A arquitetura desde seus primórdios sempre foi carregada de significados para quem a vê e vivencia todos os dias, seja na antiguidade e suas mais diversas expressões arquitetônicas, seja na contemporaneidade e as mais extraordinárias e ordinárias interpretações e releituras de antigos estilos arquitetônicos. No entanto, compreende-se que a arquitetura vai para muito além de algo visual e meramente estético, e a exemplo disso, basta observar a maneira como é feito o uso de figuras de linguagem e expressões que fazem alusão à Arquitetura para descrever a mente humana e seus mais diversos tipos de transtornos em muitos momentos, em que “nos acostumamos a pensar em relações espaciais, de modo que qualquer tentativa de compreender a mente provavelmente recorrerá a metáforas espaciais” (1).
Ao observar esta temática sob a ótica do campo de pesquisa da psicologia ambiental, torna-se possível afirmar que o meio no qual o indivíduo está inserido, tanto definitivamente ou temporariamente, bem como seja a curto ou longo prazo, possui poder de influência sobre ele e ainda é possível afirmar que o ambiente funciona como uma espécie de espelho do inconsciente, apresentando de forma material o que existe no campo imaterial, ou em termos populares, externando por meio da Arquitetura construída, escolhas de decorações, organização ou desorganização do espaço o que pode estar se passando dentro da cabeça do usuário, conforme Lucy Huskinson discorre, embasada na visão junguiana:
“De acordo com Jung, não são apenas aqueles edifícios — imaginários ou reais — que nós mesmos criamos que nos moldam e nos transformam, mas também os edifícios e cidades com os quais interagimos diariamente. Dentro dos ambientes construídos de nossas cidades existe, afirma Jung, um ‘espírito que ali impera’. A arquitetura das cidades pode ser apreciada esteticamente, diz ele, mas também pode afetar você ‘no fundo do seu ser a cada passo” (2).
A psicologia ambiental, surgida nos meados da década de 1950, no período pós guerra, traz à tona os primeiros debates científicos mais aprofundados sobre a relação do indivíduo com o espaço habitado, sendo ela um campo de conhecimento que proporciona as relações bidirecionais pessoa-ambiente (3), podendo esta ser lida como uma ponte entre as áreas de estudo da Arquitetura e da psicologia, proporcionando trocas e o compartilhamento de conceitos e teorias; para tais estudos, são observados os aspectos construtivos e funcionais do local, por conseguinte é feita a análise comportamental dos indivíduos que o ocupam (4), assim, chegando a compreensão de como se dá a vivência e impactos do ambiente sobre o habitante.
Assim, a psicologia ambiental tem por objetivo a análise do ambiente no aspecto macro e micro (5), uma vez que os efeitos do ambiente sobre o usuário podem ser observados por meio da dinâmica em pequenos espaços individuais, como o quarto de um adolescente, com suas características estéticas e espaciais e o que, tomando por base a análise destes elementos, ele diz sobre quem o habita, tal qual uma sala de aula e o modo como esta afeta o comportamento e sensação de pertencimento dos alunos.
No entanto, é válido destacar que o ambiente, de maneira isolada dos demais fatores influenciadores, não possui inteiramente o poder de uma influência extraordinária, mas trata-se de uma troca, e o que de fato pode vir a definir a essência de dado local é seu uso, histórias ali vivenciadas e sensações passíveis de potencialização (6), bem como, os significados a ele atribuídos, sejam em a. esfera individual, como o significado pessoal de cada um, por meio de gostos pessoais, histórias vividas pelo sujeito em sua formação enquanto pessoa e/ou traumas experienciados no decorrer de sua história, e b. esfera social, no que se refere aos conceitos que cada sociedade, em suas formações cívicas e conjuntos de ideias sobre determinados tipos de comportamentos, pode atribuir aos ambientes e suas características; como exemplo é possível observar a diferença de significados que um ambiente religioso católico, como um catedral, pode vir a ter para um cidadão formado em uma cultura cristã e a distinta relação que um cidadão formado em uma cultura sem contato os cristianismo podem vir a ter. Assim, faz-se destaque que a psicologia ambiental não está focada apenas na ideia do que é o ambiente físico, mas sim no âmbito social e ambiental de maneira interrelacionada (7).
