O módulo, a rua-praça
A área selecionada situa-se dentro de uma malha urbana configurada por lotes de tamanhos e características diversas, acolhendo desde de casas térreas a galpões industriais. Essa complexidade de usos e escalas e a inclusão desses terrenos numa ZEIS (Zona Econômica de Interesse Social) do Plano Diretor de São Paulo, torna-a alvo de um planejamento urbano amplo e cuidadoso.
Nessa área, onde se encontra o projeto em questão, destaca-se uma rica vocação à diversidade que justifica a elaboração de um plano maior, a partir de projetos que ilustrem esse cenário em sua totalidade, abrigando equipamentos, infra-estrutura adequada e empreendimentos que respondam da melhor forma possível às necessidades da área e sua inserção na cidade.
Implantação
A implantação do complexo habitacional integra-se com a vila operária existente, tombada pelo patrimônio histórico. A vila Maria Zélia é composta de casas em sua maioria térreas, criando gabaritos característicos que emolduram as ruas e configuram um espaço urbano peculiar. Perpendicular a essas ruas, uma outra delimita o fim da vila, dando acesso a um antigo armazém, uma igreja e um outro edifício em ruínas. Do outro lado da rua, uma praça que se defronta com grades, delimita o fim da área, significando uma barreira que priva a cidade do valor desse espaço.
O projeto propõe restauro e utilização desses três edifícios como um centro cultural e comunitário à região. A implantação reconhece esse espaço urbano como fundamental à organização da nova área a ser configurada, devolvendo-o à cidade, tornado-a mais rica a partir de elementos vivos que se cruzam e reconectam escalas de transição da metrópole e do local.
Densidade
A questão da densidade reconhece a realidade de São Paulo, mas também o fato de que densidades maiores otimizam o uso da infra-estrutura urbana existente.
Partindo do conceito de um elemento de fácil montagem-desmontagem, identifica-se uma forma de utilização do módulo proposto e seu contexto urbano adequado à realidade e escala locais. A partir das características da área organizam-se espaços internos-externos.
A partir de um módulo de 30 m² incorpora-se a rua como praça, são 32 m² por unidade de espaço de lazer. Além disso, nessa organização do espaço optou-se por um ambiente com densidade condizente às questões do lugar, com a vantagem do fácil acesso aos espaços públicos e do ganho pela forma de implantação.
Unidade de vizinhança
A permeabilidade (relação dentro-fora) do módulo de 30m2 cria uma área muito maior, absorvida pela mescla das atividades exercidas ao longo do dia. O espaço urbano é esculpido pelo edifício, negativo da habitação, prolongamento da casa.
Também fundamental à existência dessas áreas de convivência, os interiores das ‘quadras’ (oito módulos) formam um quintal comunitário, uma horta onde se pratica permacultura.
Unidade
O conceito é um kit montável, constituído de peças ambientalmente adaptáveis. As peças têm dimensões máximas de 3x3m, e podem ser montadas rapidamente por qualquer um, fixando as peças a uma fundação previamente preparada.
Os painéis conectam visualmente dentro-fora e possibilitam fácil acesso às áreas externas. Isso amplia a área efetiva da unidade, estimulando o convívio social e a unidade de espaço.
Flexibilidade
A unidade se propõe à adaptação a condições ambientais diversas, baseadas no principio da implantação.
Os critérios adotados propõem a criação de espaços públicos que conectam a cidade existente ao empreendimento. A criação de áreas restritas destinadas à permacultura e de ruas-perfis valoriza ao máximo o espaço público como um local de convivência.
Além disso, os critérios solar e de ventilação são fundamentais ao bom funcionamento e qualidade em conforto ambiental aos moradores.
A densidade entra como conceito essencial à justificativa da escolha pelo elemento térreo. Ela demonstra uma opção consciente aos contextos propostos, permitindo vantagens como a conexão direta com o espaço externo, dado fundamental ao projeto.
Qualidade ambiental
Os mecanismos utilizados têm a intenção de diminuir os gastos energéticos e otimizar a qualidade ambiental.
Na unidade de habitação isso ocorre a partir:
1. dos painéis móveis de fechamento que controlam a incidência de luz direta e indireta, funcionando como uma pele protetora no verão, e como um elemento de ganho de calor no inverno; das dinâmicas das aberturas, que permitem ventilação cruzada tal como por diferença de altura (efeito chaminé).
2. do sombreamento da cobertura por uma malha metálica.
3. dos painéis de concreto de 20cm de espessura preenchidos com uma camada de materiais isolantes que protegem o interior das unidades a partir do conceito de massa térmica.
4. da coleta de água, filtrada pela tela, recebendo o devido tratamento, ilustrando os espaços públicos.
Espaço Como Conjunto
O espaço criado pelos critérios de implantação confere afastamento suficiente à garantia da insolação necessária, tal como da ventilação.
Além disso, desenha o espaço urbano como um tecido drenável, onde o automóvel não tem papel fundamental. O adensamento, possibilitado pela centralidade do local e proximidade a meios de transporte que conectam a cidade, transforma o pedestre no elemento norteador do desenho urbano na escala do projeto.
As áreas verdes e espaços de lazer dividem-se hierarquicamente, entre públicos (ruas-praças e parques) e privados (permacultura).
O resultado é um espaço orgânico e fluido, garantido pela ordenação do verde e das questões ambientais trazidas ao desenho e a ordenação da leitura de malhas aparentemente ortogonais, existentes e propostas, que reconhecem prioritariamente o pedestre em todos os seus percursos.
ficha técnica
Universidade de São Paulo / São Paulo BrasilOrientador: Márcia Peinado Alucci