A temporaneidade das edificações
A dimensão temporal na concepção e construção de obras de arquitetura tornou-se nos últimos anos um dos temas de maior interesse e debate. Muitos fenômenos contribuíram para mudar a percepção de "tempo" na arquitetura, cujo resultado corresponde à transição de uma dimensão estática e permanente para uma dimensão dinâmica, típica das construções transitórias. Segundo Bologna (1) a arquitetura tradicional está associada ao conceito de eterno ou duradouro, o que implica em ações periódicas de manutenção, isto é, o restabelecimento das condições de desempenho para prolongar a vida útil dos edifícios. De outra parte, na concepção dinâmica prevalece o conceito de evolução e de adaptabilidade com relação à passagem do tempo, assim como relacionado às mudanças das condições de uso. Observa-se que as mudanças funcionais, a durabilidade dos materiais e os produtos são fatores determinantes na vida útil das edificações.
As rápidas mudanças das condições de uso convergem cada vez mais para uma arquitetura de caráter temporário. Essa utilização está intimamente ligada às atividades que surgem em um contexto espacial definido, no qual podem ocorrer diferentes usos em prazos muito curtos, exigindo sistemas tecnológicos flexíveis capazes de serem transformados e adequados aos novos usos. A natureza temporária da construção denota uma ruptura da relação de duas vias entre o sistema de construção e seu uso. Tanto a arquitetura considerada duradoura quanto aquela temporária podem coexistir sem necessariamente se excluírem ou se oporem. A habitação temporária visa fazer uso de um espaço para uma função ligada a uma necessidade contingente e limitada no tempo. Uma vez que o espaço usado para esse fim não tem mais razão de existir, ele pode ser convertido para outros usos. A arquitetura de exposições, instalações temporárias, circos, feiras, entre outros, são edificações temporárias pensadas para serem facilmente transportadas e reutilizadas.
Na busca de maior sustentabilidade nas edificações tornou-se necessário reduzir o consumo de recursos materiais na construção, que até então se concentrava na racionalização dos processos construtivos e na redução dos desperdicios. Conceitos de desconstrução, reutilização e reciclagem nas edificações passaram a ser propostos de modo sistemático não apenas para reduzir os consumos de materiais e energias associados a sua produção e uso, mas também no sentido de minimizar os impactos ambientais produzidos nesses processos. Essas transformações tendem a reduzir a vida útil de projeto e tornar as edificações mais perenes e em muitos casos transitórias. Como conseqüência surge a necessidade de mudança de paradigmas no que se refere a novas modalidades de usos dos edifícios, flexibilidade compositiva e construtiva e de uma adequação ao desempenho e durabilidade dos edifícios contemporâneos. De outra parte, a compatibilidade ambiental, segundo Cavelli (2), exige uma integração da edificação com o ambiente construído que inicia no tipo de ocupação proposto, nos tipos de recursos materiais e de energia utilizados, no desempenho técnico e na possibilidade, mesmo antes de finalizada a vida útil da edificação, de transformação das modalidades de uso e da reciclabilidade de suas partes integrantes.
A flexibilidade é uma das exigências fundamentais da habitação contemporânea. Essa propriedade pode ser aplicada nos arranjos projetuais, nos processos de fabricação, nas etapas de produção e construção, possibilitando assim, mediante rápidas transformações, novas formas e usos para as edificações. A flexibilidade compositiva permite diferentes configurações de tamanho, forma, correlação e distribuição de espaço durante a sua utilização. A flexibilidade tecnológica possibilita o desempenho adequado para o uso estabelecido e è dada pela capacidade do sistema construtivo em permitir a integração funcional, a adaptabilidade e a intercambialidade de componentes entre os elementos construtivos. De outra parte, a flexibilidade de utilização está relacionada com a conversão do uso por meio da transformação dos elementos da edificação, possibilitando opções de reconfiguração dos espaços por meio do reposicionamento dos elementos que alteram as relações entre os espaços e os fatores ambientais. De acordo com Macozoma (3), a flexibilidade dá suporte à adaptabilidade da edificação, permitindo atender à demanda de novas funções e diversos tipos de utilizações no tempo. Por fim, a adaptabilidade pode ser considerada como a capacidade de reconfiguração não imediata, aquela que ocorre durante o uso da edificação. Desse modo, a adapatabilidade se tornar relevante na função de personalização do ambiente, em que o usuário pode intervir diretamente para determinar as condições de uso mais adequadas às suas necessidades.
