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GILMET, Hugo. Baía de Montevidéu. ?rea de desenvolvimento do Plano Diretor Territorial. Arquitextos, São Paulo, ano 01, n. 010.02, Vitruvius, mar. 2001 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/01.010/907>.

Atualmente, estamos assistindo a paulatina configuração do espaço unificado do Merco-Sul, em particular na chamada "banana fértil" da região sul da América Latina. Entre as primeiras manifestações do processo de integração encontra-se a intensificação e desenvolvimento das vias de trânsito, que têm dado lugar a múltiplos projetos destinados a recompor a rede de sistemas e estrutura de transporte.

Dentro deste cenário, com uma localização estratégica, a cidade de Montevidéu se prepara para uma profunda inserção regional, que deverá ser acompanhada por obras de infra-estrutura e macro equipamento.

A capitalização administrativa do Merco-Sul, o novo impulso do porto de Montevidéu, as projetadas conexões territoriais, como a ponte Buenos Aires – Colonia, e as próprias mudanças que se desenvolvem em seu interior incentivam a pensar em novos papéis como um desafio e uma oportunidade. Neste contexto e em direção ao futuro, como também na perspectiva de desenvolvimento histórico, o acidente geográfico da Baía junto à Península e o Cerro tem estado sempre estreitamente vinculado à cidade de Montevidéu e assim foi considerado para a proposta do Plano Diretor Territorial.

Plano Diretor Territorial

O Plano Diretor Territorial (1998-2005), também denominado Plan Montevidéu, foi realizado no Convênio entre a Prefeitura Municipal de Montevidéu e a Universidade da República assinado no ano de 1995. Sua elaboração foi concluída no final de 1997 e, atualmente, a globalização do Plano e o projeto de decreto correspondente estão sendo analisados pela Comissão Departamental, órgão legislativo municipal.

Formalmente o Plano Diretor Territorial está integrado por 312 disposições sistemáticas, coerentes e de grande unidade que garantem efeitos de um significativo impacto sócio-ambiental no território do departamento de Montevidéu e na cidade homônima.

O modelo territorial do Plano é constituído por um conjunto integrado por propostas de estruturação e organização que cobrem toda a cidade e o território, onde são somados também Planos especiais de significado estratégico. Esta estrutura do Plano corresponde a uma interpretação da realidade composta, de um lado, por estruturas e sistemas territoriais que interrelacionam o conjunto e, por outro, de usos do solo e localização de atividades bem adaptadas às peculiaridades de cada parte do território, como uma interpretação dinâmica onde a atuação em determinadas áreas territoriais e setores de atividade é capaz de produzir transformações em sua totalidade.

As estruturas e sistemas territoriais estão organizados no Plano da seguinte forma: Redes de Infra-estrutura Básica, Rede Viária e de Transporte, Centralidades e Equipamentos e Sistemas de Espaços Verdes.

Com relação à organização territorial, além de apresentar os critérios gerais da ocupação residencial e da ocupação não residencial, se realiza uma classificação do solo ou Zoneamento primário, que configura a base do regime geral de direitos e obrigações dos proprietários do solo considerando aspectos de divisão, edificação e uso do solo. Um Zoneamento secundário, onde são definidas áreas homogêneas de atuação. Um Zoneamento terciário onde chega-se à formulação normativa do Plano.

Um importante componente do Plano tem sido a já assinalada inclusão de planos, programas, projetos e atuações, que deveriam ajudar na correção de certos desequilíbrios da cidade e do território. Entende-se também por caráter estratégico a proposta de novos usos do solo que, por sua influência, podem induzir o desenvolvimento e a transformação geral. Em outras palavras, constituem propostas contrárias para conseguir objetivos orientadores e gerais do Plano, sendo portanto as propostas estratégicas as mais comprometidas, no sentido que implicam sempre em um risco sobre a sua real influência e alcance.

Em sua concepção estarão sendo levadas em consideração determinadas ações que não correspondem exclusivamente ao Município e, portanto será necessária a organização da maioria dos agentes – públicos e privados – num território comum.

Para conformar uma idéia de cidade e território compartilhada e motivadora devem ser criadas as garantias de sua execução. Para tanto, são necessários novos instrumentos de gestão. Estes novos instrumentos jurídicos, administrativos e técnicos são parte intrínseca do Plano, possibilitando sua execução e adaptando as propostas a mutante relação entre o Plano e o desenvolvimento real da cidade e do território.

Entre os novos instrumentos da modalidade estratégica encontram-se as Áreas de Promoção. As Áreas de Promoção são as unidades territoriais designadas pelo Plano no Solo Urbano, cujo desenvolvimento terão projeções ao longo de todo o território e onde projeções urbanas prioritárias serão privilegiadas por formas mais adequadas de gestão, isenção e rebaixamentos tributários. Também nelas se aplica uma normativa especial que substitui a normativa geral em termos de uso, edificação e parcelamento. Estas Áreas de Promoção serão desenvolvidas através das chamadas Unidades de Atuação, que devem dispor a justa distribuição das cargas e benefícios derivados de sua aplicação entre os afetados diretamente.

