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A utilização dos recursos naturais proporcionam redução no consumo de energia na edificação proporcionando melhor qualidade de vida às pessoas e menor demanda de recursos não renováveis da natureza


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FURLANETO, Ederaldo; GOGOLA, Gilberto W.; PARUKER, Sílvio; SAMWAYS, Suzi; ZULIAN, Carlan S.. Arquitetura e natureza. Parceria adequada dentro da cidade grande. O efeito estufa em concessionárias de veículos em Curitiba. Arquitextos, São Paulo, ano 03, n. 036.08, Vitruvius, maio 2003 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/03.036/688>.

Especialmente nas edificações destinadas ao uso comercial, as lojas, o planejamento da fachada no projeto arquitetônico é fundamental para os resultados de conforto ambiental, de manutenção da edificação no decorrer dos anos e da salubridade do espaço interno. A redução do consumo energético deverá ser sempre uma meta perseguida ao definir-se o projeto da fachada, adotando-se ou não, um sistema de ar condicionado mais adequado, com menor consumo de energia e maior eficiência. O vidro transparente, na fachada, comporta-se de maneira ineficiente frente à radiação solar direta durante muitas horas, proporcionando desconforto térmico nos interiores, resultado do “efeito estufa”. A utilização dos recursos naturais como também de aspectos bioclimáticos e da sua integração com a arquitetura proporcionam redução no consumo de energia na edificação proporcionando melhor qualidade de vida às pessoas e menor demanda de recursos não renováveis da natureza.

O desempenho de funcionários e as condições de trabalho estão vinculados às condições de conforto térmico existentes no ambiente construído. Clientes e funcionários em edifícios comerciais, afetados por condições de desconforto térmico, tem seus propósitos, anteriormente estabelecidos, alterados. Por outro lado, em algumas situações, uma vitrine de loja mal projetada provoca nos clientes a indesejável dificuldade de visualização do interior em virtude das composições de fachadas em uma tentativa de atenuar os efeitos incômodos da radiação solar.

Na cidade de Curitiba, a rua Marechal Floriano Peixoto é uma rua de grande importância para o tráfego radial no sentido centro bairros e vice-versa, tornando-se por isso num eixo comercial importante, com diversas lojas de venda de automóveis. As concessionárias foram instaladas em construções antigas pré-existentes. Estes imóveis, salões comerciais das mais variadas finalidades, foram reformados para se adaptarem aos padrões estéticos e de layout de cada marca que representam. Geralmente a marca que concede a bandeira (a franquia) impõe também a concepção arquitetônica. Este é o procedimento padrão de quase todas as marcas que habilitam concessionários.

As edificações pesquisadas, em sua maioria são adaptadas através de reformas internas. Nessas edificações as intervenções e adaptações seguiram primeiramente o critério de não se alterar radicalmente a estrutura, principalmente a do telhado, resultando nos mais diversos tipos de estruturas – madeira, aço, etc – e de materiais de cobertura – telhas cerâmicas, metálicas e até mesmo cimento amianto. Salienta-se que originalmente essas construções já tiveram ocupações diversas como depósitos, mercados, indústrias, serviços, outros.

Algumas das edificações contam com uma parte frontal da loja em estrutura de concreto armado com laje, onde um mezanino abriga a parte administrativa da loja, enquanto outras receberam total ou parcialmente um revestimento de forro, com a finalidade de esconder a estrutura de telhado e decorar o ambiente. Quase que na totalidade os revestimentos internos das paredes são de argamassa com pintura acrílica na cor branca. Os revestimentos dos pisos em sua maioria são de cor clara, prevalecendo placas cerâmicas e pedras naturais polidas. Dentro das suas possibilidades, todas têm na fachada frontal uma grande área de vidro transparente, com um mínimo de estrutura, solução adequada à exposição de automóveis. Poucas possuem uma área de sombreamento (beiral ou marquise). A necessidade de um amplo espaço interno para a exposição dos veículos, levou à remoção de paredes, aproveitando desníveis de pisos. Há ambientes nessas edificações que se anexaram a outros, por uma comunicação interna de paredes contíguas, acrescentando um volume de ar interior muito maior.

