O ambiente mais geral onde estão situados o homem e os edifícios que este constrói, e nos quais vive, se define na geografia como “paisagem”. O estudo da paisagem apresenta dois enfoques principais, um considera a paisagem total e identifica a paisagem com o conjunto do meio, contemplando a este como indicador e síntese das inter-relações entre os elementos inertes: rocha, água e ar, e os vivos: plantas, animais e o homem. Outros consideram à paisagem visual como expressão dos valores estéticos, plásticos e emocionais do meio.
A paisagem em seu conjunto reúne esses fatores e adiciona a possibilidade de valores expressivos e de significação cultural; o mesmo pode compreender conteúdos estéticos, e conotações significativas, havendo constituído um tema de inspiração para o homem.
Ao procurar tratar sobre a origem e conformação do marco histórico de uma paisagem, seja ela natural ou cultural, intervém um conjunto de fatores de tipo geológicos, geográficos, atmosféricos e biológicos, onde não se pode analisar como um ente independente ao ser humano e sua incidência nos mesmos, posto que sua ideologia, desenvolvimento e cultura modificam em maior ou menor grau tais fatores. Esta correlação do homem com os fatores daria lugar à história de uma paisagem. Não se pode realizar uma análise específica de um lugar sem ter em conta aspectos gerais que o fariam mais completo.
Desenvolvimento
Para a realização de um estudo paisagístico, efetivou-se uma primeira etapa de diagnóstico, o que representou um primeiro contato com os setores ou lugares de estudo, buscando uma imagem geral destes através da caracterização do lugar e da importância de seu estudo. Proporcionou-se uma informação que oferecerá uma idéia clara do grau de intervenção sintetizando:
- os problemas ambientais e urbanos;
- o inventário paisagístico, em relação aos distintos componentes que conformam a paisagem;
- a determinação das unidades de paisagem segundo as características das zonas que conformam o lugar de análise;
- a determinação das áreas de percepção visual através da determinação dos enquadramentos visuais para cada lugar decidido, analisando-se desta forma o comportamento da visibilidade e inter-visibilidade;
- a caracterização visual da paisagem nas zonas de interesse paisagístico;
- a fragilidade visual da paisagem nesses lugares de estudo;
- a integração dos modelos qualidade - fragilidade com o objetivo de determinar possíveis usos do território analisado.
Nesta primeira etapa se utilizou como instrumental as entrevistas, consultas a especialistas, levantamentos “in situ” dos componentes da paisagem, gráficos, planos, fotografias, desenhos de observação, assim como matrizes e tabelas sínteses.
Partindo do diagnóstico onde se definiram potencialidades, limitações e vulnerabilidade dos lugares objetos de análise, se procederá à realização das propostas de desenho, onde se deverão propor soluções que de forma estratégica permitam obter o aproveitamento das condicionantes do lugar, sem degradação das condicionantes existentes sejam elas naturais ou antropicos, de maneira que as possíveis soluções permitam obter uma melhor harmonia, ordem, e funcionamento das atividades e infra-estruturas que se pretendam incorporar. As propostas incluirão as medidas de melhoramento: conservação e restauração, também se considerarão os usos atuais e sua complexidade com o entorno, tudo com o objetivo básico do melhoramento ambiental, paisagístico.
O instrumental desta etapa se apresentou em tabelas, planos e gráficos de simulação realizados sobre fotos, desenhos de observação ou técnicas de computação.
Não é possível deixar de mencionar o interesse existente em todo estudo paisagístico nas etapas de valorização de impactos ambientais à paisagem, no sentido de que as propostas incorporem medidas de correção ou mitigação aos impactos negativos que se possam apresentar.
Particular interesse apresenta a etapa de gestão paisagística onde se materializam as ações e mecanismos operacionais que aproximarão as propostas à realidade, por enquanto se determinarão atores envolvidos, objetivos propostos para a solução dos problemas, as restrições e soluções propostas até chegar à formulação de projetos e programas que fariam possível a materialização das propostas.
Neste artigo só se apresenta uma síntese da caracterização do lugar selecionado como caso de estudo: o forte de Jiguaní, incorporando-se algumas das propostas que em forma de simulação mostram o antes e o depois do estudo paisagístico.
