Localizada no Grande Hall da antiga Estação Júlio Prestes, a Sala São Paulo foi eleita pela pelo jornal britânico The Guardian como uma das dez melhores salas de concerto de todo o mundo. Localizada próxima à Estação da Luz e da Pinacoteca, a Sala São Paulo é fruto do intento de revitalização cultural da capital paulista. A imponência de seu estilo arquitetônico eclético captura a visão do observador, garantindo com que ele se perca em todos os seus detalhes e afrescos, elementos estes que tem impacto direto na joia da coroa da Sala São Paulo: sua qualidade acústica extremamente refinada.
Estar presente em um concerto neste ambiente é uma experiência de extrema imersão, levando o expectador, em uma grande ilusão, a buscar por equipamentos eletrônicos que potencializem a acústica local. Mas o que confere tal qualidade acústica à Sala São Paulo?
O primeiro elemento a saltar os olhos de qualquer um que entre no ambiente do antigo Grande Hall são as nuvens acústicas ajustáveis que dominam a atmosfera do ambiente. Tal mecanismo de altura ajustável permite a variação do pé direito do recinto, o que tem impacto direto sobre o volume total de ar ali comportado; por sua vez, a variação no volume de ar influencia no tempo de reverberação, o que possibilita a adequação do mesmo para os diversos usos que a Sala São Paulo pode ter, uma vez que o tempo de reverberação ótimo para a palavra falada é diferente do tempo de reverberação ótimo para concertos. Além da manipulação do tempo de reverberação, os painéis têm um design único que propicia a difusão do som por toda a sala. Tal difusão se dá através da variação da profundidade de painéis menores localizados no centro das grandes nuvens acústicas. Com a variação dessa profundidade, forma-se uma superfície irregular com incontáveis arestas que propiciam o “espalhamento” do som, uma vez que ao encontrar uma aresta, o som passa pelo fenômeno de difração, sendo “quebrado” e redistribuído em diversas direções. Painéis simulares de variadas profundidades também são encontrados revestindo os balcões suspensos que abrigam os expectadores, potencializando assim a qualidade difusora do ambiente.
Assim como os painéis contidos nas nuvens acústicas, os detalhes da rebuscada arquitetura da Sala São Paulo também fornecem arestas que auxiliam na difusão do som. Sejam as colunas das mais diversas ordens, os afrescos que emolduram as portas ou os relevos dos falsos frontões, a própria composição do ambiente já compreende um aparato acústico. E não se pode negar que, apesar de exercer esse papel em menor intensidade, as reentrâncias do ambiente – tanto as dos elementos arquitetônicos quanto as das superfícies irregulares dos painéis – servem como um sistema de absorção de ondas graves, melhorando assim a resposta de frequência da sala.
A verdadeira magia da absorção da sala São Paulo reside em seus detalhes. Os já tão falados painéis acústicos possuem um vão de aproximadamente trinta centímetros entre eles e é nesses vãos que habita um dos misteriosos atores que moldam a cena do conforto acústicos. Dependurados por entre os vãos das nuvens e longe dos olhos dos menos atentos encontram-se metros de um pesado e poroso tecido que tem como função absorver o som que perpassa por entre as estruturas de madeira, evitando que ele se torne som indireto e gere interferências na percepção do ouvinte, melhorando a experiência daqueles que vão em busca de um pouco de Mozart, Saint-Sans, Beethoven, Tartini e muitos outros.
A Sala São Paulo é um deleite para os olhos e para os ouvidos, a experiência de se ouvir grandes nomes da música clássica – e por que não releitura de músicas da cultura pop? – é algo pelo qual todos deveriam passar pelo menos uma vez na vida. A imersão é de uma singularidade palatável, todos e quaisquer sons produzidos dentro da sala são sentidos de uma forma incrivelmente mais viva como em nenhum outro lugar. E os silêncios são aterradores, pesados, desnorteadores. No que antes foi o grande hall de uma estação, hoje pode-se ver o poder de um bom projeto acústico e seu impacto direto na experiência do usuário.
sobre o autor
Brendow Butinhol é graduando em Arquitetura e Urbanismo pelo Instituto Federal de Minas Gerais, atua no Laboratório Integrado de Tecnologias Sociais (LITS) na área da pesquisa do Design Social. Participou da Operação Forte dos Reis Magos do Projeto Rondon – 2016, integrando o conjunto responsável por ações no âmbito do trabalho, meio ambiente, tecnologia e produção.