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CORINALDI, Vittorio. Nazareth: urbanismo e lugares santos. Arquitextos, São Paulo, ano 01, n. 006.02, Vitruvius, nov. 2000 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/01.006/955>.

A cidade de Nazareth neste ano 2000 está sendo foco de grande afluência de peregrinos, em comemoração aos 20 séculos do Cristianismo. Nazareth é hoje o maior centro urbano de população árabe em Israel. As atenções de que vem sendo objeto para poder responder ao citado fluxo turístico, põem em evidência não só o problema específico da cidade, como também uma crônica situação de "enfermidade" em que se encontram praticamente todas as entidades municipais do setor árabe deste país.

Para analisar objetivamente essa situação, creio necessário citar alguns fatos poucos conhecidos ou pouco lembrados – apesar da freqüência com que tudo o que se refere ao Oriente Médio ocupa os títulos da imprensa mundial.

Com o estabelecimento do Estado de Israel em 1948, uma grande parte da população árabe da então Palestina abandonou as cidades e povoados onde vivia: incitada não pouco por uma propaganda hostil que prometia um rápido e triunfal retorno aos territórios de onde os judeus seriam definitivamente expulsos, mas também (forçoso é dize-lo) apavorada por casos de violência bélica por parte de combatentes judeus, que então se empreendiam numa luta desigual e desesperada, imbuídos por um sentimento de fatalismo, explicável pelo recente Holocausto da segunda guerra mundial. Para esses combatentes, e para a totalidade da população judaica e sua liderança política, o trauma da aniquilação em massa de um terço do povo judeu fazia da criação a qualquer preço de uma base estável para as massas dispersas e perseguidas uma necessidade urgente e inadiável.

Deste processo tão carregado – de ambos os lados – de um triste contingente de tragédia, nasceu um dos problemas de que muito se falou em todos os meios da opinião pública e da política internacional no ultimo meio século: o problema dos refugiados palestinos.

Este êxodo dos árabes porém não foi fenômeno generalizado, nem atingiu igualmente todos os setores e todas as camadas da coletividade árabe: esta não era e continua não sendo homogênea, diferenciando-se pela estrutura econômica (urbana e rural, mercantil e artesanal); pela filiação religiosa (muçulmana e cristã); e até mesmo por características étnicas e culturais (os Beduínos, por exemplo, são um grupo muito especial dentro da comunidade árabe: embora muçulmanos, caracterizam-se por costumes e tradições próprios, arraigados em sua origem nômade e tribal. Somente nos últimos tempos verifica-se entre eles um fenômeno de sedentarização e assimilação gradativa de hábitos da civilização ocidental).

Depois da criação do estado de Israel, alguns núcleos de população árabe permaneceram no país e foram por etapas aceitando a realidade da existência de uma estrutura nacional judaica, dentro da qual se constituíram como uma minoria reconhecida, com direitos civis, religiosos, culturais etc.

Apesar de se considerarem parte integrante da nação árabe palestina, assumiram a cidadania israelense e desenvolveram sua vida no contexto econômico, político e cultural israelense. Não se trata de um processo fácil e seria demagógico afirmar que a sociedade israelense (de um modo geral caracterizada por uma concepção de mundo democrática, humanista e liberal) aceita o fenômeno de uma forma totalmente isenta de discriminações: compreensíveis estas, mesmo se não justificáveis, pela prioridade que o estado judeu procure outorgar aos problemas prementes da população judaica: problemas que surgem com a concentração das diásporas dispersas; com a constante tensão de segurança e a ameaça terrorista; com a existência de questões sociais e econômicas complexas.

Mas igualmente seria tendencioso ignorar o indiscutível progresso material por que passou essa comunidade árabe – mesmo comparando sua situação com a de seus irmãos em outros países da região. E nada o demonstra melhor do que o visível surto de construção e desenvolvimento que se observa na parte dos assentamentos árabes, cidades e povoados.

Ora, todo o processo de desenvolvimento físico, uso do solo, urbanização, construção, infra-estrutura viárias, de transporte, comunicação, saneamento, energia, etc. – é regido em Israel por uma legislação moldada nos padrões britânicos do período do Mandato inglês, de cuja aplicação é encarregado o Ministério do Interior.

Ele se materializa na oficialização de planos diretores que vão descendo na hierarquia administrativa e se alargando na medida do detalhamento – desde o nível nacional (o plano "Israel 2020", que vem substituir o anterior e caducado Plano Nacional, acaba de ser divulgado), e através de Planos Regionais, passando por planos Municipais das várias cidades e centros rurais, e terminando em planos detalhados de setores definidos de cada núcleo habitado.

Mas a construção Árabe – seja nas cidades como Nazareth, Iafo (Jaffa), Haifa, Acco (São João de Acre), Jerusalém, etc., seja em aldeias maiores ou menores do setor rural – sempre se caracterizou, ao longo de anos, por uma ação empírica e expontânea, apoiada em velhas tradições construtivas e artesanais, em métodos e materiais locais, e numa pragmática procura de soluções para cada problema habitacional que se apresentasse.

Essa ação é que deu aos assentamentos árabes o seu aspecto pitoresco e orgânico dentro do panorama – tão comum de toda construção local ao redor da bacia do Mediterrâneo. Mas ela se desenvolveu à revelia de qualquer planejamento e evidentemente sem atender a quaisquer dispositivos legais ou burocráticos. Ademais, ela já não responde às necessidades de uma sociedade árabe em processo de transformação e de expansão demográfica e econômica.

