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O artigo aborda as experiências de sucesso no município de São Carlos no reaproveitamento e reciclagem de resíduos gerados em obras
BALDAN, Victor José dos Santos. Gerenciamento e gestão dos resíduos de construção civil. O exemplo de São Carlos. Minha Cidade, São Paulo, ano 13, n. 145.05, Vitruvius, ago. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/13.145/4461>.
Um dos principais problemas que afetam a qualidade de vida nos grandes centros urbanos é o volume de resíduos gerados diariamente. Em obras são gerados resíduos devido às perdas ou aos desperdícios do processo construtivo e o seu potencial de reaproveitamento e reciclagem é enorme. O presente artigo contempla as experiências de sucesso realizadas no município de São Carlos (SP) há quase uma década.
A Construção Civil é reconhecidamente uma das mais importantes atividades para o desenvolvimento econômico e social, e, por outro lado, comporta-se, ainda, como grande geradora de impactos ambientais, quer seja pelo consumo de recursos naturais, pela modificação da paisagem ou pela geração de resíduos.
Este setor tem um grande desafio: como conciliar uma atividade produtiva desta magnitude com as condições que conduzam a um desenvolvimento sustentável consciente, menos agressivo ao meio ambiente? É uma pergunta, embora antiga, ainda sem respostas satisfatórias. Sem dúvida, por ser uma questão bastante complexa, requer grandes mudanças culturais e ampla conscientização.
Assim, a Prohab São Carlos (Progresso e Habitação de São Carlos S/A), empresa mista da Prefeitura Municipal de São Carlos, por meio desta, assumiu o compromisso de enfrentar tal desafio. Ainda, a Prefeitura Municipal ao constituir a Coordenadoria Municipal do Meio Ambiente, fixou como diretriz, tratar as questões ambientais de forma proativa e abrangente, buscando soluções que abrangem toda a cadeia produtiva do setor. Para tanto, em conjunto com a Prohab, desenvolve diversas pesquisas com universidades, participa de fóruns para discussão e elaboração de legislações e normas técnicas, promove cursos e programas de capacitação sobre temas relacionados ao desenvolvimento sustentável e a educação ambiental.
Desde que implantou sua a Divisão Industrial – que compreende a Usina de Reciclagem de Resíduos da Construção Civil (U.R.E.) e a Fábrica de Artefatos Reciclados de Cimento (F.A.C.) – a Prohab São Carlos é responsável pela reciclagem de grande parcela dos resíduos de construção civil gerados pelo município, transformando os agregados (que são os resíduos beneficiados) em novos materiais de construção civil que podem ser utilizados em diversas obras, como habitações, sejam populares ou não, obras públicas, como praças e demais demandas da Prefeitura Municipal, entre outras utilizações na construção civil, como no reforço de base e sub-base para pavimentação.
Portanto, o incentivo à reciclagem deve ser então, uma parte importante de qualquer política ambiental. A solução dos problemas relacionados aos resíduos sólidos, em especial aos resíduos de construção civil e à limpeza urbana reveste-se de grande importância para a saúde pública, a conservação dos recursos naturais e a geração de energia, refletindo-se, de modo positivo, na qualidade de vida da população.
A construção civil, além de ser uma das mais antigas atividades do homem e, desde os primórdios, foi desenvolvida de forma artesanal, tem uma importante repercussão quer no consumo de recursos naturais, quer na geração de impactos ambientais, sempre gerando enormes quantidades de sobras de materiais.
Os entulhos são denominados pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) como resíduos da construção civil (RCC). Geralmente, esses resíduos são compostos por fragmentos ou restos de argamassa, tijolos, concreto, solos, metais, madeiras, gesso e plásticos, originários de desperdícios em canteiros de obras, demolições de edificações ou demolições resultantes de desastres.
Quando construímos ou reformamos quase sempre temos algum desperdício de material. Muitas vezes por falta de técnico responsável pelo acompanhamento da obra ou pela falta de planejamento adequado da quantidade de materiais a ser empregada na construção ou reforma, muita coisa é jogada fora, parte sem uso ou com a utilização errada. Estima-se que algumas obras apresentem até 30% de desperdício do material empregado.
No Brasil, os municípios coletaram mais de 33 milhões de toneladas de resíduos da construção civil em 2011, o que representou um aumento de 7,2% em relação a 2010. Uma média de 173 kg por pessoa ao ano.
O município de São Carlos, localizado no interior do estado de São Paulo, conta com mais de 220.000 habitantes e gera estimativamente, de 300 a 500 toneladas/dia de resíduos de construção e demolição. Por sua vez, através da Lei Municipal 13.867/2006, que institui o Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil e o Sistema para Gestão destes resíduos, juntamente com as políticas públicas desenvolvidas desde 2001, foi um dos primeiros municípios brasileiros a avançar no cumprimento da Resolução no 307/2002, do CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente.
O Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil e o Sistema para Gestão destes resíduos prevê, como seu próprio título já diz, que o município integre as ações de coleta, transporte e destinação dos resíduos da construção civil. Para tal, foram planejados dez Ecopontos – sendo que cinco deles já estão em funcionamento – e a operacionalização da Usina de Reciclagem de Resíduos da Construção Civil, da Fábrica de Artefatos Reciclados de Cimento e do Aterro de Resíduos da Construção Civil estão em perfeita sincronia.
