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interview ISSN 2175-6708

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A entrevista com Otília Arantes parte do livro “Berlim e Barcelona” e fornece chaves de leituras para discutir o papel do urbanismo contemporâneo, dos novos atores, da crise da forma urbana e as grandes transformações a partir dos grandes eventos.

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RETTO JR., Adalberto. Entrevista com Otilia Arantes. Entrevista, São Paulo, ano 14, n. 056.02, Vitruvius, out. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/14.056/4911>.


Palácio dos Esportes San Jordi, Olimpíadas de 1992. Arquiteto Irata Isosaki
Foto Abilio Guerra


Adalberto da Silva Retto Jr: Na sequência, o que a Sra. teria a dizer sobre as Olimpíadas, visto que foi um evento importante no processo descrito sobre Barcelona? E, como no Brasil, grandes eventos estão ocorrendo e outros serão realizados, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, quais são as consequências possíveis, positivas e negativas, que podem ocorrer nas cidades brasileiras, quando comparadas a exemplos já existentes?

Otilia Arantes: Como disse, as Olimpíadas, retomadas em Atenas, em 1896, tanto quanto a Copa do Mundo, no início do século 20, estarão, durante quase 50 anos, associadas às Grandes Exposições, talvez, segundo John MacAloon , como fruto natural dos novos símbolos e rituais inaugurados por estes festivais/espetáculos de eventos internacionais, devotados ao progresso da ciência, arte e indústria, e portanto à “inventividade”, da qual os jogos atléticos se apresentariam como expressões privilegiadas – algo como o “espírito esportivo” da modernidade (num paralelo com a religião enquanto “espírito do capitalismo”, na interpretação de Weber). Com a ascensão dos regimes totalitários de entre-guerras, no entanto, as Olimpíadas vão se transformando num espetáculo político de massa, revivendo sua origem ancestral: a exibição coreografada do aparato militar de dominação (como não hesita em afirmar Maurice Roche, antes de evocar o reencantamento bastardo do mundo como uma das características primordiais destes mega-eventos performáticos). O que vai culminar na Olimpíada de Berlim, em 1936. Se, depois da Guerra, estes espetáculos vão ganhando cada vez mais autonomia, não deixam de ser a expressão maior do poderio e da performance dos países ou cidades-sedes, no fundo replicando a espetacularidade, associada à disciplina de origem militar destes eventos. Portanto, permanência da matriz de 1936, mas agora combinada ao “espírito dos negócios”, pelo menos a partir da gestão do COI por Samaranch (de 1980 a 2001), figura de destaque do franquismo, responsável por transformar as Olimpíadas, de evento em geral deficitário (como ocorreu com Tóquio, Montreal, Munich, Moscou e Los Angeles), num empreendimento altamente lucrativo, através do recurso aos patrocínios e à mídia encarregada da transmissão dos jogos. Já então “o espírito esportivo”, de que falávamos, passa a funcionar cada vez mais na alavancagem da reprodução do capital, e, os eventos esportivos, como verdadeiros meganegócios, especialmente os ligados à FIFA e ao COI. A marca Olimpíadas vai assim ser explorada tanto pelas empresas (de natureza as mais variadas, mas especialmente as da mídia), quanto pelas cidades, que, obedecendo ao standard fixado pelo Comitê para uma cidade Olímpica (na verdade, sua transformção num grande Parque temático) com seus equipamentos, arquitetura, infraestrutura viária e turística, etc., pretendem atrair capitais e competir internacionalmente como um centro urbano capaz de oferecer vantagens especiais aos investidores, transformando-se portanto num importante ingrediente nas políticas de city marketing.

Estádio Olímpico de Pequim, o "Ninho de pássaro", com tocha olímpica ao fundo. Arquitetos Jacques Herzog e Pierre De Meuron
Foto de Mylena Fiori

As Olimpíadas passariam assim, após esse remanejamento empresarial de Samaranch, a ser vistas também, e de forma privilegiada, como uma “alavanca” fundamental às máquinas de crescimento urbano (ainda uma vez), ou seja, se transformam em instrumento importante para ativar os grandes negócios urbanos – não por acaso Barcelona adota o Planejamento estratégico, de matriz empresarial, às vésperas das Olimpíadas. O que, na verdade, não redunda obrigatoriamente em benefícios, inclusive financeiros, para a cidade-sede, nem mesmo no caso tido como o mais bem sucedido de todos, Barcelona 1992 (como tento mostrar nesse meu último livro). Independentemente das intenções dos que, na prefeitura, apostavam num urbanismo “cidadão” e advogavam uma gestão que contemplasse as verdadeiras necessidades de seus habitantes, o que vimos acontecer, em parte pela urgência de obedecer às exigências impostas pelo Comitê Olímpico (afinal foi Samaranch que conseguiu a vitória de Barcelona na competição por sediar os jogos) e a necessidade de fazer da cidade tanto um grande centro esportivo, quanto atraente aos investidores e turistas, obrigou-os a mudar na mesma escala o diálogo urbano, passando a negociar diretamente com os grandes operadores: “operações urgentes que deveriam eludir as mais lentas e conflitivas, com os pequenos operadores e com as reivindicações sociais”, como observa Josep Maria Montaner. Logo, as parcerias público-privadas foram assumindo um papel preponderante, nos moldes que se sabe: fundos públicos e ganhos privados; a tal ponto que, acabadas as Olimpíadas, o déficit público da cidade era superior ao total que ela poderia arrecadar em um ano (de acordo com historiadores do período) e muitas das obras sequer tinham sido concluídas, arrastando-se até quase o final da década. Um novo evento foi imaginado para novamente gerar investimentos e atrair mais turistas, o Fórum das Culturas, de 2004, cujo sucesso foi ainda menos significativo do que o do anterior – os tempos afinal já eram outros, nada tinham a ver com o boom econômico resultante da entrada no Mercado Comum Europeu, na década de 80, e que ajudou a patrocinar as Olimpíadas e outras tantas iniciativas similares, naquele mesmo ano de 1992, como a Feira industrial de Sevilha, Madri Capital Cultural da Europa, dentre as comemorações do Quinto Centenário do descobrimento das Américas. De qualquer modo, os investidores não deixaram de comparecer, Hines à frente, cercando a praça do Fórum, com shoppings, Hotéis e outros empreendimentos rentáveis.

Nada diferente está acontecendo ou vai ocorrer no Brasil, apenas com consequências mais desastrosas, dadas as condições sociais e econômicas do país, ou a total inexistência de infra-estruturas para por em funcionamento uma máquina como esta, tanto que já recebemos vários pitos e ameaças de retirar do Brasil seja a Copa, seja a Olimpíada. Só os gastos com os Estádios para a Copa já são um despropósito sem paralelo – nem a catástrofe que foi a da África do Sul teve a intensidade da que está ocorrendo entre nós. Desnecessário comentar, nestas alturas, fatos cuja aberração já esteve na pauta dos protestos durante as jornadas de junho, e que, com certeza, devem se intensificar até as Olimpíadas do Rio de Janeiro. A respeito de tudo isso há grupos de estudos em toda parte, para não falar dos comitês populares, igualmente estudiosos e combativos, especialmente no Rio de Janeiro, com dados precisos e de que não disponho. Confesso que já não tenho mais idade e ânimo para uma pesquisa detalhada que possa acrescentar algo ao que já vem sendo dito, até nas ruas...

Arena Mineirão para a Copa do Mundo de 2014, Belo Horizonte, 2012. BCMF Arquitetos / Bruno Campos, Marcelo Fontes e Silvio Todeschi
Foto Joana França

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Mariana Wilderom

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