Os alicerces de uma devoção
Na construção e fundação do mosteiro da Luz, inicialmente um recolhimento feminino, a figura de Frei Galvão, o seu construtor, está não apenas destacada como intimamente ligada à vida desta instituição. O arquiteto Benedito Lima de Toledo, dos poucos autores a ter dado a devida atenção ao Mosteiro da Luz e a seu construtor, ressaltou a qualidade e originalidade de seu projeto arquitetônico, um dos raros exemplos de igreja construída com planta octogonal no Brasil, sendo Frei Galvão responsável ainda pelo outro exemplo de planta poligonal em São Paulo, a Capela da Venerável Ordem Terceira de São Francisco. É também um dos últimos remanescentes da taipa e o exemplo mais conservado de arquitetura colonial que ainda existe em São Paulo, segundo este autor. No frontispício voltado para a atual Avenida Tiradentes há três arcos realizados em granito, o que era raro na cidade. O pórtico do mosteiro reproduz o da Igreja de São Francisco, que também possui planta octogonal. Isso não surpreende, pois Frei Galvão foi comissário da Ordem Terceira de São Francisco entre 1776 e 1780, pouco antes das obras de ampliação da Igreja. Suas pinturas de forro, pouco conhecidas por estarem em área de clausura, representam episódios da vida franciscana e da coroação da Virgem pela Santíssima Trindade (1).
Gostaria de ressaltar neste artigo a figura do governador e capitão-general da restaurada capitania de São Paulo, D. Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, o morgado de Mateus, responsável pela fundação, em 1774, do Recolhimento da Luz, juntamente com Frei Antônio de Santana Galvão e madre Helena Maria do Espírito Santo, ou do Sacramento, sua primeira Regente. Este governador, representante da Ilustração católica portuguesa e das reformas pombalinas, terá como objetivo renovar e regenerar a capitania de São Paulo, integrando-a mais diretamente ao projeto colonizador português. Ao chegar ao Brasil, D. Luís Antônio se chocará com o “atraso” e a falta de civilidade da capitania e da cidade de São Paulo. Ele constrói, em sua correspondência, um quadro de decadência e abandono das terras paulistas e, sobretudo, de sua população, bastarda, mameluca, inculta, enfermiça, não adaptada ao trabalho sistemático e ao aproveitamento de novidades como o arado, introduzido aqui pelo governador. Queixa-se da preguiça e da negligência dos colonos, da fuga dos homens da vida civil nas vilas e cidades, que viviam pelos matos, seminômades como os indígenas, sem submeterem-se à autoridade da Coroa e da Igreja, sem trabalho, sistemático, sem pagamento de impostos, sem participar das tropas, sem utilidade nenhuma, em suma (2). Por isso uma de suas principais preocupações era congregar os homens em vilas e cidades, os indígenas em aldeamentos, e educar os colonos para as virtudes da vida em sociedade e subordinação, do respeito à Coroa e à Igreja. Assim, compreende-se o interesse do governador em ilustrar e disciplinar essa população tão rebelde, como era em sua visão a paulista, incluídas as mulheres, por isso ele rapidamente encampa o projeto de Madre Helena e frei Galvão para a construção do Convento e recolhimento da Luz. Como veremos adiante, os recolhimentos serviam ao mesmo tempo para disciplinar as mulheres sós, esposas infiéis, prostitutas, criminosas, bem como resguardar a honra de esposas de marido ausente, jovens pobres em idade de casar e beatas e devotas, como o caso de Helena do Espírito Santo, que encontravam nesses espaços lugares nos quais podiam exercer sua vocação religiosa e educar-se. Já o governador, encontra nesse projeto uma institucionalização da cooperação necessária entre Igreja e Coroa para disciplinar os povos, educar para a vida civil e moral, bem como a possibilidade de deixar uma marca pessoal de sua administração na cidade, ainda que sua memória pouco tenha restado na percepção atual do convento da Luz.
Uma ilustração católica nos trópicos
Em carta régia de 9 de novembro de 1709 a antiga Capitania de São Vicente é transformada na capitania de São Paulo e Minas do Ouro, como resultado da Guerra dos Emboabas, que tinha dividido os paulistas e demais portugueses da América em torno das recém descobertas minas de ouro (3). Em 1748 a capitania de São Paulo é desmembrada das Minas Gerais, quando se criam as capitanias de Goiás e Mato Grosso, sendo então administrada por um governador em Santos, sem patente de capitão-general e submetido ao Rio de Janeiro. Depois de requerimento da câmara de Piratininga, a capitania é restaurada por Sua Majestade. O conde da Cunha, vice-rei do Brasil entre 1763 e 1767, escreve ao Rei em 12 de agosto de 1764, afirmando estar reduzida a capitania a um estado lastimável, sendo impossível governar as capitanias de São Paulo e Rio de Janeiro conjuntamente, pelas distâncias e por serem os paulistas “excessivamente inquietos e revoltosos, em território abundante de minas de ouro e nas vizinhanças dos castelhanos” (4), uma mistura demasiado perigosa na visão do vice-rei. Em carta ao Secretário de Negócios da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, o vice-rei afirma que por conta do “miserável estado a que se achava reduzida”, pela falta de governo e pela proximidade da cidade de São Paulo com o novo descoberto de São João de Jacuri, Sua Majestade decidira nomear a D. Luís Antônio de Souza para governador e capitão-general de São Paulo, que governaria a capitania entre 1765 e 1775. Dentre as suas atribuições estava a definição dos limites com Minas Gerais e Goiás além de sua recuperação, dado o miserável estado em que se encontrava (5). A transferência dos interesses portugueses para o centro-sul, por causa das minas, os conflitos de fronteira com os espanhóis e as demandas dos comerciantes de São Paulo fizeram com que o seu governo fosse restaurado.
Na capital piratiningana, a época também era de mudanças. Com a restauração, o Pátio do Colégio dos Jesuítas, expulsos em 1760, passou a se chamar Largo do Palácio servindo, a partir de 1766, como residência do novo governador. Tanto do ponto de vista simbólico como prático, esta mudança reflete a nova orientação do governo pombalino. A presença dos inacianos deveria ser apagada das cidades e aldeamentos e seus símbolos de poder deveriam ser substituídos pela presença do Estado português e de um catolicismo oficial, controlado, submisso aos compromissos com a Coroa e sem as marcas dos jesuítas. Em São Paulo, cidade baluarte construída pelos padres da Companhia de Jesus para consolidação do poder da Igreja e do Estado, enquanto aliado do papado, e também de sua própria ordem, a transferência simbólica do poder era ainda mais necessária. Para isso o novo governador envidou todos os esforços possíveis para erradicar algumas das causas do que considerava o estado miserável da capitania: a presença jesuítica, ainda evidente nos espaços da cidade, e a resistência dos “paulistas”, “inquietos e revoltosos”, em adotarem as novas diretrizes ilustradas de “gerência” da economia, da administração pública e da segurança trazidas pelo capitão-general e a enorme “preguiça” dos naturais da terra.
A desordem dos costumes
D. Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, o quarto morgado de Mateus, nasceu em 1722, na freguesia de São Veríssimo de Riba, distrito da vila de Amarante. Recebeu educação militar de seu avô, D. Luís Antônio de Souza, governador do castelo de São Tiago da Barra da vila de Viana. Comandou a resistência à ofensiva franco-espanhola em 1762, durante a Guerra dos Sete Anos (1756-1763), tendo sido promovido a coronel de infantaria. Ao ser nomeado governador da capitania de São Paulo possuía os títulos de morgado de Mateus, de Moroleiros, de Sabrosa e Cumieira, fidalgo da casa de Sua Majestade e de seu conselho, senhor donatário da vila de Ovelha do Marão, alcaide-mor da cidade de Bragança, comendador de Santa Maria de Vimioza da Ordem de Cristo e governador do castelo da Barra de Viana. Suas habilidades militares lhe garantiram a nomeação para a capitania de São Paulo, de acordo com as diretrizes do governo pombalino, de garantir a defesa da complicada fronteira sul da colônia com os castelhanos, a “recuperação” econômica e de introduzir novos e modernos elementos de governo e “gerenciamento” da administração pública e econômica.
Em ofício ao Rei de 1 de dezembro de 1767, D. Luís Antônio se queixa da desordem e decadência que encontra na capitania que irá governar: das tropas não encontra mais do que ordenanças que, embora tivessem seus capitães-mores estavam “faltas de disciplina e de obediência pela dispersão em que vivem os Povos, e pelo dos costumes”. As povoações são todas pequenas e sem nenhum modo de ganhar a vida, “os campos incultos, tudo coberto de mata brava, a lavoura por mau método, pois só se planta em mato virgem”, pela repugnância que têm os lavradores de se sujeitarem ao trabalho de “cultivarem os campos como nesse Reino. Apenas colhe cada um para o seu sustento próprio muito pouco sobra para se vender ao público”. Ninguém aproveita os recursos do país, diz o governador, achando-se o povo “reduzido à mais lastimosa pobreza”. Não encontra o governador a população assentada em vilas e cidades como gostaria, afirmando que a
“dispersão que se costuma habitar não possibilita a devida civilidade nem a necessária Doutrina Espiritual, pois procede que esquecidos os homens das obrigações com que nasceram, seguem a desordem natural dos seus costumes, uns adormecendo-se nos vícios, outros cometendo delitos, de que todos os dias se ouviam as tristes notícias” (6).
Ao marquês de Pombal, então conde de Oeiras, descreve de modo não menos desolador o estado das coisas na capitania. D. Luís observou ao ministro que a cada dia se ia “formalizando mais nos inconvenientes que se seguem ao serviço de Deus e o de S. Majestade, e ao bem comum deste Estado por causa do mau método da lavoura” (7). Não usam os paulistas as terras “como nesse Reino”, ou seja, de maneira intensiva e comercial, preferindo-se ainda uma agricultura itinerante e extensiva. Falta a adequação da colônia às necessidades do Reino: no raciocínio do governador isto se dá pela ausência da civilidade necessária aos povos para poderem adotar as normas “ilustradas” de produção e de povoamento, comuns às nações polidas da Europa, bem como da religião, a necessária aliada da monarquia na condução dos seus súditos. É o primeiro inconveniente que encontra D. Luís Antônio, a falta de religião, “e é certo que aonde se falta a Deus, que é o criador de tudo, o Sumo bem, e a fonte de toda a felicidade, não pode haver cousa boa” (8). Um segundo inconveniente, muito ligado ao primeiro, é a “falta de Sociedade, pois sendo esta a principal das obrigações civis, se acha totalmente arruinada e caminha a passos largos para o seu precipício, levando atrás de si a ruína de todo o Estado”. A falta de religião e a técnica de plantio considerada primitiva se unem para o morgado de Mateus na desintegração da sociedade, vivendo os homens afastados do convívio e sem o controle do Estado ou da Igreja. Finalmente uma terceira causa que é a falta de Justiça,
“porque vivendo os homens fora de povoado, metidos pelos Matos sem ouvirem mais do que a família, faltos de instrução, e de doutrina, e até dos primeiros princípios da nossa Fé, que hão de ser senão piores que feras, porque estas pela falta de aptidão, e de discurso podem fazer um dano semelhante; mas os homens dotados de talento, abandonados à lei da natureza, e criados entre as brenhas como feras, são capazes de outros maiores danos; e quando o não fazem se não pode esperar deles utilidade alguma, nem para o Reino do Céu, nem para o de S. Majestade que Deus Guarde” (9).
