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Nabil Bonduki comenta o derretimento de políticas públicas e instituições construídas com muito trabalho desde a Constituição de 1988, cenário catastrófico onde se salvam apenas iniciativas pactuadas no Congresso Nacional e impostas ao governo.

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BONDUKI, Nabil. Cenário catastrófico da pandemia e do governo Bolsonaro. Derretimento de políticas públicas e instituições construídas desde a Constituição de 1988. Drops, São Paulo, ano 21, n. 154.08, Vitruvius, jul. 2020 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/21.154/7829>.


Pedestres usando máscaras, Brasília DF
Foto Marcello Casal Jr [Agência Brasil]


O cenário segue catastrófico, na pandemia, na economia, nas políticas públicas e na política. Gostaria de ser otimista, mas não enxergo mais um atalho capaz de indicar uma saída para a crise do país.

As mortes por Covid-19 batem recordes. Sábado, dia 25 de julho de 2020, a média diária semanal chegou a 1.097 óbitos confirmados, a mais alta desde o início. A pandemia está em expansão no país, com um crescimento de 8,1% em quatro semanas (em 27 de junho, a média diária semanal era de 1.014). Nesse ritmo, em 6 de agosto, quando se celebrará os 75 anos do lançamento da bomba atômica em Hiroshima, vamos “comemorar” cem mil mortos, número superior às vítimas do mais mortífero bombardeio da humanidade.

A naturalização das mortes tornou-se o novo normal. Antes era apenas Bolsonaro, que continua a zombar da prevenção, se aglomerando, contaminado e sem máscara, com garis e apoiadores. Agora são também governadores e prefeitos que, após o bom senso inicial, aderiram ao (quase) vale tudo. Apesar da aceleração da pandemia, insistem na reabertura da economia.

O negacionismo de Bolsonaro, a prevenção frouxa dos governadores e a incapacidade dos governos locais adotarem políticas públicas (de moradia, saneamento, mobilidade, assistência e de regulamentação da reabertura) capazes de minimizar a transmissão do Covid-19, apontam para um desastre.

Enquanto Bolsonaro “receita” cloroquina e vermicida, o governador Dória faz uma promessa irreal de vacina até o final do ano, contrariando as previsões da maioria dos cientistas. Esses sinais, assim como a flexibilização, confundem a população, gerando um clima de relaxamento e uma queda do isolamento social em todo o país. Esse abandono prematuro da quarentena, antes do arrefecimento da Covid-19, gerará uma aceleração de casos e mortes.

Como afirmou o infectologista e professor da USP, Marcos Boulos, do comitê de contingenciamento do coronavirus em São Paulo, “a abertura não é adequada enquanto tem transmissão importante”. Para ele, a crise já poderia ter acabado em junho se tivesse tido uma restrição importante, mas o aumento da circulação gera o prolongamento da pandemia.

Chegaremos ao pior dos mundos: nem saúde, nem economia. Um novo endurecimento do isolamento será necessário, a menos que se queira passar dos 200 mil óbitos, hoje uma previsão realista, para mais de quinhentas mil.

Além dos óbitos de pessoas, a mortalidade das micro e pequenas empresas segue acelerada, sem contar com apoio governamental. A pesquisa “Impacto da Covid-19 nas empresas” (1), realizado pelo IBGE, mostrou que 716 mil empresas fecharam as portas desde março de 2020, sendo que 522 mil afirmaram que a causa foi a pandemia.

Cerca de 20% das empresas do setor de bares e restaurantes já fechou, índice que deve alcançar 40% até o final do ano. Isso afeta a economia, mas também a identidade das cidades, pois são lugares de encontros que gera autoestima das pessoas. Álvaro Costa e Silva (2), listou mais de vinte bares e restaurantes tradicionais do Rio de Janeiro que não deverão mais abrir. Outros tantos, estão ameaçados.

A perda integra a destruição do patrimônio cultural e ambiental brasileiro, gerado pela combinação do coronavirus com o bolsonavirus. A desmonte dos órgãos e da política ambiental provocou um crescimento de 72% do desmatamento da Amazônia entre 2018 e 2020, enquanto as queimadas no Pantanal alcançaram nesse semestre seu pico histórico.

As pinturas rupestres da Serra da Capivara, no Piauí, estão em risco pela redução dos funcionários de segurança e manutenção. A caça ilegal de animais silvestres aumentou a tal ponto no Parque do Iguaçu, que o ecossistema está ameaçado. O patrimônio cinematográfico brasileiro pode se perder frente ao abandono da Cinemateca, cujo destino é incerto.