A relação entre a arquitetura e a pessoa
Compreendendo que a arquitetura pode interferir na relação da pessoa com o ambiente, tal qual uma via de mão dupla, onde este também interfere no ambiente, pois as características arquitetônicas são “expressões de nós mesmos” (8). No entanto, faz-se necessário destacar que esta jamais evocará emoções inexistentes, ou comportamentos nunca antes pensados, mas sim algo que já foi conhecido pela pessoa, uma vez que a influência do ambiente sobre o comportamento e emoções varia de acordo com cada um/a em particular (9); ou seja, a percepção do ambiente pode vir a frutificar em múltiplos sentidos e estímulos simultaneamente (10), variando de acordo com o tipo de ambiente que o indivíduo experiencia e também suas experiências passadas e os significados anteriormente construídos (11). Como afirma Bachelard, “as moradas do passado permanecem em nós para sempre […] Para além das nossas lembranças, a casa em que nascemos está fisicamente inscrita em nós” (12). Deste modo, pode-se compreender que o ambiente não é um mero local no qual o sujeito caminha e de algum modo supre suas necessidades, mas, de acordo com a ideia de Kuhnen “é rico em significações por intermédio do qual a humanidade desenvolve-se” (13).
Por exemplo, para pontuar o modo como a arquitetura do ambiente pode interferir nas sensações do usuário, segundo Kowaltowski (14), ambientes com muita iluminação artificial, vidros opacos, que não permitam a contemplação da paisagem para além do ambiente em si, e excesso de ordem são menos satisfatórios. Mas a grande questão não se refere apenas ao prazer momentâneo desfrutado durante alguns insignificantes instantes, mas sim como o ambiente é projetado e a forma como este pode, a longo prazo, por meio da visitação constante, como a exemplo de uma sala de aula, em que os alunos diariamente por um ou mais anos frequentando, vir a gerar efeitos negativos sobre o usuário, tanto na esfera funcional e física, como no quesito emocional do sujeito (15). No entanto, essa relação, pessoa-ambiente nem sempre é percebida a primeiro contato, em muitos casos é frequente que outras questões sejam levantadas para além da arquitetura, pois é comum que seus efeitos se enraízem na mente do usuário de modo inconsciente (16). Como questiona Botton:
“Sensibilidade à arquitetura tem também seus aspectos mais problemáticos. Se um único aposento é capaz de alterar o que sentimos, se a nossa felicidade pode depender da cor das paredes ou do formato de uma porta, o que acontecerá conosco na maioria dos lugares que somos forçados a olhar e habitar?” (17).
Assim, chega-se à conclusão, e base investigativa para o presente trabalho, que a qualidade do projeto arquitetônico está diretamente relacionada com o bem-estar do usuário, podendo contribuir para o desenvolvimento pessoal, mental e possui relação direta com o foco e concentração em atividades nele exercidas (18). Ou seja, para quem convive com o projeto, são mais que meras paredes, e para quem projeta, é muito mais do que cálculos de área, escolhas de cores e reflexões sobre a estética a ser adotada para a produção de um produto comercial.
Além disso, o ambiente não precisa ser apenas funcional, mas também atrativo, para que o usuário se sinta convidado a habitá-lo (19) de modo que seja um espaço em que o habitante não apenas deseje ir, mas principalmente deseje continuar frequentando, pois quando ele não sente tal convite, ou sente-se incomodado por alguma característica ali presente, como uma cor de parede, um item decorativo e até mesmo questões estruturais como janelas, pilares e vigas, tende a buscar modificá-lo favoravelmente segundo o seu interesse pessoal de gostos e necessidades ou um interesse comunitário (20).
