Giuliano Pelaio: Explique-nos o que ocorreria se caso as interpretações e decisões projetuais a fim de se conseguir um projeto bioclimático forem equivocadas?
Luís de Garrido: O projeto simplesmente pode se comportar pior do que se comporta um edifício convencional. Portanto deve-se tomar cuidado e não cometer erros, nem fazer futilidades que só atinjam fins midiáticos.
O desconhecimento que se tem de bioclimatismo é tão grande que a partir da minha experiência posso afirmar coisas como:
Quanto mais um profissional fala de “ventilação cruzada”, “sistemas passivos”, menos sabe de bioclimatismo. Esse sujeito simplesmente acreditou no que leu em um simples manual. Manual que por sinal foi escrito, sem sombras de dúvidas, em outro país (normalmente Costa Rica ou França) por alguém que esteve lendo outro manual... e assim por diante até os anos 60. Como resultado, todo mundo fala da mesma coisa, sem ter provado nada de forma pessoal. Assim se perpetua a ignorância e a incompetência.
GP: Hoje tiramos da Terra 20% a mais do que podemos repor. Estamos frente a um problema que parece monumental e são poucos os que se sentem preparados para tal tarefa. Acredita no “ecocídio” como aquele ocorrido na Ilha de Páscoa para o nosso meio?
LG: Isso é um desafio muito mais próximo e possível do que parece. Nunca pensamos que um dia morreremos. E muito menos a sociedade pensa que perecerá. O fato é que todas as pessoas vão morrer (e nossa duração depende de como nos cuidamos), e todas as sociedades vão desaparecer (dependendo de como administrarem os seus recursos naturais).
O desenvolvimento econômico poderia seguir um modelo equivocado como o norte-americano, ou o chinês, o que aceleraria lentamente sua decadência.
O Brasil poderia criar um novo modelo autônomo de desenvolvimento sustentável, em equilíbrio com o seu ecossistema.
Uma tarefa difícil em um país onde se explora demasiadamente de forma absurda a floresta amazônica. Mas é possível.
GP: Infelizmente, o que tem fama de ecológico hoje no mercado é mais caro do que um outro produto semelhante que não carrega o mesmo “selo”. Por que isso ocorre? Como está essa relação dentro dos seus projetos? Eles conseguem ter um preço de construção competitivo?
LG: Os meus edifícios possuem um alto nível de sustentabilidade e custam menos que um edifício convencional, e mais, afirmo que uma arquitetura, se for mais cara que a convencional, simplesmente não é sustentável. O custo extra se deve a um conceito arquitetônico equivocado e a decisões precipitadas.
A origem da idéia de que a arquitetura sustentável é mais cara do que a convencional possui duas origens:
1. Muita arquitetura convencional é simplesmente muito ruim. Nem sequer satifaz minimamente as necessidades humanas. Portanto é barata, mas é precária.
2. Existe um conceito equivocado do que é arquitetura sustentável. As empresas de tecnologia desejam favorecer a venda de supostos produtos ecológicos e ter boas relações com os arquitetos. Portanto adotou-se a idéia mais cômoda possível de que a arquitetura sustentável é a mesma arquitetura convencional, mas repleta de “gadgets” sustentáveis (ar condicionado, sistemas domóticos, vidros especiais, materiais estranhos, tecnologias avançadas...). Portanto, ao acrescer coisas à arquitetura convencional, simplesmente o que se obtém é uma arquitetura muito mais cara. Esta arquitetura resultante nada possui de sustentável, e além disso é arquitetura de má qualidade.
A boa arquitetura e a verdadeira arquitetura sustentável é uma arquitetura diferente, melhor pensada, sem aditivos tecnológicos inúteis e sem materiais desnecessários.
Está na hora de deixarmos as bobagens de lado e fazermos uma boa arquitetura, longe das inércias dos arquitetos dinossauros, longe dos interesses comerciais e longe de propostas puramente visuais.
Os arquitetos devem deixar de brincar como crianças ignorantes, e irresponsáveis, e devem sim começar a se comportar como gente grande.