No plano da educação D. Luís Antônio seguiu sua vocação militarista, introduzindo as Aulas de Geometria. Desde a extinção dos jesuítas a educação pública da capitania, e de toda a colônia, estava desestruturada, tendo sido aquela ordem a responsável pela instrução da colônia desde sua ocupação. Ao chegar a São Paulo constata a pequena quantidade de pessoas hábeis na geometria, muitas apenas com alguns princípios desta, o que causava “tão grande detrimento no Real Serviço, que a cada passo se está experimentando a Sua falta; esta necessidade, e as ocasiões, que no tempo presente se multiplicam para ocorrer a defensa, e segurança destes Estados”, fazendo com que peça licença ao Rei para criar uma cadeira de geometria no convento de São Francisco, rogando ao provincial dos capuchos que concedesse ao mestre da cadeira os mesmos privilégios dos mestres de Filosofia e Teologia do convento (10). Os estudos são abertos em agosto de 1771, conforme o edital de convocação de 25 de janeiro, que prometia que os que se aplicassem a esta “utilíssima arte” seriam premiados com honras e mercês por Sua Majestade (11). Os apelos às vantagens desta “utilíssima arte” não parecem ter sensibilizado os moradores da cidade, pois em 17 de setembro de 1771 ainda não havia nenhum aluno matriculado; por meio de um bando, o governador determina que “irremessivelmente [sic] se abra a dita Aula e que nela entrem todos os militares em quem se descobrir agilidade para se aplicar a esta Arte”. Para os estudantes e para as pessoas “conhecidamente curiosas” concedia o “privilégio” de que não seriam alistadas como soldados pagos contra a sua vontade; já aos desobedientes se lhes sentaria praça, por se considerar “como vadio, inútil à República e desprezador do serviço de Sua Majestade” (12). O estado de penúria da educação na capitania é tributado, como sempre, à ação nefasta dos jesuítas. Por isso não tarda o governador a introduzir nos estudos de seus governados as renovações realizadas na Universidade de Coimbra, informando ao guardião do Convento de São Francisco, em 30 de março de 1772, que nas aulas de estudos que iriam se abrir, para a instrução da mocidade da capitania, se deveriam seguir os ditames do Compêndio Histórico do Estado da Universidade de Coimbra, com as novas diretrizes do ensino, ao que o mesmo guardião se apressa em responder que as novas aulas procederão de acordo com este “nunca assaz Louvado método” (13).
Os conventos e o lugar da mística feminina
Também da educação feminina tratará o governador; as mulheres recebiam a sua educação frequentemente nos recolhimentos e conventos. Segundo Raphael Bluteau, o recolhimento é, para as mulheres, “o pregoeiro da sua honestidade”; o recolhimento religioso é, segundo o seu Vocabulário, aquela casa com Igreja na qual vivem mulheres de diferentes estados, em clausura e em observância à sua Regente. Como estava claro em Bluteau, para a mulher, ser honrada era “gozar de bom nome e estar isenta de qualquer fama” (14). O objetivo de muitos destes recolhimentos era controlar os perigos que rondavam solteiras ou viúvas, bem como proteger as mulheres dos perigos do mundo. Podiam constituir uma residência temporária ou para que se dedicassem ao serviço de Deus (15). A Coroa procurou evitar, por vezes proibir, a abertura de conventos femininos na colônia dada a escassez de mulheres brancas aptas ao matrimônio, embora a devoção de algumas mulheres e a necessidade de disciplinar umas tantas outras, adúlteras, mulheres de má vida, órfãs, viúvas, decaídas, bastardas, solteiras sem dote, fez com que em muitas cidades brasileiras houvesse este tipo de clausura. A historiadora Leila Algranti recorda que não era exatamente o medo de despovoamento que estava em jogo na proibição de conventos, “mas reafirmar o papel da mulher na sociedade colonial, que desde o início havia sido o de ser moldado para o casamento” (16). Sobretudo no período pombalino, com o crescente controle da Coroa sobre as instituições religiosas, tornava-se ainda mais difícil a abertura de conventos, o que atrai a atenção do historiador para o interesse do morgado de Mateus em fundar o recolhimento para mulheres devotas de Nossa Senhora dos Prazeres do Campo da Luz (17). Sobretudo se lembrarmos da desconfiança com a qual eram vistas as mulheres místicas e as atitudes beatas de muitas delas, algumas vezes confundidas com heresia ou superstição, já que seu sexo era sabidamente “mais vulnerável às trapaças do demônio” (18).
Entretanto, como recorda Araújo, e demonstra a trajetória de irmã Helena, uma das fundadoras do recolhimento da Luz, muitas vezes estes locais permitiam às mulheres a “conquista de um espaço próprio, longe dos poderes masculinos (do pai ou do marido) e sem vínculo religioso”, dando a elas o direito de viverem sós ou em comunidade (19). Algranti ressalta ainda a importância dos recolhimentos paulistanos para as jovens bem nascidas, recolhidas por falta de pretendentes, de dote ou pela devoção das jovens ou de suas famílias: “Em São Paulo, zona de colonização mais antiga, onde se destacava a chamada ‘nobreza da terra’, encontraremos as descendentes de famosos ramos da linhagem paulistana tanto na Luz, como no Recolhimento de Santa Teresa” (20). Desde Santa Teresa, que dá nome à maioria dos conventos femininos na América portuguesa, a mística e a vida reclusa eram uma maneira de estar em religião para as mulheres. Sem acesso à teologia, exceção da própria Teresa de Ávila, considerada doutora da Igreja, e sem poder de liturgia, rezar missas, fornecer os sacramentos ou escutar confissões, para o que dependiam de homens, de clérigos, os recolhimentos e conventos eram um espaço ideal tanto para o controle das mulheres desencaminhadas, quanto para a própria educação das mulheres em geral, já que era necessário ao menos aprender a ler e escrever para seguir as orações e leituras devocionais (21).
A igreja de Nossa Senhora da Luz já existia quando da fundação do Recolhimento e tinha sido fundada por Domingos Luiz, o Carvoeiro, natural de Carvoeira, Torres Vedras, Portugal, e por sua mulher Ana Camacho, em 1579, inicialmente no bairro chamado Piranga, ou Ireripiranga, nas terras do casal. Em 1603 a pequena igreja teria sido transferida para o Guaré, ou Guarepe, data aceito por muitos autores, mas contestada por Taunay e Arroyo. Para este último autor, 1603 seria a data de doação do patrimônio, não de construção da igreja ou mudança do Ipiranga para o Guaré (22). A doação do Carvoeiro impôs a condição de que seus descendentes fossem os responsáveis por cuidarem da ermida a partir de então. No século XVIII é seu descendente Felipe Cardoso quem a administra, tendo-a transferido em 1729, à administração perpétua dos beneditinos, doando-lhes o patrimônio territorial que a circundava. Os beneditinos desistem da igreja por ser muito onerosa, e no período do morgado de Mateus ela já se encontrava em ruínas, sendo restaurada pelo governador para que ali fosse realizada a festa de sua padroeira, Nossa Senhora dos Prazeres (23).
São Paulo, apesar de ser uma zona periférica e de menor população já possuía seu recolhimento desde pelo menos inícios do século 18, o de Santa Teresa (24), fundado sem autorização régia, esperando-se que fosse concedida posteriormente. Em 14 de novembro de 1773, uma recolhida de Santa Teresa, madre Helena Maria do Espírito Santo, ou do Sacramento, que entrara ali como serva por ser muito pobre, tornando-se depois da doação do dote por seu diretor espiritual uma recolhida, escreve ao governador solicitando seu auxílio na criação de um novo recolhimento para mulheres na cidade com o título de Nossa Senhora do Carmo e Divina Providência. Seu objetivo, diz ao governador, era cumprir a vontade de Deus “para sua maior honra e glória para aumentar o seu Reino e de sua Majestade Fidelíssima”, uma vez que os religiosos eram “também seus fieis vassalos, que sem soldo defendem sua coroa com suas orações contra os inimigos visíveis e invisíveis” (25). Um discurso ao mesmo tempo piedoso e político, bem ao gosto de D. Luís Antônio, para quem a religião era uma aliada inestimável do bom governo ilustrado, que deveria elevar o nome de Deus e do Rei ao mesmo tempo. O governador aceita ajudá-la, solicitando, no entanto, que a padroeira fosse Nossa Senhora dos Prazeres, “para que se perpetuasse a sua festa como sempre lhe fiz no Sítio da Luz, e como sempre se faz na minha Casa de Mateus” (26). Sempre que podia D. Luís Antônio deixava marcas pessoais em atos de sua administração, destacando a virgem de sua devoção e padroeira de sua casa, fosse num recolhimento ou num presídio-fortaleza no sertão, o de Nossa Senhora dos Prazeres do Iguatemi. Ele pede a irmã Helena, ainda, que em suas devoções acrescentasse três petições que havia muito tempo trazia ao “tribunal Divino”: a salvação de sua alma, de sua família e dos sucessores de sua casa; um “grande e especial acerto” de suas disposições, para bem servir a Deus, ao Rei e a seu povo; e a conservação, duração e felicidade da casa de Mateus (27). A devoção do governador esperava a consagração de seu trabalho, no que considerava a restauração da capitania de São Paulo para o engrandecimento da monarquia e de sua família e descendência, a sua salvação política, bem como a salvação espiritual de sua alma e de seus descendentes.