Quando um instinto ou emoção é mais evocado que outro em detrimento das características projetuais somadas à história de formação da pessoa, a situação pode levar à ansiedade espacial, que são conhecidos como claustrofobia e “agorafobia”, e essas consequências devem ser pensadas durante a concepção do projeto arquitetônico, pois como afirma Huskinson: “Pode-se dizer, portanto, que os edifícios nos projetam e nos constroem ou reconstroem, tanto quanto nós os projetamos e construímos” (21). Embora seja importante frisar que, em especial espaço públicos, não se faz possível compreender como cada pessoa individualmente pode vir a se sentir em um dado espaço, como exemplo uma praça ou restaurante, mas é possível que o profissional de Arquitetura analise, por meio de estudos ou conversas diretas com a população, as características e preferências do público-alvo daquele projeto. Pois, uma vez construído, a sociedade tende a ocupar o espaço à sua maneira, e caso haja identificação com este e, posteriormente, são executadas mudanças inesperadas no ambiente, surge a grande porta aberta para explorar quais identificações e apegos emocionais foram construídos e desconstruídos a cada alteração no espaço, e o modo como isso impacta o senso de self (22) do sujeito, tal qual discorre Huskinson:
“A desorientação experienciada com a destruição do edifício familiar ou a imposição de um edifício desconhecido, embora perturbadora e frequentemente desagradável, pode ser o prelúdio de uma nova orientação do ego; oferece uma oportunidade para que a pessoa reavalie a si mesma e seus vínculos, superando, assim, preconcepções antiquadas de si e de seu ambiente” (23).
O modo como o ambiente construído e natural é percebido por quem o usa pode proporcionar o debate sobre suas potencialidades e o modo como ele afeta os comportamentos individuais e coletivos (24), atuando como uma espécie de comunicação não verbal, onde a interpretação e significados, especialmente os sociais, são percebidos mediante o uso contínuo e a observação das emoções nele desenvolvida, sejam estas positivas ou negativas (25).
Além disso, cabe aqui destacar que a arquitetura e suas expressões construtivas não afetam o sujeito, no que tange às suas emoções, em uma esfera superficial, mas perfura a película externa em níveis mais profundos, a ponto de interferir em pontos como sua identidade (26), sendo assim, o ambiente um fator crucial em sua formação, podendo levar a pessoa a descobrir uma parte ausente em si mesmo (27). Esse processo tende a evoluir mediante as vivências e possíveis modificações “no meio físico e no contexto social no qual se vive” (28) de modo que, como exemplo, pode-se dizer que as impressões de um sujeito sobre o ambiente escolar em uma escola pública podem vir a ser completamente diferente das impressões daquele que frequenta uma escola particular com estrutura mais bem desenvolvida e bem estabelecida.
Simplificando, pode-se articular, segundo Kuhnen(29), que a identidade é dinâmica e constante no processo evolutivo, não sendo ela um reflexo automático, mas uma construção entre o sujeito, suas experiências e o investimento afetivo (ou abertura que se dá para este) com o local em que se vive constantemente ou que se frequenta com certa assiduidade. Estas interferências, diferente do que é comum se pensar na sociedade, não se dá apenas mediante o contato com o extraordinário da arquitetura, mas também com o ordinário, o mais que comum, por mais que este muitas vezes pareça insignificante e passe despercebido diante dos olhos de quem os vê, sua mente sente, vivencia e sua identidade é pouco a pouco configurada por eles (30) de modo que não incomumente são agregados, psicologicamente, à pessoa em si, em virtude que aquele espaço em que se convive a longo prazo, como a casa por exemplo, torna-se um local seguro para despir-se de todas as máscaras sociais e torna-se o local onde se pode ser humano, na mais pura essência, fraco e fragilizado e, normalmente, neste mesmo local o indivíduo pode ter momentos de reflexão e se recuperar mediante crises oriundas da vida.