A natureza efêmera da arquitetura contemporânea e a complexidade de processos associados à sua produção, uso e transformações tornam cada vez mais necessário avaliar as diferentes etapas que podem configurar o seu ciclo de vida. A norma ISO 15686 (4) trata da vida útil de um componente ou de um edifício e estabelece uma estrutura sistemática para a realização do planejamento da vida útil que incorpora a concepção, o projeto, a construção, o uso, a manutenção, os reparos e reformas, a desconstrução, a reutilização, a reciclagem e a disposição final de seus materiais, componentes e sistemas construtivos. Os produtos, processos e atividades podem ser analisados ao longo do ciclo de vida dos edifícios, começando com a obtenção de matérias-primas para terminar no final da vida útil dos produtos e componentes utilizados. A avaliação do ciclo de vida não é apenas uma das ferramentas básicas para a implementação de uma política integrada de produtos, mas também se apresenta como um método objetivo para a avaliação e quantificação dos impactos energéticos e ambientais. A figura 1 mostra, de modo esquemático, as etapas do ciclo de vida de uma edificação.
A desconstrução de uma edificação
A primeira conceituação de desconstrução foi elaborada por Derrida (5), apresentando-se como uma crítica de pressupostos filosóficos, em que a desconstrução não significava destruição, mas sim desmontagem, decomposição dos elementos. No âmbito da arquitetura, o termo desconstrutivismo está associado à arquitetura pós-moderna que começou nos anos de 1980, sendo caracterizada por ideias de fragmentação e manipulação da estrutura ou do invólucro dos edifícios. A aparência dos edifícios desconstrutivistas é caracterizada por certa imprevisibilidade compositiva, formas distorcidas ou propositadamente deslocadas do seu posicionamento usual. O intuito é deslocar, destacar e não destruir.
Nas edificações, o termo desconstrução ou deconstrução, representa a possibilidade de desmontagem das partes ou elementos integrantes. Nesse âmbito, a desconstrução representa a função inversa da construção, ou seja, a possibilidade de desfazer de modo sistemático os elementos e componentes de uma edificação, visando à máxima preservação de suas partes integrantes. A partir desse conceito, foram estabelecidos por alguns autores como Dolan (6) e Crowther (7) princípios para realizar a desconstrução dos edificios. O projeto para a desconstrução, Design for Deconstruction, coloca-se, segundo Guy and Shell (8) como um método emergente baseado nos campos do design para realizar a desmontagem, promovendo a reutilização e reciclagem dos produtos industriais. Seu objetivo geral é o de reduzir os impactos ambientais, reduzir o consumo de recursos naturais e aumentar a eficiência econômica por meio da adaptação e desmontagem dos edifícios. Busca a preservação e recuperação de componentes e materiais para sua reutilização, re-fabricação e reciclagem. Segundo Addis et al (9), edifícios construídos de acordo com os princípios do DfD são mais suscetíveis à renovação, uma vez que seus elementos são mais fáceis de serem substituídos por meio de operações mais simples e menos onerosas. No final da vida útil do edifício, os materiais e produtos são facilmente recuperados ou reciclados, pois podem ser removidos e separados seletivamente de acordo com suas propriedades.
As oportunidades de reutilização de componentes, de reciclagem de materiais e a experiência atual de projetar para a desconstrução modifica aqueles paradigmas da indústria da construção que ainda está baseada no intensivo consumo de matérias-primas naturais e de fontes não renováveis. Novamente, a indústria automobilística serve como balisamento ao prever e facilitar o desmonte dos veículos e de introduzir componentes em novos ciclos de produção de seus produtos. Esta também fornece orientações para os designers e seus clientes, explicitando princípios e estratégias para a concepção e especificações para a nova construção. Isso pode ser alcançado ao se levar em consideração várias abordagens na fase de projeto, indicando as melhores maneiras de considerar o ciclo de vida de elementos de construção, componentes e equipamentos. A desconstrução possibilita expandir as estratégias adaptativas dos edifícios ao considerar todo o ciclo de vida, e não apenas as fases caracterizadas pela construção, utilização, manutenção e reparação, mas as possíveis transformações durante o uso.
