Enquanto em São Carlos as chuvas parecem (esperamos) ter dado uma folga até o ano que vem, em Belo Horizonte elas têm cobrado sua cota anual de mortes, desabamentos e perdas materiais e humanas.
Em texto recente meu colega Renato Anelli, que foi secretário de Obras e Serviços Públicos de São Carlos entre 2001 e 2004 e desde então vem se dedicando a pesquisas sobre o tema, comenta o caso de Belo Horizonte.
Segundo seu texto, que vem apoiado no trabalho de vários pesquisadores mineiros, há um problema de origem no caso da cidade que foi criada para ser a nova capital do Estado no final do século 19.
Para Anelli um dos problemas na origem do recorrente problema das enchentes e deslizamentos de terra foi o abandono do plano proposto pelo engenheiro sanitarista Saturnino de Brito, que respeitava o traçado dos rios e córregos do sitio, e sua substituição pelo plano de Aarão Reis, igualmente engenheiro, que propôs uma quadricula geométrica que ignorava o traçado natural.
Isso implicou uma ocupação urbana indevida nas cabeceiras dos cursos d’água da capital mineira, com a impermeabilização do solo diminuindo a capacidade de absorção das chuvas e provocando o fluxo mais rápido das águas.
A isso se soma que em regiões ocupadas o risco de assoreamento (enormes quantidades de terra, areia e sujeira que diminuem a vazão dos corpos de água) é crescente.
E é claro que quando os córregos e rios são tamponados (cobertos) fica muito mais difícil o trabalho de desassorear (limpar o leito do córrego ou rio).
Estamos falando de Belo Horizonte, mas o leitor já percebeu que poderíamos trocar os nomes por São Carlos.
Também aqui o primeiro plano urbano da cidade se apoiou num desenho geométrico quadriculado que ignorou solenemente a topografia e a hidrografia (estudo e traçados dos corpos d’água) do nosso belo sítio.
É por isso que temos ruas (General Osorio, por exemplo) que cruzam os córregos fingindo que eles não existem e córregos que estão tamponados, embaixo de ruas e até de imóveis, sem que o cidadão se dê conta disso. Até que eles reclamem, na forma de alagamentos e enchentes.
Voltaremos ao tema. Porque as chuvas vão voltar.
sobre o autor
Carlos A. Ferreira Martins é professor titular do IAU USP São Carlos, que tem grandes especialistas no assunto.