O que tudo isso significa? Significa que o ambiente vivido faz parte da pessoa e das suas memórias de seu processo evolutivo e construtivo enquanto pessoa, de maneira que sua história pessoal se mistura com a história do ambiente e este deixa de ser um genérico ou insignificante plano de fundo e se torna um dos personagens da trama, podendo inclusive, a depender os valores a ele atribuídos, tornar-se um dos principais personagens. Como exemplificação da interação que pode ser formada entre sujeito-ambiente, em especial a casa para o morador, veja o que aponta Huskinson:
“Em relatos de roubo, a vítima (via de regra o proprietário) em geral descreve a provação de ter sua casa invadida e saqueada como uma violação de sua pessoa, comparando-a a um ataque físico ao seu corpo; alguns chegam a ponto de descrever a provação em termo de estupro ou agressão sexual. Nos casos em que a segurança de um edifício foi violada, aqueles que se identificaram com o edifício muitas vezes sentirão que também foram violados” (31).
Essa ideia da autora traz um excelente exemplo de como o ambiente e o usuário podem tornar-se parte um do outro. Assim, faz-se compreender que o projeto arquitetônico deve proporcionar uma boa interação entre ambiente-usuário, o que por sua vez depende totalmente da boa concepção de projeto arquitetônico, compreendendo não apenas questões climáticas e construtivas, como normalmente o arquiteto aprende em sua formação profissional, mas é necessário também o tato e sensibilidade para com que habitará o espaço projetado.
A importância de conhecer para quem se projeta, além da estética
Para que um bom projeto de arquitetura funcione de maneira assertiva e saudável para quem o habita, é fundamental conhecer a mente e seus modos de funcionamento e, não raro, o cliente tem demandas e desejos que nem sempre estão claros para ele próprio, quiçá para o arquiteto, logo, faz-se importante entender os silêncios não ditos, colocações mal expressadas e até atos falhos, pois embora alguma fala possa parecer “despropositada ou gerar desconforto, vai revelando o que de mais importante está para ser colocado” (32). Somado a isso, deve-se compreender a cultura de quem habitará o projeto, ou da comunidade a qual se tem como público-alvo, pois, tomando como princípio que a identidade se expressa de maneira individual ou em grupo ao analisar um contexto ou comunidade, é possível encontrar índices coletivos que se unificam mesmo com as particularidades de cada sujeito (33), em detrimento que as relações com o ambiente se dão em consequência de questões socioculturais e estas impactam diretamente na relação do usuário e seus modos de compreender um dado espaço e suas reações mediante o mesmo (34).
Além disso, o projeto muitas vezes, erroneamente, é fundamentado apenas em princípios da utilidade, eficiência, prazos de construção, custos e sua estética, mas se esquece de que esses são itens que devem estar em função de quem habita, e não o inverso. Conforme Huskinson (35) a qual critica fortemente em sua obra, é necessário que os arquitetos compreendam para quem projetam e quais as reais necessidades dos usuários, o que de fato é necessidade e o que é apenas desejo momentâneo, quais suas expectativas e o que pode vir a proporcionar o bem estar, pois “o caráter de nossos ambientes construídos é vital para nosso bem-estar porque nossa identidade pessoal é amplamente moldada por nossas identificações inconscientes com eles”.
A autora desenvolve severas críticas bem fundamentadas aos projetos que, em muitos casos, tende a priorizar “o máximo de aproveitamento do espaço com custo mínimo e de acordo com um modelo genérico, com embelezamento e ornamentação também mínimos”, o que não é raro de ser visto, ainda mais a expansão imobiliária desordenadas nas cidades e a produção de “projetos” (se é que assim pode-se os chamar, para além do sentido literal da expressão) que não contém a personalidade, a identidade, a “cara” do morador, como anteriormente apresentado. Conhecendo para quem se projeta, o traço da lapiseira e esquadro não mais passam a seguir padrões “da moda”, ou tendências do momento, mas passam de fato se importar e comportar a pessoa interior do morador. Desse modo, a visão artística não é apenas excêntrica e idiossincrática, que não contempla as expectativas do sujeito nem os princípios utilitários gerais mas passa a de fato representar sua identidade.
