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architexts ISSN 1809-6298


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português
Sobre a retirada dos alemães de Paris, a partir de ensaio de Jean-Paul Sartre (1945) e "La force de l’âge" de Simone de Beauvoir, com o objetivo de perceber como duas diferentes sensibilidades compreenderam esse episódio que marcou Paris e a França.

english
About the withdrawal of the Germans from Paris, from the view of Jean Paul Sartre (1945) and "La force de l’âge" from Simone Beauvoir, in order to understand how two different understood this episode so important to both France and Paris.


how to quote

LIMA, Adson Cristiano Bozzi Ramatis. Agosto de 1944: as jornadas da liberação de Paris. A reflexão e o testemunho de Sartre e de Simone de Beauvoir. Arquitextos, São Paulo, ano 15, n. 180.06, Vitruvius, maio 2015 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/15.180/5570>.

“Paris outragé! Paris brisé! Paris martyrisé! Mais Paris libéré!“
Charles de Gaulle (1)

Introdução

Em agosto de 1944, com a entrada das forças do General francês Leclerc e do General norte-americano Barton, a cidade de Paris, ocupada pelo exército alemão desde julho de 1940, foi liberada. As imagens dos resistentes franceses combatendo os alemães com o pouco de que dispunham como armamento, isto é, revólveres e algumas poucas granadas, correram o mundo. Correu o mundo, igualmente, a imagem do General de Gaulle atravessando a cidade enquanto ainda se ouviam disparos de franco-atiradores escondidos nos telhados das construções. Parecia que a França e os franceses encontravam, finalmente, a dignidade e a grandeza que haviam sido perdidas com a rápida derrota e com os posteriores casos de colaboração com o regime nazista. Contudo, o que esse episódio épico teria de mito e o que, por outro lado, teria de fatual? A pergunta é pertinente porque, nesse caso como em muitos outros, o tempo encobriu o passado com algumas camadas de interpretação e com tantas outras de lendas (2). Há nesse episódio, igualmente, uma questão que não deixa de ser interessante: a cidade, espaço da vida urbana cotidiana de todo cidadão, tornou-se, naquele momento, o palco de uma batalha. Paris, que havia sido poupada da destruição pela rápida derrota francesa, foi o epicentro no qual se encontraram os esforços de guerra dos aliados e do regime nazista; encontro marcado tanto pelo acaso quanto pelas táticas de ambas as forças militares (3).

Soldados americanos olham a bandeira tricolor da França hasteada na Torre Eiffel
Foto divulgação [U.S. National Archives and Records Administration]

No seu livro de memórias La force de l’âge Simone de Beauvoir narrou, de maneira um tanto romântica, as jornadas de agosto de 1944: a resistência não organizada, os tiroteios nas calçadas, as fugas desordenadas para buscar abrigo nas lojas e restaurantes e o medo constante de que os alemães, em retirada, resolvessem explodir a cidade (4). Essa narrativa deixou evidente a fragilidade de uma cidade, de qualquer cidade, em face de uma realidade que os seus cidadãos não podiam, em absoluto, controlar. Jean-Paul Sartre escreveu em duas ocasiões sobre as jornadas da liberação de Paris: publicou no jornal Le Combat, a pedido de Albert Camus, que na época o dirigia, uma série de reportagens intituladas, no seu conjunto, Un promeneur dans Paris insurgé; e publicou, em agosto de 1945, na revista Clartés, um breve ensaio intitulado La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. Com um ano separando-o desse evento, Sartre faz nesse ensaio uma espécie de reflexão sobre o que, de fato, teria representado a liberação para o futuro da França e dos franceses.

O objetivo desse artigo é cotejar a narrativa de Beauvoir com a reflexão estabelecida por Sartre. Trata-se, então, de aproximar um extrato de um texto – na realidade, um livro, como já afirmamos, de memórias – com um ensaio político; tentar-se-á com esse procedimento perceber como duas diferentes sensibilidades (ainda que culturalmente muito próximas) compreenderam esse episódio, que, como sabemos, teve uma grande importância na história da França. Antes de iniciar a nossa proposta, todavia, convém realizar um esclarecimento da cronologia dos textos que analisaremos; o ensaio de Sartre foi escrito e publicado já no ano de 1945, e o livro de Beauvoir foi publicado, pela primeira vez, quinze anos após. Este fato tem implicações, posto que a ensaísta francesa teria tido tempo para amadurecer a sua compreensão sobre os fatos ocorridos em agosto de 1944; o filósofo francês, por sua vez, escreveu quando se comemorava o primeiro aniversário da liberação, e ainda estava profundamente marcado tanto pela ocupação quanto pela insurreição popular que ocorrera com o recuo das tropas alemãs. Outro esclarecimento importante é o fato de que, nesse artigo, não se estará agindo como historiador tout-court, e isto significa que não trataremos dos fatos em si, mas do testemunho narrado por dois intelectuais parisienses que, de alguma forma, os vivenciaram.

