passagem pública que dá acesso à Rua da Bahia através do vão do Edifício Anexo da Biblioteca Pública, por se tratar de um esforço construtivo de grande pertinência, o mais eficiente modo de conciliar a melhor preservação do monumento com a melhor condição técnica para abrigar a Orquestra. Uma análise cuidadosa permite constatar que os benefícios decorrentes desta decisão superam significativamente as restrições existentes à ocupação desta área em subsolo. Além das qualidades atinentes à técnica e à preservação, esta opção se revela ainda mais pertinente por ampliar em 1.000 metros quadrados a área construída com o mesmo custo final da obra, uma vez que, ao invés de investir uma soma significativa para reconstruir o espaço interno existente, através de onerosas substituições e adequações espaciais com nova estrutura portante de alto custo, por sua dificuldade de montagem, e de alto risco para a integridade do Monumento Histórico, permite construir um espaço novo com muito mais qualidade quanto às especificidades técnicas necessárias para abrigar a Orquestra.

Da preservação do monumento: recuperação dos princípios de ordenação originais – a simetria e o pátio interno e as adequações inerentes ao novo uso pretendido

Dada a relevância do edifício da Secretaria da Fazenda na conformação da paisagem urbana, e posto que sua imagem passará a estar associada à Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, a valorização de sua escadaria como entrada principal para todos os espaços da Instituição reforça sua simetria original e seu poder de representação. Estimula a fruição das suas ambiências internas, favorece a circulação nas áreas de exposição do Patrocinador, e faz culminar os percursos no vão interno recriado pela demolição da parte central, cuja construção data de período mais recente não identificado. Esta parte da edificação apresenta conformação fragmentada, com ambiência descontinuada em relação aos espaços originais, além de padrão construtivo em concreto armado, estranho às alvenarias de tijolo e aos pisos tabuados sobre barroteamento que caracterizam as três primeiras fases de construção da Secretaria.

A recuperação de sua lógica original de ordenação tipológica, fundada na reedição dos padrões clássicos de simetria com alas laterais que delimitam o pátio semi-interno, é, portanto, estratégia que visa a preservar o Monumento em sua conformação original, evitando a todo o custo a constituição de uma Alegoria que se efetivaria pela destruição dos vestígios de uso ao longo do século passado associada à exclusiva preservação da imagem do edifício. A disposição em pátio, presente em outros edifícios da praça, existira até a terceira etapa de construção, tendo sido subvertida na construção da quarta etapa que ocupou o vazio existente em seu eixo central de ordenação.

Além disso, o mais importante benefício que a demolição desta etapa de construção apresenta é a recuperação da ambiência gerada pelo pátio interno, típica dos edifícios da época, valorizando o eixo principal de simetria, demarcado pela escadaria externa e reforçada pela escada interna de acesso aos pavimentos superiores. A recuperação do pátio interno, reeditado como um átrio coberto, promove integração visual entre os pavimentos e contribui para estabelecer uma sucessão de espaços distintos para hierarquizar o acesso de público. É a partir deste pátio recriado que se dá o acesso ao principal espaço de apresentações: a Grande Sala de Concertos. Junto ao pátio também se instalam café e loja, que possibilitam a conformação de um eixo secundário de articulação funcional com o espaço urbano adjacente. Este percurso público transversal, favorecido pelo rebaixo do pátio ao nível do porão, permite o funcionamento independente destes dois equipamentos, e funciona como um pré-foyer para acesso à Sala de Concertos.

Esta solução permite reduzir significativamente a circulação de público nos salões do Monumento Histórico sem perder a importância da ambientação que os seus espaços principais apresentam. A fim de reforçar o seu usufruto, além das áreas de exposição do Espaço do Patrocinador, que ocupam todo o Pavimento Térreo, a Sala de Música de Câmera, localizada no segundo pavimento, e a sala do Coral, localizada no terceiro, estimulam a utilização pública da escada de ferro forjado no sistema “jolly", preservando-a, contudo, do maior fluxo de usuários que acorrem à Grande Sala de Concertos. Além das salas citadas, localizam-se no segundo pavimento os espaços do programa abertos ao uso público, como biblioteca, salas de consulta, e outros. No terceiro pavimento, com maior gradação de privacidade, concentram-se todas as áreas destinadas aos músicos e à administração da orquestra.

