A viagem começa no momento em que se sabe que se vai viajar. E isso às vezes acontece muito antes da hora de entrar no ônibus, avião, navio, carro... ou até de subir na bicicleta! E quando o destino é de alguma forma especial – seja a viagem a trabalho ou a lazer – começamos a pensar nele e a querer descobri-lo previamente, munindo-nos de tantas informações quanto seja possível obter. E dos palpites, dicas e opiniões de amigos, parentes, conhecidos.
Eu tenho o vício de querer saber tudo, como se isso fosse possível. Costumo mergulhar nas revistas e guias de viagem e fico sempre tentando descobrir um roteiro diferente ou uma dica pouco usual, daquelas que não fazem parte dos quadros sinópticos que são costumeiramente inseridos no final das matérias de revistas especializadas sobre um ou outro lugar. Com Madrid foi assim. Li tudo o que encontrei pela frente e decidi me cercar de alguns guias de viagem (nunca fique à mercê de um único!). Fui a uma boa livraria (isso é fundamental!) – daquelas que têm pufes e banquetas espalhadas em meio às estantes – e tratei de carregar comigo logo uns oito exemplares de guias de viagens para a capital espanhola (alguns falavam também sobre o entorno).
Sentei-me em um pufe amarelo ("refestelei-me" talvez seja a expressão mais adequada...) e comecei, literalmente, a viajar. Os guias são engraçados. Alguns deles partem do princípio de que não sabemos nada sobre o destino e nos contam tudo – desde a fundação até os dias de hoje, com riqueza de detalhes históricos e culturais, fotografias e até fofocas sobre a vida nem tão íntima de um ou outro monarca, personalidade ou chefe de estado.
Outros, por sua vez, entendem que só queremos passear e não nos concentrarmos em coisa alguma que diga respeito à história ou à cultura – limitando-se a dar dicas de compras, passeios e restaurantes badalados. Como sou do tipo neurótica por viagens, quero saber de tudo e até me divirto ao ler sobre as peraltices de um ou outro personagem. E gosto dos desenhos da linha do tempo, com datas importantes, marcas dos lugares onde uma coisa ou outra aconteceu e as indicações do gênero "visite aquela catedral, única do período gótico", etc., etc.
Pois para este propósito específico escolhi três guias que a mim pareceram bastante adequados e decidi colocá-los à prova. Chego ao extremo de, a partir dos que escolho, organizar o meu e desenhar o meu roteiro de passeios e visitas. É claro que sempre tem uma ou outra coisa que não dá certo, mas no geral é uma experiência e tanto.
Comecei pelo Frommer´s Madrid, que achei sensacional. É prático, tem linguagem clara e, embora traga seções previsíveis como "O melhor de Madrid" ou "Onde ficar" e "O que ver e fazer", desenhadas para o mais tradicional dos turistas, vai além do óbvio e traz algumas sugestões diferenciadas e um critério e escala de avaliação de atrações que não destaca apenas o que é bom (onde estão as "descobertas especiais", "fatos engraçados", "atrações para crianças", "momentos especiais" e "dicas"), mas também aconselha sobre "lugares ou experiências que não valem o tempo e o dinheiro gasto" e sobre "boas maneiras de gastar o tempo e o dinheiro". Honesto. Em especial quando o câmbio não conspira a favor do turista
No conteúdo do Frommer's garimpei algumas dicas preciosas de história e cultura, que traduzi em passeios temáticos – o da busca do resgate da história dos hotéis de Madrid (meu grande vício de viagem, uma vez que sou hoteleira). Ele me contou que o "avô dos hotéis madrilenhos", o Ritz, apesar de caro e já com quase 100 anos, permanece charmoso e imprevisível em termos de serviço. Preparei o bolso e fui ao chá da tarde no Lobby Bar. Lindo. E, o chá, delicioso.
Foi também o Frommer´s que me recomendou filmes rodados em Madrid e linhas de ônibus que passam pelos principais pontos turísticos (dica valiosíssima para quem passa poucos dias na cidade e não pode perder tempo nem quer se deslocar de metrô), entre as quais está a linha 146: Callao – Barrio de la Concepción, um corte na direção leste-oeste da cidade, mostrando a mudança nos estilos arquitetônicos.
Andar à pé em Madrid é fácil e agradável. Mas é bobagem fazer isso sem saber previamente a história da cidade e o significado local de muitos dos signos e monumentos espalhados pelos quatro cantos da cidade.
Um dos mais charmosos destes monumentos é o Urso e o Madroño, a estátua de bronze na Puerta del Sol (e que reaparece aqui e acolá, na insígnia dos táxis locais, por exemplo) cuja silhueta é o símbolo de Madrid. Há várias versões para a lenda, contadas pelo Frommer´s. Ah, claro... o Frommer´s está escrito em inglês. E não tem uma ilustraçãozinha sequer. Mas é extenso, completo e competente em seu propósito de bem orientar o viajante.