Um fotógrafo da AFPU beija uma criança na liberação de Paris, 26 de agosto de 1944
Malindine E. G. (Capt), No 5 Army Film & Photographic Unit [Collections of the Imperial War Museums]

Paris liberada

“Em onze de agosto, os jornais e o rádio anunciaram que os americanos se aproximavam de Chartres” (5). Assim Beauvoir narrou o início das épicas jornadas que culminariam com a liberação de Paris, e, confessando que não poderia de maneira nenhuma perder esse episódio histórico, tentou, junto com o seu companheiro Sartre, fazer rapidamente o trajeto – inicialmente em bicicleta, e, depois, em um vagão de trem – que os separava da capital francesa. Chegaram à cidade na noite desse mesmo dia, e rapidamente foram ao café Flore discutir com o igualmente escritor Albert Camus os possíveis destinos que aguardariam Paris: “Todos os chefes da Resistência estavam de acordo: Paris deveria se liberar a si mesma” (6). E o que significaria isso? Ora, tanto as forças norte-americanas quanto as forças francesas se aproximavam, mas, na opinião de muitos parisienses, deveriam ser eles os agentes da libertação da sua cidade. Sartre, já em 1945, parecia estar bem menos otimista que teria estado um ano antes, e escreveu: “Hoje, se você não proclamar que Paris liberou a si mesma, você passa por um inimigo do povo. Contudo, parece evidente que a cidade não teria podido sequer pensar em se insurgir se os Aliados não estivessem tão próximos” (7). O filósofo francês reconheceu, então, o fato de que um punhado de cidadãos – ainda que bem intencionados – dificilmente conseguiria derrotar um exército regular e disciplinado. Naquele momento, contudo, o propósito era menos derrotar os alemães estacionados em Paris do que recuperar a dignidade e regatar o seu orgulho de “cidadão de Paris”: “[...] eles quiseram afirmar a soberania do povo francês e eles compreenderam que eles não dispunham de outro meio, para legitimar um poder que emanava deles mesmos, senão o de derramar o seu próprio sangue” (8). Dito de outra maneira, o objetivo era nobre e justo, mas o sucesso da empreitada era limitado devido à escassez de recursos militares à disposição.

02. Sentinela da resistência francesa, 23 de agosto de 1944
Foto Pierre Jahan [Wikimedia Commons]

E como Simone de Beauvoir teria descrito essa insurreição popular? Nesse extrato, pode-se ler: “Nós voltamos para a Rive Gauche, na Praça de Saint-Germain-des-Près, e, no bulevar, um homem trabalhava para erguer uma barricada; eu cruzei com Francis Vintennon, um fuzil pendurado nas costas, um lenço vermelho no pescoço, ele estava demais” (9) Ora, percebe-se que a ensaísta francesa abordou a resistência parisiense sob um viés quase romântico, como se os parisienses tivessem se tornado, de repente, os legítimos herdeiros das lutas revolucionárias do século XIX (10). A sua descrição, que está muito longe de questionar a eficácia da resistência – o que, aliás, ela poderia ter feito, uma vez que escreveu as suas memórias quinze anos depois dos eventos –; tem, ao menos, o mérito de apresentar a transição de uma cidade ocupada e relativamente submissa a uma cidade que tenta tomar o seu destino nas suas próprias mãos (11). E há, certamente, a descrição de uma Paris única, metade em guerra e metade em festa (12) um período no qual a cidade encontrava-se dividida entre a alegria da liberação que é sentida como muito próxima e a angústia da incerteza, posto que o exército alemão ainda estava presente:

“Um perigo ainda ameaçava a todos nós: em se retirando, eles [os alemães] poderiam explodir Paris. Pessoas bem informadas diziam que o subsolo estava minado em toda a região em torno do Senado; na Rua de Seine como em Montparnasse, nós seríamos pulverizados” (13).

