Eileen Gray tem sido bastante revisitada de cerca de vinte anos para cá. Irlandesa, de família aristocrática, mudou-se para Paris bem jovem para estudar arte.
A partir de 1906 passou a trabalhar com laca, tendo enfrentado duro aprendizado (raríssimo entre mulheres) para lidar com o material. Obteve o azul em laca, operação dificílima. Também fez tapeçarias e desenhou biombos e móveis. Durante a I Guerra Mundial, retornou à Grã-Bretanha, e passou a dirigir caminhões do exército.
De volta a Paris, Gray abriu a loja Jean Desert. Teve contato com os modernos holandeses e, a partir de 1925, projetou móveis de aço tubular, mudando bastante o partido anterior de sua produção. Firmou-se como designer de móveis, interiores e como fotógrafa.
Entre 1926 e 1929 projetou e acompanhou a construção da casa E1027 para Jean Badovici e para ela própria no litoral sul da França, tão estudada por suas soluções originais, por seu extremo cuidado com os detalhes, por sua implantação no terreno. Desenhou móveis de materiais diversos como cromo, celuloide, plásticos, metal perfurado e cortiça. Em contraposição a Le Corbusier dizia que “a casa não é máquina de morar, mas a concha do homem, sua extensão, seu relaxamento, sua emanação espiritual”.
Construiu depois casa de verão para si própria e fez aproximadamente 100 projetos de arquitetura, poucos realizados. Seus móveis, a parir de 1922, são leves, multidirecionais e multifuncionais. Servia-se de materiais industriais, e o melhor exemplo disso é a poltrona Bibendum e seus gomos de borracha, lembrando o boneco de pneus Michelin.
Muito estudiosa, Eileen Gray conhecia a produção de muitos artistas e arquitetos e construiu poética própria. Na polêmica das janelas verticais e horizontais, definiu-se pelas horizontais, mas com panos de vidro proporcionais ao corpo humano e articuladas por persianas pivotando verticalmente. Para ela, a janela sem persiana era como o olho sem pálpebra.
Gosto de saber que ela teve, pelo menos, duas Ethel na sua vida: sua irmã mais velha; e Ethel Walker, artista e sua professora na Escola Slade em Londres.
PS – não falo da polêmica dos murais de Le Corbusier pintados na casa E1027. Depois de ler o artigo de Tim Benton a respeito (enviado por Renato Anelli), desconfio de certa prosa que apressa conclusões, apontando o machismo de Le Corbusier, que existia, sem dúvida, mas talvez nesse caso não, pelo menos com as tintas tão marcadas como pintou Beatriz Colomina.
nota
NE – oitava texto da série “Terça-feira das mulheres”, publicado pela autora em sua página Facebook.
sobre a autora
Ethel Leon é jornalista, pesquisadora, professora na área de história do design brasileiro e autora dos livros Memórias do design brasileiro, IAC – Primeira Escola de Design do Brasil, Michel Arnoult, design e utopia – móveis em série para todos e Design brasileiro – quem fez, quem faz.