Parto do princípio de que em maior ou menor grau para cada pessoa, a beleza pura e simples é um dado indispensável para a sua saúde mental, tendo como exemplo principalmente a minha própria experiência. Tenho ainda a convicção de que a nossa saúde mental é um item absolutamente decisivo na opção pela sobrevivência do planeta. Assim, apostando muito mais na vocação curativa/balsâmica/didática da arte que em qualquer outra que ela possa ter, minha intenção é fazer a dimensão do belo acessível ao maior número de pessoas possível.
Para tanto, reformulei o repertório veiculado pelo meu trabalho lançando mão de um tipo de visualidade que acredito responder com eficiência essa preocupação, isto é, acrescentei às minhas primeiras investigações plásticas o dado da ornamentação islâmica. Fi-lo por acreditar ser este um dos mais belos produtos visuais da humanidade; portanto, potencialmente com maior capacidade apelativa que a linguagem mais seca e menos sensual característica dos primeiros anos da minha produção. Essa transformação se deu há uns oito anos e meu trabalho, acrescido do elemento "beleza pura", novamente se voltou para um crescimento vertical, aprofundando as questões basicamente metalingüísticas que propunha.
Tenho agora sentido falta de uma atualização deste mote, possivelmente o mais importante do meu trabalho, isto é, proporcionar o contato coma dimensão do belo para o maior número de pessoas possível. A idéia é executar pinturas de parede em zonas urbanas excluídas do circuito das artes, desprovidas de qualquer equipamento cultural, lugares onde a probabilidade de se vivenciar esta dimensão é praticamente nula. Estas pinturas seriam feitas nas paredes públicas possíveis destas áreas. Desta forma estaria colaborando para a expansão dos limites impostos à experiência estética pelo circuito protegido de arte.
Note-se que não pretendo fazer qualquer denúncia, nem chamar a atenção para algum dos muitos problemas socio-econômicos existentes. Quero apenas proporcionar o contato dos ditos excluídos com um produto cultural que jamais teriam chance de conhecer, contato este que acredito ser principalmente salutar para os que dele usufruírem. Deste modo, pretendo deslocar a questão da transformação da sintaxe interna do trabalho para a intervenção direta no circuito, entendendo-o como um dos elementos integrantes do léxico da minha própria produção.
De fato, entendo a beleza pura como atitude política inclusive dentro do próprio circuito de arte estabelecido, uma vez que a grande maioria da produção artística "de ponta" manipula informações geralmente agressivas e de forma ajuda comprometida com os preceitos desestetizantes promulgados pela arte deste século. Entendo que aqui no Ocidente a pura fruição estética sofre enormes constrangimentos provocados por uma equivocada supervalorização do intelecto, o que restringe enormemente o campo de ação da arte e, segundo o meu ponto de vista, justamente na sua especificidade máxima: o exercício da fruição do belo, sutil porem profundamente transformador.
notas
[publicação: julho 2001]
Mônica Nador , São Paulo Brasil