Contudo, o sentimento final de Beauvoir sobre essa inquietante questão é de resignação: afinal, não se deve ter preocupação em relação ao que não se pode controlar, e, se a insurreição é percebida como necessária para que os parisienses pudessem resgatar o seu sentimento de orgulho e de pertencimento a uma comunidade urbana, devia-se, então, enfrentar as inevitáveis consequências de tal escolha. Não foi de outra maneira que Sartre se expressou: “Não dependiam deles que os alemães explodissem ou não o Senado e, com este, todo um quarteirão. Não dependia deles que as divisões em retirada se voltassem a Paris e fizessem da nossa cidade uma nova Varsóvia.” (14). A diferença de dicção entre ambos os textos, todavia, é flagrante: enquanto Beauvoir colocou-se como um agente que teria, supostamente, o seu quinhão de participação na insurreição, Sartre, por sua vez, referiu-se aos insurretos como “eles”, colocando-se, portanto, na condição de um analista exterior aos acontecimentos e que tenta, dessa maneira, mostrar-se imparcial nas suas reflexões.

Gendarmes e um combatente da resistência francesa vigiam o Sena durante a Batalha de Paris
Foto divulgação [Wikimedia Commons]

Mas, é mister afirmar que a suposta ação de Simone de Beauvoir nas “barricadas de Paris” pareceu ter-se limitado a assistir as dramáticas cenas que se desenrolavam nas ruas da cidade: os franco-atiradores que, no telhados das construções, representavam um perigo nada desprezível para os passantes, os tanques alemães que atravessavam velozmente as ruas, as poças de sangue que tingiam de vermelho as calçadas, a procura frenética por munição, as pessoas que passavam de bicicleta espalhando possíveis boatos e, finalmente, os tiros de metralhadora que eram ouvidos ao longe (15). Pela descrição de Beauvoir, a cidade de Paris, que antes da guerra tinha uma frenética vida boêmia – além do seu caráter industrioso –, e que, posteriormente, havia ganhado um aspecto sombrio de cidade ocupada (“Hoje eu vejo o que era: Paris estava morta.” (16)), em agosto de 1944 assemelhava-se mais a um campo de batalha (17). Pela sua narrativa, percebe-se que a ensaísta francesa tinha ao menos uma certeza imperiosa: era necessário, a todo custo, derrotar os alemães e expulsá-los de Paris. Sartre, em 1945, foi mais pragmático: “Aliás, não se expulsa quem já está saindo por vontade própria, e os alemães, quando a insurreição começou, já haviam começado a evacuar a cidade.” (18). Ora, segundo o filósofo francês, o que os parisienses realmente fizeram foi retardar e dificultar a partida das tropas alemães da sua cidade. Outra questão importante é o fato de que, durante essas jornadas, Paris havia se tornado uma cidade dividida, e, o que seria mais desolador e perigoso é que não havia limites claros nessa divisão, tratar-se-ia, se preferirem, de uma espécie de fronteira móvel, separando zona seguras daquelas nas quais a “batalha de ruas” se desenrolava:

“Em pequenas ruas, crianças brincavam de amarelinha, as pessoas flanavam com despreocupação; nós saímos para as margens e nós nos imobilizamos: as calçadas estavam desertas, e balas sibilavam, e, atrás de nós, se estendia um no man’s land de onde a vida tinha se retirado. Nós o atravessamos correndo, e sob a ponte os passantes se curvavam de modo a fazer com que os parapeitos se tornassem muralhas” (19).

Nessa cidade a ordem parecia não mais existir, aliás, ainda existia em certos pontos, mas tratava-se da ordem antiga imposta pelos alemães e que, a esse título, deveria ser combatida a todo custo. E foi dessa maneira que Sartre compreendeu essa espécie de fratura na ordem estabelecida: “O Apocalipse: isto é, uma organização espontânea das forças revolucionárias” (20). Pela liberdade (21), nos limites certamente estreitos da sua ação, segundo Sartre, os insurretos teriam trinfado sobre o elemento que os dominava e que quase sempre os havia vencido e subjugado: a ordem. As vitoriosas jornadas de agosto de 1944 teriam sido um Triunfo do Apocalipse e, igualmente, um triunfo da Liberdade (22). A patente inutilidade dessa ação – que foi, como vimos, claramente reconhecida pelo filósofo francês – somente acentuava o seu caráter simbólico: homens mal armados que escolheram o seu destino e, assim fazendo, escreveram a história (ao menos a história da França e a de Paris): “Choltitz, hesitando em destruir Paris, os Aliados, aceitando adiantar a data da sua entrada na capital, os resistentes, escolhendo travar a sua grande batalha, todos decidiram que o evento seria ‘histórico’” (23). Então, segundo Sartre, aceitando a morte como uma possibilidade próxima, os insurretos teriam escrito a história, e, ainda segundo o filósofo francês, teria sido este o aspecto mais tocante daquelas jornadas: o seu aspecto de um cerimonioso “sacrifício humano” (24).