Em virtude da maior oferta de áreas decorrente da opção pela integral preservação do monumento e direcionamento do maior investimento para a construção do novo espaço por sob a praça, foi possível ofertar espaços mais generosos para todas as atividades principais. Além deste benefício, foi possível ofertar uma sala multimídia adicional para abrigar, entre outras atividades, apresentações de vídeos e dvd's relacionadas à música, como se faz tradicionalmente no Conservatório de Música da UFMG. A ampliação da oferta de espaços multiuso reforça o atendimento às determinações do Plano Diretor do Circuito Cultural da Praça da Liberdade em seu ítem 2-Definição das Diretrizes Básicas, letra”b”, que determina como fundamental o “alto dinamismo, com grande variedade de atividades, incluindo, além dos espaços e equipamentos com destinação específica, alguns espaços multiuso flexíveis”, visando ao incremento “da animação e do dinamismo do conjunto, possibilitando mais variedade, alternância e rotatividade de atividades e programações, criando condições para projeções cinematográficas e audiovisuais (...).”

Em todos os pavimentos, novos sanitários foram projetados, reunidos em uma única prumada de modo a reduzir interferências nos elementos edificados. Estes sanitários reúnem os equipamentos no centro, evitando qualquer interferência entre as novas instalações e as alvenarias existentes. O novo piso impermeável é elevado o mínimo necessário para comportar a montagem das novas instalações, preservando integralmente o piso existente e assegurando a reversibilidade da intervenção. No terceiro pavimento, os sanitários privativos das salas do maestro, solista e regente convidado têm seus pisos elevados, com desvio das instalações para prumadas no novo bloco de circulação vertical.

Em todos os espaços do edifício existente são previstas interferências mínimas para compatibilizar os novos usos com os elementos existentes. Na Sala de Música de Câmera e na Sala do Coral, localizados respectivamente no segundo e no terceiro pavimentos, as aberturas existentes receberão duplo fechamento em vidro temperado, o que define maior isolamento acústico em relação ao ambiente externo sem, contudo, abrir mão da permeabilidade visual entre esses espaços e a Praça da Liberdade. Este isolamento imprescindível é favorecido pelo acesso em antecâmara conformado pelo hall onde atualmente se instala o elevador que, removido, dá lugar à criação de dois shafts que permitem conduzir as instalações necessárias entre os pavimentos.

Todas as divisões internas de ambientes de trabalho – áreas de uso público e administrativo – serão executadas em vidro temperado, transparente quando convier, serigrafado quando necessária maior privacidade. Esta solução se utilizará inclusive nos sanitários, a fim de demarcar mais enfaticamente a diferenciação entre os elementos existentes e a nova intervenção. Permite ainda uma montagem rápida e segura, minimizando riscos à integridade do Monumento e reforçando a sua possibilidade de reversão ao estado original. Apenas nos espaços destinados aos ensaios, localizados no terceiro pavimento, prevê-se a instalação de divisões internas com grande capacidade de isolamento acústico e acabamento final em madeira, material que apresenta melhor desempenho acústico para qualificação do ambiente.

A escolha dos materiais utilizados em todos os elementos da intervenção se fundamenta em uma diferenciação gradativa que busca a um só tempo demarcar com clareza a intervenção e inserir-se harmonicamente em relação às pré-existências. Para isso, as subdivisões internas apresentam desenho simples, sempre que possível com o vidro, de modo a enfatizar a unidade de cada espaço original. Na intervenção mais significativa no Monumento a recriação do pátio central propõe-se a utilização de revestimento em placas de quartzito rosa serrado, com paginação que respeita os vãos existentes. A utilização desta pedra busca reeditar o padrão de cor predominante nos edifícios e no espaço público da praça e reforça o caráter de lugar externo, coberto com zenital de vidro transparente a permitir a visualização do céu. O desenho da estrutura portante da cobertura, associado à utilização de vidros duplos, permite conciliar a abertura zenital com a devida proteção da incidência direta da radiação solar que reduziria a habitabilidade deste espaço pela geração de efeito estufa. Reforça a qualificação do pátio a possibilidade de tiragem do ar quente pela elevação da cobertura do pátio, permitindo a configuração de uma grande chaminé que favorece inclusive a climatização dos salões a ele adjacentes. Associado a um desenho contemporâneo, instalado com tecnologia que permite deixar a junta aberta e instalar material fono-absorvente atrás do revestimento em pedra a fim de qualificar acusticamente este espaço de concentração de público, essa solução permite conferir unidade ao espaço recriado que revela seu caráter contemporâneo através de uma inserção delicada que visa à unidade potencial do Monumento. Nesse sentido, o quartzito serrado cumpre função das mais importantes, ao reeditar contemporaneamente o requinte do cuidadoso tratamento parietal que caracteriza o edifício, tanto nas pinturas dos espaços internos quanto na sua ornamentação geral.