Nesta primeira formulação do Plano, encontra-se a Área de Promoção da Baía de Montevidéu, além da Área de Promoção Bulevar José Batlle e Ordoñez – Avenida Dr. Luis Alberto de Herrera, do Projeto Centro e do Plano Especial Riacho Miguelete. No futuro, durante a vigência do Plano, poderão ser integrados outros, uma vez demonstrados seus valores estratégicos. O Plano Montevidéu também propõe a redação e execução de outros planos, programas, projetos e atuações especiais que estruturam e organizam uma parte do território com referência a um âmbito de zoneamento e local (Planos de Zoneamento), ou aqueles que estão relacionados a uma estrutura ou sistema territorial de caráter setorial (Planos Setoriais).

Área de Promoção Baía de Montevidéu

Os objetivos perseguidos no Plano com a Área de Promoção Baía de Montevidéu buscam recuperar a histórica vivência urbana da Baía, potencializar a função residencial e melhorar a relação Baía–Cidade, em particular, a relação com o porto.

A área periférica da Baía mantém as potencialidades originais devido ao seu excelente acesso e localização urbana estratégica, com importantes superfícies de terra disponível – a grande maioria de propriedade estatal – e edificações sem uso, além da sua proximidade ao centro principal.

O significativo cenário geográfico constituído pela Baía, a Península e o Centro de Montevidéu, conforma e caracteriza a cidade. Neste sentido, as dimensões da Baía são eloqüentes: o espelho de água alcança 1050 hectares e o perímetro costeiro, desde o Cais de Escala até a Punta del Rodeo, tem uma extensão de 12 km.

Historicamente a Baía é onde as embarcações encontraram abrigo, aproveitando que ali se localizam as maiores profundidades de drenagens naturais no Rio da Prata, razão pela qual se constituiu em porto de entrada ao território e à cidade. Atualmente o porto de Montevidéu dispõe de 10 m de profundidade nos canais de acesso. Com a sua vantagem natural poderia chegar aos 12 m de profundidade e passar a ser uma real opção regional.

Durante as primeiras décadas do século as áreas costeiras da Baía foram o local privilegiado das atividades da cidade. Ao longo da Baía foram instalados os grandes equipamentos da época: o já citado Porto, a Ferrovia, as usinas de energia elétrica e, posteriormente, as refinarias da Administração Nacional de Combustíveis, Álcool e Portland (A.N.C.A.P.), como também a principal indústria daquele momento: os frigoríficos. Com o desenvolvimento da indústria da carne aparecem os bairros operários de Vila Cosmópolis, na parte baixa do Cerro, e o Povoado de Vitoria, entre os riachos Miguelete e Pantanoso. A própria Cidade Velha, numa primeira etapa também se apoiou sobre a Baía, no setor norte da Península, protegida do forte vento sudoeste. O Prado, outro setor residencial, se conectou com a Baía ao longo do riacho Miguelete até o Parque e a Praia de Capurro, a principal estação balnearia da cidade durante muitos anos.

Porém, mais tarde esta tendência de desenvolvimento tomou outra direção. A partir de 1920, com o acelerado crescimento urbano de Montevidéu e as mudanças nas preferências e comportamentos sociais por parte da população mais privilegiada, a cidade começou a apresentar uma expansão em direção leste, sobre a área costeira. Hoje este crescimento transcende os limites do departamento de Montevidéu. Como conseqüência, as áreas residenciais próximas à Baía sofreram um processo de abandono e perderam prestígio social.

Por outro lado, as novas instalações industriais da década de 30, localizadas nas áreas de Aguada, Teja, Capudo e Arrojo Seco ou sobre os afluentes da Baía, promoveram a deterioração das condições ambientais.

O crescimento do Porto junto com a Zona portuária de cais privados e depósitos de couro e lã, como também o desenvolvimento das instalações da A.N.C.A.P., das Usinas e Transmissões Elétricas (U.T.E.) e dos estabelecimentos industriais citados, completaram uma cortina de grandes equipamentos que fecharam a Baía para o resto da cidade. Em outras palavras, a cidade terminou se voltando em direção contrária à Baía.

Nas décadas de 60 e 70, mudanças nos sistemas produtivos e de transporte provocaram o abandono das instalações da indústria frigorífica da zona e o Porto junto à ferrovia deixaram de ser a exclusiva porta de entrada à cidade e ao país, gerando como conseqüência grandes áreas de deterioração e sem uso. Apesar do pouco uso e utilização, algumas instalações representam grande acervo arquitetônico a ser preservado e valorizado.

Junto à deterioração física estavam as más condições ambientais devido à contaminação provocada pelo despejo dos sistemas de saneamento do Paraguay-Piedras Blancas, Miguelete, Belvedere e Cerro – sem tratamento prévio – nos riachos Miguelete e Pantanoso ou diretamente na Baía.

Por outro lado, nos tecidos próximos a deterioração progressiva incrementou-se pela ausência da dinâmica urbana.