Algumas características são comuns a todas as marcas de veículos observadas. O ambiente frontal é amplo, espaçoso, com pé direito próximo de 5,00 m. Ali funciona a sala de vendas, onde se recepciona o cliente e onde ficam, portanto, os vendedores. No espaço está o show room com os carros expostos, que precisam ser vistos também do lado de fora. Identifica-se então uma característica das lojas de carros: fachadas frontais ricas em vidros transparentes absorvem grande quantidade de energia solar radiante. Medidas atenuadoras como vidros escuros, cortinas ou persianas são evitadas, pois interfeririam na visão aos carros expostos. A ampla área envidraçada recebe muita energia radiante, o ar interior se aquece bastante e a massa de ar quente resultante sobe e não encontra saída para o exterior, formando-se o efeito estufa. A razão principal de não haver saídas para o ar quente em ascensão é motivada pelo fato do projeto de reforma negligenciar o problema. A arquitetura atual deve entender como se projeta com a natureza e não contra ela, os edifícios devem aproveitar as energias naturais do sol e do vento, incorporando-os através do projeto arquitetônico (1).

O que chama a atenção na rua Marechal Floriano é a sua orientação aproximada norte-sul. Ao se percorrer a rua de sul para norte, pode se observar que as lojas do lado esquerdo recebem incidência solar direta todo o período matutino, enquanto as lojas do lado direito sofrem a mesma incidência por todo o período vespertino. As amplas fachadas de vidro transparente permitem a ocorrência do efeito estufa, tornando o interior de todas elas, em alguns dias ensolarados, muito desconfortável. A solução encontrada é invariavelmente a climatização artificial por meio de sistema central de ar condicionado. Além do custo de instalação, dos inconvenientes de se instalar um sistema desses, não previsto em projeto arquitetônico e com a loja em funcionamento, há o custo fixo com o aumento substancial de energia elétrica.

O projeto de reforma sempre se constitui num desafio para os profissionais projetistas, especialmente para o arquiteto. Adaptar um edifício para determinada função para a qual ele não foi inicialmente concebido, dentro de um orçamento limitado, atendendo necessidades específicas – como é o caso de uma vitrine de carros – é sem dúvida um desafio estimulante à criatividade de qualquer arquiteto. Naturalmente que todos os projetos de uma obra são de fundamental importância, mas o projeto de arquitetura possui um ingrediente único. O seu resultado final interage diretamente com as sensações das pessoas. Se na reforma o projeto estrutural superestimar uma sapata de fundação, as pessoas que utilizam o prédio jamais saberão disso. Se o projeto elétrico ou hidráulico é inconveniente, provavelmente poucas pessoas sentirão os efeitos disso no dia a dia. Contudo, uma arquitetura inadequada toca as sensações das pessoas imediatamente. No caso de conforto térmico do ambiente construído os efeitos são amplificados e muito mais imediatos. O conforto térmico é o estado mental que expressa a satisfação do homem com o ambiente térmico que o circunda (2). As conseqüências dessa satisfação se refletem no desempenho geral da empresa, tanto nos funcionários como nos clientes.

Então se lança mão de providencias corretivas, sempre muito onerosas, muitas vezes inconvenientes e de resultados duvidosos. Uma solução preventiva sempre é menos cara, podendo até não custar nada quando for apenas uma questão de atitude. Atitude do proprietário do prédio em valer-se do profissional adequado para determinado serviço ou projeto, atitude ética do próprio profissional em reconhecer suas limitações e ele próprio orientar o leigo a respeito da atitude a ser tomada. Um bom exemplo disso é o caso mais comum em que o proprietário do imóvel, leigo, procura inicialmente um engenheiro, para conceber sua obra. Esse engenheiro identificando a complexidade da reforma e tendo em vista os resultados, deveria, tomando uma postura ética, orientar o proprietário a buscar a ajuda especializada do arquiteto. Existe legislação prevendo esses problemas, os Conselhos Regionais trabalham nessa direção. Mas o leigo, que não tem consciência da amplitude do problema, por hábito cultural de se gastar o menos possível, acaba optando equivocadamente pelo profissional inadequado para o caso em questão, colhendo resultados justamente inversos, contraindo custos inesperados e indiretos. O resultado final é sua insatisfação própria, dos funcionários e, o que é pior, dos próprios clientes. Aqueles que precisam do segmento da construção possuem muita dificuldade em identificar claramente qual profissional deveria buscar para cada situação específica. A ética profissional pode ser observada freqüentemente na medicina, onde um oftalmologista não oferece seus préstimos profissionais a uma gestante em hora de parto, mas a conduz a um obstetra, oferecendo uma útil orientação ao cliente leigo.

O consumo excessivo de energia, que poderia ser evitado, é um luxo que a sociedade atual não pode mais ostentar, pois tem que se levar em conta a preservação ambiental e a competitividade crescente entre as empresas. Não obstante aos recursos técnicos e tecnológicos disponíveis para solucionar problemas de conforto do ambiente construído, a prevenção sempre será a solução mais conveniente, mais barata e menos agressiva. O instrumento para chegar a essa prevenção é o projeto arquitetônico de qualidade e substanciado nos conhecimentos atualizados e numa consciência ética para com o proprietário, para com a sociedade, para com o respeito à qualidade de vida das pessoas e para com o meio ambiente. O projeto arquitetônico em parceria com a natureza, além de ser uma necessidade muito atual, é um sublime momento quando o profissional, responsável em pensar o espaço utilizado pelas pessoas, projeta uma construção tendo sempre em vista que este espaço será utilizado por seres humanos que terão suas sensações imediatamente afetadas por este ambiente. Ou seja, em última instância está em jogo a própria qualidade de vida das pessoas.