Política e profecia
Na origem deste recolhimento estão as visões proféticas de irmã Helena, nascida em Apiaí em 1740: ela comunica ao seu confessor, Frei Galvão, diversas revelações de Nosso Senhor, que lhe ordenava que fundasse em São Paulo um outro recolhimento além do já existente de Santa Teresa. O Senhor voltou em seus sonhos
“rodeado de ovelhas, umas nos braços, outras pelos ombros e outras tentando subir pelo seu corpo e disse-lhe: Eis aqui estas minhas ovelhas, que procuram um aprisco para se recolherem e não o encontram, pois vós, podendo, não quereis subministrar-lhes um, fundando um Convento, em cumprimento de minha vontade” (28).
Pela pronta resposta do morgado de Mateus, o governador parecia já estar interessado nessa fundação muito antes da petição. Por isso, Arroyo aventa a possibilidade de que a idéia de fundação do recolhimento tivesse partido do próprio governador, conhecido por sua “extrema vaidade” (29), ou mesmo de Frei Galvão, responsável pela direção espiritual de irmã Helena e de suas imagens proféticas reveladas em seus sonhos. Na carta enviada ao morgado de Mateus, irmã Helena afirma que desejava fundar um novo recolhimento, não por descontentamento “da santa vida que escolhi e vivo”, diz ela, mas “para cumprir a vontade de Deus” (30). O fato de ter deixado em segredo a fundação até o momento de sua saída de Santa Teresa, e de ter sido admitida ali inicialmente como serva, por sua pobreza, indicam que sua situação neste recolhimento poderia não ser das mais confortáveis, constituindo a Luz uma alternativa para mulheres de menos recursos, como era o caso de sua fundadora. Ao mesmo tempo fica claro o caráter político e civilizador que o morgado de Mateus vê na fundação deste recolhimento, aumentando os espaços nos quais a religião funcionaria como uma esfera educadora e socializadora da população local, e como forma ainda de deixar uma marca pessoal de sua administração na capitania.
Em 2 de fevereiro de 1774, madre Helena, tornada regente do novo recolhimento, e sua sobrinha Ana da Conceição, saíam de Santa Teresa para a Luz com outras sete noviças, depois de terem mantido silêncio sobre a fundação do novo recolhimento. No mês de setembro deste ano, no dia 8, as recolhidas recebem do Bispo de São Paulo, D. Manuel da Ressurreição, o hábito branco da Imaculada Conceição, ficando constituída assim a nova comunidade sob a regência de sua fundadora (31). Embora adversário do governador, D. Manuel foi o primeiro Bispo a se identificar com o ideário do Iluminismo português, sendo grande colaborador do marquês de Pombal (32). Em 7 de novembro de 1774 o cônego da Sé, Manuel José Vaz, escreve ao governador pedindo licença real para principiar a obra, sem a qual não podia iniciá-la, aproveitando para elogiar a iniciativa, já que a nobreza da capitania não tinha “cômodos decentes para suas filhas” (33). Apesar da necessidade de licença régia, este como os outros recolhimentos da colônia eram fundados antes das autorizações do Rei, que eram enviadas quando estes locais já eram um fato consumado. A câmara, por exemplo, não teve que esperar ordem régia, pois em 12 de novembro deste ano fazia termo de aprovação e licença do recolhimento da Luz no local no qual já havia capela em honra de Nossa Senhora dos Prazeres, reformada pelo próprio governador, “abrindo portas e fazendo de novo todos os madeiramentos”, e onde já se realizava a sua festa. A câmara ressalta que para além da utilidade à devoção das recolhidas constituiria um passeio à população, servindo “de ornato de recreação e ocasião de devoção às pessoas que ali concorrem todos os dias especialmente aos sábados”. Ressalta ainda que, entrando sem dote as recolhidas não servem de ônus “nem de perturbação às famílias nem a este povo”, servindo também para que os moradores das redondezas, então afastadas do centro, pudessem ouvir missa (34). Como afirma o arquiteto Benedito Lima de Toledo, Frei Galvão acreditava que a Luz se tornaria parte importante da cidade, fazendo com que se alterasse “a disposição original do templo voltado para o Campo da Luz”; seu frontispício original era voltado para a cidade; posteriormente o seu arquiteto edificou outro, voltado para o caminho do Guaré (35), percebendo e antecipando, talvez, a transformação da área adjacente num lugar de recreio que viria a ser importante para São Paulo, como ressalta o arquiteto Hugo Segawa, com a posterior construção do Jardim Botânico, atual Parque da Luz, cujas terras foram cedidas pela câmara em 1799, e onde se realizaria uma importante feira (36). Assim, além das tradicionais funções dos conventos e recolhimentos, de assistência à pobreza e aos doentes, como hospício, maternidade, casa de caridade, acolhimento de “mulheres de mal viver”, trabalho cultural e intelectual (37), educativa e religiosa, ao Convento da Luz também podemos acrescentar uma função urbanística, desenvolvendo uma zona de expansão da cidade, criando um polo importante dedicado a atividades de ócio e comércio que identificaria a todo o bairro do Guaré, chamado a partir de então e até hoje em dia de bairro da Luz. É justamente essa antecipação de uma função urbana que vai muito além de seus muros que Toledo vê no projeto de Frei Galvão e que a câmara percebe no momento de dar sua licença de funcionamento.
Vemos na história de madre Helena a confirmação da trajetória de muitas outras mulheres beatas que escolhem a vida religiosa e de recolhimento, negando o papel destinado ao seu sexo, sobretudo na colônia americana. A irmã carmelita descalça Jacinta de São José, fundadora do recolhimento de Santa Teresa do Rio de Janeiro, em 1742, também recebeu a direção espiritual de seu confessor e biógrafo, Frei Manuel de Jesus, entre 1744 e 1745, além do vigário da Candelária, Inácio Manuel da Costa Mascarenhas, seu diretor espiritual entre 1747 e 1748. Assim como madre Helena, irmã Jacinta tinha visões proféticas, nas quais estabelecia diálogos com Deus e com Santa Teresa, o que lhe valeu uma denúncia à Inquisição e a inimizade do Bispo do Rio, D. Antônio do Desterro, que a acusava de ser uma falsa santa (38). Igualmente ao que sucede com o recolhimento da Luz, o de Santa Teresa do Rio é fundado pela ação voluntariosa de uma beata, que chega a desobedecer ao Bispo e ir a Lisboa em busca de autorização régia, do apoio de seus confessores e sem autorização prévia. O Bispo acaba por permitir às reclusas viverem sob a regra das carmelitas, comprometendo-se a obter as licenças do Rei e do Papa. Também no caso de irmã Jacinta houve a proteção de um governador, Gomes Freire de Andrade, após a sua denúncia à Inquisição que, segundo Frei Manuel de Jesus, venerava-a como a uma santa (39). Para Algranti, as vidas destas beatas são assimiladas à hagiografia, sobretudo de outras mulheres devotas, religiosas e santas em três momentos singulares: sua infância, a fundação do convento e sua morte (40). As visões e sonhos proféticos, experimentadas desde a infância, dão argumentos de autoridade que reforçam a desobediência aos religiosos, sobretudo aos Bispos, desconfiados de sua “santidade” (41), além da proteção que recebem de homens poderosos, como o morgado de Mateus. Outra santa mística e perseguida, Teresa de Jesus, serve de inspiração a essas mulheres devotas, construindo uma identidade religiosa que dá sustentação a suas pretensões e às suas trajetórias de vida mística e religiosa.
Irmã Helena chega pobre, como serva, ao recolhimento de Santa Teresa, revelando a seu primeiro confessor, padre Manuel José Vaz, ser importunada frequentemente pelo demônio. Mais tarde faria a mesma revelação a Frei Galvão, a quem confiou suas visões, que a acompanhavam desde a infância, dedicando-se a orações, jejuns e penitências contínuas (42). O caráter místico da fundação da Luz está marcado ainda na forma como irmã Helena e as outras recolhidas saem de Santa Teresa, em 2 de fevereiro de 1774: elas partem embarcadas em duas cadeiras, acompanhadas do capitão-general, do governador do bispado, do ouvidor, de Frei Galvão, em meio a uma enorme tempestade que molhou a todos, exceto a sua fundadora (43). Se madre Jacinta morre sem ter podido tomar o hábito carmelita, morrendo em sacrifício em nome de sua causa, irmã Helena não pôde fundar seu recolhimento sob esta mesma ordem carmelita, que já existia na cidade, cedendo a honra de lhe definir a invocação ao governador (44). Além disso, apesar de cumprir a ordem divina, e de formar o que Maia Fina chama de “Trindade espiritual que havia de criar o Convento da Luz”, juntamente com Frei Galvão e o morgado de Mateus, Deus não foi generoso com ela, segundo este autor, tendo-a levado para junto de si em 23 de fevereiro de 1775 (45).
Tanto madre Jacinta quanto irmã Helena recebem a proteção de um governador que, no caso do morgado de Mateus, entendia a religião como uma operação construtora de civilidade e bom governo, podendo civilizar as terras incultas e pouco “polidas” da América, sem a qual os homens não tinham nenhuma utilidade ao Estado ou à sociedade, sendo piores do que feras. Embora em colônias os recolhimentos fossem vistos com desconfiança, D. Luís Antônio vê na devoção de irmã Helena a possibilidade de uma instância pedagógica e civilizadora, que tinha ainda a vantagem de apagar um pouco mais a memória dos jesuítas na cidade e funcionar como um marco urbano de uma administração ilustrada e regeneradora, dignificando ainda mais a capital da Província. Isso sem contar a marca de sua administração e de sua casa no nome de Nossa Senhora dos Prazeres, perpetuando seu nome na capitania por ele restaurada e ressuscitada, além de contribuir para a sua salvação, uma vez que era homem de devoção sincera, deixando a marca de sua fé no convento da Luz, junto às vidas místicas de irmã Helena e de Frei Galvão.
notas
1
TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto. Cotia, Ateliê, 2007, p. 43 e seguintes. Ver também: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: um arquiteto paulista. In: TIRAPELI, Percival (org.). Arte sacra colonial: barroco memória viva. 2a edição. São Paulo, Unesp, Imprensa Oficial, 2005, p. 34-41.
2
TORRÃO FILHO, Amilcar, O 'milagre da onipotência' e a dispersão dos vadios: política urbanizadora e civilizadora em São Paulo na administração do morgado de Mateus (1765-1775). Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, XXXI(1): 145-165, 2005.