Minha segunda viagem prévia foi feita com a ajuda do Travellers Madrid, da Thomas Cook Publishing, também em inglês, mais compacto e mais agradável aos olhos do leitor, pelo simples motivo de que é ilustrado e bem diagramado. Em termos de estrutura, é um guia tradicional. Traz uma seção introdutória com informações sobre história, cultura e a própria cidade. Na seqüência vêm dicas de organização da viagem, recomendações sobre as principais atrações a serem vistas e um diretório de compras, entretenimento, programas para crianças, hospedagem, alimentação e dicas práticas de viagem.
Pessoalmente, gostei das dicas de roteiros a pé, com recomendações de por onde começar, tempo de caminhada e o que ver em cada uma delas. Também me pareceram preciosas as opiniões sobre restaurantes, bares e casas de chá, com avaliações de preço em intervalos de valores, fundamental para quem busca fazer um orçamento mais exato de viagem. E o Travellers me adiantou as fotos que eu gostaria de tirar durante a viagem. Várias das constantes do guia eu fui buscar e agora fazem parte do meu álbum pessoal.
Por último, mergulhei no "Madri: o guia que mostra o que os outros só contam", da Dorling Kindersley, editado no Brasil pela Publifolha – o único selecionado em português. A cada dia, aliás, as opções de guias de viagens em nosso idioma pátrio reafirmam a superioridade dos guias da Publifolha... seja em termos gráficos (são lindos, bem cuidados, em edições primorosas em termos visuais) ou em relação ao conteúdo.
Além de rico em imagens, o guia disponibiliza pequenos mapas estilizados em perspectiva, com apontamentos sobre as principais atrações de cada uma das áreas da cidade – o que estabelece como está dividido o conteúdo do guia – por áreas. Em cada uma delas, há uma pequena descrição da história e dos principais fatos sócio-culturais que ajudaram a identificar as mais importantes atrações, um mapa com a localização destas atrações, fotos e verbetes descritivos dos pontos de visitação indicados, com informações sobre horários de funcionamento, preço e dicas de visitação. Para as atrações mais importantes, há uma seção interna especial, com representações gráficas em perspectiva e destaque para os pontos mais importantes da edificação, do jardim, das ruas. Apenas uma observação ao guia da Publifolha. Um dos verbetes descritivos de uma das atrações não foi traduzido, permanecendo o texto em inglês. Um lapso, por certo. Mas que não pode acontecer. Que se corrija para a segunda edição. Há ainda uma versão pocket deste guia da Dorling Kindersley (que as pessoas usam chamar de DK), mas que não foi traduzida para o português. Em nossas livrarias há a edição em inglês, chamada Madrid Pocket Map & Guide, também bastante interessante e com a enorme vantagem de caber no bolso.
Bom, depois disso tudo, tinha que sair da livraria com alguma coisa na mão... Foram três horas de leitura e particular deleite. Saí com os três listados ao fim deste texto (preços indicados). Chegando em casa, desenhei meu próprio caderninho de viagem, onde reuni as dicas mais valiosas de cada uma das três publicações. Levei na bagagem o DK em português, por motivos óbvios – é agradável à visão, completíssimo e está em português. Lá fora, tive o maior orgulho de carregá-lo e de sentar no Parque do Retiro e mostrar para todo mundo que sou brasileira, sim senhor!
Devo ainda dizer que incorporei ao meu caderninho as dicas do Prof. Mário Beni em seu Colecionando destinos (resenhado no Biblioteca do Arquiteturismo de nov/2007) e do 1.000 lugares para conhecer antes de morrer: um guia para toda a vida, de Patricia Schultz (traduzido para o português pela Editora Sextante em 2006). Fiz isso porque, em toda viagem, além das dicas dos guias, valem muito as dos amigos. E é com essa postura que Beni e Schultz escreveram seus "guias pessoais de viagem". Eu agora tenho o meu de Madrid. E vou por onde me leva o meu coração.
Obras consultadas
BENI, Mario Carlos. "Colecionando destinos: viagens - percepção, imaginário e experiências". São Paulo, Senac São Paulo, 2007. R$ 85,00.
INMAN, Nick; VILLANUEVA, Clara. "Travellers Madrid". 2ª edição. Thomas Cook Publishing, 2007. R$ 39,00.
KINDERSLEY, Dorling. "Madri: o guia que mostra o que os outros só contam". São Paulo, Publifolha, 2007. R$ 59,00.
SCHULTZ, Patrícia. "1.000 lugares para conhecer antes de morrer: um guia para toda a vida". Sextante, 2006. R$ 40,00.
STONE, Peter. "Frommer's Madrid: With side trips to Salamance & Ávila". 2ª edição. John Wiley Consumer, 2007. R$ 39,00.
sobre o autor
Ana Paula Garcia Spolon é consultora hoteleira, tradutora e professora universitária. Formada em Hotelaria pelo SENAC, é doutoranda e mestre em Arquitetura e Urbanismo pela USP, onde desenvolve pesquisas sobre turismo, estética arquitetônica e valorização imobiliária. Atua na área de planejamento e desenvolvimento de projetos turísticos e hoteleiros há 15 anos