A área que se selecionou para o estudo e onde foi aplicado todo o instrumental referido corresponde com uma zona do oriente de Cuba, pertencente ao que como município leva o nome de Jiguaní, na província Granma (ver gráfico nº 1).
A vila de Jiguaní se localiza na planície do rio Cauto, o maior do país, nos 22º 22' de latitude norte e nos 76º 25' de longitude oeste a 110m de altitude.
Tem limite ao norte com a província de Holguín, pelo leste com Santiago de Cuba, pelo sul com o município III Frente e Guisa. Possui uma extensão territorial de 64.624 km. Destes, 1 394 de zona urbana e 50.068 km rurais.
Ao noroeste da vila de Jiguaní, contíguo ao centro, se desenvolve a zona de estudo, com uma colina de aproximadamente 1.100 m de diâmetro, conformando o potencial principal para o estudo; por sua estreita relação territorial com a urbanização se terão em conta fatores da paisagem construída que não podem ver-se isoladas das zonas a tratar e que, de forma geral, será o campo de ação deste trabalho.
Jiguaní, que não por casualidade relacionada com a linguagem aborígine significa “Rio de Ouro”, aloja em suas terras as comunidades indígenas La Rinconada, Faldón, Calabazar, Jiguaní Abajo e a maior de todas na colina do Forte.
Os índios deste lugar, moradores de um paraíso sem sonhos e distribuídos em toda a região de maneira aleatória, sem mais premissas que a acessibilidade ao rio e às bondades do entorno, viram seu ideal frustrado com o descobrimento da América em 27 de Outubro de 1942 pelo almirante Cristóvão Colombo.
O estabelecimento oficial dos governantes nas vilas fundadas acelerou o extermínio dos nativos quando em 1552 e fez efetiva a proibição das emendas na comarca Jiguanicera, território que pertencia à Vila de São Salvador de Bayamo.
Estes núcleos aborígines haviam modificado a paisagem natural com suas incipientes aldeias, ainda que com o predomínio das formas naturais não se podia definir como uma paisagem urbana e para chegar a definir-la como, esta devia ter um processo evolutivo à cidade.
A vila de Jiguaní, em seu crescimento contínuo como trama urbana, se desenvolveu ao redor de uma pequena colina a noroeste do centro histórico onde se localizava o maior assentamento aborígine. Esta lhe outorga uma singularidade especial em termos de paisagem, que num principio foi puramente natural e depois assumiu características de uma paisagem antropizada, produto da cultura da vila, independente de que desde o forte se observam os dois tipos de paisagem, a natural e a cultural ou urbana.
O forte da colina se assentou no topo de uma pequena colina contígua ao centro histórico, onde habitaram os aborígines em tempos mais antigos. Sua majestosa presença qualifica a paisagem por levantar-se num espaço extra-urbano e ser uma área transitória entre os edifícios e o meio natural, visível de qualquer ponto do território. A posição geográfica, sua proximidade ao acesso da área, o controle visual da praça de armas e da vila no seu conjunto, assim como a existência de um canteiro de pedra calcária que serviria de matéria prima para sua execução, foram a gênesis de sua existência juntamente com os fatores mais gerais do clima político da época.
Em 20 de dezembro a vila de Jiguaní foi bombardeada pelo governo de Batista já que havia sido tomada pelo exército rebelde, deste sucedido foi evidente o dano ao meio ambiente na colina, a perda de espécies, vegetais e animais, o forte foi danificado mais do que já estava pelo tempo e lutas de independência anteriores.
Posterior ao triunfo revolucionário foram desenvolvidas tarefas de restauração, encontrando-se atualmente no estado que se observa nas fotos, havendo-se degradado com o tempo e a falta de manutenção, perdendo-se costumes e tradições dignas de recuperar como as festas patronais de 25 de janeiro, os bailes amenizados pelas bandas desde a colina, os altares da cruz do 3 de Maio, e comidas típicas como o cazabe e a raspadura.
Para desenvolver o estudo paisagístico o primeiro que se realizou foi desenvolver um estudo do estado da qualidade dos principais fatores do meio, inclusive aqueles de origem natural, antrópicos ou de interação (ver tabela nº 1).