A economia da desconstrução está relacionada com a reutilização, recuperação e recilclagem de materiais. A taxação sobre descarte e os custos na eliminação de resíduos estimula o surgimento de novas técnicas de recuperação e reciclagem, gerando mercados alternativos para os novos ciclos de utilização de sub-produtos e materiais de construção. Outros fatores relevantes são os custos operacionais e a velocidade do processo de desmontagem. A eficiência da desconstrução afeta os custos diretos de trabalho e de equipamentos para as remoções no local da construção. A eficiência do processo de desconstrução, os custos para a reutilização e recuperação dos materiais e o consequente valor dos elementos e materiais reciclados são influenciados pelas características do projeto. Os usos específicos de produtos, das ligações entre componentes, as inter-relações dos elementos de construção e a inteligibilidade do projeto de produção são determinantes para a eficácia dos processos de desconstrução. Isso garante a fácil remoção das construções, a redução de resíduos, a maximização na recuperação de componentes e materiais de alto valor para a reutilização e cria condições favoráveis para a reciclagem dos materiais.
A reversabilidade dos processos construtivos
Um sistema construtivo pode ter diferentes graus de reversibilidade, que depende do nível de desempenho que os produtos derivados do seu uso tem em relação às condições inciais de utilização. A desconstrução seletiva do edifício possibilita ganhos qualitativos e quantitativos, na medida em que preserva a integridade de elementos e componentes para a reutilização e reciclagem de componentes e materiais. A principal diferença entre reciclagem e reutilização reside no fato de que neste último não se necessita de processos que alteram significativamente as características dos materiais ou produtos, por isso o grau de reversibilidade de um sistema de construção é muito mais elevado quando os elementos são reutilizáveis. Os materiais podem ser reutilizados como produtos em novos processos construtivos, reduzindo os custos de extração ou ainda, na impossibilidade de seu emprego, devolvidos à sua condição original para o meio ambiente natural com o mínimo de impacto.
Uma das condições de projeto para a reutilização é a invariabilidade de componentes e elementos construtivos, tendo as suas propriedades básicas inalteradas em termos de dimensões, constituição física e química, e aspecto compatível com o novo uso. Deste modo, a reversibilidade de uma construção se torna possível ao se utilizar o princípio da dis-integração (dis-ligação) dos seus sub-sistemas e elementos construtivos. Esta desintegração tecnológica pode ser alcançada pela desconexão e desmontagem das partes constituintes, de modo a permitir sua reutilização nos mesmos tipos de configurações ou em novos arranjos. A tecnologia para a desconstrução pode ser a comumente praticada na Construção a Seco, que permite a separação de materiais e elementos por meio da sua desconexão. Por outro lado, a necessidade de assegurar a reutilização de partes ou elementos construtivos exige flexibilidade operacional na montagem e desmontagem. A figura 2 ilustra as etapas do ciclo de vida de uma edificação mostrando as interfaces da demlição e desconstrução com o dominio do ambiente construído. A técnica de estratificação, que parte da justaposição e integração de camadas ou elementos permite adequar o desempenho técnico destes às necessidades variáveis da edificação durante o período de vida útil. Essa estratificação se tornou sinônimo de tecnologia híbrida quando as características expectativas são conseguidas por meio de técnicas de construção e de materiais mais adequados àquele tipo de utilização.
A reciclabilidade de materiais e componentes das edificações
A reciclabilidade de uma edificação é definida pelas características dos materiais e produtos que após o seu período de utilização ainda apresentam capacidades físicas e químicas compatíveis com o tipo de uso e que podem ser reaproveitados ou reciclados em novos ciclos de produção de edifícios. O princípio de referência desses ciclos pode ser observado na própria natureza, em que se observa a decomposição da matéria orgânica em nutrientes que servem para a geração de outros seres vivos, que em situação de equilíbrio não geram resíduos, e sim recursos que são absorvidos pelas cadeias alimentares. De maneira análoga, os produtos e materiais reciclados podem retornar aos ciclos de produção, reduzindo a extração e produção de grande quantidade de matéria-prima virgem. Os processos construtivos em geral são caracterizados por operações e transformações que envolvem também grande consumo de energia e produzem diferentes tipos de resíduos. A edificação ainda demanda energia durante seu ciclo de vida e produz resíduos na fase de uso e manutenção. Não obstante, no final da sua vida útil, as operações de desconstrução ou demolição demandam mais energia e podem ainda produzir um grande volume de resíduos, potencialmente nocivos ao meio ambiente.