3
Carta Régia creando a Capitania de S. Paulo e Minas do Ouro e nomeando governador da mesma a Antonio de Albuquerque Coelho de Carvalho, de 9 de novembro de 1709. Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo. São Paulo, Archivo do Estado de S. Paulo. Volume 67: Officios do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão (Morgado de Mateus) aos diversos funccionarios da Capitania (1766-1767), 1943, p. 65. Cf. ROMEIRO, Adriana. Paulistas e emboabas no coração das Minas. Ideias, práticas e imaginário político no século XVIII. Belo Horizonte, UFMG, 2008.
4
Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo (op. cit.). Volume 11: Divisas de S. Paulo e Minas Geraes, 1896, p. 209-211.
5
Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo (op. cit.). Volume 67, p. 144.
6
AHU, São Paulo, cx. 5, doc. 18. Ofício do governador e capitão-general da capitania de São Paulo Morgado de Mateus, D. Luís Antônio de Souza Botelho Mourão ao Rei (D. José I), dando conta do estado em que achou a capitania, descrevendo e dando sugestões (...). 1767, Dezembro, 01. São Paulo. AHU, São Paulo, cx. 5, doc. 18 [D. 333].
7
Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo (op. cit.). Volume 23. Correspondencia do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão (1766-1768), 1896, p. 1.
8
Idem, ibidem, volume 23, p. 1.
9
Idem, ibidem, volume 23, p. 2.
10
Idem, ibidem, volume 92: Oficios do Capitão-General D. Luiz aos diversos funcionarios da Capitania (1768-1772), 1978, p. 140. Carta ao Rmo. Prval. dos Capuchos., data ileg., 1770.
11
Idem, ibidem, volume 65: Officios do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão aos diversos funccionarios da Capitania (1765-1771), 1940, p. 344.
12
Idem, ibidem, volume 33: Bandos, ordens e portarias de D. Luiz Antonio de Souza (1771-1775), 1901, p. 35.
13
Idem, ibidem, volume 64: Officios do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão aos diversos funccionarios da Capitania (1772-1775), 1939, p. 9-10.
14
BLUTEAU, Raphael. Vocabulario portuguez e latino. Coimbra, Collegio das Artes da Companhia de Jesu, 1712. Apud ARAÚJO, Maria Marta Lobo de. Os recolhimentos femininos de Braga na época moderna. In: ABREU, Laurinda de (org.). Asistencia y caridad como estrategias de intervención social: Iglesia, Estado y comunidad (siglos XV-XX). Bilbao, Universidad del País Vasco/Euskal Herriko Unibersitatea, 2007, p. 293.
15
Idem, ibidem, p. 294-295.
16
ALGRANTI, Leila Mezan, Honradas e devotas: mulheres da colônia. Condição feminina nos conventos e recolhimentos do Sudeste do Brasil, 1750-1822. Rio de Janeiro/Brasília, José Olympio/Edunb, 1993, p. 67.
17
Biblioteca Nacional. Oficio do capitão José Gonçalves Coelho, como procurador do governador Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, à Câmara da cidade de São Paulo, requerendo certidão do termo de aprovação e licença de fundação do Recolhimento de nº Sra. dos Prazeres, no campo da Luz. S.d. Acompanha o documento requerido. São Paulo, 18 de maio. 1775. I-30, 26, 22 nº 1.
18
BORGES, Célia Maia, Santa Teresa e a espiritualidade mística: a circulação de um ideário religioso no Mundo Atlântico. In: O Espaço Atlântico de Antigo Regime: Poderes e Sociedade. Centro de Estudos de Além-Mar (CHAM), Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2005, p. 5 <http://cvc.instituto-camoes.pt/eaar/coloquio/comunicacoes/celia_maia_borges.pdf>. Consultado em novembro de 2010.
19
ARAÚJO, Maria Marta Lobo de. Op. cit., p. 299.
20
ALGRANTI, Leila Mezan. Op. cit., p. 138.
21
TORRÃO FILHO, Amilcar, Mística femenina y gobierno ilustrado en São Paulo colonial. La fundación del Convento de la Luz (1774). Boletín Americanista, Barcelona, n, 2, Universitat de Barcelona, 2014, p. 179-197.
22
ARROYO, Leonardo. Igrejas de São Paulo. Introdução ao estudo dos templos mais característicos de São Paulo nas suas relações com a crônica da cidade. Rio de Janeiro, José Olympio, 1954, p. 24-25.
23
TOLEDO, Benedito Lima de. Op. cit., p. 16.
24
ALGRANTI, Leila Mezan. Op. cit., p. 69 e 85. Diz a autora que a primeira menção oficial ao recolhimento de Santa Teresa é de um parecer do Conselho Ultramarino de 1718 em resposta a um ofício da câmara de 1715.
25
Carta de 14 de novembro de 1773. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo, I(X), mar., 1935, p. 139-140. Cf. ALGRANTI, Leila Mezan. Op. cit., p. 97-98.
26
Carta de 25 de dezembro de 1773. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo, I(X), mar., 1935, p. 141.
27
Idem, ibidem.
28
Apud ARROYO, Leonardo. Op. cit., p. 34.
29
Idem, ibidem, p. 35.
30
Carta de 14 de novembro de 1773. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo (op. cit.), p. 139.
31
SILVEIRA, Carlos da. O convento da Luz. Três interessantes documentos inéditos. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo. São Paulo, I(X): 137-142, mar. 1935, p. 138..
32
WERNET, Augustin, Vida religiosa em São Paulo: do Colégio dos Jesuítas à diversificação de cultos e crenças (1554-1954). In: PORTA, Paula (org.). História da cidade de São Paulo. Volume 1: a cidade colonial. São Paulo, Paz e Terra, 2004, p. 209.
33
Biblioteca Nacional. Carta do Vigário Capitular e Cônego da Sé de São Paulo, Manuel José Vaz, ao governador da Capitania de São Paulo Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, pedindo licnça. expressa de S.M. para começar as obras de construção de um recolhimento de mulheres devotas naquela cidade. São Paulo, 7 de novembro. 1774. I-30, 26 nº 2.
34
Actas da Camara Municipal de S. Paulo. São Paulo: Archivo Municipal de S. Paulo, 1919. Volume 16 (1771-1776) , p. 347-350.
35
TOLEDO, Benedito Lima de. Op. cit., p. 50-52.
36
SEGAWA, Hugo, Ao amor do público: jardins do Brasil. São Paulo, Studio Nobel/Fapesp, 1996, p. 132. Outra utilidade deste recolhimento, que não escapou ao governador, seria dar um destino às terras na Luz que haviam sido doadas anteriormente ao padre Gabriel Malagrida, jesuíta místico e famoso adversário de Pombal executado pela Inquisição após o terremoto de 1755, por “culpas de fingimento e hipocrisia heregiarca [sic]”, nas quais desejava construir um convento de ursulinas. Estas terras foram tornadas de utilidade pública em 1770, quando a câmara nega petição dos mordomos e devotos de são Manuel para construírem ali um altar ao santo. Como essas terras foram consideradas parte do espólio dos expulsos jesuítas por Gomes Freire de Andrade, conde de Bobadela e governador do Rio, elas foram seqüestradas como as suas demais propriedades, tornando-se públicas. Cartas de Datas de Terras. Volume 5. São Paulo, Departamento de Cultura, 1937 (1755-1800), p. 66-68.
37
GÓMEZ NAVARRO, Soledad, De rejas adentro: monjas y religiosas en la España moderna. Una historia de diferencias en la igualdad. Revista de Historia Moderna, n. 29, 2011, p. 223-224.
38
ALGRANTI, Leila Mezan, Mémoire et hagiographie: la (re)construction de la vie d’une religieuse dans le Brésil colonial. Clio. Histoire, femmes et sociétés. Toulouse, n. 19, Presses Universitaires du Mirail, 2004, p. 3 <http://clio.revues.org/index657.html>. Consultado em dezembro de 2010.
39
Idem, ibidem, p. 4.
40
Idem, ibidem, p. 4.
41
Idem, ibidem, p. 8.
42
ALGRANTI, Leila Mezan. Honradas e devotas: mulheres da colônia (op. cit.), p. 97.
43
Apud ARROYO, Leonardo. Op. cit., p. 36.
44
ALGRANTI, Leila Mezan. Honradas e devotas: mulheres da colônia (op. cit.), p. 98. Cf. BORGES, Célia Maia. Op. cit., p. 9.
45
FINA, Wilson Maia. O Convento da Luz. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de S. Paulo, São Paulo, n. 65, 1968, p. 410.
bibliografia complementar
DERNTL, Maria Fernanda. Método e Arte: criação urbana e organização territorial na capitania de São Paulo, 1765-1811. Tese (Doutorado em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo). São Paulo, FAU/USP, 2010.
HOORNAERT, Eduardo et. al. História da Igreja no Brasil. Ensaio de interpretação a partir do povo. 3. ed. São Paulo/Petrópolis, PaulinasVozes, 1983.
JORGE, Clóvis de Athayde. Luz: notícias e reflexões. São Paulo, Departamento do Patrimônio Histórico, 1988.
TORRÃO FILHO, Amilcar. Paradigma do caos ou cidade da conversão? São Paulo na administração do Morgado de Mateus. São Paulo, Annablume/Fapesp, 2007.
TORRÃO FILHO, Amilcar; DERNTL, Maria Fernanda. Cidade e civilidade: um governo ilustrado na Capitania de São Paulo. In: GAZZANEO, Luiz Manoel (org.). Da Baixa Pombalina a Brasília. Iluminismo e Contemporaneidade em Países e Espaços de Língua Portuguesa. Cidades e Espacialidade. Rio de Janeiro, UFRJ/FAU/PROARQ, 2010, p. 257-275.
sobre o autor
Amilcar Torrão Filho é professor do Departamento de História da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
legendas
01. Mosteiro da Luz com os dois alçados voltados ao observador. Aquarela de Miguelzinho (Miguel Arcanjo Benício da Anunciação Dutra), 1847
Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto, p. 35
02. Foto de Militão Augusto de Azevedo, tomada da Várzea do Carmo, 1862
Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto, p. 37
03. Mosteiro da Luz em foto de Militão Augusto de Azevedo
Fonte: http://www.museuartesacra.org.br/mosteiro.html
04. Altar da Imaculada Conceição. Igreja do Mosteiro da Luz. Foto de Benedito Lima de Toledo
Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto, p. 51
05. Vista aérea do Mosteiro da Luz, com sua horta preservada
Foto de Benedito Lima de Toledo
Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto, p. 53
06. Frontispício do Mosteiro da Luz com seus dois frontões
Foto de Benedito Lima de Toledo
Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto, p. 54
07. Risco existente em parede do Mosteiro da Luz, de autoria de Frei Galvão
Foto de Benedito Lima de Toledo
Fonte: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto, p. 67.