Nos anos 80 esse ciclo foi fechado e iniciou-se uma nova etapa. Desde 1985, com a construção dos novos acessos das estradas nº 1 e nº 5 ao Porto, se estabelece uma nova relação da cidade com a Baía, oferecendo visuais para muitos desconhecidas. Outros símbolos de reabilitação da zona que constituem possíveis prefigurações de futuro são: a localização do terminal da companhia "Buquebus", pela qual chegam via marítima um milhão de passageiros por ano, a recuperação das águas da Baía – previsto pelo Plano de Saneamento Urbano III – como um objetivo a ser alcançado em um futuro próximo e, por último, o início da construção da Torre de Comunicações, nova sede da Administração Nacional de Telecomunicações (A.N.TEL.).

O Programa Nacional de Recuperação Urbana – ou Plano Fênix como também é conhecido na cidade de Montevidéu – propõe a restauração e recuperação de uma zona incluída na Área de Promoção da Baía de Montevidéu. Nesta zona se localizam as estações da ferrovia já existente, as áreas ferroviárias adjacentes, os galpões da Administração de Ferrovias do Estado (A.F.E.) e o bairro periférico La Guarda. O Banco Interamericano de Desenvolvimento (B.I.D.) financia parte dos custos através da concessão de empréstimo a longo prazo, mesmo o Plano Fênix ter como proposta fundamental fomentar a inversão privada na região. Seu elemento-chave é a Estação Central da Ferrovia, construída em 1890 e considerada Monumento Histórico. Propõem-se convertê-la em um Centro Cultural e de Eventos, voltado para recreação e comércio. Suas funções originais foram removidas para um novo terminal de passageiros, em prédio adjacente.

Os objetivos do Plano Fênix se ajustam aos do Plano Diretor Territorial no que se refere à valorização do entorno próximo à Baía, ao processo de ocupação residencial das áreas centrais e o melhor aproveitamento econômico do tecido residencial existente.

Simultaneamente, com estas mudanças surgem conflitos territoriais provocados pela necessidade de ampliação das áreas de operações portuárias, a necessidade de assegurar o acesso ferroviário ao Porto e uma atuação cada vez maior dos depósitos de containers, principalmente os localizados na área sul da Rambla Baltasar Brum, os quais têm se transformado em um verdadeiro anteparo visual em direção à Baía. Da mesma forma, as atuais áreas de depósito de madeira para exportação, cortam a relação visual entre a cidade e a Baía.

Existem, contudo, vários traçados nos quais a cidade pode, com o equipamento adequado, usufruir da Baía. Cada um poderá constituir um projeto específico na Área de Promoção Baía de Montevidéu. Entre os já identificados, encontram-se o entorno do dique Sarandí, vinculado à união do ramblas, como fecho da Cidade Velha. Em seguida, a área da Estação Central da Ferrovia e a atual área de manobras da empresa estatal de ferrovias (A.F.E.), no já citado Plano Fênix. Em direção oeste, alguns setores da área costeira ladeada pela Rambla Baltasar Brum e a área do Parque Capurro, incluindo a conquista de terras junto a Baía através de aterros, sendo que muitas dessas áreas já se encontram na categoria de armazenamentos submersos.

Por último, a costa do Cerro, com uma proposta de mudança de usos, a construção de uma rambla de terra argilosa – cuja primeira etapa denominada Rambla Suiza já foi executada – e a recuperação do Parque Vaz Ferreira.

Este projeto procura dar resposta urbana ao espaço frontal da praia do Cerro e a via pública, com o objetivo de desencadear um processo de apropriação cidadã das zonas costeiras.

A Rambla Suiza, com uma extensão de 800 metros, inclui um muro de contenção de 450 metros e áreas com parques. Foi realizada na modalidade de obra municipal direta e o custo alcançou um milhão e meio de dólares.

nota

[Traduação Diego Wisnivesky]

referências bibliográficas

Prefeitura Municipal de Montevidéu Hacia un Plan de Montevideo. Avance del Plan Montevideo. Avance del Plan de Ordenamiento Territorial (1998-2005) Montevideo, 1997.

Prefeitura Municipal de Montevidéu Plan Montevideo. Plan de Ordenamiento Territorial (1998-2005). Memoria Informativa. Memoria de Ordenación. Memoria Normativa, de Gestión y Seguimiento. Memoria de Participación (no prelo).

Rosalba Oxandabarat "Una bahía y siete miradas" in Semanário Brecha 20 março 1998.

Programa Nacional de Recuperação Urbana Proyecto Fénix Montevideo 1997.

Luis Roux "Recuerdos del futuro de la bahía" in El Observador 15 março 1998.

sobre o autor

Hugo Gilmet, nascido em 1945, é arquiteto desde 1976, formado pela Universidade de Lund, Suécia. Atualmente desempenha os cargos de catedrático de Teoria na Faculdade de Arquitetura de Montevidéu e assessor da Unidade Central de Planejamento da Prefeitura Municipal de Montevidéu, Uruguai.

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