Este livro não existiria não fosse o zelo de Maria Helena (1910-1989) e Vera Maria (1935-2015) que, desde 1946, preservaram a memória e o acervo técnico do marido e do pai.
Jayme Campello Fonseca Rodrigues (1905-1946) foi colega de turma de Oswaldo Bratke, contemporâneo de Eduardo Kneese de Mello e Henrique Mindlin no curso de Arquitetura da Escola de Engenharia Mackenzie.
Até 1946, ele havia realizado projetos de urbanização e habitação social para o IAPC e IAPETC, bem como suas sedes na capital paulista; desenvolveu propostas de paisagismo, prédios de apartamentos e casas, hospitais, arquitetura de interiores, mobiliário, luminárias e objetos. Tinha um conjunto de realizações mais extenso que seus colegas de geração. Provavelmente, ao lado de Rino Levi, mantinha o maior (se não o maior mesmo) escritório de projetos de arquitetura de São Paulo. Por ele passaram arquitetos como Migue Forte, Aníbal Martins Clemente e Oswaldo Corrêa Gonçalves. Mede-se seu prestígio por ter sido fundador e primeiro vice-presidente do IAB/SP.
O livro se organiza em sete partes: “Uma cápsula do tempo” é a narrativa da guarda e resgate de uma documentação conservada pela viúva e filhas: desenhos originais, croquis, memoriais técnicos, fotografias, diários, correspondência de escritório, arquivo técnico que se preservou, quase íntegro, por 70 anos; “Uma viagem de 41 anos” é a biografia e trajetória profissional de JCFR, uma leitura realizada a partir desses documentos e pesquisa de campo; “Um arquiteto emsemblier”, ensaio da professora Juliana Suzuki (DAU-UFPR) que analisa o design de interiores, projeto de mobiliário e objetos e comunicação visual desenvolvido pelo arquiteto; “Um cinema do ano 2000” narra um episódio da descentralização da Cinelândia carioca, com o projeto do Cine São Luiz, no Catete, Rio de Janeiro; “Não se limitou a erguer paredes lisas” é o registro do projeto e obra da casa do arquiteto na Rua Ceará, 202 e sua vizinha; “Edifícios dignos da importantíssima classe” é o estudo da professora Nilce Aravecchia-Botas (FAU USP) sobre os projetos para os IAPs – sedes administrativas e conjuntos habitacionais – que JCFR desenvolveu para o governo Getúlio Vargas; e “Um palácio de sonho debruçado sobre o mar” é a crônica da criação do cult edifício Sobre as Ondas, no Guarujá, que JCFR não chegou a ver construído.
Sua morte, aos 41 anos, interrompeu uma carreira em plena ascensão. O canto do cisne foi o edifício Sobre as Ondas, tombado pelo Condephaat.
O Sobre as Ondas (1) parecia apontar novos rumos para um arquiteto cujos desenhos se referenciavam na estética dos transatlânticos, no streamline, no gosto art déco. Era um designer que dialogava com Rob Mallet-Stevens, Pierre Patout, Michel Roux-Spitz, Bruno Elkouken, J.-E. Ruhlmann, J.-E. Leleu, Ivan da Silva Bruhns. Antecipando muitos colegas, desde cedo dedicou-se à arquitetura de interiores e projeto de mobiliário, em sintonia com o que se fazia de mais refinado nos Estados Unidos e Europa nos anos 1930/40.
Seu desaparecimento prematuro também o fez desaparecer da História da Arquitetura e do Design. Esta pequena mostra é o início do resgate de uma obra e um personagem que foi um ponto de inflexão na arquitetura paulista e brasileira.
Este livro, fragmento da documentação preservada por Maria Helena e Veria Maria, é lançado aos 111 anos do nascimento, e 70 anos da morte de JCFR.
notas
1
NE – ver: DIAS, Maurício Azenha. Edifício "Sobre as Ondas", um ícone da arquitetura moderna no litoral brasileiro. Arquitextos, São Paulo, ano 03, n. 033.04, Vitruvius, fev. 2003 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/03.033/708>.
sobre o autor
Hugo Segawa é arquiteto, professor da FAU USP, é organizador do livro Jayme C. Fonseca Rodrigues Arquiteto (BEĨ Editora, 2016), com lançamento no dia 17 de novembro de 2016, às 19h, na Casa do arquiteto, Rua Ceará, 202, Higienópolis, São Paulo, com apresentações de Hugo Segawa, Juliana Suzuki, Nilce Aravecchia-Botas e da família.