Marcelo Bezerra: Essa questão de intuição, que você falou agora, ela é uma misto de transpiração e também de criatividade?
Sergio Rodrigues: Você tem a beleza que você está querendo, a cadeira tem que ser bonita porque senão não funciona. A cadeira não pode ser brincadeira, tem que ser cadeira mesmo, porque ela tem que ter determinadas características e ter alguma coisa a mais. Você poderia dizer, se for uma cadeira ideal, parou, não precisa fazer mais nada, não precisa desenhar mais nenhuma, vou fazer outra coisa, desenhar objeto para Marte. Mas a gente sempre procura alguma coisa melhor. E talvez fazendo assim, um detalhe que possa ter. A gente, por exemplo, está sentado em uma cadeira que ainda não foi completamente aprovada. Mas eu coloco aqui porque eu não tenho vergonha. Essa daqui, por exemplo, foi feita, também é um protótipo, mas que foi executada, foram mais de 300 cadeiras dessa, para a Manchete, no caso, das empresas Bloch. Eu fiz a cadeira, ainda estava testando, e fui viajar, quando cheguei, eles já tinham produzido um protótipo. Então essa cadeira daí tem uns problemas, e se eu fosse produzi-la novamente, ela tinha que ser menor, o assento tinha que ser menor, o encosto um pouco mais curvo e um pouco mais baixo para poder pegar adequadamente.
MB: Essa questão da inspiração vem de qualquer coisa? De algo visto?
SR: Eu sei o que você está dizendo. Às vezes a gente tem isso, eu digo, fico superexcitado quando vou a alguma exposição. Toda vez que eu faço uma viagem, quando volto penso em criar, eu digo que é impossível que a gente não possa ter alguma coisa nesse sentido, ou então fazer alguma coisa melhor, e aí fica procurando. E eu vendo outras coisas, às vezes vendo coisas ruins, eu digo porque que o pessoal não fez aqui uma coisa melhor.
MB: Em uma entrevista sua, na revista Arquitetura & Urbanismo, há um ano e meio, de novo vem aquela questão da adaptação ao nosso clima, as nossas características, a questão da brasilidade.
SR: Eu estou entendendo o que você está querendo dizer. Quando eu fiz a poltrona Mole eu nunca imaginei que fosse ganhar prêmio com ela. E essa coisa de brasilidade vem na própria premiação, no dia que levaram a poltrona para receber um prêmio internacional com 400 candidatos, trinta e tantos países, porque que a poltrona Mole ganhou: Aí eles disseram o seguinte, que foi a primeira e única peça que representava alguma coisa regional, que valorizava o regional. Porque as outras todas eram peças maravilhosas, mas nenhuma você podia identificar se era francesa, japonesa ou alemã. Eram boas, mas não tinham identidade. Na época estava começando a globalização, e eles começaram a dizer que tem valor é isso, valorizar a identidade local. Então eu comecei, dessa época em diante, a perceber, mas continuei imaginando, não porque era jacarandá, porque era palhinha, mas a poltrona Mole não tem nada disso. A poltrona era couro. Mas eles justificavam de que isso tinha alguma coisa de rede de índio, e essa grossura de madeira, era o lugar onde tinha muita madeira, para usar madeira daquela maneira, o pessoal todo estava procurando peças finas, e aquilo apresentado daquela maneira, só podia ser de um lugar dessa maneira, aí eles localizaram o Brasil. Daí passou a ser uma coisa muito interessante. Essa história de brasilidade, até então eu estava imaginando que só o brasileiro que produzisse aqui no Brasil alguma coisa nova, que poderia ser, eventualmente, chamado de brasileiro apresentasse alguns materiais típicos. Bem a gente ficaria daqui a 5 séculos tendo que usar o jacarandá, a palhinha, para ser alguma coisa brasileira.
Eu já vinha mergulhando em um estudo um pouco mais profundo. Você descobre que uma Lina Bardi, que veio em 1945 para cá. Ela se apaixonou de tal maneira pelo Brasil que ela produzia lá na Itália modelos italianos de primeiríssima linha, reconhecidos. Ela chegou no Brasil e começou a produzir coisas com o espírito brasileiro. O que seria esse espírito brasileiro? Era um espírito independente do modismo, da globalização.