08. Mosteiro da Luz
Foto Amilcar Torrão Filho
09. Mosteiro da Luz
Foto Amilcar Torrão Filho
10. Mosteiro da Luz
Foto Amilcar Torrão Filho
11. Mosteiro da Luz
Foto Amilcar Torrão Filho
O sumo bem contra a ruína da sociedade
Ilustração católica e mística feminina na fundação do Recolhimento da Luz em 1774
Amilcar Torrão Filho
Os alicerces de uma devoção
Na construção e fundação do mosteiro da Luz, inicialmente um recolhimento feminino, a figura de Frei Galvão, o seu construtor, está não apenas destacada como intimamente ligada à vida desta instituição. O arquiteto Benedito Lima de Toledo, dos poucos autores a ter dado a devida atenção ao Mosteiro da Luz e a seu construtor, ressaltou a qualidade e originalidade de seu projeto arquitetônico, um dos raros exemplos de igreja construída com planta octogonal no Brasil, sendo Frei Galvão responsável ainda pelo outro exemplo de planta poligonal em São Paulo, a Capela da Venerável Ordem Terceira de São Francisco. É também um dos últimos remanescentes da taipa e o exemplo mais conservado de arquitetura colonial que ainda existe em São Paulo, segundo este autor. No frontispício voltado para a atual Avenida Tiradentes há três arcos realizados em granito, o que era raro na cidade. O pórtico do mosteiro reproduz o da Igreja de São Francisco, que também possui planta octogonal. Isso não surpreende, pois Frei Galvão foi comissário da Ordem Terceira de São Francisco entre 1776 e 1780, pouco antes das obras de ampliação da Igreja. Suas pinturas de forro, pouco conhecidas por estarem em área de clausura, representam episódios da vida franciscana e da coroação da Virgem pela Santíssima Trindade (1).
Gostaria de ressaltar neste artigo a figura do governador e capitão-general da restaurada capitania de São Paulo, D. Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, o morgado de Mateus, responsável pela fundação, em 1774, do Recolhimento da Luz, juntamente com Frei Antônio de Santana Galvão e madre Helena Maria do Espírito Santo, ou do Sacramento, sua primeira Regente. Este governador, representante da Ilustração católica portuguesa e das reformas pombalinas, terá como objetivo renovar e regenerar a capitania de São Paulo, integrando-a mais diretamente ao projeto colonizador português. Ao chegar ao Brasil, D. Luís Antônio se chocará com o “atraso” e a falta de civilidade da capitania e da cidade de São Paulo. Ele constrói, em sua correspondência, um quadro de decadência e abandono das terras paulistas e, sobretudo, de sua população, bastarda, mameluca, inculta, enfermiça, não adaptada ao trabalho sistemático e ao aproveitamento de novidades como o arado, introduzido aqui pelo governador. Queixa-se da preguiça e da negligência dos colonos, da fuga dos homens da vida civil nas vilas e cidades, que viviam pelos matos, seminômades como os indígenas, sem submeterem-se à autoridade da Coroa e da Igreja, sem trabalho, sistemático, sem pagamento de impostos, sem participar das tropas, sem utilidade nenhuma, em suma (2). Por isso uma de suas principais preocupações era congregar os homens em vilas e cidades, os indígenas em aldeamentos, e educar os colonos para as virtudes da vida em sociedade e subordinação, do respeito à Coroa e à Igreja. Assim, compreende-se o interesse do governador em ilustrar e disciplinar essa população tão rebelde, como era em sua visão a paulista, incluídas as mulheres, por isso ele rapidamente encampa o projeto de Madre Helena e frei Galvão para a construção do Convento e recolhimento da Luz. Como veremos adiante, os recolhimentos serviam ao mesmo tempo para disciplinar as mulheres sós, esposas infiéis, prostitutas, criminosas, bem como resguardar a honra de esposas de marido ausente, jovens pobres em idade de casar e beatas e devotas, como o caso de Helena do Espírito Santo, que encontravam nesses espaços lugares nos quais podiam exercer sua vocação religiosa e educar-se. Já o governador, encontra nesse projeto uma institucionalização da cooperação necessária entre Igreja e Coroa para disciplinar os povos, educar para a vida civil e moral, bem como a possibilidade de deixar uma marca pessoal de sua administração na cidade, ainda que sua memória pouco tenha restado na percepção atual do convento da Luz.
Uma ilustração católica nos trópicos
Em carta régia de 9 de novembro de 1709 a antiga Capitania de São Vicente é transformada na capitania de São Paulo e Minas do Ouro, como resultado da Guerra dos Emboabas, que tinha dividido os paulistas e demais portugueses da América em torno das recém descobertas minas de ouro (3). Em 1748 a capitania de São Paulo é desmembrada das Minas Gerais, quando se criam as capitanias de Goiás e Mato Grosso, sendo então administrada por um governador em Santos, sem patente de capitão-general e submetido ao Rio de Janeiro. Depois de requerimento da câmara de Piratininga, a capitania é restaurada por Sua Majestade. O conde da Cunha, vice-rei do Brasil entre 1763 e 1767, escreve ao Rei em 12 de agosto de 1764, afirmando estar reduzida a capitania a um estado lastimável, sendo impossível governar as capitanias de São Paulo e Rio de Janeiro conjuntamente, pelas distâncias e por serem os paulistas “excessivamente inquietos e revoltosos, em território abundante de minas de ouro e nas vizinhanças dos castelhanos” (4), uma mistura demasiado perigosa na visão do vice-rei. Em carta ao Secretário de Negócios da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, o vice-rei afirma que por conta do “miserável estado a que se achava reduzida”, pela falta de governo e pela proximidade da cidade de São Paulo com o novo descoberto de São João de Jacuri, Sua Majestade decidira nomear a D. Luís Antônio de Souza para governador e capitão-general de São Paulo, que governaria a capitania entre 1765 e 1775. Dentre as suas atribuições estava a definição dos limites com Minas Gerais e Goiás além de sua recuperação, dado o miserável estado em que se encontrava (5). A transferência dos interesses portugueses para o centro-sul, por causa das minas, os conflitos de fronteira com os espanhóis e as demandas dos comerciantes de São Paulo fizeram com que o seu governo fosse restaurado.
Na capital piratiningana, a época também era de mudanças. Com a restauração, o Pátio do Colégio dos Jesuítas, expulsos em 1760, passou a se chamar Largo do Palácio servindo, a partir de 1766, como residência do novo governador. Tanto do ponto de vista simbólico como prático, esta mudança reflete a nova orientação do governo pombalino. A presença dos inacianos deveria ser apagada das cidades e aldeamentos e seus símbolos de poder deveriam ser substituídos pela presença do Estado português e de um catolicismo oficial, controlado, submisso aos compromissos com a Coroa e sem as marcas dos jesuítas. Em São Paulo, cidade baluarte construída pelos padres da Companhia de Jesus para consolidação do poder da Igreja e do Estado, enquanto aliado do papado, e também de sua própria ordem, a transferência simbólica do poder era ainda mais necessária. Para isso o novo governador envidou todos os esforços possíveis para erradicar algumas das causas do que considerava o estado miserável da capitania: a presença jesuítica, ainda evidente nos espaços da cidade, e a resistência dos “paulistas”, “inquietos e revoltosos”, em adotarem as novas diretrizes ilustradas de “gerência” da economia, da administração pública e da segurança trazidas pelo capitão-general e a enorme “preguiça” dos naturais da terra.
A desordem dos costumes
D. Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, o quarto morgado de Mateus, nasceu em 1722, na freguesia de São Veríssimo de Riba, distrito da vila de Amarante. Recebeu educação militar de seu avô, D. Luís Antônio de Souza, governador do castelo de São Tiago da Barra da vila de Viana. Comandou a resistência à ofensiva franco-espanhola em 1762, durante a Guerra dos Sete Anos (1756-1763), tendo sido promovido a coronel de infantaria. Ao ser nomeado governador da capitania de São Paulo possuía os títulos de morgado de Mateus, de Moroleiros, de Sabrosa e Cumieira, fidalgo da casa de Sua Majestade e de seu conselho, senhor donatário da vila de Ovelha do Marão, alcaide-mor da cidade de Bragança, comendador de Santa Maria de Vimioza da Ordem de Cristo e governador do castelo da Barra de Viana. Suas habilidades militares lhe garantiram a nomeação para a capitania de São Paulo, de acordo com as diretrizes do governo pombalino, de garantir a defesa da complicada fronteira sul da colônia com os castelhanos, a “recuperação” econômica e de introduzir novos e modernos elementos de governo e “gerenciamento” da administração pública e econômica.
Em ofício ao Rei de 1 de dezembro de 1767, D. Luís Antônio se queixa da desordem e decadência que encontra na capitania que irá governar: das tropas não encontra mais do que ordenanças que, embora tivessem seus capitães-mores estavam “faltas de disciplina e de obediência pela dispersão em que vivem os Povos, e pelo dos costumes”. As povoações são todas pequenas e sem nenhum modo de ganhar a vida, “os campos incultos, tudo coberto de mata brava, a lavoura por mau método, pois só se planta em mato virgem”, pela repugnância que têm os lavradores de se sujeitarem ao trabalho de “cultivarem os campos como nesse Reino. Apenas colhe cada um para o seu sustento próprio muito pouco sobra para se vender ao público”. Ninguém aproveita os recursos do país, diz o governador, achando-se o povo “reduzido à mais lastimosa pobreza”. Não encontra o governador a população assentada em vilas e cidades como gostaria, afirmando que a
“dispersão que se costuma habitar não possibilita a devida civilidade nem a necessária Doutrina Espiritual, pois procede que esquecidos os homens das obrigações com que nasceram, seguem a desordem natural dos seus costumes, uns adormecendo-se nos vícios, outros cometendo delitos, de que todos os dias se ouviam as tristes notícias” (6).