O cliente leigo eventualmente será um empresário, no caso da obra de uma loja de veículos com certeza o é, por razões culturais, nem sempre entenderá os motivos da contratação de um arquiteto se já possui um engenheiro dando andamento nas providências para a sua obra. Uma boa conversa poderá faze-lo entender que o engenheiro e o arquiteto não lhe servem meramente para atender serviços burocráticos e cartoriais de aprovações e obtenção de alvará de construção. Constatará que um arquiteto não vai se limitar a lhe oferecer uma fachada “bonitinha”, mas irá adequar um espaço, um ambiente, mesmo que improvisado como o é no caso de reformas, à satisfação das pessoas que vão trabalhar ou comprar ali, e tudo isso pode ainda contribuir para uma economia financeira, uma maior produtividade de funcionários, maior satisfação de clientes, maior economia de energia e consequentemente a contribuição para a preservação ambiental, tão urgente nesses dias. Se aquele empresário for convencido na metade desses argumentos verdadeiros, não há dúvida que o profissional de arquitetura ganhará grande vantagem competitiva na oferta de seus préstimos profissionais. E certamente todos sairão ganhando, inclusive a nossa velha e amada Terra. Que, aliás, ainda é o único planeta que temos.

Atentando para o fato de que o Brasil sofre há muito tempo um processo de urbanização crescente, devido aos fenômenos sociais que provocam a migração interna e o êxodo rural, as cidades cada vez maiores terão as suas áreas comerciais ocupando bairros e ruas onde já existem construções. O fator econômico incentiva o aproveitamento de construções existentes para finalidades diversas. O fenômeno observado em Curitiba, não é isolado, pois outros exemplos são flagrantes em outras cidades de grande porte. O caso específico das lojas de automóveis na rua curitibana chamou a atenção pelo fato de concentrar ao mesmo tempo vários fatores que vêm afetar o desempenho climático do ambiente construído. Já uma agência bancária, por exemplo, não apresentaria o mesmo grau do problema se utilizasse uma fachada com vidros escuros, decisão que não implicaria em nenhuma perda já que em princípio é um comércio que não tem necessidade de apresentar amplas vitrines. Mesmo no caso das concessionárias, uma rua com orientação leste-oeste apresentaria o problema de forma atenuada, evidenciando-se apenas entre verão e inverno dependendo da latitude considerada, e que eventualmente poderia obter solução com a utilização de artifícios estratégicos para provocar naturalmente as trocas de massa de ar, ou de pequenos elementos arquitetônicos, que não prejudicassem a vitrine no projeto de fachada. Um projeto de reforma adequado pode contemplar essas soluções sem onerar o orçamento da obra.

De qualquer maneira, devido às rápidas mudanças no ambiente urbano, devido às circunstâncias econômicas, devido à necessidade e desejo de ter-se sempre melhor qualidade de vida e devido ao fato do consumo de energia entrelaçar-se com a grande questão ambiental, o arquiteto é o profissional a ser chamado, a estar atento ao problema levantado.

notas

1
Cf. EVANS, M. Housing, climate and confort. London, The Architectural Press, 1980.

2
Cf. LAMBERTS, R.; GHISHI, E.; PAPST, A. L. Desempenho térmico de edificações. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina, agosto de 2000. AKUTSU, M. Avaliação de desempenho térmico de edificações: a necessidade de uma revisão normativa. Tecnologia das Edificações – IPT. São Paulo, Editora Pini, 1991. FANGER, P. O. Thermal confort. Flórida, Robert E. Krieger Publishing Co., 1982.

sobre os autores

Ederaldo Furlaneto é engenheiro civil, docente da Universidade Estadual de Londrina, UEL Londrina PR.

Gilberto W. Gogola é engenheiro civil, docente do CEFET Curitiba PR.

Sílvio Paruker é arquiteto, docente da PUC Curitiba PR.

Suzi Samways é arquiteta e desenhista industrial.

Carlan S. Zulian é engenheiro civil, docente da Universidade Estadual de Ponta Grossa PR. Todos os autores são mestrandos no Programa de Pós Graduação em Construção Civil – PPGCC – da Universidade Federal do Paraná.

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