Nas áreas totalmente novas, edificadas em subsolo, propõe-se o uso de um único material como revestimento a madeira visando a uma diferenciação enfática entre o Monumento existente e os novos espaços. Com melhor desempenho quanto à acústica e com grande potencial para ambientação, aparece nos revestimentos de foyer e Grande Sala de Concertos, assegurando unidade a estes espaços.

Busca-se, com isso, o restabelecimento de uma unidade potencial do Monumento em seu novo uso, editando sutilmente sua conformação espacial de modo a atender às demandas contemporâneas sem apagar os traços decorrentes da sua história e de suas ocupações anteriores, assegurando assim sua conservação para as gerações futuras.

Da relação da orquestra com a cidade: o edifício como res Publica e sua interação com o espaço urbano adjacente

A importância do edifício da Secretaria da Fazenda como Monumento Histórico, entendido como objeto de saber e objeto artístico com valor próprio centrado no testemunho do tempo da origem da cidade, fundado no ideal republicano, associada à grande relevância da destinação a sede da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, demanda um compromisso de abertura do edifício como coisa pública, para além da idéia de propriedade, mas fundada no ideal de igualdade e universalidade que sua nova função exige. Neste sentido, propõe-se uma maior articulação entre edifício e cidade, conciliando a introspecção, definida pelo seu princípio gerador simétrico e articulado ao redor do pátio interno recriado, com a definição de novos vetores de abertura ao público, demarcados fisicamente pela seqüência transversal ao eixo principal do edifício, definido por café, pátio e loja, e simbolicamente, pela sutil intervenção na praça Carlos Drummond de Andrade, reeditando sua topografia e promovendo uma integração visual entre o foyer e os dois edifícios das secretarias a ele adjacentes – Fazenda e Educação. Esta intervenção, ao mesmo tempo em que viabiliza tecnicamente a criação do espaço para a Grande Sala de Concertos, assegura a preservação integral do vazio urbano configurado entre os edifícios, ampliando as suas possibilidades de apropriação e reforçando, com isso, seu caráter público.

Além disso, a localização privilegiada do edifício da Secretaria da Fazenda em relação à presença dos espaços públicos adjacentes permite especular acerca da extensão das atividades da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais para aqueles espaços. Como ocorre no Parque Municipal aos domingos, a Orquestra poderá utilizar a Praça da Liberdade para apresentações ao ar livre. Objetivando ampliar as possibilidades de apropriação do espaço público, o aprimoramento do desenho da praça Carlos Drummond de Andrade permite implantar ali pequena escadaria-arquibancada voltada para o vazio do pórtico de entrada do Anexo da Biblioteca Pública de modo a estimular a ocupação desta área com atividades da Orquestra. Este vão, por sua maior demarcação territorial e por dispor de parte de sua área coberta, favorece a ambientação de pequenas apresentações. Esta área tem sua vitalidade ampliada pela proximidade com o Café-concerto, no subsolo existente da Secretaria da Fazenda e aberto para este intervalo público.

A elevação criada favorece ainda, do lado voltado para a Praça, com inclinação mais suave, a apresentação da Orquestra para públicos maiores, ocupando a rua frontal às secretarias e parte dos passeios da praça.

Reforçam a vocação pública do edifício e sua relação enfática com a estrutura urbana adjacente a previsão de um terraço com mesas ao ar livre, nova iluminação que amplie a segurança no uso noturno e a possibilidade de definição do citado percurso interno ao edifício ao nível do subsolo que integra a Rua Gonçalves Dias com a Praça Carlos Drummond de Andrade, passando pela loja, pátio e café, com controle independente a permitir funcionamento em horários alternativos.

A intervenção proposta fortalece a idéia do Circuito Cultural da Praça da Liberdade ao ampliar a integração do edifício com os espaços públicos a ele adjacentes, estabelecendo uma seqüência de percursos na cidade que integra a praça da Liberdade e as outras secretarias com seus futuros usos culturais, o café-concerto, a Praça Carlos Drummond de Andrade e o pórtico do Edifício anexo da Biblioteca Pública, a loja e a calçada alargada da Rua Gonçalves Dias, e na continuidade, o Cine Belas Artes, bares e restaurantes da região.