Para onde se olha, vê-se o derretimento de políticas públicas e instituições construídas com muito trabalho desde a Constituição de 1988. Apenas se salvam as iniciativas pactuadas no Congresso Nacional e impostas ao governo, como a Renda Emergencial e o Fundeb, que são posteriormente apropriadas politicamente por Bolsonaro.

A situação de guerra que vivemos exige um governo com credibilidade, criatividade, competência, conhecimento do setor público e diálogo com a sociedade para estruturar uma estratégia pactuada para enfrentar essa tripla crise.

Após 19 meses, o Bolsonaro e sua equipe mostraram que não têm condições para realizar em tarefa, até porque sua proposta é mais destruir e confrontar do que formular políticas pública. Após o confronto com as instituições provocadas pelos seus apoiadores e a detenção de Queiroz, o presidente recuou, temporariamente, dos seus propósitos mais radicais para solidificar seu apoio no Congresso para evitar o risco de um impeachment.

Como FHC, Lula, Dilma e Temer, ele se aliou ao Centrão e aos parceiros da bancada dos 3Bs (bala, bíblia e boi), ganhando respaldo parlamentar e político. Perdeu apoio na classe média lavajatista, mas angariou simpatia popular graças à Renda Emergencial, que caiu no seu colo sem querer e que ele tentará manter ao transformar o Bolsa-Família em Renda Brasil. E ainda, conta com parte dos adeptos das reformas neoliberais, que o enxergam como uma cunha para concretizar suas propostas.

O apoio popular segue sólido. Pesquisa do Instituto Paraná, divulgada pela Veja, mostra uma divisão na avaliação do governo, com uma desaprovação 48,3% e uma aprovação de 47,1%; 34,3% o considera como bom ou ótimo. Em relação às eleições de 2022, o presidente lidera em todos os cenários de 1º turno, com porcentuais que vão de 27,5% a 30,7% e venceria todos os seis possíveis concorrentes, inclusive Lula e Moro, no 2º turno.

As eleições estão ainda distantes, mas o quadro mostra Bolsonaro vivo e com chances reais de reeleição. As principais figuras históricas do PSDB (Serra, Alckmin e Aécio), veem-se (finalmente) às voltas com a lava-jato, contaminando a legenda. A centro-esquerda e a esquerda caminham cada vez mais divididas, como se vê nas eleições de São Paulo e Rio de Janeiro, apontando para um cenário mais de disputa do que de convergência. Se os projetos pessoais, os personalismos e as antigas divergências não forem superados para dar um rumo para o país, dificilmente escaparemos de um desastre.

Bolsonaro deu um passo atrás para ganhar força. Não pode ser subestimado. Em novembro, nomeará um ministro do STF. Em 2021, outro. Se um aliado conseguir se eleger presidente do Congresso e ele mantiver o apoio popular, poderá retomar sua ofensiva autoritária. E o futuro do país será incerto.

notas

NE – Publicação original do artigo: BONDUKI, Nabil. Enquanto o país derrete, Bolsonaro se consolida, a esquerda se divide e a Lava Jato chega ao PSDB. Folha de S.Paulo, São Paulo, 26. jul. 2020 <https://bityli.com/4QzBJ>.

1
PESQUISA PULSO EMPRESA. Impacto da Covid-19 nas empresas. Brasília, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 2020 <https://bit.ly/2Pbn4f7>.

2
COSTA E SILVA, Álvaro. A cara do Rio está sumindo. Folha de S. Paulo, São Paulo, 22 jun. 2020 <https://bit.ly/3febxGL>.

sobre o autor

Nabil Bonduki é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, foi relator do Plano Diretor e Secretário de Cultura de São Paulo.

Bar vazio, Rio de Janeiro RJ
Foto Tomaz Silva [Agência Brasil]

Incêndio em áreas florestais de Roraima
Foto José Cruz [Agência Brasil]

Enterro de indígenas mortos pela Covid-19, cemitério Parque da Saudade, São Gabriel da Cachoeira AM
Foto Paulo Desana – Dabakuri/Amazônia Real [Wikimedia Commons]

Parque Nacional da Serra da Capivara, São Raimundo Nonato PI
Foto Marcello Casal Jr [Agência Brasil]

 

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