O tema
Um dos problemas mais complexos da sociedade brasileira é a habitação para a população de baixa renda, cuja solução envolve aspectos econômicos e políticos.
Apesar dos vários programas implantados pelos governos para a produção de habitação popular, o problema persiste e é grande o déficit habitacional em todas as grandes cidades do Brasil.
“Com a extinção do BNH em 1968 desestruturou-se a política habitacional do país. A partir de então o Estado se exime da responsabilidade de financiar de alguma forma programas habitacionais para a população de baixa renda. Além disso, as diferentes iniciativas realizadas atenderam efetivamente muito pouco a essa população. Os programas implantados atualmente são pontuais, com a participação de algumas administrações municipais e estaduais que incluíram em sua política essa preocupação urbano-social.” (FOLZ, 2003)
Criar propostas inovadoras visando a solução do problema da habitação popular no Brasil é função dos governantes juntamente com profissionais da área de arquitetura e urbanismo.
Fundamentação
Na maioria das cidades brasileiras a população de baixa renda normalmente reside na periferia – locais com infra-estrutura básica (água, luz, esgoto) - mas distantes dos locais de trabalho e muitas vezes carentes de escolas, hospitais lazer, além de transporte deficiente. Ou residem em favelas, que apesar de privadas de infra-estrutura básica, estão muitas vezes localizadas próximas aos centros urbanos, podendo usufruir com mais facilidade de seus serviços. O objetivo é preservar a cidadania dessa população, trazendo-a para locais onde poderá usufruir toda infra-estrutura do meio urbano, ao invés de segrega-la na periferia
Existem dentro do perímetro urbano de Belo Horizonte áreas residuais – muitas vezes localizadas em locais com boa infra-estrutura – que estão desocupadas devido à sua topografia desfavorável. A ocupação desses terrenos, quando ocorre, acontece de forma inadequada, como construções com grandes fundações a céu aberto, com a real ocupação ocorrendo somente a partir do nível da rua. Ou então através de profundos cortes no terreno e construção de enormes muros de arrimo, caracterizando uma violenta agressão ao terreno e conseqüentemente ao meio ambiente.
Este projeto propõe, através de uma solução tecnológica inovadora a inserção, em terrenos desse tipo, de núcleos habitacionais para população de baixa renda.
Para aplicação prática da proposta, foi escolhido um terreno no Bairro Luxemburgo, na zona sul de Belo Horizonte, que atende aos requisitos básicos exigidos pelo projeto.
O projeto
O partido adotado se baseia no escalonamento da edificação, seguindo o desenho natural do terreno, com pouca ou nenhuma alteração da topografia original.
A construção é suspensa, criando naturalmente uma galeria técnica onde se poderá instalar toda a tubulação hidráulica, facilitando sua manutenção. O espaço sob a edificação possibilita ainda a criação de um sistema de ventilação para os apartamentos e a manutenção da permeabilidade do solo.
A disposição das unidades escalonadas ocorre em patamares horizontais que incluem uma circulação frontal aos apartamentos, onde surgem naturalmente áreas de socialização, encontros e permanência, com playgrounds, bancos, jardins, além de escadas fazendo a ligação entre um patamar e outro.
A circulação horizontal se comunica com a circulação vertical localizada na lateral direita, constituída por escadas que percorrem todo o conjunto. Ao lado das escadas, existe uma rampa onde circula um bondinho, que possibilita a acessibilidade e o transporte do lixo até as ruas.
Este assentamento da edificação de forma escalonada apresenta uma vantagem em relação aos edifícios convencionais, pois não se caracteriza como uma barreira entre uma quadra e outra, permitindo maior visibilidade entre as mesmas.
As garagens, com 85 vagas estão localizadas no alto, com acesso pela rua acima do conjunto, e em baixo, com três níveis, com acesso pela rua localizada na parte mais baixa do conjunto.
Captação de água pluvial/depósito ao solo
Vigas calha captam a água que vem das lajes com vegetação, esta água vai para os pilares (furados) e então depositada no solo.
Os apartamentos
As áreas dos apartamentos variam entre 40m², 48m² e 58m² e as unidades são dispostas nas plataformas horizontais lado a lado, tendo à frente a circulação e ao fundo a galeria técnica.
Essa disposição permite que o usuário possa expandir seu espaço, ocupando áreas pertencentes aos apartamentos vizinhos ou ainda à sua frente, em espaços destinados à expansão.
Como as divisões internas não são rígidas, o layout do apartamento pode ser modificado pelo usuário, como também pode sofrer alterações para se adequar às mudanças do seu modo de vida.
O espaço proposto é também extremamente adequado para a instalação de atividades comerciais comuns em ocupações dessa natureza, como pequenas oficinas, sapateiros, costureiras, e até mesmo empreendimentos como mercearias, sacolão, entre outros.
Os núcleos hidráulicos dos apartamentos – idênticos e compostos de instalação sanitária, cozinha e área de serviço – são agrupados aos pares nas plataformas e alinhados de cima a baixo do conjunto, possibilitando sua alimentação que é feita através de uma caixa d’água localizada no alto, sendo uma para cada prumada hidráulica.
Sistema construtivo
O sistema construtivo é todo constituído de peças pré-fabricadas de concreto de pequena dimensão, para melhor adaptação à topografia do terreno e também para facilitar a execução exigindo máquinas de dimensões menores.
As peças são todas tipo padrão do fabricante, com exceção de uma, criada especialmente para este projeto e que possibilita a execução das escadas, guarda corpo, piso elevado, caixa d’água e bancos.
A modulação dos apartamentos é função da dimensão da laje – 1,25m – evitando desperdício. Cada módulo mede 3,32m, semdo composto por duas larguras e meia de laje.
As alvenarias são executadas pelo sistema dry-wall, com perfis de aço galvanizado revestidos com gesso, OSB ou placa cimentícia, dependendo do local da obra.
As esquadrias, portas e janelas são do sistema de correr por dentro das paredes.
Sustentabilidade
O empreendimento ocorre de maneira sustentável, pois mantém o terreno em sua topografia original e garante sua ventilação e umidade através dos buracos existentes nas lajes. Os canteiros sobre as lajes nas circulações horizontais, além de contribuírem para o conforto térmico com sua vegetação, captam a água das chuvas que descem até o solo através dos pilares vazados, outra contribuição para manter a umidade do solo.
A opção pelo uso de processo industrializado de construção, com estrutura em pré-fabricados de concreto e vedação em sistema “dry wall”, além de possibilitar a produção em larga escala, proporciona, por ser um sistema construtivo a seco, uma obra limpa e sem desperdício.