O gosto pela paisagem em grandes perspectivas, vistas à distância, foi estimulado a partir da última década do século XVIII, quando começaram a surgir panoramas apresentados em rotundas construídas nas principais cidades da Europa. As rotundas eram edifícios de forma cilíndrica, projetados especialmente para abrigar grandes pinturas – paisagens pitorescas ou exóticas, cenas históricas ou religiosas de reconhecido apelo popular – executadas sobre um suporte contínuo de 360º. Essas instalações panorâmicas envolviam totalmente o espectador que, imerso na ilusão, experimentava a surpresa e a novidade com deslumbramento.
A partir de 1808, o Brasil passou a fazer parte da rota de viajantes e artistas de espírito romântico, como Johann Moritz Rugendas, Carl von Martius e Charles Landseer, entre outros, que partiam em busca de oportunidades em cenários estrangeiros. Empenhados em ver e registrar tudo que chamasse atenção, deixaram um legado inestimável de documentos iconográficos sobre papel – esboços do natural, estudos preparatórios ou pequenas aquarelas, bem como uma quantidade incontável de gravuras. Essa produção de larga escala ilustrava álbuns de suvenir e livros de viagem, mas também era comercializada na forma de peças avulsas, muitas delas em formato panorâmico. A invenção da litografia, no final do século XVIII, foi fundamental para a popularização de gravuras, tanto pelo baixo custo quanto pela praticidade.
Em 1839, com a invenção da fotografia, simbolizada pelo anúncio público da daguerreotipia em Paris, as possibilidades de registro e de documentação visual foram ampliadas, uma vez que se tornou possível a captura em uma superfície fotossensível da imagem projetada dentro da câmara escura. Já em janeiro de 1840, a fotografia chegava ao Rio de Janeiro, com os daguerreótipos realizados pelo abade Louis Compte na praça XV, e despertou um grande interesse, tanto do público como do imperador d. Pedro II. Esse interesse permitiu que se desenvolvesse aqui, em data bastante precoce, uma atividade fotográfica intensa, por obra de nomes como Augusto Stahl, Victor Frond, Georges Leuzinger e Marc Ferrez, entre outros, que se especializariam no registro da paisagem urbana e natural do país – novamente, lançando mão do formato panorâmico em suas várias configurações e possibilidades.
A fotografia, associada às demais técnicas de impressão, propiciaria também, alguns anos depois, o desenvolvimento dos processos de reprodução da imagem por meios fotomecânicos. Aliado a essa expansão da circulação de imagens em múltiplos suportes, o formato panorâmico se estabeleceu, ao longo do século XIX, como uma das principais formas de representação iconográfica da paisagem brasileira.
A presente exposição, uma seleção de obras do acervo IMS, tornou-se possível graças à recente incorporação da coleção de Martha e Erico Stickel, constituída, sobretudo, de desenhos, gravuras e aquarelas que retratam o Brasil do século XIX. As obras dessa coleção aqui expostas, somadas à vasta coleção oitocentista de fotografias do IMS, torna possível ao visitante de Panoramas travar contato com muitos procedimentos e atitudes que moldaram a representação da paisagem brasileira, contribuindo para a formação da imagem do país no decorrer do século XIX e sua divulgação no exterior.
nota
NE
Texto curatorial da exposição Panoramas: a paisagem brasileira no acervo do Instituto Moreira Salles. Instituto Moreira Salles – Rio de Janeiro, de 4 de setembro a 13 de novembro de 2011.
sobre os autores
Carlos Martins e Sergio Burgi são curadores da exposição.