Para reforçar o caráter de passagem entre a Rua da Bahia e a Praça da Liberdade, já consolidado pela criação do vão do edifício anexo da Biblioteca, propõe-se, a título de sugestão, uma pequena alteração no traçado do canteiro lateral da Praça da Liberdade, associada ao deslocamento do semáforo e faixa de pedestres existentes na esquina da Rua Gonçalves Dias para a chegada da passagem da Praça Carlos Drummond de Andrade. Esta intervenção, além de ampliar a acumulação de veículos desafogando o nó viário da conversão da Av. João Pinheiro na Praça, estimula maior conexão para quem usa a passagem e especialmente configura um convite para quem circula pela praça adentrar na passagem e dali nas áreas públicas e comerciais da Orquestra.

A fim de mitigar impactos decorrentes da transformação de uso que implicará em maior atratividade de público, cabe apontar, ainda que preliminarmente, alternativas para a acomodação dos automóveis dos usuários da orquestra. Uma alternativa mais onerosa, mas que poderia ser pensada no conjunto da praça para atender a todas as edificações culturais que funcionarão no lugar, consiste na previsão de estacionamentos subterrâneos sob a alameda ou sob as vias laterais da praça, como se tem feito na maioria dos núcleos urbanos de interesse histórico. Alternativamente, para o caso exclusivo da Orquestra, se poderia estudar a gestão específica do trânsito na região. Como os horários de apresentações com maior atração de público se concentram nas noites e nos fins de semana, que coincide com a redução do fluxo de veículos na região, pode-se estabelecer reordenação do trânsito periférico da praça para a Rua da Bahia, de modo a fechar a rua lateral da praça, como usualmente se faz aos domingos, para estacionamento nestes horários (a partir das 20:00hs nos dias de semana, e nas tardes e noites de sábado). Essa iniciativa permitiria acomodar mais de 100 vagas sem demandar grandes investimentos.

Da pertinência das soluções tecnológicas propostas

Todas as soluções tecnológicas propostas têm por objetivo primeiro a melhor qualificação técnica dos ambientes destinados aos músicos e à orquestra. Nesse sentido, a opção pela ocupação em subsolo vem viabilizar a qualificação dos espaços para atender às atividades que ali tomarão lugar sem entrar em conflito com as premissas colocadas quanto à preservação do bem tombado. Evita, portanto, o dilema entre a preservação do Monumento ou o atendimento às demandas técnicas imprescindíveis para o novo uso.

Estruturas e contenções

A disposição em subsolo implica em escavação de um volume de 22 mil m3, com profundidade média de 18 metros. Esta escavação demanda, naturalmente, a construção de contenções cuja eficiência do processo construtivo e de sua capacidade portante seja de absoluta segurança e confiabilidade, posto que se implanta no intervalo entre dois Monumentos Históricos. Para assegurar a completa conservação dos edifícios e eliminar qualquer risco de comprometimento de sua integridade, foram levantadas duas alternativas para a viabilização da obra. Cabe ressaltar que ambas as alternativas reúnem procedimentos usuais na construção civil brasileira, já razoavelmente recorrentes nas obras civis do mercado da construção em Belo Horizonte, inclusive em maior escala e proporção do que da proposta.

A primeira alternativa considera a hipótese de que a escavação não atinja o NA – Nível de água – do subsolo. A observação da condição topográfica da Praça da Liberdade, implantada em área elevada, razoavelmente distante de cursos d’água, associada ao fato de que a área a ser escavada se constitui de aterro, e ainda o conhecimento de situações análogas em regiões próximas à área de intervenção levam a crer, por analogia, que é bastante plausível que a escavação possa se realizar sem interferências no NA. Neste caso, propõe-se a utilização de um sistema de escavação manual dos elementos principais da contenção: os retangulões. Com largura de 60cm, necessária para a operação de escavação, estes elementos são escavados e concretados de modo a definir uma cortina que estabiliza o solo sob os edifícios do entorno e permite que se inicie a retirada de terra. A partir da retirada dos primeiros 4 metros de terra, inicia-se o processo de estabilização do conjunto de retangulões com vigas transversais, que podem ser moldadas in loco ou metálicas. Após a montagem das vigas, o solo lateral é perfurado com sonda rotativa com inclinação, diâmetro e comprimento conforme projeto, e são colocados cabos de ancoragem, que recebem reforço com nata de cimento (jet grouting) nas partes mais profundas de ancoragem para criar no solo a devida resistência. Após estes procedimentos, se executa a protensão dos cabos ou monobarras dos tirantes com macacos hidráulicos de modo a assegurar a obtenção da carga de projeto que vai garantir a estabilidade do solo adjacente. Após a protensão dos tirantes, executa-se nova retirada de terra e posterior execução da viga de travamento seguida de nova linha de tirantes, e sucessivamente até a cota final de escavação. Todo o processo é objeto de monitoramento de alta precisão, com estação total e dispositivos de aferição semanal do nivelamento das construções adjacentes e do prumo dos elementos de contenção, a fim de diagnosticar o menor indício de recalque de terreno antes de qualquer comprometimento das edificações.

