A atual sede da escola de ensino primário Gitanjali em Badalona (Barcelona), obra do escritório AIA – dirigido pelos arquitetos Albert Salazar e Joan Carles Navarro – é um edifício que oferece em si mesmo, a seus pequenos usuários, um duplo componente educativo: é o espaço de reunião para o aprendizado e o local que se torna referência direta de como estabelecer com o entorno uma relação sustentável. Como uma lição reiterada, os alunos e alunas da escola Gitanjali aprendem, em seu uso diário do colégio, como manter uma relação respeitosa com o meio ambiente mediante o aproveitamento das energias alternativas. Esse conceito de edifício auto-abastecido desenhado por Salazar e Navarro se encontra em absoluta sintonia com o conceito pedagógico de Gitanjali, uma escola que nasceu em 1962 como uma reação ao ambiente educativo rarefeito e opressor do franquismo, no qual se educaram suas fundadoras Mercè Illana, Roser Padrós e Maria Teresa Giné, que tinham 24 anos quando decidiram criar uma escola aonde os meninos e meninas se sentissem "livres e felizes". Baseando-se nas teorias pedagógicas defensoras da liberdade infantil e com a motivação de um progressismo revolucionário de então, de potenciar em sua nova escola a catalanidade, a co-educação e a condição laica, estas três mulheres resolveram batizar o centro com o título de um poema de Rabinadrath Tagore para expressar o caráter de seu projeto.
A escola está hoje encravada no casco antigo de Badalona. A construção de Salazar e Navarro substitui uma edificação de um piso que abrigava parte da antiga escola e conforma uma extensão das antigas instalações, situadas em um edifício de estilo modernista, reabilitado por estes mesmos arquitetos, onde atualmente estão as salas de aula dos alunos da pré-escola. A integração do velho e do novo edifício se realiza pela diferença, com o acréscimo ao edifício modernista de um volume cúbico. Nos três pisos do novo edifício se distribuem os equipamentos próprios de todo colégio: salas de aula, escritórios administrativos, refeitório, ginásio, biblioteca, espaços para reunião e orientações...
Os arquitetos do escritório AIA não apenas são especializados em instalações, mas também as tornam centrais em seus projetos. Foram colaboradores em importantes obras de Dominique Perrault, arquiteto que reconheceu e elogiou o conceito moderno e dinâmico de entender a profissão, muito próprio destes arquitetos, que combinam arquitetura, engenharia e desenho, e que dedicam fundamentalmente seu trabalho ao desenho de sistemas de instalações. Neste projeto, revestindo conscientemente a ação arquitetônica de uma motivação pedagógica, Salazar e Navarro se esforçaram por conseguir que as placas destinadas à captação de energia solar se incorporassem à estrutura de maneira que se colocassem a serviço da expressão estética do edifício, com o objetivo de que os meninos e meninas percebessem esses elementos com naturalidade. Isto se faz patente na forma em que se incorpora uma placa fotovoltaica na fachada externa, que contrasta com a interior por sua austeridade – de forma que visualmente possa passar totalmente desapercebida ao ficar totalmente integrada na pele que recobre o edifício – e aonde se destaca, à maneira de um grafitti, o rótulo com o nome da escola. Esta placa gera uma produção elétrica de 5 kw. Na laje de cobertura do edifício alguns coletores solares cobrem praticamente os 100% das necessidades de uso energético de Gitanjali. Os tratamentos do ar e da ventilação são realizados por um climatizador, que recolhe ar exterior da câmara formada no vão entre a fachada interior e a placa fotovoltaica, ar que é introduzido controladamente no interior: no inverno, o ar quente obtido pela radiação solar é impulsionado para dentro dos diferentes espaços da escola, permitindo a redução do consumo de gás; quando as temperaturas são frescas, o interior recebe ar da face norte do edifício, complementando-se com um sistema de acondicionamento do ar. O ar quente entra por finas frestas feitas no teto e os radiadores são substituídos com o desenho de um embasamento radiante. O edifício foi dotado de um pequeno sistema de controle centralizado que permite programar e visualizar o funcionamento via Internet, recolhendo e armazenando os dados de manutenção e economia energética de tais sistemas.
Da mesma maneira que o espírito renovador com que se fundava Gitanjali foi fruto de um desejo de inverter um conceito tradicional e encarquilhado de escola que partiu de uma reflexão sobre a própria experiência de Illana, Padrós e Giné como alunas, é como se o processo de criação deste edifício por parte de Salazar e Navarro houvesse consistido também em levar a cabo esse exercício de memória, que habitualmente é apenas literário, de regressão aos sentimentos da infância e de evocação do que suscita em nós o espaço e a dinâmica do colégio: o conceito sobre o qual os arquitetos basearam seu projeto gira em torno da convicção de que o edifício de um colégio deve possuir o mesmo espírito que os meninos e as meninas: "tem que ser vivo, alegre e próximo; não um simples recipiente frio e despersonalizado", sustentam. Evidência dessa concepção é a sensibilidade no tratamento da fachada interior, voltada para o pátio de recreio e por isso a fachada do colégio que as crianças vivenciam, cheia de contrastes em suas cores vivas, com a intenção de desmistificar a transcendência que representa o colégio para uma criança.
O edifício de Gitanjali surge da conjunção e da concordância sobre valores e objetivos compartilhados: alguns buscados, outros, surgidos com o acaso. O encontro deste escritório de arquitetos com um projeto de escola fundado nos valores de liberdade confluiu em uma determinação de se realizar uma escola sustentável, racional e que em cujo projeto primava a economia energética. Conseguindo às vezes transmitir a partir de sua própria estrutura sensações de afeto, segurança e respeito, hibridizou em um mesmo compromisso criatividade e ética. Neste caso, também prolongando, reatualizando e revitalizando aqueles ideais a partir dos quais nasceu Gitanjali há 40 anos.
notas
[Publicação original no suplemento “Cultura/s”, jornal La Vanguardia, Madri, 02 de março de 2005].
Fredy Massad e Alicia Guerrero Yeste, Lleida, Espanha