Tabela nº 1: Estado da qualidade dos fatores do meio
Fator do meio | Problemas | Causa | Efeitos |
Vegetação | Escassa e de pouco valor, deteriorada e de cores pouco atraentes, grande presença de ervas. |
Pouca resistência ao meio das espécies existentes, afetadas ainda mais pela seca. Desmatamento. Carência de manutenção periódica. |
Degradação do meio pela erosão do solo, excesso de incidência solar, emigração de aves, perda dos atrativos do lugar no que diz respeito à paisagem. Existe pasto de eqüinos e ovinos, o que acentua mais a situação existente. |
Solo | Erosão. Contaminação do solo e escavação de taludes. |
Falta de vegetação arbórea e de coberturas. Descarga de lixo e resíduos domésticos. Escavações para refúgios de defesa. |
Deslizamentos de terras. Transformações físicas do solo. Acumulação de resíduos não biodegradáveis. Afetação à saúde. Afetação à imagem do lugar, deterioração da paisagem. |
Paisagem |
Deterioração da fortificação militar colonial. Perda da escadaria por derrubamentos e cobertura de terra em alguns trechos. Informação e referência do lugar de interesse histórico muito pobres. Habitações em mal estado e sem nenhum valor arquitetônico no entorno. Falta de proteção solar e proteção física na escadaria. |
Não existência de uma manutenção e de uma recuperação. Falta de sistema de drenagem de águas pluviais na escadaria. Falta de mobiliário urbano e má qualidade e desenho dos existentes. Falta de sistema de sinalização. Ausência de elementos que proporcionem sombras. Falta de corrimão na escadaria. |
Afetação nos componentes da paisagem construída de alto valor histórico. Redução da qualidade visual da paisagem. Deterioração das vias de acesso. Risco provocado por acidentes. Desmotivação à visitar o lugar histórico, repulsa ao lugar. |
Com o diagnóstico da problemática que apresenta o forte e seu entorno e com a aplicação de todo o instrumental de análise foi possível a determinação das unidades de paisagem pelas quais seria necessário começar o estudo, determinando a qualidade visual nelas e por elas, a partir do estudo dos enquadramentos visuais, se determinou o grau de fragilidade dessas zonas, o que permitiu estabelecer a partir da qualidade e da fragilidade propostas de uso ou recuperação segundo o caso.
Neste artigo não é possível, por sua extensão, apresentar todas as análises e propostas, no entanto se apresentam dois casos de simulação que refletem a forma em que se desenvolveu este estudo que compreende ademais todo um plano de gestão a respeito.
Mostraram-se como exemplo das propostas que se desenharam duas simulações; a referente ao acesso de pedestres, mais freqüentado, onde se observou a forma de realizar sua intervenção (ver situação atual e proposta).
De igual forma se apresenta outro exemplo que reúne algumas das ações na zona do forte também mediante situação do estado atual e sua proposta.
Este trabalho se realizou de uma forma mais completa, no entanto o objetivo deste artigo é apresentar a forma de recuperação da paisagem em uma zona suburbana, em que a colina onde se localiza o forte constitui a transição entre o natural e o construído.
Conclusões
O lugar conformado pela colina do forte e seu entorno imediato se converteu através dos anos em um marco de referência pelos inumeráveis valores que possui. O acervo cultural desta região lhe outorga uma singular identidade arquitetônica de uma construção militar que teve lugar no período da colônia, vinculada à acontecimentos históricos e personalidades. Sua presença no tempo como testemunho de uma cultura passada, ao formar parte de um ambiente que favorece com sua imagem e qualifica com seus valores, faz que este lugar possua valores essenciais históricos, arquitetônicos e ambientais.
A crescente deterioração da zona já explicada, forma parte de uma realidade e um interesse social que pretende deter o processo de degradação, pelo que se deseja chegar a recuperar e preservar o lugar, este trabalho constrói um ponto de partida nas ações para a recuperação da paisagem na colina do forte e seu entorno.
Tradução Ivana Barossi Garcia
bibliografia
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sobre os autores
Graciela Gómez Ortega é arquiteta pela U.O, Cuba. Mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, Nicarágua. Professora Titular, Chefe da disciplina de Projeto Arquitetônico e Urbano da Faculdade de Construções, Universidade de Oriente, Cuba. Membro do Comitê Acadêmico de Pós-graduação na UNI, Manágua, Nicarágua
Omarky Aguilar Labrada é estudante na U.O, Cuba. Realiza seu trabalho de graduação sobre estudos paisagísticos no Forte de Jiguaní, Província Granma, Cuba