Ao marquês de Pombal, então conde de Oeiras, descreve de modo não menos desolador o estado das coisas na capitania. D. Luís observou ao ministro que a cada dia se ia “formalizando mais nos inconvenientes que se seguem ao serviço de Deus e o de S. Majestade, e ao bem comum deste Estado por causa do mau método da lavoura” (7). Não usam os paulistas as terras “como nesse Reino”, ou seja, de maneira intensiva e comercial, preferindo-se ainda uma agricultura itinerante e extensiva. Falta a adequação da colônia às necessidades do Reino: no raciocínio do governador isto se dá pela ausência da civilidade necessária aos povos para poderem adotar as normas “ilustradas” de produção e de povoamento, comuns às nações polidas da Europa, bem como da religião, a necessária aliada da monarquia na condução dos seus súditos. É o primeiro inconveniente que encontra D. Luís Antônio, a falta de religião, “e é certo que aonde se falta a Deus, que é o criador de tudo, o Sumo bem, e a fonte de toda a felicidade, não pode haver cousa boa” (8). Um segundo inconveniente, muito ligado ao primeiro, é a “falta de Sociedade, pois sendo esta a principal das obrigações civis, se acha totalmente arruinada e caminha a passos largos para o seu precipício, levando atrás de si a ruína de todo o Estado”. A falta de religião e a técnica de plantio considerada primitiva se unem para o morgado de Mateus na desintegração da sociedade, vivendo os homens afastados do convívio e sem o controle do Estado ou da Igreja. Finalmente uma terceira causa que é a falta de Justiça,
“porque vivendo os homens fora de povoado, metidos pelos Matos sem ouvirem mais do que a família, faltos de instrução, e de doutrina, e até dos primeiros princípios da nossa Fé, que hão de ser senão piores que feras, porque estas pela falta de aptidão, e de discurso podem fazer um dano semelhante; mas os homens dotados de talento, abandonados à lei da natureza, e criados entre as brenhas como feras, são capazes de outros maiores danos; e quando o não fazem se não pode esperar deles utilidade alguma, nem para o Reino do Céu, nem para o de S. Majestade que Deus Guarde” (9).
No plano da educação D. Luís Antônio seguiu sua vocação militarista, introduzindo as Aulas de Geometria. Desde a extinção dos jesuítas a educação pública da capitania, e de toda a colônia, estava desestruturada, tendo sido aquela ordem a responsável pela instrução da colônia desde sua ocupação. Ao chegar a São Paulo constata a pequena quantidade de pessoas hábeis na geometria, muitas apenas com alguns princípios desta, o que causava “tão grande detrimento no Real Serviço, que a cada passo se está experimentando a Sua falta; esta necessidade, e as ocasiões, que no tempo presente se multiplicam para ocorrer a defensa, e segurança destes Estados”, fazendo com que peça licença ao Rei para criar uma cadeira de geometria no convento de São Francisco, rogando ao provincial dos capuchos que concedesse ao mestre da cadeira os mesmos privilégios dos mestres de Filosofia e Teologia do convento (10). Os estudos são abertos em agosto de 1771, conforme o edital de convocação de 25 de janeiro, que prometia que os que se aplicassem a esta “utilíssima arte” seriam premiados com honras e mercês por Sua Majestade (11). Os apelos às vantagens desta “utilíssima arte” não parecem ter sensibilizado os moradores da cidade, pois em 17 de setembro de 1771 ainda não havia nenhum aluno matriculado; por meio de um bando, o governador determina que “irremessivelmente [sic] se abra a dita Aula e que nela entrem todos os militares em quem se descobrir agilidade para se aplicar a esta Arte”. Para os estudantes e para as pessoas “conhecidamente curiosas” concedia o “privilégio” de que não seriam alistadas como soldados pagos contra a sua vontade; já aos desobedientes se lhes sentaria praça, por se considerar “como vadio, inútil à República e desprezador do serviço de Sua Majestade” (12). O estado de penúria da educação na capitania é tributado, como sempre, à ação nefasta dos jesuítas. Por isso não tarda o governador a introduzir nos estudos de seus governados as renovações realizadas na Universidade de Coimbra, informando ao guardião do Convento de São Francisco, em 30 de março de 1772, que nas aulas de estudos que iriam se abrir, para a instrução da mocidade da capitania, se deveriam seguir os ditames do Compêndio Histórico do Estado da Universidade de Coimbra, com as novas diretrizes do ensino, ao que o mesmo guardião se apressa em responder que as novas aulas procederão de acordo com este “nunca assaz Louvado método” (13).
Os conventos e o lugar da mística feminina
Também da educação feminina tratará o governador; as mulheres recebiam a sua educação frequentemente nos recolhimentos e conventos. Segundo Raphael Bluteau, o recolhimento é, para as mulheres, “o pregoeiro da sua honestidade”; o recolhimento religioso é, segundo o seu Vocabulário, aquela casa com Igreja na qual vivem mulheres de diferentes estados, em clausura e em observância à sua Regente. Como estava claro em Bluteau, para a mulher, ser honrada era “gozar de bom nome e estar isenta de qualquer fama” (14). O objetivo de muitos destes recolhimentos era controlar os perigos que rondavam solteiras ou viúvas, bem como proteger as mulheres dos perigos do mundo. Podiam constituir uma residência temporária ou para que se dedicassem ao serviço de Deus (15). A Coroa procurou evitar, por vezes proibir, a abertura de conventos femininos na colônia dada a escassez de mulheres brancas aptas ao matrimônio, embora a devoção de algumas mulheres e a necessidade de disciplinar umas tantas outras, adúlteras, mulheres de má vida, órfãs, viúvas, decaídas, bastardas, solteiras sem dote, fez com que em muitas cidades brasileiras houvesse este tipo de clausura. A historiadora Leila Algranti recorda que não era exatamente o medo de despovoamento que estava em jogo na proibição de conventos, “mas reafirmar o papel da mulher na sociedade colonial, que desde o início havia sido o de ser moldado para o casamento” (16). Sobretudo no período pombalino, com o crescente controle da Coroa sobre as instituições religiosas, tornava-se ainda mais difícil a abertura de conventos, o que atrai a atenção do historiador para o interesse do morgado de Mateus em fundar o recolhimento para mulheres devotas de Nossa Senhora dos Prazeres do Campo da Luz (17). Sobretudo se lembrarmos da desconfiança com a qual eram vistas as mulheres místicas e as atitudes beatas de muitas delas, algumas vezes confundidas com heresia ou superstição, já que seu sexo era sabidamente “mais vulnerável às trapaças do demônio” (18).
Entretanto, como recorda Araújo, e demonstra a trajetória de irmã Helena, uma das fundadoras do recolhimento da Luz, muitas vezes estes locais permitiam às mulheres a “conquista de um espaço próprio, longe dos poderes masculinos (do pai ou do marido) e sem vínculo religioso”, dando a elas o direito de viverem sós ou em comunidade (19). Algranti ressalta ainda a importância dos recolhimentos paulistanos para as jovens bem nascidas, recolhidas por falta de pretendentes, de dote ou pela devoção das jovens ou de suas famílias: “Em São Paulo, zona de colonização mais antiga, onde se destacava a chamada ‘nobreza da terra’, encontraremos as descendentes de famosos ramos da linhagem paulistana tanto na Luz, como no Recolhimento de Santa Teresa” (20). Desde Santa Teresa, que dá nome à maioria dos conventos femininos na América portuguesa, a mística e a vida reclusa eram uma maneira de estar em religião para as mulheres. Sem acesso à teologia, exceção da própria Teresa de Ávila, considerada doutora da Igreja, e sem poder de liturgia, rezar missas, fornecer os sacramentos ou escutar confissões, para o que dependiam de homens, de clérigos, os recolhimentos e conventos eram um espaço ideal tanto para o controle das mulheres desencaminhadas, quanto para a própria educação das mulheres em geral, já que era necessário ao menos aprender a ler e escrever para seguir as orações e leituras devocionais (21).
A igreja de Nossa Senhora da Luz já existia quando da fundação do Recolhimento e tinha sido fundada por Domingos Luiz, o Carvoeiro, natural de Carvoeira, Torres Vedras, Portugal, e por sua mulher Ana Camacho, em 1579, inicialmente no bairro chamado Piranga, ou Ireripiranga, nas terras do casal. Em 1603 a pequena igreja teria sido transferida para o Guaré, ou Guarepe, data aceito por muitos autores, mas contestada por Taunay e Arroyo. Para este último autor, 1603 seria a data de doação do patrimônio, não de construção da igreja ou mudança do Ipiranga para o Guaré (22). A doação do Carvoeiro impôs a condição de que seus descendentes fossem os responsáveis por cuidarem da ermida a partir de então. No século XVIII é seu descendente Felipe Cardoso quem a administra, tendo-a transferido em 1729, à administração perpétua dos beneditinos, doando-lhes o patrimônio territorial que a circundava. Os beneditinos desistem da igreja por ser muito onerosa, e no período do morgado de Mateus ela já se encontrava em ruínas, sendo restaurada pelo governador para que ali fosse realizada a festa de sua padroeira, Nossa Senhora dos Prazeres (23).
São Paulo, apesar de ser uma zona periférica e de menor população já possuía seu recolhimento desde pelo menos inícios do século 18, o de Santa Teresa (24), fundado sem autorização régia, esperando-se que fosse concedida posteriormente. Em 14 de novembro de 1773, uma recolhida de Santa Teresa, madre Helena Maria do Espírito Santo, ou do Sacramento, que entrara ali como serva por ser muito pobre, tornando-se depois da doação do dote por seu diretor espiritual uma recolhida, escreve ao governador solicitando seu auxílio na criação de um novo recolhimento para mulheres na cidade com o título de Nossa Senhora do Carmo e Divina Providência. Seu objetivo, diz ao governador, era cumprir a vontade de Deus “para sua maior honra e glória para aumentar o seu Reino e de sua Majestade Fidelíssima”, uma vez que os religiosos eram “também seus fieis vassalos, que sem soldo defendem sua coroa com suas orações contra os inimigos visíveis e invisíveis” (25). Um discurso ao mesmo tempo piedoso e político, bem ao gosto de D. Luís Antônio, para quem a religião era uma aliada inestimável do bom governo ilustrado, que deveria elevar o nome de Deus e do Rei ao mesmo tempo. O governador aceita ajudá-la, solicitando, no entanto, que a padroeira fosse Nossa Senhora dos Prazeres, “para que se perpetuasse a sua festa como sempre lhe fiz no Sítio da Luz, e como sempre se faz na minha Casa de Mateus” (26). Sempre que podia D. Luís Antônio deixava marcas pessoais em atos de sua administração, destacando a virgem de sua devoção e padroeira de sua casa, fosse num recolhimento ou num presídio-fortaleza no sertão, o de Nossa Senhora dos Prazeres do Iguatemi. Ele pede a irmã Helena, ainda, que em suas devoções acrescentasse três petições que havia muito tempo trazia ao “tribunal Divino”: a salvação de sua alma, de sua família e dos sucessores de sua casa; um “grande e especial acerto” de suas disposições, para bem servir a Deus, ao Rei e a seu povo; e a conservação, duração e felicidade da casa de Mateus (27). A devoção do governador esperava a consagração de seu trabalho, no que considerava a restauração da capitania de São Paulo para o engrandecimento da monarquia e de sua família e descendência, a sua salvação política, bem como a salvação espiritual de sua alma e de seus descendentes.
