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my city ISSN 1982-9922

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Leia o artigo de Edmundo Dias sobre a tranferência da sede do governo estadual de Minas Gerais para a Cidade Administrativa de Belo Horizonte e discute como fica a Praça da Liberdade e seus edifícios desocupados

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DIAS, Edmundo A.. A nova sede governamental de Minas Gerais e o Espaço Cultural Praça da Liberdade, em Belo Horizonte. Discurso e inconsistências. Minha Cidade, São Paulo, ano 11, n. 130.03, Vitruvius, maio 2011 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/11.130/3865>.



A mudança da sede do governo estadual para a Cidade Administrativa colocou desde o início, obviamente, a questão sobre as utilizações possíveis dos edifícios públicos da Praça da Liberdade. Uma das soluções mais atraentes que então se apresentava era a requalificação dos prédios que seriam desocupados com a transferência das secretarias governamentais, para que passassem a compor um circuito cultural. Foi o que se deu, e as obras da praça estão sendo feitas a partir de parceria com a iniciativa privada, a qual investiu, no projeto como um todo, cerca de R$90 milhões.

Embora preveja uma grande economia com aluguéis, o governo mineiro gastou, para a construção da Cidade Administrativa, mais de R$1 bilhão. É verdade que se fomentou, de modo muito positivo, o crescimento de Belo Horizonte pelo seu vetor norte, ao que se somam a implantação da chamada Linha Verde, melhorando a via de acesso ao aeroporto de Confins e, agora, a noticiada construção da Vila da Copa, um empreendimento da Prefeitura, com cerca de 74 mil apartamentos, parte deles destinada ao setor hoteleiro, que receberão os turistas da Copa de 2014.

A Praça da Liberdade representa, para Belo Horizonte – e, portanto, para todo o Estado –, um patrimônio urbanístico, histórico e cultural de grandeza exponencial, embora ainda carente do devido reconhecimento pelo Iphan. Com o novo circuito, o componente cultural preponderará sobre o político, e a praça atravessará suas ruas laterais para adentrar os prédios públicos que, agora, serão de uso comum de todos. Sobreleva-se, de outro lado, a utilização do valor publicitário contido no patrocínio da requalificação dos antigos edifícios, que passam a sediar equipamentos culturais vinculados aos nomes de grandes empresas particulares, o que expõe uma específica concepção do papel do Estado. Note-se também que a composição geral do circuito, com um museu das minas e do metal, um esperado planetário para a cidade, um memorial, um centro de arte popular etc., revela que não se pensou um projeto para, a seguir, implantá-lo. No caminho inverso, preencheram-se vazios deixados pela mudança das antigas secretarias. Em suma: à necessidade de ocupação de cada prédio, procurou-se ver o que se podia ajeitar junto à iniciativa privada. Não há, nesse sentido, um plano único, de partes coordenadas, mas sim projetos esparsos, desconectados e, por isso, inconsistentes sob um aspecto sistêmico.

Na verdade, o projeto principal era a transferência da sede do governo. Em sua concepção, os mais pobres são e seguem sendo um mero detalhe. Sente-se, nele, a ausência de transporte coletivo moderno, opondo-se, à falta de linha de metrô que atenda o local, os elevados custos de sua construção. A justificativa não guarda coerência com a bilionária cifra investida na Cidade Administrativa, já tendo sido apontado que os valores totais ali investidos, para além das edificações, ultrapassam a casa de R$1,6 bilhão.

Ainda assim, há outra externalidade positiva da mudança da sede do governo: Belo Horizonte passa a dispor de mais uma obra significativa com a singularidade do trabalho de Oscar Niemeyer; isso ficará aí, de fato, para as próximas gerações, aumentando o patrimônio construído da capital. Os mais sinceros admiradores do arquiteto – e incluo-me entre eles – devem, porém, saber reconhecer a existência de outros trabalhos seus que melhor conciliam boa solução arquitetônica com a esperada singeleza final da obra, mesmo em se tratando de criações que demandem uma escala monumental, como no caso de sedes governamentais. Não se apressem os entusiastas do projeto em dizer que o Estado tem agora, sob o Palácio Tiradentes, o maior vão livre do mundo. A ociosidade desse ineditismo homenageia perenemente – em cada grama extra do dispendioso reforço estrutural responsável pelo deslocamento de colunas para fora da projeção do prédio – o inexorável retardamento da diminuição de nossa desigualdade social. Para que os próximos governantes do Estado andem em um palácio suspenso, quantas mães terão deixado de contar com uma simples creche para suas crianças enquanto trabalham? Quantos leitos hospitalares e salas de aula não puderam ser construídos? Além disso, em pleno despertar da consciência da humanidade para os perigos do aquecimento global, aponta-se ainda a reconhecida incorreção ecológica de terem sido projetadas enormes paredes de vidro, que são competentes estufas que sobrecarregam o sistema de climatização. Não há nem mesmo os brises da escola modernista do mesmo Niemeyer, e que poderiam amenizar o problema.

Na boa parte velha de Belo Horizonte, após a implantação do “circuito cultural” da praça mais tipicamente belohorizontina, o Centro de Referência do Professor cederá lugar ao museu das minas e do metal. Para concretizar a transformação, foi inserida uma chamativa estrutura metálica vermelha, que desfigura o edifício, mas é legitimada pelo renome e pelo prêmio Pritzker ostentados pelo arquiteto que o projetou, Paulo Mendes da Rocha, responsável pela requalificação de outros prédios históricos, sobretudo na cidade de São Paulo. Como pôde o sistema mineiro de Justiça ignorar tamanho descuido ao patrimônio? É preciso ver que não basta a preservação formal da parte antiga de um prédio para respeitar-se o seu valor histórico-cultural. Há que preservar o seu entorno, poupando-o de novos acréscimos, pois o resgate da concepção arquitetônica primeira não prescinde dos espaços livres entre edifícios. A ampliação volumétrica do prédio reformado e a sua subsequente aproximação física com a biblioteca pública, que está logo atrás, acabam por comprometer o conjunto em sua harmonia anterior. Não nos esqueçamos de ouvir – ecoando nas obras mais significativas dos tempos passados – as palavras outrora proferidas na cidade onde hoje vivemos. Mas há de se procurar o tom original com que foram ditas, que é o que lhes mantêm a vitalidade do seu som, permitindo que se relacionem, de igual para igual, com as obras que lhe sucedam. Não sendo assim, aquelas se perderão na releitura que estas lhes façam: não serão mais aquelas, porém, e o nosso tempo calará o de ontem.

sobre o autor

Edmundo A. Dias é Procurador da República em Minas Gerais. Foi Promotor de Justiça substituto em Montes Claros – MG, onde atuou na Promotoria de Justiça de Defesa do Cidadão, tendo celebrado termo de ajustamento de conduta para a reconstrução do Solar dos Rego, ao lado da Igreja Matriz, hoje reerguido, e, ainda, termo de ajustamento de conduta visando ao plantio de árvores às margens do Rio Vieira, ao longo da Av. Sanitária daquela cidade, como efetivamente ocorreu. Foi Procurador do Estado de Minas Gerais e Promotor de Justiça adjunto do Ministério Público do Distrito Federal, onde atuou na Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística. Foi, também, Juiz Federal substituto na 4ª região, sediada em Porto Alegre (RS).

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