Na natureza, existem seres híbridos que utilizam partes de outros animais, conchas e corais na sua configuração física. Essa modalidade de reciclagem também pode ser utilizada na arquitetura, onde partes de uma edificação ou de elementos construtivos tomam novas aplicações, otimizando o uso de energias e recursos materiais. Deste modo, a reciclabilidade de uma edificação pode comportar uma diversidade de produtos e materiais, assim como uma variedade de processos de transformação. Segundo Vefago (10) os materiais de construção podem ser classificados de acordo com os ciclos de vida em: reciclados, reutilizados, infraciclados e infrautilizados.
Reciclado: um material ou componente reciclado é aquele que sofre ao menos uma transformação química de sua estrutura interna ou uma mudança de estado físico. Mantém as suas propriedades iniciais, sem ter necessariamente a mesma função do ciclo de vida anterior. Um exemplo é a reciclagem de metais, que pode ser realizada integralmente dependendo da qualidade e da quantidade do produto coletado. A madeira, quando isenta de compostos tóxicos, pode retornar para um novo ciclo com uma nova configuração sem apresentar transformações químicas.
Infraciclado: trata-se de um material ou componente que apresenta ao menos uma transformação química de sua estrutura interna ou que apresenta uma mudança de estado físico. Em geral apresenta redução das suas propriedades iniciais, sem apresentar necessariamente a mesma função do ciclo de vida anterior. Os plásticos derivados do petróleo estão incluídos nesta classificação, pois apresentam perdas de suas propriedades iniciais ao longo dos ciclos de vida sucessivos.
Reutilizado: um material ou componente reutilizado é aquele que não sofre nenhuma transformação química de sua estrutura interna, ou mudança de estado físico. Mantém as suas propriedades iniciais, e não tem porque ter a mesma função do ciclo de vida anterior. Uma viga de madeira pode ser um exemplo de componente reutilizado já que ainda pode ser reutilizada como viga ao final do ciclo de vida de um determinado edifício.
Infrautilizado: trata-se de um material ou componente que não apresenta nenhuma transformação química de sua estrutura interna ou de mudança de estado físico. Estes materiais não mantêm as propriedades iniciais, e não tem necessariamente a mesma função do ciclo de vida anterior. Como exemplo, tem-se os blocos cerâmicos e os blocos de concreto que podem ser triturados e utilizados como agregados para outros tipos de concretos.
Os materiais mais utilizados na construção de edifícios podem ser classificados de acordo com os processos relacionados com sua produção. Para uma breve conceituação, os materiais e produtos podem ser classificados em:
Industrial: trata-se de produto obtido por meio de processo industrializado que altera as propriedades dos materiais constituintes, permitindo melhorias de desempenho, como o caso dos materiais compósitos GRC (Glass Reinforced Concrete) e gerando a grande diversidade propiciada pelos produtos compostos, a exemplo das placas de ACM (alumínio composto com polietileno).
Biológico: Trata-se de produto ou material que não apresenta processo industrial na sua constituição, sendo utilizado basicamente na forma como é encontrado na natureza.
Híbrido: um produto híbrido contém materiais biológicos (tais como a lã de ovelha ou fibras vegetais) e produtos industriais, como resinas ou cimentos em sua composição. Nestes casos, a matéria orgânica não pode completar o processo de biodegradação.
Nesta abordagem, a tabela 1 apresenta as possibilidades de uso dos materiais de construção, segundo os conceitos da reciclabilidade e de acordo com os processo envolvidos na sua produção.