Membros da resistência francesa lutam contra soldados alemães e colaboracionistas franceses do outro lado da rua da famosa Le Grand Hôtel, Paris, agosto 1944
Foto divulgação [Wikimedia Commons]

Últimas considerações

A liberação de Paris, que, no final das contas, não passou de uma nota de rodapé na história da Segunda Guerra Mundial, tornou os parisienses cidadãos livres na sua própria cidade, que, dessa maneira, perdeu o seu caráter de “cárcere domiciliar”. Mas o fim da guerra não significou que o mundo havia, como por encanto, se tornado mais simples; a descoberta dos campos de concentração (25) e as bombas atômicas lançadas em solo japonês mostraram a possibilidade da morte em escala industrial e deixaram clara a fragilidade da existência humana. Ora, nem Sartre nem Beauvoir ficaram indiferentes a essa realidade: Beauvoir tornou-se, posteriormente, uma militante feminista e Sartre tornou-se um ativista político, engajado a ponto de alterar o sentido do conceito de liberdade, como afirmou Contat:

“A questão da liberdade, de filosófica, tornou política. Em que condições pode-se querer a liberdade que todos almejam, mas que a negam pelos seus atos? Pensar a liberdade é, principalmente, medir as suas alienações de todos os tipos. Mas a alienação não é primeira, uma vez que ela pressupõe a liberdade; esta é a convicção de Sartre, e, igualmente, a sua aposta” (26).

A dimensão política da liberdade tomou um papel tão importante na vida do filósofo francês que este chegou a renegar antigas paixões, como a admiração que ele nutria pelos Estados Unidos da América (27) e a própria literatura ficcional, fato atestado pela sua dramática e inédita recusa do Prêmio Nobel (28) até as viagens de lazer, as quais ele apreciava tanto, ficaram no passado (29). De qualquer sorte, quando Sartre escreveu o seu ensaio, as batalhas eram de outro tipo e de outra dimensão, posto que se tratava, naquele momento, de reconstruir a França e de tornar mais justo o mundo (30), e tudo isto militando politicamente no espectro político da esquerda, inicialmente como comunista e depois como maoista. Quanto a Beauvoir, quando ela escreveu as suas memórias, muitas das feridas abertas pela derrota da França e pela ocupação alemã já estavam relativamente curadas, e as épicas jornadas de agosto eram, naquele momento, tema para historiadores.

Parisienses celebram a liberação de Paris, agosto de 1944
Foto Ralph Morse [Life]

notas

NA - Tradução das citações do francês para o português da responsabilidade do autor.

1
Extrato do discurso do general Charles de Gaulle proferido no Hôtel de Ville no dia da Liberação de Paris.

2
Mas não pretendemos responder a essa questão, tarefa que é, aliás, impossível no espaço de um único artigo; contentaremo-nos em apresentar duas versões de um mesmo episódio. Adiante definiremos com mais precisão o objetivo desse texto.

3
“é necessário concluir que a liberação de Paris, episódio de uma guerra que se estendia ao universo, foi uma obra de todas as forças aliadas”. SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 659.

4
Assim o historiador francês Maurice Agulhon descreveu essas jornadas: “Contudo, em Paris, (e em uma escala menor em outras cidades) surgiu uma revolta urbana do dia 19 ao dia 24 de agosto para preparar a chegada da divisão blindada de Leclerc (avant-garde do exército de Patton). A liberação de Paris é uma revolta, inicialmente, muito moderna, muito “século XX”, com a greve como arma principal. Foi só nas últimas vinte e quatro horas que esta se direcionou para a tradição “século XIX” do combate de rua, com as barricadas de saco de areia ou feitas com árvores abatidas destinadas, ao mesmo tempo, a dificultar a circulação de veículos inimigos e servir de proteção aos soldados improvisados que atiravam nestes”. AGULHON, Maurice. Os cidadãos e a política. In DUBY, Georges (Org.). Histoire de la France urbaine. Paris, Seuil, 1983, p. 630.

