O cinema vem sendo uma das atividades culturais mais procuradas pelos brasileiros, segundo a pesquisa feita pela consultoria JLeiva Cultura e Esporte (1), em parceria com o Datafolha, o que mostra a importância desse meio em reproduzir a diversidade cultural. Em relação ao cinema brasileiro, nota-se que, devido a abundância cultural presente no país, existem numerosas formas de retratar essa pluralidade.
Com isso, o trabalho em questão baseia-se na representação das variantes culturais por meio de obras cinematográficas, como definido no tema deste artigo, tendo o objetivo de entender e demonstrar como essa interpretação cultural é feita. Dessa forma, mostrar-se como essa variedade existente no país pode ser manifestada e assimilada.
As estatísticas da Ancine, divulgadas em 2018 e relacionadas às obras cinematográficas no cenário nacional, apresentam um aumento em relação ao ano anterior, que são: 185 títulos brasileiros lançados, sendo o recorde de lançamentos entre 2009 e 2018; 22 títulos produzidos em regime de coprodução com outros países, como Portugal, Argentina, Alemanha, França e Espanha; 24 milhões de ingressos vendidos, com uma participação do público de 14,8%, a maior já registrada na américa latina, superando a Argentina e Colômbia (2).
Conforme a matéria escrita por Nathalia Durval e divulgada na Folha de S. Paulo (3), uma pesquisa apresentada pela JLeiva Cultura e Esporte e pelo Datafolha, 10.630 pessoas das doze capitais mais populosas do Brasil foram entrevistadas a respeito de seus hábitos de frequência em atividades culturais. De todas as respostas, com 64% dos votos, o cinema foi o mais citado; em segundo lugar, com 46%, estão os vários tipos shows e, em seguida, festas populares com 42%. Com relação a atividades pagas e gratuitas, 32% dos entrevistados revelaram que preferem atividades gratuitas e 40% preferem mais atividades gratuitas do que pagas.
Visto que a sétima arte é muito consumida pelos brasileiros e, segundo as palavras de Dudley Andrew em Cinema & Culture (4), o cinema é uma forma de voltar ao passado e uma de suas funções é ser um reflexo da cultura. Contudo, a representação do Brasil nas telonas não é feita seguindo as diferentes culturas de cada região do país. Dentro da cinematografia brasileira nota-se a grande quantidade de filmes relacionados ao sertão brasileiro em razão de suas histórias e costumes únicos, porém existem diferentes culturas a serem retratadas que ainda não tiveram a chance de aparecer nas telas do cinema.
Por muitos anos o Brasil teve fama de “o país do futebol”, samba, mulheres bonitas, violência, pobreza e corrupção, e na maioria das vezes o cinema contribuiu para que essa imagem fosse fortificada. Cansada dos filmes clichês onde o Brasil é retratado, a cineasta Lucia Murat fez um documentário, chamado “Olhar Estrangeiro” (5), na qual interroga os principais produtores, diretores, roteiristas e atores de filmes que tinham o Brasil como tema. Ao indagá-los a respeito da ideia que tinham do país, obteve respostas como exótico, festeiro e que havia cenas frequentes de mulheres de topless.
Murat também entrevistou moradores dos países em que o documentário foi gravado, França, Suécia e Estados Unidos, e recebeu as seguintes frases: “sei que o Brasil é forte no futebol”, “muitas mulheres na praia, usando biquíni e de topless”, “futebol, amor, romance e selva”, “eu não sei se eles trabalham, eles estão sempre de férias”, “eles fazem festas o tempo todo”.
O cinema brasileiro contribuiu muito para a criação desses estereótipos. Franthiesco Ballerini (6), discute os tipos de filme que fortaleceram a visão distorcida que os estrangeiros têm do Brasil. A começar pela ascensão da Carmem Miranda em Hollywood, formando a imagem de país das bananas e do samba. Anos depois o país foi marcado como ignorante e pobre pelo filme “O pagador de promessas”, escrito por Anselmo Duarte, onde teve um grande alcance no exterior, sendo premiado no festival de Cannes em 1962.
Dessa forma, percebe-se que o Brasil é um país muito rico, com inúmeras variantes culturais e isto precisa ser mostrado para o país e para o mundo, sendo que, uma das formas de isso acontecer é por meio do cinema. Essa representação do povo brasileiro é importante também para que haja uma mudança da visão estrangeira acerca do país, para que o todos percebam que o Brasil não se resume a futebol, samba e mulheres de topless. Toda essa dinâmica começa com o consumo das produções nacionais pelos próprios brasileiros, assim, fomentando o cinema nacional e aumentando a quantidade e a qualidade das produções. Mas para que haja essa mudança da perspectiva estrangeira, deve haver uma representação das pessoas e das culturas de forma fiel à realidade e não de forma caricata, reforçando os estereótipos.
Portanto, é de suma importância entender a necessidade de apoiar o cinema nacional, dado que as produções cinematográficas são a forma de consumo cultural mais escolhida entre a população brasileira. Da mesma forma, é fundamental verificar como que esses valores nacionais estão sendo transmitidos cinematograficamente, desse modo, a população, a sétima arte e de forma mais geral, a cultura do Brasil conseguirá ser mais reconhecida e compreendida.
notas
1
JLeiva é uma consultoria especializada em cultura, esporte e investimento social, que atende empresas, produtores, instituições públicas e privadas. Realiza também pesquisas e estudos nesses segmentos.
2
LIMA, Adriana (Org.). Anuário Estatístico do Cinema Brasileiro 2018. Brasília, Ministério da Cidadania, Ancine, 7a edição, 2019 <https://bit.ly/2OAIsdA>.
3
DURVAL, Nathalia. Se tiver de pagar por cultura, brasileiro dá preferência ao cinema. Folha de S.Paulo, São Paulo, 24 jun. 2018 <https://bit.ly/3jhkkur>. Acesso em: 24 mar. 2020.
4
ANDREW, Dudley. Cinema & Culture. Humanities, v. 6, n. 4, Washington, DC, ago. 1985, p. 24-25 <https://bit.ly/2B8J0UQ>.
5
“Olhar Estrangeiro”, direção de Lúcia Murat. Brasil, Europa Filmes, 2005, 70’.
6
BALLERINI, Franthiesco. Cinema brasileiro no século 21: reflexões de cineastas, produtores, distribuidores, exibidores, artistas, críticos e legisladores sobre os rumos da cinematografia nacional. São Paulo, Summus, 2012.
sobre os autores
Gabriel Augusto de Souza Santos, Larissa Rodrigues Lucas e Thalya Alves Coimbra são estudantes do 3º período de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS.