O desenrolar dos acontecimentos envolvendo a construção de uma estação de metrô em Higienópolis traz novos aspectos para o problema da (i)mobilidade urbana em São Paulo.
A recusa da estação por moradores de classe alta não se diferencia muito de ocorrências passadas e reafirma que o direito ao deslocamento rápido e confortável tem de ser conquistado. Por mais que o transporte individual por automóvel paralise as cidades, continua sendo um sinal de distinção social. Contudo, fatos novos surgiram nesta semana.
O primeiro foi a mobilização contra a mudança do projeto inicial da estação (na Rua Sergipe com a Avenida Angélica). Seguindo a onda das redes sociais, o protesto na forma do “churrascão da gente diferenciada” reuniu jovens de classe média, uma geração consciente de que São Paulo só tem futuro se mudar o paradigma de mobilidade urbana. Arriscaria dizer que apesar da classe social, são usuários de transporte público ou de meios não motorizados (ciclistas e pedestres), muitos com experiência de utilização das eficientes redes de transportes urbanos européias, para onde é cada vez mais fácil viajar.
A pesquisa realizada pelo Datafolha (publicada na edição de 17/05) também revelou dados interessantes de opinião pública. Ao contrário de algumas interpretações, dotar certas áreas ricas de bom transporte público beneficia quem nelas trabalha e não só seus moradores. Isso reverte os parâmetros de análise da injusta distribuição espacial dos investimentos em infraestrutura de transportes. Certo que falta metrô na zona Leste, mas os principais usuários dos trens da CPTM ao longo do rio Pinheiros não são os moradores das vizinhanças e sim aqueles que ali trabalham. Basta ver as direções dos deslocamentos das multidões de usuários nas proximidades das estações nos horários de pico.
A pesquisa demonstra a existência de uma relação direta entre a maior oposição à estação quanto mais próximo se mora do local proposto, permitindo outra interpretação além do preconceito social. A experiência urbana brasileira com os equipamentos de infraestrutura de transporte é lamentável. Em uma cidade na qual uma estação desmoronou durante a construção e o Minhocão ainda assombra os quarteirões onde passa, quem arriscaria?
sobre o autor
Renato Luiz Sobral Anelli, arquiteto e professor do Instituto de Arquitetura e Urbanismo, USP-São Carlos.