Uma vez finalizada a escavação, executa-se a laje de base, com a fundação necessária para os elementos edificados. Construídas as lajes e a cobertura, que funcionam como contrafortes para as contenções laterais, os tirantes de estabilização dos muros perdem sua função. Como são estruturas temporárias, dispensam tratamentos especiais e pintura anticorrosiva.

A construção completa de todos os elementos de contenção e fundação nesta alternativa gera um custo estimado R$ 2.429.746,80, já incluindo BDI de 30% – vide planilha anexa.

A segunda alternativa considera a hipótese de que a escavação atinja o NA – Nível de água – do subsolo. Embora menos provável, esta hipótese foi estudada com mesmo cuidado a fim de certificar a viabilidade da solução mesmo na condição mais crítica. Neste caso, o processo se iniciaria pela escavação de retangulões até cota próxima ao NA a fim de definir uma contenção preliminar de segurança para as edificações adjacentes. Procede-se a escavação dos primeiros quatro metros de modo a rebaixar o nível do canteiro de obras, reduzindo conflitos com o espaço urbano e com as edificações adjacentes. Nesta cota, se executaria uma parede guia temporária, paralela à linha de retangulões, e se iniciaria a escavação mecânica de paredes diafragma moldadas in loco com guindaste tipo Clam Schell de controle hidráulico, que apresenta maior precisão e portanto, minimiza risco de colisão com os elementos ornamentais e saliências dos edifícios. Este tipo de fundação tem como principais virtudes a possibilidade de alcançar profundidades abaixo do nível d’água, apresentar total ausência de vibrações, não causar sensíveis descompressões ou modificações no terreno, evitando danos às estruturas existentes, e funcionar como elemento estrutural e como septo impermeabilizante impedindo o fluxo de água. Ao conter a água adjacente, a parede diafragma evita a execução de rebaixamento do lençol freático, que é um dos mais graves causadores de recalques em edificações.

Uma vez executada a parede diafragma, faz-se uma consolidação do solo de base que promoverá a estanqueidade da água abaixo da cota de implantação do primeiro piso. Esta base é construída com Jet-Grouting – injeção de calda de cimento com alta pressão e elevada velocidade que desagrega a estrutura do solo misturando-se com ele de modo a formar uma coluna de solo de cimento de alta resistência.

Consolidada a base estanque, procede-se à escavação seguida de estabilização com tirantes com o mesmo procedimento anterior.

A construção completa de todos os elementos de contenção e fundação nesta alternativa, que seria a mais onerosa possível, gera um custo estimado R$ 4.681.528,80, já incluindo BDI de 30% – vide planilha anexa. Assim, considerando o custo final pretendido para toda a obra de restauração e adequação de R$ 14.000.000,00, restam mais de 9 milhões de reais para a construção dos elementos de acabamento e instalações da sala de espetáculos e seus apoios, e para as pequenas adequações do edifício existente que, por ter mantida sua condição atual no que concerne à grande maioria de seus elementos construtivos e de acabamento, tem reduzido significativamente o custo da intervenção. Cabe ainda ressaltar que o ótimo estado de conservação do edifício existente demanda poucas intervenções restauradoras posto que o espaço de maiores proporções que demandaria grande intervenção foi disposto fora do Monumento.

Em ambas as soluções, o volume habitável abrigado pela contenção tem suas vedações independentes das paredes da estrutura, definindo um colchão de ar que permite recolher eventuais afloramentos de água, conduzindo-os através de drenos a caixa de drenagem para posterior lançamento externo, e assegura maior qualidade do ar interno com total isolamento em relação à umidade proveniente dos solos.