A interação Sujeito-Arquitetura é desenvolvida pelo tato, a dinâmica de trocas e influências entre o sujeito que usa o espaço e o espaço que é usado, vivenciado, pelo sujeito, conforme desenvolve Huskinson:
“A natureza evocativa da arquitetura, seja ela estranha, sublime ou numinosa, é estabelecida no intercâmbio inconsciente entre sujeito e edifício e, portanto, pela interação corporal entre os dois. Requer a intimidade de uma fusão mimética de formas, e não simplesmente a contemplação abstrata de seus componentes visuais” (36).
Assim sendo, é possível validar mais ainda a importância da compreensão de que o projeto é muito além do desenho da casa, da escola, do hospital e afins, mas trata-se de um espaço de trocas e interações que podem interferir diretamente na saúde não somente física, mas também psíquica do indivíduo (37).
No entanto, mais que comum, a população tende a associar a boa experiência no espaço com a reputação do projeto, de modo tal que é corriqueiro ligar a boa arquitetura (mais a frente será debatida a subjetividade da boa arquitetura) com a iconicidade do projeto, seja por suas associações históricas ou sua complexidade construtiva, mas é necessário o questionamento: em quantos espaços assim o cidadão transita durante os seus dias? Será que seus momentos de prazer se resumem apenas ao extraordinário, ou ao incomum? Certeiramente toda e qualquer pessoa desfruta de bons momentos, de prazer e boas interações com o espaço no seu cotidiano, no ordinário dos dias, na simplicidade do chalé e até quem sabe, na palafita cheia de significados e história para quem usa (38).
Conforme discorre o psicólogo junguiano James Hillman (39), a modernidade desenvolveu uma fixação pela arquitetura extraordinária, ou como ele chama, “obsessão pela geometria”, em que o foco é a construção de espaços cada vez mais expressivos e mais altos, o que pode diariamente ser observado na janela do ônibus ou do carro nas cidades brasileiras, como o caso do Recife PE, em que há a disputa por lotes cada vez maiores e melhores para construção das grandes torres brancas, genéricas e sem personalidade, que não contemplam sequer as necessidades mínimas de conforto ambiental para o usuário em que, a população infelizmente adquire, dominada por propagandas falaciosas e que fazem alusão a uma qualidade de vida, ou até se referem a um contato com a natureza, mas quando se analisa de maneira honeste, vê-se que o dito contato com o meio natural é a verdade dado por espaços verdes ínfimos, inseridos em um meio completamente urbano, que se estreitam entre as grandes torres e em nada representam de fato um retorno à natureza, como frequentemente é vendido nas publicidades esdruxulas estampadas nos outdoors dos bairros mais nobres das cidades. Ou seja, essa arquitetura é apenas fruto das demandas da consciência do ego, sendo uma verdadeira ilusão, uma mentira de quem vende e uma mentira para si próprio de quem compra e insiste em acreditar que o jardim que ocupa 5% do lote, em disputa a 95% de estacionamento e construção é qualidade de vida.
Considerações finais
Diante da argumentação apresentada nesse texto, vê-se que a relação entre o ambiente em que se vive e a saúde psicológica do usuário não são elementos distantes, mas sim interligados diretamente, de tal modo que o estado psíquico do momento, adjunto a construção psicológica enquanto pessoa, tende a influenciar a percepção do espaço e a maneira como o espaço é experienciado e utilizado. Além disso, o espaço possui poder de agregar efeitos e sensações a quem o utiliza, gerando assim a necessidade ao arquiteto de compreender de quais maneiras o seu projeto poderá influenciar positivamente e negativamente a vida do usuário.
Sabendo que o ambiente pode espelhar o interior de quem o habita, a observação deste pode auxiliar na compreensão do real estado psicológico do usuário e seus traços de personalidade e como se dá sua dinâmica com o meio, seja ela de modo individual, seja em conjunto social, através de sua interação com outras pessoas. Funcionando assim o ambiente como um local instigador ou bloqueador de interações e posicionamentos do indivíduo ou grupo. Assim, faz-se necessário analisar como os componentes artificiais, atrelados aos elementos naturais, podem ser utilizados a fim de proporcionar o bem-estar para o usuário, por meio do uso elementos, cores e texturas, bem como a disposição destes no ambiente e o modo como cada um se relacionam com a história da pessoa.
