Os primeiros hotéis de negócios eram empreendimentos de luxo, localizados nos centros financeiros das grandes cidades, junto aos mais importantes estabelecimentos públicos e empresas, inseridos na principal atração turística local.
Os terrenos eram especiais e as construções apresentavam o que havia de mais moderno, o que proporcionava ao empreendimento hoteleiro substancial sobrevalorização sobre o patrimônio imobiliário.
Com isso, os hotéis bem sucedidos passaram a desempenhar a função de indutores de expansão urbana e desenvolvimento imobiliário, em torno dos quais a cidade crescia, determinada pelo padrão indicado pelo hotel.
No Brasil há diversos empreendimentos, planejados ou não, com estas características.
No Rio de Janeiro, desde o início do séc. XX, verifica-se este fenômeno: o arrojado projeto de abertura da Avenida Central pelo Prefeito Pereira Passos, com a desapropriação de mais de três mil imóveis e o planejamento de edificações ao longo desta avenida de inspiração européia, abrigou, entre seus prédios, o Palace Hotel, do empresário Otávio Guinle, de 1910 e o Hotel Avenida, construído pela Light em 1906, referências de arquitetura e padrões operacionais, iniciando no país a atividade hoteleira, até então limitada a estalagens e modestas hospedarias.
O Hotel Avenida, demolido em 1957 para dar lugar ao Edifício Avenida Central, foi o mais importante hotel da capital da república, no início do século XX, oferecendo 220 apartamentos, com base em incentivo governamental que isentava de emolumentos e impostos, por sete anos, os primeiros grandes hotéis que se instalassem na avenida, com o objetivo de melhorar a qualidade dos equipamentos hoteleiros para a realização da Exposição Nacional, no centenário da abertura dos portos brasileiros.
O Hotel Copacabana Palace, de 1923, também de Otávio Guinle – um dos principais empresários brasileiros, proprietário da Companhia Docas – e projeto de Joseph Gire, inspirado nos hotéis Negresco de Nice e Carlton de Cannes, é o que melhor se enquadra nesta situação, construído na orla de Copacabana praticamente vazia; o bairro cresceu em torno do hotel, no mesmo padrão de sofisticação.
A valorização imobiliária proporcionada por este hotel é incalculável - o Rio, antes do “Copa”, limitava-se ao centro, Flamengo, Botafogo e Glória; a construção do túnel ao Leme e do hotel indicou um novo desenvolvimento urbano.
Sem o Copacabana Palace, o bairro teria crescido, mas certamente não da mesma forma; como desdobramento, o crescimento da sofisticada Copacabana, proporcionou, após trinta anos, o surgimento, em alto estilo, de Ipanema e Leblon.
A partir de 1930, a Cinelândia – região em torno da Praça Floriano, junto à Av. Rio Branco (ex-Avenida Central) – abrigou hotéis, teatros, boates, bares e restaurantes e se notabilizou como a principal região de entretenimento da efervescente capital da república, uma verdadeira broadway carioca.
Neste cenário, surge o Hotel Serrador, oferecendo ótimos serviços a empresários, políticos e alta sociedade, oferecendo a famosa boate Night & Day.
O alto edifício com arrojadas linhas em art décó induzia à verticalização, em uma região que passava pela substituição de arquitetura dos prédios de inspiração francesa e inglesa dos tempos da Avenida Central, como o Palácio Monroe, o Teatro Municipal, o Palácio Pedro Ernesto, entre muitos outros, para os arranha-céus de influência norte-americana.
A mudança da capital para Brasília causou profunda crise em todos os setores produtivos do Rio de Janeiro, o que refletiu em grave crise em seu parque imobiliário, com evidentes conseqüências no setor urbano.
Desta forma, mesmo com o Rio de Janeiro mantendo-se, durante as décadas seguintes, até os dias atuais, como o principal destino turístico brasileiro (recebendo cerca de 36% dos estrangeiros que vêm ao Brasil), seu parque hoteleiro sofreu grande degradação e foi pouco renovado na segunda metade do século XX.
Nos anos 1970, os hotéis altos de Copacabana – Rio Othon Palace e Le Méridien despontaram nos céus de Copacabana, modificando a paisagem da orla e indicando um novo crescimento imobiliário, ocorrido no início dos anos 1980, substituindo-se antigos prédios nas ruas próximas à praia por edifícios residenciais e comerciais de alto padrão.
Ao mesmo tempo, observou-se acentuado crescimento urbano em outras regiões turísticas do Rio de Janeiro: a construção do Hotel Caesar Park (1979) exerceu forte influência no desenvolvimento e padrão construtivo de Ipanema, assim como os hotéis Sheraton (1974), Nacional (1968) e Inter-Continental (1974), o primeiro na Praia do Vidigal e os outros dois em São Conrado, iniciaram o desenvolvimento imobiliário da região oeste, rumo à Barra da Tijuca.
Estes foram os primeiros grandes hotéis com projetos de redes internacionais a se instalarem no Rio de Janeiro, influenciando definitivamente as construções residenciais destas localidades, como alternativas aos bairros de Copacabana, Ipanema e adjacências.
Vale destacar que os imóveis de São Conrado estão entre os mais valorizados do Rio até os dias atuais, mesmo com o fechamento do Hotel Nacional e apesar do crescimento das favelas próximas, que poderiam ser fatores inibidores de desenvolvimento urbano e imobiliário.
sobre o autor
Caio Sergio Calfat Jacob, engenheiro civil pela Universidade de Mogi das Cruzes, sócio-diretor da CJ&N Real Estate Consulting e da NBB – National Business Brokers Brasil, professor de Planejamento de Empreendimentos Hoteleiros do MBA Real Estate, da FUPAM FAU-USP e do Curso de Especialização de Gerenciamento de Empreendimentos na Construção Civil da FAU-Mackenzie.