Política e profecia
Na origem deste recolhimento estão as visões proféticas de irmã Helena, nascida em Apiaí em 1740: ela comunica ao seu confessor, Frei Galvão, diversas revelações de Nosso Senhor, que lhe ordenava que fundasse em São Paulo um outro recolhimento além do já existente de Santa Teresa. O Senhor voltou em seus sonhos
“rodeado de ovelhas, umas nos braços, outras pelos ombros e outras tentando subir pelo seu corpo e disse-lhe: Eis aqui estas minhas ovelhas, que procuram um aprisco para se recolherem e não o encontram, pois vós, podendo, não quereis subministrar-lhes um, fundando um Convento, em cumprimento de minha vontade” (28).
Pela pronta resposta do morgado de Mateus, o governador parecia já estar interessado nessa fundação muito antes da petição. Por isso, Arroyo aventa a possibilidade de que a idéia de fundação do recolhimento tivesse partido do próprio governador, conhecido por sua “extrema vaidade” (29), ou mesmo de Frei Galvão, responsável pela direção espiritual de irmã Helena e de suas imagens proféticas reveladas em seus sonhos. Na carta enviada ao morgado de Mateus, irmã Helena afirma que desejava fundar um novo recolhimento, não por descontentamento “da santa vida que escolhi e vivo”, diz ela, mas “para cumprir a vontade de Deus” (30). O fato de ter deixado em segredo a fundação até o momento de sua saída de Santa Teresa, e de ter sido admitida ali inicialmente como serva, por sua pobreza, indicam que sua situação neste recolhimento poderia não ser das mais confortáveis, constituindo a Luz uma alternativa para mulheres de menos recursos, como era o caso de sua fundadora. Ao mesmo tempo fica claro o caráter político e civilizador que o morgado de Mateus vê na fundação deste recolhimento, aumentando os espaços nos quais a religião funcionaria como uma esfera educadora e socializadora da população local, e como forma ainda de deixar uma marca pessoal de sua administração na capitania.
Em 2 de fevereiro de 1774, madre Helena, tornada regente do novo recolhimento, e sua sobrinha Ana da Conceição, saíam de Santa Teresa para a Luz com outras sete noviças, depois de terem mantido silêncio sobre a fundação do novo recolhimento. No mês de setembro deste ano, no dia 8, as recolhidas recebem do Bispo de São Paulo, D. Manuel da Ressurreição, o hábito branco da Imaculada Conceição, ficando constituída assim a nova comunidade sob a regência de sua fundadora (31). Embora adversário do governador, D. Manuel foi o primeiro Bispo a se identificar com o ideário do Iluminismo português, sendo grande colaborador do marquês de Pombal (32). Em 7 de novembro de 1774 o cônego da Sé, Manuel José Vaz, escreve ao governador pedindo licença real para principiar a obra, sem a qual não podia iniciá-la, aproveitando para elogiar a iniciativa, já que a nobreza da capitania não tinha “cômodos decentes para suas filhas” (33). Apesar da necessidade de licença régia, este como os outros recolhimentos da colônia eram fundados antes das autorizações do Rei, que eram enviadas quando estes locais já eram um fato consumado. A câmara, por exemplo, não teve que esperar ordem régia, pois em 12 de novembro deste ano fazia termo de aprovação e licença do recolhimento da Luz no local no qual já havia capela em honra de Nossa Senhora dos Prazeres, reformada pelo próprio governador, “abrindo portas e fazendo de novo todos os madeiramentos”, e onde já se realizava a sua festa. A câmara ressalta que para além da utilidade à devoção das recolhidas constituiria um passeio à população, servindo “de ornato de recreação e ocasião de devoção às pessoas que ali concorrem todos os dias especialmente aos sábados”. Ressalta ainda que, entrando sem dote as recolhidas não servem de ônus “nem de perturbação às famílias nem a este povo”, servindo também para que os moradores das redondezas, então afastadas do centro, pudessem ouvir missa (34). Como afirma o arquiteto Benedito Lima de Toledo, Frei Galvão acreditava que a Luz se tornaria parte importante da cidade, fazendo com que se alterasse “a disposição original do templo voltado para o Campo da Luz”; seu frontispício original era voltado para a cidade; posteriormente o seu arquiteto edificou outro, voltado para o caminho do Guaré (35), percebendo e antecipando, talvez, a transformação da área adjacente num lugar de recreio que viria a ser importante para São Paulo, como ressalta o arquiteto Hugo Segawa, com a posterior construção do Jardim Botânico, atual Parque da Luz, cujas terras foram cedidas pela câmara em 1799, e onde se realizaria uma importante feira (36). Assim, além das tradicionais funções dos conventos e recolhimentos, de assistência à pobreza e aos doentes, como hospício, maternidade, casa de caridade, acolhimento de “mulheres de mal viver”, trabalho cultural e intelectual (37), educativa e religiosa, ao Convento da Luz também podemos acrescentar uma função urbanística, desenvolvendo uma zona de expansão da cidade, criando um polo importante dedicado a atividades de ócio e comércio que identificaria a todo o bairro do Guaré, chamado a partir de então e até hoje em dia de bairro da Luz. É justamente essa antecipação de uma função urbana que vai muito além de seus muros que Toledo vê no projeto de Frei Galvão e que a câmara percebe no momento de dar sua licença de funcionamento.
Vemos na história de madre Helena a confirmação da trajetória de muitas outras mulheres beatas que escolhem a vida religiosa e de recolhimento, negando o papel destinado ao seu sexo, sobretudo na colônia americana. A irmã carmelita descalça Jacinta de São José, fundadora do recolhimento de Santa Teresa do Rio de Janeiro, em 1742, também recebeu a direção espiritual de seu confessor e biógrafo, Frei Manuel de Jesus, entre 1744 e 1745, além do vigário da Candelária, Inácio Manuel da Costa Mascarenhas, seu diretor espiritual entre 1747 e 1748. Assim como madre Helena, irmã Jacinta tinha visões proféticas, nas quais estabelecia diálogos com Deus e com Santa Teresa, o que lhe valeu uma denúncia à Inquisição e a inimizade do Bispo do Rio, D. Antônio do Desterro, que a acusava de ser uma falsa santa (38). Igualmente ao que sucede com o recolhimento da Luz, o de Santa Teresa do Rio é fundado pela ação voluntariosa de uma beata, que chega a desobedecer ao Bispo e ir a Lisboa em busca de autorização régia, do apoio de seus confessores e sem autorização prévia. O Bispo acaba por permitir às reclusas viverem sob a regra das carmelitas, comprometendo-se a obter as licenças do Rei e do Papa. Também no caso de irmã Jacinta houve a proteção de um governador, Gomes Freire de Andrade, após a sua denúncia à Inquisição que, segundo Frei Manuel de Jesus, venerava-a como a uma santa (39). Para Algranti, as vidas destas beatas são assimiladas à hagiografia, sobretudo de outras mulheres devotas, religiosas e santas em três momentos singulares: sua infância, a fundação do convento e sua morte (40). As visões e sonhos proféticos, experimentadas desde a infância, dão argumentos de autoridade que reforçam a desobediência aos religiosos, sobretudo aos Bispos, desconfiados de sua “santidade” (41), além da proteção que recebem de homens poderosos, como o morgado de Mateus. Outra santa mística e perseguida, Teresa de Jesus, serve de inspiração a essas mulheres devotas, construindo uma identidade religiosa que dá sustentação a suas pretensões e às suas trajetórias de vida mística e religiosa.
Irmã Helena chega pobre, como serva, ao recolhimento de Santa Teresa, revelando a seu primeiro confessor, padre Manuel José Vaz, ser importunada frequentemente pelo demônio. Mais tarde faria a mesma revelação a Frei Galvão, a quem confiou suas visões, que a acompanhavam desde a infância, dedicando-se a orações, jejuns e penitências contínuas (42). O caráter místico da fundação da Luz está marcado ainda na forma como irmã Helena e as outras recolhidas saem de Santa Teresa, em 2 de fevereiro de 1774: elas partem embarcadas em duas cadeiras, acompanhadas do capitão-general, do governador do bispado, do ouvidor, de Frei Galvão, em meio a uma enorme tempestade que molhou a todos, exceto a sua fundadora (43). Se madre Jacinta morre sem ter podido tomar o hábito carmelita, morrendo em sacrifício em nome de sua causa, irmã Helena não pôde fundar seu recolhimento sob esta mesma ordem carmelita, que já existia na cidade, cedendo a honra de lhe definir a invocação ao governador (44). Além disso, apesar de cumprir a ordem divina, e de formar o que Maia Fina chama de “Trindade espiritual que havia de criar o Convento da Luz”, juntamente com Frei Galvão e o morgado de Mateus, Deus não foi generoso com ela, segundo este autor, tendo-a levado para junto de si em 23 de fevereiro de 1775 (45).
Tanto madre Jacinta quanto irmã Helena recebem a proteção de um governador que, no caso do morgado de Mateus, entendia a religião como uma operação construtora de civilidade e bom governo, podendo civilizar as terras incultas e pouco “polidas” da América, sem a qual os homens não tinham nenhuma utilidade ao Estado ou à sociedade, sendo piores do que feras. Embora em colônias os recolhimentos fossem vistos com desconfiança, D. Luís Antônio vê na devoção de irmã Helena a possibilidade de uma instância pedagógica e civilizadora, que tinha ainda a vantagem de apagar um pouco mais a memória dos jesuítas na cidade e funcionar como um marco urbano de uma administração ilustrada e regeneradora, dignificando ainda mais a capital da Província. Isso sem contar a marca de sua administração e de sua casa no nome de Nossa Senhora dos Prazeres, perpetuando seu nome na capitania por ele restaurada e ressuscitada, além de contribuir para a sua salvação, uma vez que era homem de devoção sincera, deixando a marca de sua fé no convento da Luz, junto às vidas místicas de irmã Helena e de Frei Galvão.
sobre o autor
Amilcar Torrão Filho é professor do Departamento de História da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
notas
1
TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: arquiteto. Cotia, Ateliê, 2007, p. 43 e seguintes. Ver também: TOLEDO, Benedito Lima de. Frei Galvão: um arquiteto paulista. In: TIRAPELI, Percival (org.). Arte sacra colonial: barroco memória viva. 2a edição. São Paulo, Unesp, Imprensa Oficial, 2005, p. 34-41.