Os entulhos, por sua vez, são encaminhados à Usina de Reciclagem de Resíduos da Construção Civil ou ao Aterro de Resíduos da Construção Civil. Os materiais recicláveis como papel, metal e plástico são encaminhados às Centrais de Triagem do Programa de Coleta Seletiva Solidária. O material sem possibilidade de reaproveitamento é levado para o Aterro Sanitário.
Ainda, cabe ressaltar, que a responsabilidade por esses descartes clandestinos não é só do poder público e deve ser compartilhada também com os geradores de resíduos, os quais devem fazer bom uso destes pontos.
Os resíduos da construção civil gerados na cidade de São Carlos são geralmente encaminhados aos Ecopontos ou coletados pelos caçambeiros ou carroceiros, que por sua vez, transporta o RCC para o Aterro de Resíduos da Construção Civil do município ou para a Usina de Reciclagem de Resíduos da Construção Civil, que é mantida pela PROHAB São Carlos, em parceria com a Prefeitura Municipal de São Carlos. Tal Unidade de Triagem e Reciclagem iniciou seu funcionamento em setembro de 2006, e é capaz de processar 160 toneladas/dia.
Diariamente, a Usina recebe uma média de 30 caçambas, estas com capacidade de quatro toneladas cada, resultando no recebimento 120 toneladas/dia de RCC. As experiências apontam que a Unidade de Triagem e Reciclagem da PROHAB São Carlos, processa aproximadamente 40% de todo o material recebido, totalizando o beneficiamento de quarenta e oito toneladas/dia – são reciclados diariamente tijolos cerâmicos, blocos de concreto e/ou cerâmicos, telhas, resíduos argamassados e outros semelhantes, provindos de demolições.
O material é entregue na Usina por caminhões, onde é realizada a separação, dividindo e classificando o entulho em grupos (concreto, ferragem, madeira, cerâmica, etc.). Na seqüência, os pertencentes aos grupos concreto e cerâmico, passam pelo processo de britagem e trituração, feitos por aparelhos instalados na própria Usina. Após essas etapas, o agregado é classificado e separado de acordo com sua granulometria.
Por sua vez, parte dos resíduos processados na Usina são transportados para a Fábrica de Artefatos Reciclados de Cimento, o que possibilita a produção de artefatos reciclados de cimento – blocos, canaletas, pisos intertravados para pavimentação (popularmente chamados de bloquetes ou pavers), mesas e bancos de praças, entre outros. A capacidade diária de produção da Fábrica, que opera desde junho de 2004, é de 3000 blocos, o que corresponde a construção de 02 casas populares por dia, ou ainda, pode confeccionar a quantidade de pisos intertravados suficiente para pavimentar um quadra por dia - 600 metros quadrados. Assim, para cada metro cúbico (1500 kg) de resíduos de construção civil, são produzidos 300 blocos de concreto; com 5 metros cúbicos de entulho (uma caçamba), é possível erguer uma casa popular.
A comercialização desses artefatos reciclados atende uma escala de demandas, suprindo primeiramente a Prefeitura local e demais órgãos públicos e posteriormente a comunidade em geral e os órgãos privados.
O grande diferencial desta Usina é a sua mão de obra operante – todos os processos da Divisão Industrial (que envolve desde a separação, britagem, trituração e confecção dos materiais) – são desenvolvidos por 14 pessoas, sendo estes, reeducandos (detentos) da Penitenciária “Dr. Antonio de Queiróz Filho”, localizada em Itirapina, cidade vizinha do município de São Carlos. A composição desta mão de obra é possível, graças à parceria da Prefeitura Municipal de São Carlos com a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo. Os benefícios proporcionados aos reeducandos são o fornecimento de sua alimentação, e transporte no local de trabalho, um salário que é depositado na conta da família, além de promover sua ressocialização. Atualmente, outras três empresas do município de São Carlos, contam com os serviços prestados por estes reeducandos.
Vale ressaltar que a redução, a reciclagem e o reaproveitamento do entulho beneficiam a sociedade como um todo, especialmente a população de baixa renda, que é a mais atingida pela questão da disposição inadequada de resíduos e a que mais necessita de materiais de construção de baixo custo. Os resultados expostos neste artigo demonstram a grande potencialidade das peças recicladas de concreto, com relação àquelas produzidas através de agregados naturais, podendo ser utilizadas em grandes escalas pelos profissionais da construção civil em seus diversos projetos.
Ainda, a reciclagem dos resíduos de construção e demolição, pode caracterizar uma fonte de geração de renda, estimulando grande parcela da população a trabalhar neste setor. Desse modo, todas essas ações, mais que atos de conscientização, constituem atos de cidadania.
sobre o autor
Victor José dos Santos Baldan é engenheiro da Prohab São Carlos (SP) e faz mestrado em Arquitetura, Urbanismo e Tecnologia pelo Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) da USP São Carlos.