Método dos Índices de Reciclabilidade
A partir desses conceitos e da classificação proposta é possível estabelecer um método para a criação de um índice de avaliação da reciclabilidade dos edifícios. O método permite analisar as quantidades dos materiais reutilizados, reciclados, infraciclados e infrautilizados que entram no processo de construção de uma edificação, além de possibilitar a análise dos materiais de um edifício a ser desconstruído ao final do seu ciclo de vida. O método serve como balizamento das escolhas de materiais e sistemas construtivos em novos projetos, permitindo estabelecer estratégias para o aumento da reciclabilidade dos edifícios. A determinação da reciclabilidade dos materiais pode ser realizada tanto na fase de projeto como na fase de desconstrução. Uma hierarquia qualitativa para estabelecer a reciclabilidade dos edifícios é apresentada na tabela 2, em que se assume que a melhor maneira de reaproveitar os produtos de uma construção é mediante a reutilização. Esse processo exige menos energia para adequar os componentes aos seus novos usos, de modo a alcançar um desempenho compatível com as normas vigentes, gerando o mínimo de desperdício.
A pontuação na tabela 2 define a hierarquia do índice de reciclabilidade. O método estabelece uma graduação de 0 a 100, com variações a cada 25 pontos, de modo que a reutilização corresponde a 100 pontos, a reciclagem a 75 pontos e o descarte não pontua. A figura 3 ilustra a hierarquia tanto para a reciclabilidade no projeto quanto na desconstrução de um edifício.
Para se realizar o cálculo dos índices de reciclabilidade de um edifício, as massas dos materiais e componentes previstos no projeto do edifício deverão ser estimadas separando os produtos reutilizados, reciclados, infraciclados, infrautilizados. A massa total em Kg ou toneladas é somada para encontrar os respectivos percentuais de cada categoria. Estes percentuais, escritos em formato decimal (50% = 0,5), se multiplicam pelo número correspondente a cada categoria do modelo da pirâmide invertida (100, 75, 50, 25 ou 0). Os valores resultantes são somados, obtendo-se o índice de reciclabilidade do edifício, que pode variar entre 0 e 100. Se todos os materiais são virgens não renováveis, o índice de reciclabilidade é 0, enquanto um valor de 100 significa que todos os produtos do edifício foram reutilizados de construções anteriores. Este índice também pode ser expresso em porcentagem.
Após a obtenção do índice de reciclabilidade dos materiais que formarão o novo edifício faz-se o mesmo para esses materiais ao final do ciclo de vida do mesmo. A única diferença em relação ao processo anterior é a substituição da categoria de materiais virgens não renováveis pela categoria do aterro sanitário. Nesse caso, o valor 0 designa que todos os materiais vão para o aterro e o valor 100 estabelece que todos os produtos de um edifício poderão ser reutilizados em outras edificações.
Um exemplo prático de aplicação é a reciclabilidade de alguns tipos de estruturas que frequentemente são em concreto, aço e madeira. A referência adotada foi a pesquisa desenvolvida por Rabelo (11) na qual foi selecionada a estrutura da parte central de um edifício com unidades habitacionais voltadas para a população de baixa renda construído em Villaverde, Espanha, conforme mostrado esquematicamente na figura 4.
Simplificações foram realizadas Partindo de sua planta-baixa e planta tipo, para que fosse mais flexível a outros sistemas construtivos. Dessa forma é possível comparar as massas das diferentes estruturas. No caso de uma estrutura de concreto armado, ela está formada por pilares, vigas e lajes de concreto. A estrutura de aço pode ser composta por pilares e vigas de aço, com laje de concreto steeldeck; enquanto que a estrutura de madeira pode ser composta por painéis laminados, laje de chapas e vigas de madeira. A tabela 3 ilustra a massa de cada tipo de estrutura e seus materiais por m² construído.
A estrutura de concreto tem quase o dobro da massa da estrutura de aço, enquanto a estrutura de madeira é a mais leve. A reciclabilidade de projeto pode ser calculada segundo esses dados, sendo que os valores máximos para cada tipo são vistos na tabela 4.
A tabela 4 ilustra que a estrutura de madeira tem o mais alto índice de reciclabilidade entre as estruturas analisadas com 98.4 pontos. Nos casos da estrutura de aço e de concreto, cujos valores de reciclabilidade de projeto são de 18.95 e 4.7, o que diminui os índices é basicamente o concreto infrautilizado. Na tabela 5 é apresentado como ilustração o cálculo da reciclabilidade para a desconstrução de cada estrutura analisada.
De acordo com os resultados da tabela 5, pode-se concluir que a estrutura de madeira, com 100 pontos, tem o grau mais elevado de reciclabilidade na desconstrução, uma vez que em teoria todo o material pode ser reutilizado em futuras construções. Nos casos das estruturas de aço e de concreto, com índices de 37.97 e de 26.85 respectivamente, o que diminui os índices é a massa de concreto infrautilizado.