2
TORRÃO FILHO, Amilcar, O 'milagre da onipotência' e a dispersão dos vadios: política urbanizadora e civilizadora em São Paulo na administração do morgado de Mateus (1765-1775). Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, XXXI(1): 145-165, 2005.
3
Carta Régia creando a Capitania de S. Paulo e Minas do Ouro e nomeando governador da mesma a Antonio de Albuquerque Coelho de Carvalho, de 9 de novembro de 1709. Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo. São Paulo, Archivo do Estado de S. Paulo. Volume 67: Officios do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão (Morgado de Mateus) aos diversos funccionarios da Capitania (1766-1767), 1943, p. 65. Cf. ROMEIRO, Adriana. Paulistas e emboabas no coração das Minas. Ideias, práticas e imaginário político no século XVIII. Belo Horizonte, UFMG, 2008.
4
Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo (op. cit.). Volume 11: Divisas de S. Paulo e Minas Geraes, 1896, p. 209-211.
5
Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo (op. cit.). Volume 67, p. 144.
6
AHU, São Paulo, cx. 5, doc. 18. Ofício do governador e capitão-general da capitania de São Paulo Morgado de Mateus, D. Luís Antônio de Souza Botelho Mourão ao Rei (D. José I), dando conta do estado em que achou a capitania, descrevendo e dando sugestões (...). 1767, Dezembro, 01. São Paulo. AHU, São Paulo, cx. 5, doc. 18 [D. 333].
7
Documentos interessantes para a historia e costumes de S. Paulo (op. cit.). Volume 23. Correspondencia do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão (1766-1768), 1896, p. 1.
8
Idem, ibidem, volume 23, p. 1.
9
Idem, ibidem, volume 23, p. 2.
10
Idem, ibidem, volume 92: Oficios do Capitão-General D. Luiz aos diversos funcionarios da Capitania (1768-1772), 1978, p. 140. Carta ao Rmo. Prval. dos Capuchos., data ileg., 1770.
11
Idem, ibidem, volume 65: Officios do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão aos diversos funccionarios da Capitania (1765-1771), 1940, p. 344.
12
Idem, ibidem, volume 33: Bandos, ordens e portarias de D. Luiz Antonio de Souza (1771-1775), 1901, p. 35.
13
Idem, ibidem, volume 64: Officios do Capitão-General D. Luiz Antonio de Souza de Souza Botelho Mourão aos diversos funccionarios da Capitania (1772-1775), 1939, p. 9-10.
14
BLUTEAU, Raphael. Vocabulario portuguez e latino. Coimbra, Collegio das Artes da Companhia de Jesu, 1712. Apud ARAÚJO, Maria Marta Lobo de. Os recolhimentos femininos de Braga na época moderna. In: ABREU, Laurinda de (org.). Asistencia y caridad como estrategias de intervención social: Iglesia, Estado y comunidad (siglos XV-XX). Bilbao, Universidad del País Vasco/Euskal Herriko Unibersitatea, 2007, p. 293.
15
Idem, ibidem, p. 294-295.
16
ALGRANTI, Leila Mezan, Honradas e devotas: mulheres da colônia. Condição feminina nos conventos e recolhimentos do Sudeste do Brasil, 1750-1822. Rio de Janeiro/Brasília, José Olympio/Edunb, 1993, p. 67.
17
Biblioteca Nacional. Oficio do capitão José Gonçalves Coelho, como procurador do governador Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, à Câmara da cidade de São Paulo, requerendo certidão do termo de aprovação e licença de fundação do Recolhimento de nº Sra. dos Prazeres, no campo da Luz. S.d. Acompanha o documento requerido. São Paulo, 18 de maio. 1775. I-30, 26, 22 nº 1.
18
BORGES, Célia Maia, Santa Teresa e a espiritualidade mística: a circulação de um ideário religioso no Mundo Atlântico. In: O Espaço Atlântico de Antigo Regime: Poderes e Sociedade. Centro de Estudos de Além-Mar (CHAM), Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2005, p. 5 <http://cvc.instituto-camoes.pt/eaar/coloquio/comunicacoes/celia_maia_borges.pdf>. Consultado em novembro de 2010.
19
ARAÚJO, Maria Marta Lobo de. Op. cit., p. 299.
20
ALGRANTI, Leila Mezan. Op. cit., p. 138.
21
TORRÃO FILHO, Amilcar, Mística femenina y gobierno ilustrado en São Paulo colonial. La fundación del Convento de la Luz (1774). Boletín Americanista, Barcelona, n, 2, Universitat de Barcelona, 2014, p. 179-197.
22
ARROYO, Leonardo. Igrejas de São Paulo. Introdução ao estudo dos templos mais característicos de São Paulo nas suas relações com a crônica da cidade. Rio de Janeiro, José Olympio, 1954, p. 24-25.
23
TOLEDO, Benedito Lima de. Op. cit., p. 16.
24
ALGRANTI, Leila Mezan. Op. cit., p. 69 e 85. Diz a autora que a primeira menção oficial ao recolhimento de Santa Teresa é de um parecer do Conselho Ultramarino de 1718 em resposta a um ofício da câmara de 1715.
25
Carta de 14 de novembro de 1773. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo, I(X), mar., 1935, p. 139-140. Cf. ALGRANTI, Leila Mezan. Op. cit., p. 97-98.
26
Carta de 25 de dezembro de 1773. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo, I(X), mar., 1935, p. 141.
27
Idem, ibidem.
28
Apud ARROYO, Leonardo. Op. cit., p. 34.
29
Idem, ibidem, p. 35.
30
Carta de 14 de novembro de 1773. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo (op. cit.), p. 139.
31
SILVEIRA, Carlos da. O convento da Luz. Três interessantes documentos inéditos. Revista do Arquivo Municipal de São Paulo. São Paulo, I(X): 137-142, mar. 1935, p. 138..
32
WERNET, Augustin, Vida religiosa em São Paulo: do Colégio dos Jesuítas à diversificação de cultos e crenças (1554-1954). In: PORTA, Paula (org.). História da cidade de São Paulo. Volume 1: a cidade colonial. São Paulo, Paz e Terra, 2004, p. 209.
33
Biblioteca Nacional. Carta do Vigário Capitular e Cônego da Sé de São Paulo, Manuel José Vaz, ao governador da Capitania de São Paulo Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, pedindo licnça. expressa de S.M. para começar as obras de construção de um recolhimento de mulheres devotas naquela cidade. São Paulo, 7 de novembro. 1774. I-30, 26 nº 2.
34
Actas da Camara Municipal de S. Paulo. São Paulo: Archivo Municipal de S. Paulo, 1919. Volume 16 (1771-1776) , p. 347-350.
35
TOLEDO, Benedito Lima de. Op. cit., p. 50-52.
36
SEGAWA, Hugo, Ao amor do público: jardins do Brasil. São Paulo, Studio Nobel/Fapesp, 1996, p. 132. Outra utilidade deste recolhimento, que não escapou ao governador, seria dar um destino às terras na Luz que haviam sido doadas anteriormente ao padre Gabriel Malagrida, jesuíta místico e famoso adversário de Pombal executado pela Inquisição após o terremoto de 1755, por “culpas de fingimento e hipocrisia heregiarca [sic]”, nas quais desejava construir um convento de ursulinas. Estas terras foram tornadas de utilidade pública em 1770, quando a câmara nega petição dos mordomos e devotos de são Manuel para construírem ali um altar ao santo. Como essas terras foram consideradas parte do espólio dos expulsos jesuítas por Gomes Freire de Andrade, conde de Bobadela e governador do Rio, elas foram seqüestradas como as suas demais propriedades, tornando-se públicas. Cartas de Datas de Terras. Volume 5. São Paulo, Departamento de Cultura, 1937 (1755-1800), p. 66-68.
37
GÓMEZ NAVARRO, Soledad, De rejas adentro: monjas y religiosas en la España moderna. Una historia de diferencias en la igualdad. Revista de Historia Moderna, n. 29, 2011, p. 223-224.
38
ALGRANTI, Leila Mezan, Mémoire et hagiographie: la (re)construction de la vie d’une religieuse dans le Brésil colonial. Clio. Histoire, femmes et sociétés. Toulouse, n. 19, Presses Universitaires du Mirail, 2004, p. 3 <http://clio.revues.org/index657.html>. Consultado em dezembro de 2010.
39
Idem, ibidem, p. 4.
40
Idem, ibidem, p. 4.
41
Idem, ibidem, p. 8.
42
ALGRANTI, Leila Mezan. Honradas e devotas: mulheres da colônia (op. cit.), p. 97.
43
Apud ARROYO, Leonardo. Op. cit., p. 36.
44
ALGRANTI, Leila Mezan. Honradas e devotas: mulheres da colônia (op. cit.), p. 98. Cf. BORGES, Célia Maia. Op. cit., p. 9.
45
FINA, Wilson Maia. O Convento da Luz. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de S. Paulo, São Paulo, n. 65, 1968, p. 410.
Bibliografia complementar
DERNTL, Maria Fernanda. Método e Arte: criação urbana e organização territorial na capitania de São Paulo, 1765-1811. Tese (Doutorado em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo). São Paulo: FAU/USP, 2010.
HOORNAERT, Eduardo et. al. História da Igreja no Brasil. Ensaio de interpretação a partir do povo. 3. ed. São Paulo: Paulinas; Petrópolis: Vozes, 1983.
JORGE, Clóvis de Athayde. Luz: notícias e reflexões. São Paulo, Departamento do Patrimônio Histórico, 1988.
TORRÃO FILHO, Amilcar. Paradigma do caos ou cidade da conversão? São Paulo na administração do Morgado de Mateus. São Paulo, Annablume/Fapesp, 2007.
TORRÃO FILHO, Amilcar; DERNTL, Maria Fernanda. Cidade e civilidade: um governo ilustrado na Capitania de São Paulo. In: GAZZANEO, Luiz Manoel (org.). Da Baixa Pombalina a Brasília. Iluminismo e Contemporaneidade em Países e Espaços de Língua Portuguesa. Cidades e Espacialidade. Rio de Janeiro: UFRJ/FAU/PROARQ, 2010, pp. 257-275.