5
BEAUVOIR, Simone de. La force de l’âge. Paris, Gallimard, 2009, p. 675.

6
Idem, ibidem.

7
SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 659.

8
Idem, ibidem.

9
BEAUVOIR, Simone de. La force de l’âge. Paris, Gallimard, 2009, p. 680. Sartre, por sua vez, assim descreveu os insurretos: “Ora, nesse mês de agosto, os combatentes que encontrávamos nas ruas eram jovens em mangas de camisa; eles tinham como armas revólveres, alguns fuzis, granadas e garrafas de gasolina; eles ficavam fora de si em face de um inimigo feito de ferro, por sentir a liberdade, a leveza dos seus movimentos, a sua disciplina inventada a cada minuto triunfava sobre a disciplina ensinada, ele mediam e nos faziam medir a potência nua do homem.” SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 660. Tradução nossa do Francês para o Português. Como se pode observar, o filósofo francês interpretou os insurretos a partir do conceito – na sua obra um conceito capital – de liberdade.

10
“Essa evocação, ao mesmo tempo material e simbólica, das condições de luta que tinham sido as de 1830, de 1848 ou de 1871, não contribuíram pouco para permitir à Resistência, notadamente aquela de inspiração comunista, de ligar a Liberação à tradição dos combates republicanos e populares de antigamente.” Agulhon, Maurice. Os cidadãos e a política. Em duby, Georges (Org.). Histoire de la France urbaine. Paris, Seuil, 1983, p. 630.

11
Em um ensaio escrito no ano de 1945, Sartre definiu amargamente o período da ocupação alemã: “Nós sentíamos o nosso destino nos escapar; a França era como um vaso de flores que se coloca no peitoril da janela quando há sol e que se retira à noite, sem lhe perguntar a opinião”. Paris sous l’occupation. In: SARTRE, Jean-Paul. Situations III. Paris, Gallimard, 2003, p. 24.

12
Sartre referiu-se dessa maneira aos bairros parisienses que já se encontravam liberados: “Assim, o outro aspecto da insurreição parisiense, é o ar de festa que não a abandonou. Bairros inteiros estavam endomingados.” SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 660.

13
BEAUVOIR, Simone de. La force de l’âge. Paris, Gallimard, 2009, p. 676.

14
SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 660.

15
BEAUVOIR, Simone de. La force de l’âge. Paris, Gallimard, 2009, p. 676, 677, 678.

16
SARTRE, Jean Paul. Situations III. Paris, Gallimard, 2003, p. 22.

17
Uma boa descrição de uma cidade em guerra: “Um caminhão alemão passou sob a janela; dois jovens soldados, muito louros, estavam de pé, metralhadores em punho; a vinte metros dessa posição, a morte os espiava, tinha-se vontade de gritar a eles: ‘cuidado!’ Houve uma saraivada de balas, e eles caíram.” BEAUVOIR, Simone de. La force de l’âge. Paris, Gallimard, 2009, p. 679. Como se pode observar, nem mesmo a guerra dispensa certa dose de ambiguidade.

18
SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 659.

19
BEAUVOIR, Simone de. La force de l’âge. Paris, Gallimard, 2009, p. 676.

20
SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 659.

21
A esse respeito escreveu Contat, notório sartrianista: “Para os leitores de L’Être et le Néant em 1943, a sua relação com situação da época era evidente. Em seguida, ele se distanciou desse livro, o próprio Sartre falando deste como de uma obra anterior a sua descoberta da história e da práxis. No entanto, várias situações concretas descritas nesse tratado de ontologia fenomenológica reenviam à Ocupação, às proibições feitas aos judeus. E esse livro de filosofia trata do começo ao fim de um único tema: a liberdade”. CONTAT, Michel. Sartre L’invention de la liberté. Paris, Textuel, 2005, p. 74.