Considerações finais
O método em análise pode ser aplicado para determinar possíveis melhorias no uso e gestão de produtos e materiais nas edificações, de modo a promover soluções projetuais que integrem processos de reutilização e reciclagem, assegurando a redução dos impactos ambientais gerados pelos produtos utilizados. Estes resultados possibilitam uma reflexão sobre os potenciais de reciclagem de materiais utilizados nas construções. Observa-se que para o aumento dos índices de reciclabilidade faz-se necessário tornar as construções mais facilmente decomponíveis e desmontáveis, ampliando assim as possibilidades de reutilização de produtos e componentes. Essa reutilização, valorizada no método da reciclabilidade, representa também a possibilidade de modificar o paradigma da construção de edifícios, que ainda está centrada na utilização intensiva de matérias-primas com grande produção de resíduos e desperdícios de insumos e energia. Para incrementá-la, é necessário que o projeto da edificação preveja a desconstrução sistematizada, de maneira a preservar a qualidade dos componentes e elementos, além de atender os demais princípios do DfD (Design for Deconstruction). Outros estudos de casos com técnicas construtivas utilizadas em edificações brasileiras podem estabelecer diretrizes projetuais, de modo a otimizar a desmontagem das construções e incrementar a reciclabilidade dos seus elementos.
notas
1
BOLOGNA, R. La reversibilità del costruire. L’abitazione transitoria in una prospettiva sostenibile. Firenze, Maggioli, 2002.
2
CAVELLI, S. Insediamenti temporanei: la definizione del quadro esigenziale. In: La temporaneità oltre l’emergenza. Roma, Kappa, 2000.
3
MACOZOMA D S. Building Deconstruction, CSIR Building and Construction Technology. South Africa, CIB publication, December 2001.
4
International Organization for Standardization – ISO 15686 – Buildings and constructed assets – Service life planning. 2011.
5
DERRIDA, J. Origem da geometria de Edmund Husserl, 1961.
6
DOLAN, P.J.; Lampo R.G.; DEARBORN J.C. Reuse and Recycling Construction and Demolition Waste Technical Report USACERL 99/58 USACERL. USA. 1999.
7
CROWTHER, P. Design for buildability and the deconstraoction consequences. Procedings CIB Taskgroup 39 Report 274. Deconstructiuon Annual Meeting CIB. Alemanha 2002.
8
GUY, B.; SHELL, Scott. Design for Deconstruction and Materials Reuse. Center for Construction and Environment, Gainesville, Florida. 2000.
9
ADDIS, B.; SCHOUTEN, J. Design for Deconstruction: Principles of design to facilitate reuse and recycling. August 2004 <www.design4deconstruction.org/literature.html>.
10
Vefago, L.H. El concepto de reciclabilidad aplicado a los materiales de construcción y a los edificios: propuesta de índices para evaluar la reciclabilidad de los sistemas constructivos. Tese de doutorado. ETSAB. Barcelona, Universitat Politècnica de Catalunya, 2012.
11
RABELO, P. L. El material constructivo y la densidad urbana: la repercusión medioambiental de los sistemas estructurales en la compacidad de una ciudad. Dissertação para Máster de Arquitectura, Energía y Medio Ambiente. Departamento de construcciones arquitectónicas I. Barcelona, Universidad Politécnica de Cataluña, 2010.
sobre os autores
Fernando Barth é engenheiro civil e mestre em Estruturas pela UFRGS. Doutor em Fachadas Pré-fabricadas pela Escola Superior de Arquitetura de Barcelona-UPC com pós Pós-doutorado no Departamento de Tecnologia da Arquitetura e Design-UNIFI. Professor Titular do Departamento de Arquitetura e Urbanismo e supervisor do Laboratório de Sistemas Construtivos da UFSC.
Luiz Henrique Vefago é arquiteto e mestre pela UFSC. Doutor em sustentabilidade na Arquitetura em 2012 pela Escola Técnica Superior de Arquitetura de Barcelona na Universidade Politécnica de Catalunha - ETSAB. Atualmente realiza pesquisas no Programa de Pós-doutorado do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC.