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my city ISSN 1982-9922

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Andrey Rosenthal Schlee comenta a ignorância confessa do prefeito Eduardo Paes em relação ao valor histórico do Palácio Gustavo Capanema, que se tornou objeto de destaque ao ser considerado para venda em um Feirão de Imóveis proposto pelo Governo Federal.

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SCHLEE, Andrey Rosenthal. Oportunidade perdida (mais uma...). Ignorância e ignorância assolam o Palácio Capanema. Minha Cidade, São Paulo, ano 22, n. 253.11, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8235>.


Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos
Foto Nelson Kon


Em sua edição de número 63, datada de 4 de julho de 1953, a revista Manchete publicou matéria de página inteira assinada por Lucio Costa. O título, ainda hoje chama atenção: “Lucio Costa defende a nossa arquitetura moderna. Oportunidade perdida". A polêmica que motivou tal manifestação estabeleceu-se a partir da divulgação, no mesmo periódico, mas em edição de 13 de junho daquele ano, da entrevista de Max Bill concedida à Flávio de Aquino. Revoltado com as palavras pouco elogiosas e repletas de preconceito, Lucio Costa resolveu falar (ou escrever).

O que surpreende na famosa entrevista de Max Bill é a sua ignorância confessa, próprio de quem não conhecia a nossa arquitetura. Sobre o edifício sede do Ministério da Educação e Saúde Pública do Rio de Janeiro – Mesp, atual Palácio Gustavo Capanema, o suíço afirmou que já havia lido “quase tudo” que se publicara no exterior e que conhecia “apenas a decoração externa” do edifício, ou seja, os jardins e os azulejos. Sobre a avaliação do visitante, basta lembrar que considerou os painéis de Portinari, ainda hoje expostos publicamente, “inúteis” (1).

Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos
Foto Nelson Kon

Por sua vez, Lucio Costa – figura chave na elaboração do projeto do Mesp – entre outras coisas, argumentou que se tratava do “edifício público mais acolhedor do país, concebido em função do homem e à sua escala, sem embargo da intenção monumental”, naquele momento já consagrado pela crítica internacional como “um dos marcos fundamentais da Arquitetura Contemporânea” (2).

Passados 68 anos das citadas publicações, a ignorância e a falta de conhecimento voltam a atacar o Mesp. Obra emblemática do ministro Gustavo Capanema – quando se acreditava na Educação, investia na Saúde e apostava na Ciência e na Cultura – o edifício foi projetado em 1936, inaugurado em 1945 e reconhecido como Patrimônio Cultural da nação em 1948.

Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos
Foto Nelson Kon

Em pleno agosto de 2021, entre tantos absurdos e retrocessos que irão, historicamente, caracterizar o fracassado governo Bolsonaro, veio à tona o chamado “Feirão de Imóveis” da Secretaria do Patrimônio da União – SPU e do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS na cidade do Rio de Janeiro. A questão fundamental não é o leilão, mas a maneira irresponsável e criminosa como vários edifícios tombados a nível federal (ou seja, protegidos via Decreto-lei nº 25 de 1937) estão sendo considerados. Entre eles, o Palácio Capanema. Embora o Mesp, não conste da lista preliminar disponibilizada pelo Ministério da Economia, do material de divulgação do leilão consta que as propostas de aquisição podem ser feitas para “qualquer outro imóvel de interesse não relacionado” (3).

A insensata pretensão de alienar um dos mais importantes edifícios da arquitetura internacional – projeto de Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira e Ernani Vasconcellos; que contou com a consultoria de Le Corbusier paisagismo de Roberto Burle Marx, azulejos e painéis de Cândido Portinari, além de pinturas ou esculturas de Alberto Guignard, José Pancetti, Bruno Giorgi, Adriana Janacópulos, Jacques Lipchitz e Celso Antônio – resultou de enérgica manifestação de personalidades do mundo da cultura e, particularmente, de um expressivo número de instituições, historiadores e críticos de arquitetura mundo a fora.

Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos
Foto Nelson Kon

Surpreendentemente, na mesma linha verborrágica e irresponsável que caracterizada o atual Presidente da República, manifestou-se o Prefeito do Rio de Janeiro. Pretendendo ser irônico, Eduardo Paes, afirmou que “Que ali [no Capanema] não existe público mais estatal do aquele Palácio [..]. A gente precisa entender quando a gente fala de equipamento público, que o conceito de público não é estatal, é para gente frequentar [...]. Se tem um Portinari lá dentro, é importante que o público tenha acesso [...]. Eu, como autoridade, só entrei uma ou duas vezes no Capanema” (4). Assim, quando impera o desconhecimento e a falta de informação, abre-se a possibilidade de liquidar o que é “estatal”, com a calhorda desculpa de tornar a coisa, que é de direito pública, em coisa privada! Como diria, mais uma vez Lucio Costa: “oportunidade perdida”, desta vez, de ter ficado calado e não ter demostrado, publicamente, a sua ignorância.

Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos
Foto Nelson Kon

Para quem ainda não sabe, ou faz questão de não saber, o Palácio Capanema encontra-se em delicado processo de intervenção de conservação, que começou com a troca dos elevadores e, gradualmente foi ampliado, abarcando recuperação dos terraços jardins, do sistema de proteção solar, dos panos de vidro, dos painéis de azulejos externos e, finalmente, dos diferentes pavimentos. O processo de retirada dos servidores do extinto Ministério da Cultura e dos diferentes acervos até então alojados na edificação só iniciou em agosto de 2016. A locação temporária do Teleporto (que garantiu a continuidade das atividades) ocorreu em final de dezembro, a mudança iniciou em janeiro e foi até abril de 2017. Portanto, não estamos falando de um edifício sem uso! O Palácio Capanema tem função estabelecida, historicamente consolidada, abrigando inúmeras unidades de instituições culturais das mais relevantes do Brasil, como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, a Biblioteca Nacional, a Fundação Nacional de Artes – Funarte, a Casa de Rui Barbosa. Espaços, arquivos, bibliotecas, auditórios, centro de formação – todos visitáveis – acessíveis ao público em geral. Se a questão é ampliar a apropriação social do monumento, ótimo! Mas não vamos utilizar uma intervenção de conservação como desculpa, esfarrapada, para liquidar com a memória nacional.

Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos
Foto Nelson Kon

notas

NE 1 – o documento “Heritage under siege in Brazil – the Bolsonaro Government announced the auction sale of the Palácio Capanema in Rio, a modern architecture icon that was formerly the Ministry of Education building”, redigido pelo Docomomo Internacional e Brasil, pode ser lido e assinado no link <https://bit.ly/3D7bglQ>.

NE 2 – sobre o tema, veja a série de artigos:

CAU/BR, Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil; et. al. “O MEC não pode ser vendido!”. Manifesto contra ameaça de venda do Palácio Capanema. Drops, São Paulo, ano 21, n. 167.06, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/21.167/8203>.

COMAS, Carlos Eduardo. Equipamentos, documentos, monumentos, desgovernos. A desventura do Palácio Capanema. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.10, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8226>.

CURTIS, William J. R. A destruição da memória. Contra a privatização de um importante monumento histórico e cívico. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.07, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8220>.

DANOWSKI, Miriam. Memória ameaçada. Governo federal continua evasivo sobre o destino do Palácio Capanema. Minha Cidade, São Paulo, ano 22, n. 254.01, Vitruvius, set. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/22.254/8239>.

FRAMPTON, Kenneth. Carta de Kenneth Frampton a Ana Tostões e Renato Gama-Rosa Costa, presidentes do Docomomo International e Brasil. Palácio Capanema em risco. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.06, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8218>.

HATOUM, Milton. Palácio Capanema. O difícil processo de alfabetização. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.12, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8234>.

LIERNUR, Jorge Francisco. Lembrete para autoridades sem memória, e sem juízo. O Palácio Capanema não é mercadoria. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.08, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8223>.

MONTANER, Josep Maria. A venda do Palácio Capanema é um ultraje e uma insensatez. Carta aos arquitetos Carlos Eduardo Comas e Abilio Guerra. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.09, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8225>.

ROLNIK, Raquel. Feirão de um sonho de país. Palácio Capanema à venda. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.03, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8204>.

SCHLEE, Andrey Rosenthal. Oportunidade perdida (mais uma...). Ignorância e ignorância assolam o Palácio Capanema. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.11, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8235>.

TOSTÕES, Ana; COSTA, Renato da Gama-Rosa; INTERNATIONAL, Docomomo; BRASIL, Docomomo. Patrimônio sob cerco no Brasil. Palácio Capanema à venda. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 253.04, Vitruvius, ago. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.253/8216>.

1
BILL, Max. Max Bill critica a nossa arquitetura. Entrevista a Flávio de Aquino. Revista Manchete, n. 60, Rio de Janeiro, 13 jun. 1953, p. 38.

2
COSTA, Lucio. Lucio Costa defende a nossa arquitetura moderna. Oportunidade perdida. Revista Manchete, n. 63, Rio de Janeiro, 4 jul. 1953, p. 49.

3
BRASIL. Feirão de imóveis SPU e INSS, Rio de Janeiro. Brasília, Ministério da Economia, 2021.

4
Discurso de Eduardo Paes no lançamento do “Feirão de Imóveis”, Rio de Janeiro

sobre o autor

Andrey Rosenthal Schlee é mestre e doutor em Arquitetura e Urbanismo. Professor da UnB e ex-diretor do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

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