Assim, ao mesmo tempo que conceitos de legislação urbana demoram a ser compreendidos a assimilados pela população árabe (levando a uma proliferação de construções "clandestinas" que tem sido tratada com medidas impopulares de demolição compulsória), assistimos a uma deterioração sensível do caracter visual e ambiental – em especial naqueles núcleos que se adequaram às limitações administrativas. E então – apesar da adoção de gabaritos, alinhamentos, porcentagem de ocupação, etc. – presenciamos hoje o desaparecimento daquele espírito autêntico de criatividade, que vai cedendo lugar a edificações pseudo-modernas, que se baseiam em recursos de tecnologia atualizada, e respondem a regulamentações municipais definidas, mas o fazem através de uma imitação mal dirigida de modelos da arquitetura israelense (de cuja formação muitos cidadãos árabes são partícipes ativos, sendo o trabalho na construção civil uma das atividades econômicas mais difundidas entre eles).

E por outro lado, deve-se reconhecer que uma grande parte da responsabilidade por este estado de "patologia urbana" recai sobre os meios governamentais encarregados, os quais – por má distribuição de verbas ou por ingerência de fatores e interesses políticos – não dedicaram até hoje suficientes esforços profissionais e administrativos para aprovação de planos diretores realmente adaptados às exigências físicas e aos costumes próprios da população árabe.

É este pano-de-fundo que se aplica também à cidade de Nazareth. E talvez fosse necessário um acontecimento de grande envergadura como o esperado afluxo do ano 2000 para remover a situação de sua prolongada inércia: embora de idade bi-milenar, ela surgiu como um dos tantos povoados da região e foi crescendo e se desenvolvendo muito além da média de outros centros vizinhos: graças à sua profunda importância histórica, ao seu caráter de pólo de atração de peregrinos, ao surgimento de instituições religiosas cristãs que nela erguem conventos, escolas e igrejas de "molde europeu", e a sua posição geográfica central dentro do perímetro regional da Galiléia.

Porém ela não perdeu durante este processo seu caráter provinciano de "grande aldeia", e hoje ela chegou à beira do século 21 com um notável atraso na adaptação de suas infra-estruturas às exigências de uma cidade moderna. Isto se refere não só aos aspectos do turismo peregrino que já agora denota um aumento, como também a outras estruturas urbanas que foram penetrando de forma caótica e não planificada na malha da cidade: uma rede viária mal conservada e congestionada por um tráfego que se canaliza quase exclusivamente na artéria principal, carecendo de soluções apropriadas para o premente problema do estacionamento; uma área de pequenas indústrias e oficinas extremamente desordenada e ecologicamente ofensiva; um agressivo pequeno comércio de baixo nível, carregado de poluição visual, espalhado pelas ruelas estreitas tipo "bazar" que sobem em labirinto a partir da artéria central; uma degradação por desleixo de muitos edifícios e casarões de grande porte e de reconhecível qualidade arquitetônica, que se encontram inseridos no apertado tecido construído, e que devidamente postos, em realce poderão dar a todo conjunto uma escala e um critério de referência, além de uma renovada utilização prática; uma promíscua mistura de lugares santos com atividades "profanas", que pelo seu próprio exercício e descuidada aparência vêm desrespeitar a atmosfera de espiritualidade que se deseja num tal entorno; uma ausência de espaços convenientemente dimensionados e equipados com mobília e iluminação de rua dignos de sua tarefa; uma insuficiência de instalações hoteleiras e serviços complementares; uma má qualidade e lotação excessiva de grande parte do setor habitacional.

Todos esses problemas estão agora sendo enfrentados em uma escala que não poderia caber apenas nos recursos da administração municipal e portanto recaem também sobre o âmbito governamental (o Ministério da Habitação assumiu todos os encargos relativos ao planejamento e aos projetos específicos, delegando-os a escritórios profissionais diversos; ocupou-se igualmente de todas as medidas infra-estruturais e das ligações viárias da cidade – seja as internas, seja os acessos externos e o tráfego de veículos; e mais do que tudo originou de seu orçamento as verbas necessárias para a grande operação). Também participam do esforço agências internacionais e entidades interessadas – dentre elas o Vaticano.

A cidade encontra-se num ritmo frenético de recuperação e reforma, em uma corrida contra os curtos prazos, a que nem sempre intervenções e obstáculos de estreitos interesses sectários colaboram.

E si uma impressão animadora pode ser tirada deste assunto, isto sem dúvida está no fato de que um esforço multi-disciplinar conjugado está sendo posto a serviço de uma finalidade que em última analise virá em benefício de todos os interessados: uma cidade que poderá responder às necessidades e aspirações de seus habitantes, em conformidade com sua posição histórica e sua importância simbólica para grande parte da humanidade. E desta experiência, é de se esperar que lições e conclusões sejam tiradas: para um novo enfoque que possa levar a uma regulamentação "simpatizante" da construção e do desenvolvimento físico de núcleos urbanos, árabes e judeus; para um relacionamento sensível com o ambiente, o panorama e o patrimônio histórico e artístico existente; para uma regulamentação eficiente de todos os recursos relevantes, em favor de uma melhor qualidade de vida.

sobre o autor

Vittorio Corinaldi nasceu em Milão, Itália, em 1931, emigrando para o Brasil em 1939. Arquiteto formado pela FAU USP, desenvolve atividade profissional em Israel, onde radicou-se a partir de 1956. Contribui periodicamente com diversas publicações, principalmente sobre aspectos práticos e teóricos do planejamento para as comunidades Kibutz. Professor convidado na FAU-USP no ano de 1986, ganhador do Prêmio do Comitê Olímpico de Israel por projetos de edifícios esportivos e participante oficial da 2ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo. Desde 1995 é correspondente Óculum em Israel.

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