Muitos lamentos em torno da mudança do Museu da Casa Brasileira para a Vila Mariana. Sou daquelas que sempre acharam que um museu dedicado a design deveria ocupar a Casa Modernista de Warchavchik, o que está em cogitação há muitos anos. Não com todo o seu acervo, mas apenas com aquele que se referenciasse na história desses modernos.
Além de revitalizar a casa e tornar-se parte de circuito museal (com o Lasar Segall ali perto), o MCB pode (acentuo o pode, isso não quer dizer que vai se realizar) encontrar vocação de verdade, longe da prática errática que o caracteriza.
Estudei em meu doutorado o Museu da Casa Brasileira desde sua fundação até depois que ele criou o prêmio Design (1). Meu foco era a musealização do design no Brasil, tema que escolhi só para ter o prazer de ser orientada pela professora Ciça França Lourenço. Li todas as atas de reuniões desde a fundação, percorri o que pude das exposições realizadas, das doações e aquisições.
O Museu, como tantos outros, tem trajetória errática. Um de seus grandes animadores, Ernani Silva Bruno, coletou informações etnográficas sobre a casa (paulista, brasileira?), que a diretora Marlene Acayaba publicou (2), aliás um dos maiores feitos do Museu.
Mas houve de tudo por ali, digo nos diversos caminhos que a instituição tomou, e o Facebook não é espaço para eu replicar resumo do capítulo da minha tese.
E o prêmio? Bem, tenho severas crítica ao regulamento e externei por diversas vezes minha preocupação. Acho que o prêmio de design deveria adotar as regras validadas internacionalmente pelas associações de designers e que estabelecem rigorosa diferença entre concurso e prêmio. Como está, ele não é nem uma coisa nem outra.
Quando vejo o rigor e a qualidade do grupo de pesquisa do Museu Paulista, sua preocupação com a cultura material (que inclui design) comecei a achar que este museu tomaria o lugar de debate que o MCB não conseguiu construir. Só para citar: o livro de uma das pesquisadoras de lá, Vânia Carvalho, Gênero e artefato (3), é das melhores contribuições ao pensamento de história do design que temos!
Fico contente com a mudança. Na Faria Lima, a dicotomia Solar Crespi Prado/MCB instaurou espécie de esquizofrenia museal. Espero que esta virada dê um arranque conceitual ao Museu, que a casa modernista passe por processo de revitalização, que seus jardins sejam cuidados e que a própria casa ofereça condições de debate sobre o projeto moderno no Brasil, o que não seria pouco!
No entanto a casa de Warchavchik e Mina Klabin é pequena, poderia se transformar em casa-museu, tentando preservar suas soluções. E não tem espaço para reserva técnica – o que a sede da Faria Lima também não tem.
Enfim, muitas questões, inclusive a amplitude da definição de design que pode ajudar a definir os objetivos do Museu.
notas
1
LEON, Ethel. Design em exposição: o design no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (1968-1978), na Federação das Indústrias de São Paulo (1978-1984) e no Museu da Casa Brasileira (1986-2002). Orientadora Maria Cecilia Franca Lourenço. Tese de doutorado. São Paulo, FAU USP, 2013 <https://bit.ly/44jodXE>.
2
MCB. Equipamentos da casa brasileira: usos e costumes. Arquivo Ernani Silva Bruno. São Paulo, Museu da Casa Brasileira <https://bit.ly/44i9uMg>
3
CARVALHO, Vânia Carneiro de. Gênero e artefato: o sistema doméstico na perspectiva da cultura material – São Paulo, 1870-1920. São Paulo, Edusp, 2021.
sobre a autora
Ethel Leon é pesquisadora e professora na área de história do design brasileiro, e autora dos livros Memórias do design brasileiro, IAC – primeira escola de design do Brasil, Michel Arnoult, design e utopia – móveis em série para todos e Design brasileiro – quem fez, quem faz.