A solução adotada para a Grande Sala de Concertos reduz drasticamente a necessidade de intervenções estruturais no Monumento. Para ampliar a integração física e visual entre o pátio interno criado e os espaços públicos localizados no subsolo – café, loja e rampa de acesso ao foyer – prevê-se a implementação de reforços nas estruturas de fundação que atualmente compartimentam estes espaços.

A fim de não falsear a história e explicitar os novos elementos, toda estrutura necessária para abertura de novo vão será executada em aço, e será exposta sem revestimentos. Nestes pavimentos, a fim de ampliar os pés-direitos dos espaços públicos e para viabilizar o vão de passagem para a conexão de acesso ao foyer, prevê-se um pequeno rebaixo do piso.

Acústica

A necessidade de total isolamento acústico da Grande Sala de Concertos reforça a pertinência da sua implantação em subsolo. Além de reduzir significativamente o custo com o isolamento do espaço, comparativamente a outras soluções, a dissociação completa deste volume edificado em relação ao edifício tombado elimina a necessidade de delicadas instalações de amortecimento das vibrações que estes edifícios apresentam em decorrência da proximidade com vias públicas de intenso tráfego automotivo. Essas vibrações, incompatíveis com a atividade proposta para o edifício, são acentuadas neste caso pelo fato de a edificação ter sido originalmente construída sobre terreno em aterro.

Amplia o isolamento da sala a presença do foyer por sobre o seu teto. O piso do foyer deverá apresentar tratamento acústico sobre a laje, com piso flutuante sobre material resiliente a fim de eliminar ruído de impacto decorrente do trânsito de pessoas no ambiente.

A fim de garantir balanço tonal de graves e razão de agudos de forma a gerar calidez e brilho, definição e claridade apropriados ao ambiente, as superfícies apresentarão absorção e difusão sonora adequadas, inclinações e possibilidade de ajustes resultantes de estudos detalhados da acústica geométrica do ambiente. Em caráter preliminar, ressaltam-se as seguintes medidas:

  • as laterais da platéia possuem ranhuras refletoras para evitar o efeito flutter. Estas ranhuras, instaladas com pequena inclinação, consistem em painéis de madeira refletores de média e alta freqüência e absorventes de baixa freqüência, instalados sobre camada de material fono-absorvente;
  • os painéis de teto apresentam perfil curvo cuja composição geométrica contribui para refletir o som para as partes mais profundas da platéia. A fim de permitir ajustes variados de reverberação da sala, estes painéis apresentam dois tipos de movimento: o ajuste vertical e o ajuste de inclinação.
  • o palco apresenta em suas laterais painéis que permitem a difusão e reflexão do som, com padrão móvel e ajustável. Já o fundo do palco se constitui de difusores sonoros com geometria a ser definida por posterior estudo e detalhamento.
  • a porção posterior da platéia e do balcão apresenta material fono-absorvente, assim como seus pisos, que recebem carpete de modo a reduzir interferências sonoras decorrentes da movimentação de público.

Condicionamento de ar e instalações gerais

A fim de reforçar a preservação dos elementos constitutivos do edifício tombado, todos os equipamentos de condicionamento de ar se localizam na nova construção em subsolo, nas áreas técnicas laterais ao foyer. Esta localização reduz os percursos de dutos e instalações em relação ao espaço com maior solicitação de climatização, favorece a troca de calor com o ambiente externo e permite o fornecimento de água fria aos climatizadores tipo fan-coil que atenderão a Grande Sala de Concertos e seu Foyer, e também aos fancoletes de ambiente nos espaços climatizados do edifício existente e das áreas de apoio ao palco. No edifício existente, apenas os dois espaços de maior concentração de público – a sala de Música de Câmera e a Sala do Coral – demandam a previsão de casa de máquinas. Sua localização coincidente em planta, no 2o e 3o pavimentos, permite a instalação deste equipamento no entreforro da antecâmara definida pelo hall que atualmente abriga o elevador. Esta posição estratégica favorece o menor percurso de dutos por se localizar em cota intermediária às duas salas. Nestas, os dutos correrão aparentes a fim de explicitar o caráter de intervenção nova que representam, e reduzir conflitos com os forros existentes em ambos os espaços.

Para alimentação destes equipamentos e para sua drenagem, tubos de pequena seção percorrem o subsolo e utilizam do vazio existente do atual elevador para a distribuição em todos os pavimentos.