22
A visão dos historiadores é bem menos, por assim dizer, “filosófica”, sobre as jornadas de agosto e sobre todos os eventos que ocorreram após a liberação da França: “Na França, cerca de dez mil pessoas foram mortas em processo ‘extrajudiciais’, muitas das quais por grupos de resistência independentes, de modo particular as Milices Patriotiques, que caçavam colaboracionistas suspeitos, confiscavam-lhes as propriedades e, não raro, fuzilavam-nos sumariamente. Cerca de um terço das execuções sumárias ocorreu antes do desembarque na Normandia em 6 de junho de 1944, e a maioria das restantes foi registrada ao longo dos quatro meses seguintes das lutas travadas em solo francês. De certo modo, os números são bastante reduzidos, considerando a intensidade do ódio recíproco e a desconfiança causada na França depois de quatro anos de ocupação e do regime do Marechal Pétain, em Vichy; ninguém se surpreendeu com as represálias – nas palavras de um ex-primeiro-ministro francês, já idoso, Edouard Herriot: ‘A França precisa primeiro passar por um banho de sangue, antes que os republicanos possam tomar as rédeas do poder’”. JUDT, Tony. Pós-Guerra: uma história da Europa desde 1945. Tradução José Roberto O’Shea. Rio de Janeiro, Objetiva, 2008, p. 56.

23
SARTRE, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 659.

24
“Uma cerimônia pomposa e sangrenta cuja execução havia sido criteriosamente regrada e que terminava, fatalmente, com mortos, algo como um sacrifício humano. É este triplo aspecto, de tragédia recusada, de apocalipse e de cerimônia, que conferiu à insurreição de agosto de 1944 esse caráter profundamente humano e esse poder que ela conservou de tocar os nossos corações.” Sartre, Jean-Paul. La libération de Paris: une semaine d’apocalypse. In: CONTAT, Michel; RYBALKA, Michel. Les écrits de Sartre. Paris, Gallimard, 1970, p. 662.

25
"A opinião pública ficou emocionada com a descoberta dos campos da morte (que os governos não ignoravam)". CONTAT, Michel. Sartre: l’invention de la liberté. Paris, Textuel, 2005, p. 80.

26
CONTAT, Michel. Sartre: l’invention de la liberté. Paris, Textuel, 2005, p. 80.

27
Em um livro publicado em 1948, ele afirmou: “Enquanto isso, o anti-semitismo e a negrofobia dos americanos, o nosso colonialismo, a atitude das grandes potência em face de Franco conduzem a injustiças menos espetaculares, porém visam também perpetuar o atual regime de exploração do homem pelo homem. SARTRE, Jean-Paul. O que é a literatura? Tradução Carlos Felipe Moisés. São Paulo, Ática, 2005, p. 2010. Como se pode perceber, o tratamento dispensado aos Estados Unidos da América é bem menos indulgente  do que aquele das trinta e três reportagens que ele havia escrito três anos antes em solo norte-americano.

28
Sartre recusou-o alegando duas razões: primo: não o havia pleiteado; secondo: não queria se tornar uma “instituição” (razão pela qual recusou, igualmente, ser membro do College de France).

29
“Nas viagens também, pois o viajante é uma perpétua testemunha, que passa de uma sociedade a outra sem jamais se deter em nenhuma, e porque, consumidor estrangeiro numa coletividade laboriosa, ele é a própria imagem do parasitismo”. SARTRE, Jean-Paul. O que é a literatura? Tradução Carlos Felipe Moisés. São Paulo, Ática, 2005, p. 2010. Destaque do autor.

30
A paz não representou, para Sartre, um motivo de regozijo: “Como se regozijar, de barriga vazia, do fim dessa guerra que não acabava de acabar, e que, depois de ter devastado as nossas terras, vai morrer nos diabos, nessas ilhas cujos nomes lembram um par de amêndoas e as apostas em família. E que fim abstrato: temem-se confusões no Japão, o exército japonês contra-ataca na Manchúria, o Imperador e os seus capitães falam de uma revanche, os chineses estão à beira de uma guerra civil; e, além de tudo isso, jovens e enormes potências se consideram com surpresa, com uma frieza cerimoniosa, se medindo e se respeitando, como esses lutadores que se fazem afagos rápidos nos braços e nos ombros antes de apunhalar”. La fin de la guerre. In: SARTRE, Jean Paul. Situations III. Paris, Gallimard, 2003, p. 49.

sobre o autor

Adson Cristiano Bozzi Ramatis Lima é Arquiteto e Urbanista pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Mestre em Estudos Literários pela UFES, Doutorando em Arquitetura e Urbanismo pela FAU-USP. Professor Assistente do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Maringá.

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