No entanto, vale enfatizar que o projeto e análise projetual não deve ser limitar à caixa restritiva da funcionalidade, mas deve-se observar a estética e o modo como a relação pessoa-ambiente é percebida pelo usuário e se este sente-se convidado ou repelido pelo ambiente, assim proporcionando a compreensão do que seria, para aquela pessoa ou grupo, um ambiente agradável e acolhedor, por meio de suas memórias e afetividades construídas no decorrer de sua formação.
Assim sendo, é fundamental conhecer para quem se está projetando, pois, ao compreender que a percepção espacial propriamente dita varia a cada pessoa e principalmente entre grupos sociais, deve-se conhecer como funciona a cultura social no qual o indivíduo ou grupo estão imersos e sua história enquanto pessoa, resultando assim em um projeto que de fato representa quem se é e seus reais desejos e necessidades.
notas
1
BREUER. Apud HUSKINSON, Lucy. Arquitetura e psique: um estudo psicanalítico de como os edifícios impactam nossas vidas. São Paulo, Perspectiva, 2021, p. 2.
2
HUSKINSON, Lucy. Op. cit.
3
CAVALCANTI, Silvia; ELALI, Gleice A. Temas básicos em psicologia ambiental. Petrópolis, Vozes, 2011.
4
ELALI, Gleice Azambuja. Psicologia e arquitetura: em busca de um locus interdisciplinar. Estudos de Psicologia, v. 2, n. 2, 1997 p. 349-362.
5
MOSER, Gabriel. Psicologia ambiental. Estudos de Psicologia, v. 3, n. 1, 1998, p. 121-130.
6
ELALI, Gleice Azambuja. Op. cit.
7
PATO, C.; DELABRIDA, Z.N.C. Proposta transdisciplinar em contextos formativos: chave mestra para a sustentabilidade. In HIGUCHI, M.I.G.; KUHNEN, A.; PATO, C (Org.). Psicologia ambiental em contextos urbanos. Florianópolis, Edições do Bosque/CFH/UFSC, 2019, p. 34-58.
8
HUSKINSON, Lucy. Op. cit.
9
PINHEIRO, José Q. Psicologia ambiental: a busca de um ambiente melhor. Estud. Psicol. (Natal). vol. 2, n. 2, jul./dez. 1997, p. 377-398.
10
GÜNTER, Hartmut. Mobilidade e affordance como cerne dos estudos pessoa-ambiente. Estud. Psicol. (Natal). vol. 8, n. 2, mai./ago. 2003, p. 273-280.
11
RAPOPORT, Amos. Human aspects of urban form. Oxford, Pergamon, 1977.
12
Apud HUSKINSON, Lucy. Op. cit., p. 57.
13
KUHNEN, Ariane. Interações humano-ambientais e comportamentos socioespaciais. In KUHNEN, Ariane; CRUZ, Roberto Moraes e TAKASE, Emílio (org.). Interações Pessoa-Ambiente e saúde. São Paulo, Casa do Psicólogo, 2009, p. 15-35.
14
KOWALTOWSKI, DCCK. Arquitetura escolar: o projeto do ambiente de ensino. São Paulo, Oficina de textos, 2011.
15
CARDEAL, C. C.; VIEIRA, L. R. C. Neurociência como meio de repensar a arquitetura: formas de contribuição para a qualidade de vida. Cadernos de graduação ciências humanas e sociais, v. 6, n. 3, 2021, p. 55-70.
16
BENCKE, Priscilla. Como os ambientes impactam no cérebro? Qualidade corporativa, [s. l.], 2018.
17
BOTTON, Allain de. Arquitetura da felicidade. Rio de Janeiro, Rocco, 2007, p. 13.
18
BENCKE, Priscilla. Op. cit.
19
BOTTON, Allain de. Op. cit.
