Após a estreia do “Transa Marieta” no mês de abril passado (1), programa com personalidades da arte e da cultura contemporânea, o segundo episódio ocorreu no dia 12 de maio de 2020, com início às 18h30, com quase duas horas de duração, e foi transmitido ao vivo via Facebook, na página do projeto Marieta, chegando a mais de 1.000 visualizações e recebendo 48 comentários.
Nas semanas anteriores ao evento, Silvana Romano Santos fez extensa pesquisa da trajetória de Arrigo Barnabé, resgatando suas participações em obras próprias e como convidado nas áreas da música, cinema, teatro, rádio etc. Um artista de mil facetas surgiu após horas de pesquisa na internet, com leitura de artigos e livros, juntando um material suficiente para dezenas de entrevistas.
A seleção dos entrevistadores foi feita a partir desse critério: abarcar a multiplicidade de sua atuação artística, revelando não só a amplitude, profundidade e complexidade de sua capacidade criativa, mas também seu lado operário, que se aplica com enorme dedicação e seriedade a cada novo desafio.
Luiz Gê, seu grande amigo e parceiro de diversos trabalhos ao longo das décadas, cobriria sua conexão com as artes visuais em geral e a história em quadrinhos em especial. Carla Camurati, atriz e diretora de cinema e teatro, e parceira de trabalho em dois filmes, se incumbiria das recorrentes investidas de Arrigo na sétima arte, como ator, roteirista e compositor de trilhas sonoras. E sua atividade principal na área de música seria escrutinada pelos jovens e talentosos irmãos Sampaio – João, mais velho, atuante na área da música popular; Paulo, o mais novo, desenvolvendo estudos e composições na área da música erudita.
A conversa foi estruturada em três blocos temáticos – “Retratos de um artista quando jovem (católico)”, “A obra de arte na era da maquinização da vida” e “O artista na era da fakenização da sociedade” –, com a intenção de cobrir fases distintas de sua vida, permitindo a compreensão da formação e do desenvolvimento do artista ao longo das décadas. Nas perguntas imaginadas habitava o desejo que nas respostas do artista se revelassem aspectos internos – a invenção artística – e os aspectos externos da obra de arte – sua relação com a sociedade.
Três textos foram particularmente importantes para a estruturação dos blocos temáticos e de parte das perguntas: o artigo “O universo de Clara Crocodilo”, de Luiz Nazario (2); o livro autobiográfico O fim da infância, de Arrigo Barnabé (3); e o posfácio do livro de Arrigo, de autoria de Felipe Melhado, republicado de forma autônoma na revista Resenhas Online do portal Vitruvius (4).
No livro de Arrigo podemos acompanhar – ao menos em suas lembranças elaboradas – como as experiências da criança e do adolescente vão constituindo a sensibilidade e a visão de mundo do artista em formação. Nos conta, por exemplo, o despertar de seu interesse pela psicanálise ao assistir ao filme “Freud além da alma”, de John Huston, no início da adolescência, e, alguns anos depois, ao ler o livro Conversando com o homem dos lobos, de Karin Obholzer, que trata do famoso caso narrado por Freud em História de uma neurose infantil. Considerou que o livro seria “um bom material para uma ópera”, “uma ópera no divã”, com um título inspirado no caso freudiano: “O homem dos crocodilos” (5).
Felipe Melhado desenvolve a explicação de base psicanalítica, agora com auxílio de Gilles Deleuze, e sugere como o menino dócil de Londrina, que oscila entre os afetos alegres e a emoção triste, se transforma no adolescente transgressor, que busca escapar dos mecanismos de controle. “É Arrigo abandonando o compromisso familiar de cursar Engenharia Química ou Arquitetura, e por fim decidindo ser um músico, e ainda por cima de vanguarda” (6). Luiz Nazario tenta compreender a expansão da sensibilidade do artista no contato com a grande metrópole, a intuição aguda das relações contraditórias nas entranhas exploração capitalista, que produz, ao mesmo tempo, a realidade material dos bens de consumo e o universo anímico dos desejos e da alienação:
“Arrigo Barnabé rasga, então, o véu da imaginação, para oferecer a realidade em fotomontagens, instantâneos, reportagens, crônicas, fragmentos da surrealidade impressa no cotidiano. E basta ouvir essa estrofe: Ela era caixa num supermercado / Todo dia ela só apertava os botões / E aquelas máquinas cantavam, para que o sentido da alienação universal penetre em nós como uma faca” (7).
Quem for assistir à gravação da entrevista poderá escolher entre a transmissão original no Facebook (8), com o registro de comentários e perguntas encaminhados pela audiência, ou a versão disponibilizada no Youtube – e disponível no módulo 2 desta edição – e que torna acessível o conteúdo ao contingente expressivo de pessoas não frequentadoras de redes sociais. No módulo 3 está disponibilizado o roteiro da entrevista, que expressa a expectativa prévia do que ocorreria durante a entrevista, o que nem sempre foi conseguido, afinal a realidade tem sua própria dinâmica. A ficha técnica presente no módulo 4 traz informações sobre os participantes, sobre o evento e dados fartos sobre a trajetória de Arrigo Barnabé. Por fim, a função “como citar”, presente no menu em preto posicionado no lado superior direito, permitirá que os interessados façam a correta referência das falas de entrevistado e entrevistadores.
Segunda experiência ao vivo do coletivo, o programa “Transa Marieta” com Arrigo Barnabé é oferecido agora na forma de documento a todos os interessados em música, histórias em quadrinho, cinema, teatro e cultura em geral.
notas
1
O primeiro episódio do “Transa Marieta”, com Milton Hatoum, ocorreu no dia 20 de abril de 2020, com início às 18h30, e está disponibilizado no portal Vitruvius: GUERRA, Abilio; MASSI, Augusto; BUSSIUS, Julia. Milton Hatoum: literatura em tempos de cólera política e pandemia de coronavírus. Transa Marieta – episódio 1. Entrevista, São Paulo, ano 21, n. 082.02, Vitruvius, abr. 2020 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/21.082/7713>.
2
NAZARIO, Luiz. O universo de Clara Crocodilo. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n. 59, São Paulo, dez. 2014, p. 413-418.
3
BARNABÉ, Arrigo. O fim da infância. Londrina, Grafatório, 2012, p. 84-94.
4
MELHADO, Felipe. Como nascem os crocodilos? Vida e obra de Arrigo Barnabé segundo ele próprio. Resenhas Online, São Paulo, ano 19, n. 221.05, Vitruvius, maio 2020 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/19.221/7737>.
5
BARNABÉ, Arrigo. Op. cit., p. 51.
6
MELHADO, Felipe. Op. cit.
7
NAZARIO, Luiz. Op. cit., p. 416.
8
Transa Marieta #2 – Arrigo Barnabé com Carla Camurati, Luiz Gê, Irmãos Sampaio e Abilio Guerra <https://www.facebook.com/projetomarieta/videos/676429379858893/>.