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architexts ISSN 1809-6298


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COMAS, Carlos Eduardo. Stud banker bang bang!: casa e ateliê. Barragán em Tacubaya, México, 1947. Arquitextos, São Paulo, ano 01, n. 006.08, Vitruvius, nov. 2000 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/01.006/961>.

O lote situado em um subúrbio da Cidade do México, com características de cidade do interior; o alto muro que conforma a rua e estabelece clara separação entre o espaço público e o âmbito doméstico, à maneira árabe, o vulgar e chamativo amarelo cromo, o reboco de textura áspera da construção vernacular: tudo isso tem sido amplamente lembrado. Mas nunca se menciona que o portão da garagem é amplo e por ele passam dois carros, sinal de prosperidade e aceitação das realidades da época.

O precioso Cadillac de Don Luís reluz na garagem, e esta tem duas portas. Uma se comunica com o vestíbulo, continuando-o; a outra conduz até a cozinha de aço e cerâmica, incrivelmente equipada por meio de um corredor que apoia uma escada de serviço em caracol. Esta proporciona acesso independente às dependências de serviço no terraço e ao banheiro intermediário que compartem. Abaixo, os dois dormitórios possuem seus próprios banheiros; no do dormitório principal, em algum momento, foi colocada uma jacuzzi. Em frente a cama do arquiteto, estão seus discos e um Bang & Olufsen, notável por sua qualidade técnica e o refinado minimalismo no desenho. Há um banheiro de hóspedes à direita do vestíbulo e outro na saleta superior da biblioteca. A casa Barragán é exaltada como palco de memória e sonho, mas é preciso acrescentar que a maquinaria de cena era de última geração.

A sofisticação do projeto demostra um considerável domínio do ofício. A regularidade da planta se subdivide em três faixas paralelas à rua e ao jardim, ou em três perpendiculares a elas, tênue reflexo do velho problema dos nove quadrados. Na faixa horizontal intermediária, estão a escada de serviço e seus patamares, as ante-salas, cujos lados ascendem os sucessivos degraus da escada principal e o corredor virtual que leva ao estúdio; em frente ao jardim, os conjuntos de quartos e banheiros se sobrepõem à seqüência de cozinha, copa, jantar e estar, incluindo o acesso ao estúdio; frente à rua, se encontram a garagem, o vestíbulo, banho e biblioteca. As faixas perpendiculares incluem as seqüências de garagem, corredor e cozinha; a de vestíbulo, ante-sala e jantar, servida pela copa; a de estar e biblioteca, com pé direito duplo e uma continuidade marcada pela ausência de portas na parede que os separa. Estar e biblioteca configuram um espaço em L, alguns degraus separam o vestíbulo da ante-sala do andar térreo, interceptado em sua seção média. Dormitório e banheiro constituem um conjunto integrado em termos de comunicação com as ante-salas. Desta forma, a centralidade e a continuidade vertical são reforçadas graças à variação de percurso da escada e à iluminação zenital. A casa praticamente dispensa corredores e aparece compacta em torno de um pátio de roupagem nova, com um certo ponto de contato com a casa pompeiana do Poeta Trágico tão apreciada por Le Corbusier.

A referência a Le Corbusier é procedente porque neste projeto estão presentes a ativação funcional do terraço coberto e é lícito comparar a solução de acesso em Tacubaya com a rampa funcionalmente especializada em Poissy, inclusive no relativo à privacidade da comunicação à medida que se sobe. O impulso espiral em direção ao céu se neutraliza pela hierarquia que o pé direito duplo confere ao conjunto de estar e biblioteca, para reentroduzir-se de novo mediante um giro ao redor do fim da parede divisória e à descoberta da escada em balanço que conduz à saleta superior, hábil reelaboração da escada no terraço do apartamento Beistegui. Os convites rotatórios se reiteram com a colocação dum mínimo de duas portas em cada peça do andar térreo. A eles se somam propostas diagonais mediante a sábia disposição de portas, janelas, escadas e circulações. Como no Ministério da Educação do Rio de Janeiro, uma distribuição simples e totalmente ortogonal é entrecortada por encaminhamentos que a tensionam e a distorcionam, dilatando virtualmente as dimensões do espaço. O drama aumenta com a hábil manipulação de pés direitos e pochés que liga Barragán tanto com Kahn e sua atualização da tradição beaux-arts, como com o tradicional projeto do hôtel particulier francês. Os armários embutidos do andar térreo proporcionam altura e sensação de umbrais às portas entre as salas de jantar, estar e o pátio.

A arquitetura da Casa Barragán é uma arquitetura de planos, mas não aquela do neoplasticismo, nem a da "planta livre" e seus espaços sandwich. A manipulação das alturas para conseguir o volume adequado à natureza funcional e ao tamanho das diferentes peças se assemelha ao Raumplan de Loos. A eliminação de corredores e a multiplicação de portas por peças permite conciliar uma experiência de fluidez espacial com uma autonomia de recintos. O resultado é uma proposta alternativa de síntese entre o pintoresco e a racionalidade construtiva, que se vale apenas da pureza dos elementos arquitetônicos para provocar uma sensação de modernidade e ao mesmo tempo de atemporalidade. Não se trata da integração do pintoresco e do clássico que pretendia Le Corbusier, nem o sistema é facilmente transponível para a edificação em altura, pois esta requer a presença estrutural da coluna, e a coluna está fora do sistema estrutural de Don Luís. Contudo, quando aplicado a uma casa, o sistema usado por Barragán permite uma contundente unidade formal e espacial sem prejuízo da privacidade. Pode intentar-se a coexistência de dois sistemas na mesma obra, como o de planta livre e o de compartimentação convencional com corredores na Tugenthat de Mies, e eliminar a dificuldade– manifesta em Garches – de camuflar portas normais de abrir na alvenaria.

A busca de unidade arquitetônica no âmbito doméstico, o pragmatismo material e construtivo demonstrado no processo e as dificuldades evidentes de generalizar estratégias projetuais além da edificação de baixa altura sugerem, como contrapartida, uma aceitação realista do ecletismo tecnológico, tanto na construção como na cidade moderna, que deve aceitar a coexistência justaposta da cidade das torres e da cidade das casas. Mediante o projeto de uma casa e um escritório modernos como unidades autônomas, alinhadas e construídas entre paredes medianeiras - que associam a casa e o trabalho – Don Luís demonstra que o quarteirão tradicional não é, de forma alguma incompatível com essa cidade de casas, nem com a comodidade e a mundanidade burguesas.

Na realidade, a Casa Barragán não parece ascética. Humilde e dourada, patinada e brilhante, francamente cenográfica, recebe uma mundanidade culta e elegante: o cumprimento na ante-sala que é um átrio, o casaco pendurado na rouparia, o aperitivo no estar, a conversa na sala de jantar com louça naif e talheres logicamente de prata de lei, o charuto na biblioteca, a conversa íntima na saleta, o baile no terraço exposto ao firmamento, a despedida no vestíbulo. Também despreza a celebração pagã do corpo suando ao sol em total privacidade e, logo, descendo a escada para trocar de roupa no lavabo. Mas é igualmente plausível pensá-la cheia de crianças inocentes ou como palco de meditação austera, e tanta polivalência não é a menor de suas virtudes.

sobre o autor

Carlos Eduardo Dias Comas é arquiteto, membro da Comissão Coordenadora do PROPAR (Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura) da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e responsável pela pesquisa "Arquitetura Brasileira Contemporânea: Cidade Figurativa, Teoria Acadêmica, Arquitetura Contemporânea".

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