20
KUHNEN, Ariane. Op. cit.; SILVEIRA, BB, & KUHNEN, A. (2019). Psicologia ambiental e saúde na relação pessoa-ambiente: uma revisão sistemática. PSI UNISC, v. 3, n. 1, Santa Cruz do Sul, jan./jun. 2019, p. 89-105.
21
HUSKINSON, Lucy. Op. cit.
22
Para Jung o self pode ser compreendido como a imagem da totalidade da psique, como seu centro e também como símbolo dessa unidade, abrangendo consciente e inconsciente e o próprio eu. Para uma síntese, conferir: RAFFAELLI, Rafael. Imagem e self em Plotino e Jung: confluências. Rev. Estudos de Psicologia, v. 19, n. 1, PUC Campinas, jan./abr. 2002, p. 23-36.
23
HUSKINSON, Lucy. Op. cit., p. 57.
24
ELALI, G. A. Op. cit.
25
VALERA, S. & POL, E. El concepto de identidad social urbana: una aproximación entre la psicología social y la psicología ambiental. Anuario de psicología/The UB Journal of psychology, v. 62, 1994, p. 5-24; MANZO, L. Beyond house and haven: toward a revisioning of emotional relationship with places. Journal of Environmental Psychology, v. 23, 2003, p. 47–61; FELIPPE, M. L. Ambiente pessoal: o papel da personalização na construção de espaços saudáveis. In KUHNEN, Ariane; CRUZ, Roberto Moraes e TAKASE, Emílio (org.). Op. cit.
26
“O arquiteto Neil Leach, por exemplo, descreve a identidade como um ‘vaívem contínuo’ entre duas tendências humanas contrastantes: sentir-se ‘conectado’ ao ambiente e ‘distinto’ dele. Elas funcionam, diz ele, como uma ‘relação figura fundo’, e de modo que a identidade é, ‘em última análise, uma questão de primeiro e segundo plano. É uma questão de definir o self’ por meio desses movimentos oscilantes, ‘contra um determinado ambiente’”. HUSKINSON, Lucy. Op. cit., p. 48.
27
HUSKINSON, Lucy. Op. cit.
28
KUHNEN, Ariane. Op. cit., p. 28-29.
29
Idem, ibidem.
30
HUSKINSON, Lucy. Op. cit.
31
Idem, ibidem, p. 58.
32
ZONIS, S. Arquitetura no divã: a quarta dimensão do espaço. São Paulo, Olhares, 2019, p. 11.
33
ALMEIDA, Maristela M. Análise das interações entre o homem e o ambiente: estudo de caso em agência bancária. Dissertação de mestrado. Florianópolis, PPGEP UFSC, 1995.
34
TUAN, Y. F. Topofilia: um estudo de percepção, atitudes e valores do meio ambiente. Londrina, Eduel, 2012; ZACARIAS, Elisa Ferrari Justulin; HIGUCHI, Maria Inês Gasparetto. Relação pessoa-ambiente: caminhos para uma vida sustentável. Interações, v. 18, n. 3, Campo Grande, 2017, p. 121-129.
35
HUSKINSON, Lucy. Op. cit.
36
Idem, ibidem.
37
CARDEAL, C. C.; VIEIRA, L. R. C. Op. cit.
38
Destaca-se aqui a não romantização da pobreza e insalubridade dos espaços, mas sim a compreensão de que, independentemente das condições construtivas do ambiente, o indivíduo pode construir memórias afetivas com o espaço e suas características em detrimento de suas vivências e histórias ali desenroladas.
39
HILLMAN, James. Cidade e alma. São Paulo, Studio Nobel, 1993.
sobre os autores
Marcos Henrique Lins de Oliveira é graduando em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Ciências Humanas Esuda.
Pedro Paulo Viana Figueiredo é psicólogo (2007) e mestre em Psicologia (2010) pela UFPE e doutor em Psicologia Social pela PUC SP (2014). Docente na Universidade Federal de Alagoas, vinculado ao Centro de Educação.