Prevenção e combate a incêndio

A mudança de uso do edifício implica na sua readequação quanto às saídas de emergência, rotas de fuga e instalações no que couber, como recomenda a norma ABNT NBR 9077. A implementação de uma sala de espetáculos de uso público para 600 pessoas demanda a definição de percursos de fuga com capacidade significativa. O partido adotado, com a Grande Sala de Concertos no subsolo, permite diferenciar os sistemas e equipamentos que atendem a este espaço daqueles que atenderão ao restante do edifício. Essa distinção reduz significativamente o público usuário do edifício, reduzindo a demanda por escadas e dispositivos de fuga no corpo do prédio tombado. Em contrapartida, a fuga em caso de emergência para os usuários da Sala de Concertos se faz diretamente ao espaço público definido pelo intervalo entre as duas Secretarias, o que torna mais eficiente o sistema.

Em resumo, foram previstos os seguintes dispositivos em função das determinações normativas:

Para a Grande Sala de Concertos, o dimensionamento demanda 8 unidades de passagem para fuga, sendo 2 UP’s no núcleo de circulação vertical junto ao palco e 6 UP’s nas escadas atrás das platéias. As três escadas devem ser protegidas de fumaça, para o que se deve utilizar sistema mecânico de pressurização visto que os sistemas usuais de proteção contra fumaça por ventilação natural não funcionam em subsolo.

Considerando o fato de a fuga ser ascendente, há uma restrição adicional no dimensionamento das Unidades de Passagem, para o que se adotou o espelho com altura máxima de 17cm. As saídas de emergência se fazem, nos três casos, para o espaço público entre as secretarias, evitando direcionar as rotas de fuga para o interior da edificação tombada.

A localização em subsolo determina ainda a utilização de chuveiros automáticos (sprinklers) na grande sala e no foyer. Para alimentação deles, estão previstos dois reservatórios que ocupam o entreforro das circulações de serviços existentes no bloco de circulação vertical acrescido ao conjunto, localizado no pátio posterior da edificação existente. As bombas para pressurização dos chuveiros automáticos se localizam na área técnica lateral ao foyer, de modo a reduzir os percursos de instalações e otimizar o desempenho do sistema.

Por fim, tendo em vista a possibilidade de utilização de materiais de fácil combustão no interior da sala – tecidos, materiais isolantes, madeira – é necessário prever a instalação de sistema automático de exaustão de gases, como determina a norma ABNT NBR 8232. Este sistema também se instala nas áreas técnicas laterais ao foyer, permitindo a conexão de dutos de exaustão do interior da sala de espetáculo até o ambiente externo, providos dos necessários atenuadores de ruídos e isolamentos.

Para o edifício existente, foi considerado, para efeito de dimensionamento, o pavimento de maior número de usuários – 2o pavimento, que abriga a Sala de Música de Câmera e a maioria dos espaços de acesso de público. O total da área deste pavimento, confrontado com o uso público, demanda o mínimo de 5 unidades de passagem para a fuga em casos de emergência. Para atender a esta demanda, foram consideradas 3 UP’s na escadaria existente, acrescidas de 2 UP’s no bloco de circulação técnica e de serviço acrescido à edificação. Neste caso, a fuga se dará em duas direções, sendo o primeiro grupo direcionado para a porta de entrada principal e o segundo para o subsolo, passando pelo pátio central e deste para a área aberta posterior ao edifício. Como os usuários do 1o pavimento e do subsolo dispõem de acesso direto aos espaços públicos adjacentes, estes espaços não demandam equipamentos especiais para fuga em caso de emergência, apenas a sinalização das rotas de fuga.

Todo o edifício, nas partes novas e na existente, deve ainda dispor de sinalização luminosa das rotas de fuga e alarme de incêndio tendo em vista seu uso público, bem como de sistema de hidrantes, cujos equipamentos se concentram na torre de circulação vertical acrescida ao edifício. Neste bloco, um grande reservatório no topo concentra toda a água de uso e a reserva de incêndio, com casa de bombas e barrilete lateral.

ficha técnica

Autores
Alexandre Brasil Garcia, André Luiz Prado, Bruno Santa Cecília e Carlos Alberto Maciel

Colaboradores
Antônio Ananias de Mendonça (fundações); Carlos Alberto de Oliveira (instalações); Sandra Botrel (climatização); Fabiano Campos Faria (orçamento, prevenção e combate a incêndio)

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