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drops ISSN 2175-6716

abstracts

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Segundo Luiz Fernando Janot, as cidades não podem continuar sendo apreciadas unicamente por sua materialidade, pois o convívio pacífico nos espaços públicos constitui o principal instrumento para se desenvolver uma sociabilidade coletiva harmoniosa.

how to quote

JANOT, Luiz Fernando. O gosto amargo dessa eleição. Drops, São Paulo, ano 19, n. 130.03, Vitruvius, jul. 2018 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/19.130/7046>.


Pichação “Amor ao Estado mata”, parede externa de edificação em pedra gnaisse, centro do Rio de Janeiro
Foto Abilio Guerra


Os avanços e retrocessos das nações geralmente decorrem dos seus modelos de desenvolvimento. Em países democráticos, os programas de governo são necessariamente submetidos ao crivo de parlamentares eleitos pelo conjunto da sociedade. Nos regimes totalitários, onde o comando da nação resulta de golpes de Estado ou de estratagemas para perpetuar no poder determinados grupos políticos, as decisões são tomadas de cima para baixo sem anuência da população.

Achei oportuno trazer à tona essa dualidade por estarmos vivendo um momento político extremamente delicado. A proximidade das eleições trouxe um sabor amargo ao colocar diante de nós posicionamentos ideológicos fortemente antagônicos. Não obstante o fato de não concordar com os discursos de certos candidatos, defendo o direito de manifestarem as suas opiniões com absoluta liberdade.

Infelizmente temos observado comportamentos extremados de parte a parte, principalmente dos seus correligionários. Em geral, a reação ao contraditório tem se dado por meio de posturas agressivas que beiram o desequilíbrio emocional. Um candidato com esse perfil se eleito for, certamente, ao primeiro contratempo, jogará a toalha pela incapacidade de governar em sintonia com os demais poderes constituídos.

Para agravar essa apreensão vemos viúvas da ditadura destilando ódio e conclamando uma nova intervenção militar. Juntam-se a essas figuras esdrúxulas os indivíduos que gostam de se intitular “cidadãos de bem” e empunhar bandeiras preconceituosas contra quem não compartilha do seu ideário político e seus costumes ultrapassados. Felizmente, nossas instituições democráticas falam mais alto que o discurso rancoroso desses radicais da intolerância.

Também não dá para se deixar levar pela retórica de candidatos outsiders que tentam ganhar espaço demonizando a própria estrutura política que anseiam participar. Apoiados em postulados empresariais consagrados mercadologicamente, fazem dos seus discursos uma valorização específica da sua vivência como gestores profissionais. Esquecem, contudo, que administrar um país com a extensão e a complexidade do Brasil é muito diferente do que dirigir uma empresa privada.

Além do mais, os futuros mandatários deverão estar cientes de que terão que enfrentar os graves problemas conjunturais que afetam diretamente os nossos Estados combalidos. No caso específico do Rio de Janeiro será preciso resgatar a sua imagem de prosperidade, atualmente comprometida pela corrupção deslavada que se apoderou do governo passado. Será preciso grande sensibilidade política para que o novo governador obtenha o apoio necessário do governo federal e das administrações municipais.

Reativar a economia, atrair novas empresas nacionais e internacionais e proporcionar oportunidades diversificadas de trabalho, dependerá de grandes investimentos em infraestrutura urbana, ambiental e tecnológica. E, sobretudo, na completa reformulação das políticas de mobilidade urbana para suprir as demandas da população. Integrar os modais de transportes coletivos, privilegiando os trens e o metrô, não pode ser mais adiado.

Todavia, de nada adiantará esse esforço se não houver, de fato, uma política de segurança pública integrada que envolva solidariamente os governos federal, estadual e municipal. Não dá continuar fechando os olhos para essa violência urbana descontrolada que ceifa vidas de inocentes, que mata policiais aleatoriamente e que incentiva a execução sumária de bandidos. Trata-se de mais uma guerra sem vencedores ou vencidos que evidencia as condições adversas que estamos vivendo.

Por serem referências da existência humana, as cidades não podem continuar sendo apreciadas unicamente por sua materialidade. O convívio pacífico nos espaços públicos constitui o principal instrumento para valorizar a ambiência urbana e desenvolver uma sociabilidade coletiva harmoniosa.

Entendo que o resgate da urbanidade perdida seja uma questão de honra para os que decidiram continuar morando no Brasil e uma questão de sobrevivência para quem vive entre os limites da pobreza e da miséria. Quando se sabe mais claramente o que se quer, sem dúvida, fica mais fácil fazer suas escolhas.

nota

NE – publicação original: JANOT, Luiz Fernando. O gosto amargo dessa eleição. O Globo, Rio de Janeiro, 30 jun. 2018.

sobre o autor

Luiz Fernando Janot, arquiteto urbanista, professor da FAU UFRJ.

 

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